Projeto de resolução (ao DN de 7 de dezembro de 2020)

Proposta de resolução

Segue abaixo proposta de resolução ao DN de 7 de dezembro, pelos seguintes integrantes do Diretório: Jandyra Uehara, Julio Quadros, Natália Sena, Patrick Araújo e Valter Pomar.

1.O Diretório Nacional do Partido, reunido no dia 7 de dezembro de 2020, inicia homenageando dois companheiros que acabam de partir: Tabaré Vázquez, militante da Frente Amplio e duas vezes presidente do Uruguai; e Kjeld Jakobsen, que foi secretário de relações internacionais da CUT, SRI da prefeitura de São Paulo e diretor da Fundação Perseu Abramo. Tabaré presente! Kjeld presente!

2.O Diretório foi convocado para iniciar o balanço das eleições municipais de 2020 e para debater nossa posição na eleição da Mesa da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. Entretanto, antes disso temos a obrigação de chamar a atenção para o aprofundamento da tragédia sanitária, social e econômica.

3.Todos os indicadores confirmam que estamos em meio a mais uma onda de contaminações e mortes devido, não apenas ao Covid 19, mas principalmente devido as escolhas feitas pelo atual governo federal e pelos que se aliam a ele. Enquanto noutros países começa a vacinação, aqui no Brasil o governo Bolsonaro é um vetor de proposital desorganização.

4.Todos os indicadores confirmam, também, que o desemprego crescente, que vitima especialmente os jovens, a miséria e a fome vão crescer ainda mais, nas próximas semanas e meses. Passada a eleição, o auxílio emergencial será suspenso pelo governo federal.

5.Todos os indicadores confirmam, finalmente, que em 2021 a situação econômica do país continuará positiva para poucos e desastrosa para a imensa maioria.

6.O povo brasileiro precisa lutar contra esta situação e contra os governos (federal, estaduais e municipais) que são responsáveis por ela. A defesa do “Fora Bolsonaro, fora Mourão, este governo e suas políticas” deve ganhar as ruas, acompanhada pela luta em favor da anulação dos processos ilegais contra Lula e pela devolução de seus direitos políticos. Devemos construir a mais ampla unidade partidária na luta em torno do fora Bolsonaro, do impeachment e da restituição dos direitos políticos de Lula.

7.O Diretório Nacional propõe, aos movimentos, sindicatos, frentes e partidos, uma ação coordenada em defesa do impeachment do governo Bolsonaro, articulada com a proposta de reforma tributária justa, solidária e sustentável, subscrita pelo PT, que gere recursos para garantir vacinação universal, renda emergencial, geração de empregos e combate à desigualdade abissal.

8.Neste mesmo espírito, o Diretório Nacional orienta as bancadas petistas na Câmara dos Deputados e no Senado, a articular o lançamento de candidaturas democráticas e populares à presidência de ambas as casas. A crise do país é profunda e as bancadas do PT não podem se comprometer com quem está diretamente relacionado com esta crise e seu agravamento.

9.Finalmente, o Partido convoca, para o primeiro semestre de 2021, o seu 8º Congresso, com o objetivo exclusivo de prosseguir o debate iniciado no 6º Congresso, acerca do programa, da estratégia, da tática, da política de alianças e da organização do Partido.

10.Caberá também ao 8º Congresso (ou Encontro Extraordinário) concluir o balanço do processo eleitoral de 2020. Um balanço completo deve analisar, entre outras questões:

a/O crescimento da abstenção, dos votos brancos e dos votos nulos. Em que medida isso se deve a pandemia, em que medida se deve a razões políticas, qual o impacto que isto tem sobre a votação da esquerda e o que pode ser feito para reverter a situação, para impedir — conforme é o desejo do atual presidente do TSE — que se instale entre nós o voto facultativo na prática?

b/Como os votos válidos se distribuíram pelos diferentes campos políticos e pelos diferentes partidos? E qual a composição social, étnica, de gênero, geracional, regional e como se distribuí pelo tamanho de cidade, da votação de cada campo político e de cada partido?

c/Levando em consideração as diferenças entre eleições municipais e eleições gerais, em que medida os resultados eleitorais estimulam ou dificultam alianças políticas entre os diferentes partidos, tendo em vista as futuras eleições presidenciais?

d/Qual o impacto das eleições, sobre a disputa entre os diferentes setores da direita? Especificamente, como avaliar o desempenho eleitoral do bolsonarismo e o desempenho eleitoral da direita tradicional?

e/Como avaliar o desempenho da esquerda em geral, em particular o desempenho do PT, do PSOL e do PCdoB? No caso do PSOL e do PCdoB, o que este resultado projeta, quando levamos em conta a chamada cláusula de barreira?

f/Como avaliar o desempenho dos governadores de esquerda e que tipo de impacto isto pode ter na sucessão, em 2022?

g/Como avaliar as relações entre PT, PSB e PDT, tendo em vista o ocorrido nas eleições de Recife e de Fortaleza, bem como as declarações anteriores e posteriores de Ciro Gomes?

h/Como avaliar o fato de que, no primeiro turno de 2020, quase dois terços (63,7%) dos candidatos prefeitos à reeleição foram reeleitos, quando em 2016, somente 40% obtiveram êxito na reeleição, sendo que o percentual de reeleição se manteve acima de 60% em todas as eleições municipais desde 2000? Por quais motivos diminuiu o número absoluto de prefeituras petistas, embora tenha aumentado a presença de prefeitos em médias e grandes cidades, assim como crescido um pouco o número de habitantes governados pelo PT?

i/Levando em conta que em 2020 houve, pela primeira fez, fundo público para eleições municipais, como avaliar o seu impacto em geral e no PT em particular? O PT cumpriu o estipulado por lei e algo mais? Que conclusões tirar do fato de que mais da metade dos vereadores eleitos das cidades com mais de 200 mil habitantes foi financiada também por doações de empresários, especialmente do setor imobiliário e do comércio varejista?

j/Como avaliar e como enfrentar o antipetismo (e outras expressões do discurso da extrema direita, como o discurso moralista anticorrupção, de ódio, de crítica dos costumes e dos valores, de preconceitos contra pobres, trabalhadores, LGBTQI, negros, mulheres, assim como o fundamentalismo religioso) como arma ideológica, política e eleitoral, especialmente na reta final, para mobilizar o “exército de reserva eleitoral” das candidaturas conservadoras? E como avaliar o emprego desta arma, mediada pelas chamadas fake news, inclusive por partidos e candidaturas que fazem parte do arco de alianças do PT?

k/Em muitas cidades foram eleitas candidaturas de jovens, mulheres, negras e LGBTQI, assim como candidaturas indígenas, indicando uma renovação fundamental para o futuro da esquerda. Como estas candidaturas se distribuem pelos diferentes partidos, em que proporção estão nos partidos de esquerda, em que medida isto foi produto de uma política organizada e em que medida isto foi na contramão de interesses já estabelecidos? Como, a partir dos resultados obtidos, fortalecer a luta contra o racismo, a defesa das mulheres, dos jovens, dos LGBTI etc.

l/Que decorrências podemos extrair, dos resultados da eleição municipal, no que diz respeito a estratégia geral da esquerda, em particular na polêmica sobre a frente ampla e frente de esquerda? E que decorrências podemos extrair, no que diz respeito a nossas formas de organização de atuação, a nossa formulação programática e ao nosso discurso, a nossas políticas de comunicação, especialmente com a juventude e com os setores populares, bem como sobre nossa política, alianças e candidatura na próxima eleição presidencial? Como enfrentar a hegemonia das mídias das famílias tradicionais de direita, e como estabelecer uma comunicação massiva com os trabalhadores?

11.Sem prejuízo dos debates que serão concluidos pelo 8º Congresso (ou Encontro Extraordinário), o Diretório Nacional reunido no dia 7 de dezembro, iniciou um balanço. Mas antes de apresentar nossas conclusões preliminares, cabe dirigir uma saudação:

-à militância popular que fez campanha no primeiro e no segundo turno para as candidaturas da esquerda, em particular para as candidaturas petistas;

-a todas as nossas candidaturas majoritárias e proporcionais, tanto aquelas que foram vitoriosas, quanto aquelas que foram eleitoralmente derrotadas;

-as companheiras Marilia Arraes, Luizianne Lins, Benedita da Silva e Manuela Dávila, e através delas homenageamos a todas as candidaturas – em particular as de companheiras mulheres — que foram vítimas de uma campanha brutal de ataques, patrocinada pela velha e pela nova direita brasileira;

-as companheiras Margarida Salomão, de Juiz de Fora, e Marília Campos, de Contagem; e os companheiros José de Filippi, de Diadema, Marcelo Oliveira, de Mauá e  Edmilson Rodrigues, de Belém, através dos quais homenageamos todos e todas as candidaturas petistas e de esquerda que foram vitoriosas nas eleições 2020, tanto no primeiro quanto no segundo turno;

-aos mais de dez milhões de brasileiros e de brasileiras que votaram na esquerda, especialmente os mais de seis milhões que votaram em candidaturas do Partido dos Trabalhadores.

12.O Diretório orienta todas as instâncias do Partido dos Trabalhadores a se reunir, para fazer o balanço detalhado dos resultados eleitorais e principalmente para discutir como dar continuidade à nossa luta contra os governos e contra as políticas ultraliberais, em âmbito municipal, estadual e nacional. Pois o balanço só faz sentido se for orientado no sentido da luta, que será ainda mais necessária no próximo período, em que tudo indica vão piorar ainda mais as condições de vida do povo brasileiro, em função das políticas adotas pelo governo Bolsonaro e seus aliados.

OS NÚMEROS

13.O primeiro turno das eleições municipais aconteceu no dia 15 de novembro. O Brasil possui 5.568 municípios. E cada um destes municípios tem características próprias, que um balanço precisa levar em conta.

14.Em todo o país, o PT lançou 1.256 candidaturas às prefeituras, 1.292 candidaturas a vice e 28.900 candidaturas à vereança em 2.902 cidades. Ou seja: em pelo menos 3.020 cidades o PT não participou da chapa majoritária. E não tivemos candidatura à vereança em 2.666 cidades. Evidentemente, isto não se explica por razões eleitorais, mas por razões organizativas.

15.Em 5.511 municípios, a disputa eleitoral se encerrou no dia 15 de novembro. Destes, em 38 poderia ter havido segundo turno, mas já no primeiro turno uma das candidaturas conseguiu maioria absoluta. Em outras 57 cidades, a disputa foi ao segundo turno e se encerrou no dia 29 de novembro.

AS ABSTENÇÕES

16.Tanto no primeiro, quanto no segundo turno, um grande número de brasileiros e brasileiras não compareceu para votar, votou branco ou votou nulo. No primeiro turno, de um total de 147.403.074 eleitores aptos, 34.121.874 não compareceram para votar. Dos que compareceram para votar, 10.983.466 votaram branco ou nulo. Ou seja, 45.105.340 eleitores não votaram em nenhuma das candidaturas. O mais alto percentual de abstenção, brancos e nulos da história eleitoral recente do Brasil: 30,6% (contra 27,8% em 2016). Em alguns casos, como SP e RJ, o percentual de abstenção no primeiro turno chegou a 37,22% e 29,16%, respectivamente. E no segundo turno, se ampliou.

17.É importante lembrar que, com o recadastramento e a biometria, o número de abstenções, brancos e nulos de 2020 é mais próximo da realidade do que o de 2018. Na prática, isto quer dizer que parte expressiva da população escolheu não participar politicamente, instituindo uma espécie de voto facultativo de fato (ainda que não de direito) que afeta sobremaneira trabalhadores e trabalhadoras pobres.

18.Claro que parte desta abstenção pode decorrer do fato do artigo 14, parágrafo 1º da Constituição não considerar o voto obrigatório para maiores de 16 e menores de 18 anos, analfabetos e os maiores de 70 anos. Em 2016, por exemplo, 11.352.863 tinham 70 anos ou mais, 2.311.120 tinham 16 ou 17 anos, e 6.981.111 declararam ser analfabetos. Portanto, 20.645.094 pessoas. Mas o número de abstenções excede muito o número dos que podem exercer facultativamente o voto.

19.Na abstenção de 2020, é preciso considerar a pandemia e o estímulo que o TSE deu ao não comparecimento, ao facilitar a justificativa de voto. Entretanto precisamos levar em conta também outros fatores, entre os quais a decepção com a participação política eleitoral, especialmente entre eleitores que em 2018 votaram em Bolsonaro, e que em eleições anteriores apoiaram as candidaturas de Lula e Dilma.

20.Para o PT, é chave compreender as motivações dessas massas populares que se abstiveram, votaram branco e nulo. Até porque uma das implicações práticas desta abstenção tão alta é que o voto dos setores médios cresceu de importância relativa, elitizando o eleitorado.

21.Na esteira do debate sobre as abstenções, nulos e brancos, cabe também uma análise do fenômeno da compra de votos. Tanto no primeiro quanto no segundo turno, a compra de votos foi extremamente presente, por exemplo na cidade de Recife, neste caso praticada por apoiadores da candidatura do PSB.

O RESULTADO DA DIREITA

22.Cerca de 75% dos votos válidos no primeiro turno e parte majoritária dos votos no segundo turno foram dados para partidos que estão à direita do centro, seja a candidaturas vinculadas ao bolsonarismo raiz, seja a candidaturas vinculadas aos partidos tradicionais da direita: MDB, PSDB, PP, DEM, PSD etc. Partidos que, entre outras coisas, foram capazes de capitalizar a ajuda emergencial em seu favor.

23.Ou seja: a maioria dos novos governantes municipais e dos vereadores/as eleitos integram o campo político que deu o golpe em 2016, apoiou a condenação e prisão de Lula, contribuiu para a eleição de Bolsonaro e sustenta parte essencial das políticas adotadas por este governo.

24.Tanto no primeiro quanto no segundo turno, as candidaturas lançadas pelos partidos tradicionais de direita, como PSDB, MDB e DEM, se saíram eleitoralmente melhor do que aquelas explicitamente bolsonaristas.

25.Além disso, as pesquisas de opinião indicam um crescente desgaste de Bolsonaro e de seu governo.

26.Mas parte importante do eleitorado continua se orientando pelo repertório bolsonarista. Aliás, foi no esgoto bolsonarista que as campanhas de João Campos, de Melo e de Sarto foram buscar “argumentos” contra as candidaturas de Marilia Arraes, de Manuela Dávila e de Luizianne, respectivamente.

27.Parte das candidaturas eleitas e das candidaturas derrotadas, mesmo que não tenham explicitado isso durante a campanha eleitoral, apoia, apoiou e/ou pode voltar a apoiar o próprio Bolsonaro. Vide os casos de Fortaleza, de Vitória, de Cariacica, de Belém e de São Gonçalo.

28.Por tudo isso, embora seja correto dizer que Bolsonaro não saiu vencedor das eleições, embora possa ser dito que ele saiu derrotado das eleições, não se deve concluir daí que o resultado de 2020 decidiu o futuro de seu governo e seu potencial de reeleição.

29.O bolsonarismo não é um fim em si mesmo, mas um dos meios para implementar a política ultraliberal. E a verdade é que os apoiadores desta política foram amplamente vitoriosos nas urnas de 2020.

30.Por tudo isso, os resultados de 2020 confirmam, mais uma vez, que não virá principalmente da luta eleitoral-institucional o impulso necessário para derrotar o bolsonarismo e o ultraliberalismo. Para alterar a correlação de forças do país, faz-se necessário uma grande onda de lutas sociais. Sem isso, as próximas eleições tendem a perpetuar a atual correlação de forças, com pequenas inflexões à esquerda ou à direita.

O RESULTADO DO CENTRO E DA ESQUERDA

31.Do ponto de vista numérico, os partidos de centro (PDT, PSB, PROS, PV e Rede) obtiveram 13.018.963 votos no primeiro turno. Elegeram, somando 1º e 2º turnos, ao todo 658 prefeituras e 7.968 vereadores. A partir de 1 de janeiro de 2021, governarão cidades onde moram 10,74% dos brasileiros e brasileiras.

32.Os partidos de esquerda (PT, PSol, PC do B, PSTU, UP, PCO e PCB) obtiveram 10.451.618 votos no primeiro turno. Elegeram, somando 1º e 2º turnos, cerca de 234 prefeituras e 3.370 vereadores. A partir de 1 de janeiro de 2021, governarão cidades ondem moram 4,15% dos brasileiros e brasileiras.

33.No primeiro turno, os principais partidos de esquerda (PT, PSOL e PCdoB) apresentaram-se separados na maioria das eleições municipais. No geral, todas as candidaturas da esquerda tiveram muita dificuldade e até mesmo resistência a nacionalizar as campanhas.

O RESULTADO DO PT

34.As candidaturas lançadas pelos maiores partidos de esquerda (PT, PSOL e PCdoB) obtiveram cerca de 10.433.119 votos. Deste total, o PT obteve 6.971.136 votos, ou seja, 66% dos votos da esquerda foram dados ao PT; o PSOL teve 2.236.273 votos, ou seja, 21%; e o PCdoB teve 1.184.609, ou seja, 11%. Quanto ao número de prefeituras, o PT elegeu no primeiro turno 175 prefeitas/os, o PSOL elegeu 4 e o PCdoB elegeu 45. Das 57 disputas de segundo turno, o PT encabeçou 15 e venceu 4; o PCdoB encabeçou 1, que foi derrotada; o PSOL encabeçou 2 e venceu em uma.

35.Em 2012 o PT+PSOL+PCdoB conquistaram 21.688.830 votos; em 2016, os três partidos conquistaram 10.883.557 votos; em 2020, os três partidos conquistaram 10.392.018 votos. Estes números indicam, portanto, que o fenômeno principal, em 2020, não foi o de uma transferência de votos do PT para outros partidos de esquerda, mas sim o da transferência de votos do PT para fora da esquerda (outros partidos, abstenção, brancos, nulos).

36.No primeiro turno de 2020, o PT conquistou menos prefeituras do que em 2016: 175 contra 276. A queda ocorreu em todas as categorias de cidades, com ligeira melhora nas cidades grandes após o resultado no segundo turno.

37.Quanto ao número de vereadores, o PT elegeu 2609, o PSOL 88 e o PCdoB 678; somados, 3.375 vereadores e vereadoras. Cabe uma avaliação qualitativa, verificando o perfil das candidaturas eleitas: quantas mulheres, quantos negros e negras, quantos indígenas, quantos lgbti+, quantos são trabalhadores que estavam no processo de produção e de que categorias, quantos são reeleições etc.

38.Em 2020, o PT conquistou menos mandatos de vereadores do que em 2016: 2609 contra 2808. Destacamos que entre 2016 e 2020, deixaram de existir coligações proporcionais.

39.Por outro lado, no primeiro turno tivemos um crescimento no número de votos no PT: de 6.843.575 em 2016 para 6.971.136 votos em 2020. Este crescimento pode ser considerado vegetativo, pois nesses quatro anos cresceu o eleitorado como um todo. Mas o crescimento se deu na contramão do número de votos válidos e também do universo total de eleitores de esquerda.

40.A conjuntura de 2016 era muito pior do que a de 2020. E o número total de candidaturas lançadas pelo PT em 2020 foi maior do que o de 2016. Portanto, tínhamos um ambiente político melhor e um número maior de candidaturas. Porque então não tivemos um resultado maior? Entre os motivos, destacamos os seguintes:

41.A maior parte de nossas campanhas não foi nacionalizada, não foi de fato organizada em torno do objetivo de acumular forças pelo Fora Bolsonaro. Este objetivo estava escrito em nossas resoluções, mas não se materializou na imensa maioria das campanhas, que giraram em torno de questões locais. Também estava escrito que faríamos campanhas em defesa do legado dos governos petistas e em defesa de Lula. Mas isto igualmente foi a exceção, não a regra.

42.O Diretório Nacional não considerou a possibilidade de que fossemos reduzir o número de prefeituras governadas por nós, nem reduzir o número de vereadores. Pelo contrário, prevaleceu a ideia de que, lançando mais candidaturas e atuando numa situação política melhor do que a de 2016, cresceríamos. E isso não ocorreu. Como não imaginávamos que pudesse ocorrer, não tomamos as devidas medidas.

43.Faltou política no enfrentamento da compra de votos, houve dificuldades na política de comunicação, faltou uma política para lidar com a abstenção, os votos brancos e nulos. Destacamos o fato do Partido simplesmente não existir, não estar organizado, em um grande número de cidades do país. E citamos a crença nas pesquisas eleitorais, desmentidas inúmeras vezes tanto no primeiro, quanto no segundo turno.

44.Não antevimos e, portanto, não nos preparamos para o crescimento das candidaturas de direita na reta final. Em outras eleições, o PT demonstrou ser um “partido de chegada”, capaz de crescer muito na reta final. Nesta eleição, muitas vezes foi a direita que demonstrou esta capacidade, com crescimentos imensos de votação na reta final da disputa.

45.É principalmente nesse sentido que deve ser compreendido o papel do antipetismo: como uma arma mobilizada pela direita na reta final das campanhas, muitas vezes pegando de surpresa nossas candidaturas, especialmente aquelas que haviam baixado a guarda, que não haviam feito o debate político, que não quiseram radicalizar o confronto de ideias e de projetos, que achavam que sem explicitar os símbolos do Partido não atrairiam rejeição. O antipetismo, como o anticomunismo no passado, é uma arma sempre disponível no arsenal da direita; não é nada de novo, nem de extraordinário, nem de invencível. Mas exige um trabalho permanente de organização e de disputa ideológica, por exemplo em torno de temas como a corrupção, as causas da crise nacional, os direitos humanos e civis, a religiosidade etc. Sem este trabalho permanente, continuaremos nos deparando com situações em que segmentos do eleitorado votam silenciosamente na direita, não por conta do que foi dito e feito na campanha eleitoral, mas por conta de uma adesão mais profunda, cristalizada ao longo de anos e décadas.

46.Entre os erros é preciso citar, também, a tática adotada nas cidades onde o Partido existe, mas decidiu não lançar candidatura à prefeitura; bem como a tática adotada naquelas cidades onde o Partido, em flagrante desrespeito a expressa proibição, decidiu fazer aliança com partidos de direita.

47.Citamos, ainda, os erros cometidos em Belo Horizonte, resultado não apenas de escolhas eleitorais, mas da promiscuidade com o prefeito hoje reeleito; os erros cometidos em Salvador, que contribuíram para a vitória em primeiro turno do candidato do DEM; e desastre eleitoral, político e organizativo de imensas proporções ocorrido em João Pessoa.

48.O desempenho do partido em vários dos estados governados pelo PT indica um desacumulo no desempenho eleitoral do Partido. O caso do Ceará (em que o governador fez campanha, já no primeiro turno, para a candidatura do PDT) é particularmente grave.

49.Citamos, ainda, a tática adotada em São Paulo, onde o Diretório Nacional recusou, em reunião realizada em agosto de 2020, convocar Fernando Haddad para ser candidato. Com isso se perdeu a última oportunidade que havia para corrigir um processo eivado de problemas. Nas semanas seguintes a citada reunião do DN e até o final do primeiro turno, fomos alvo de uma campanha que pressionava o PT a retirar a candidatura de Tatto em favor da candidatura Boulos, do PSOL. Esta campanha utilizou vários argumentos, o principal dos quais era o de que a manutenção da candidatura do PT impediria a esquerda de estar no segundo turno das eleições municipais. Este argumento foi derrotado pelos fatos: a manutenção até o final da candidatura Tatto não impediu que a candidatura Boulos fosse ao segundo turno. Felizmente, o candidato e uma parte da base do partido recusaram as pressões e mantiveram a candidatura até o fim. Ao término da campanha, o mapa dos votos da candidatura Boulos 2020 coincidiu com o voto da candidatura Haddad de 2018. E parte importante do resultado se deveu ao esforço da militância petista e do próprio candidato Jilmar Tatto.

50.Entre os problemas que afetaram nosso desempenho, existem também os que dizem respeito a gestão do fundo eleitoral. Neste caso, propomos que o Diretório faça uma análise detida das decisões adotadas e dos problemas verificados, bem como da relação entre recursos alocados e votação obtida.

51.Vista a situação de conjunto, obtivemos vitórias eleitorais e políticas, assim como derrotas eleitorais e vitórias políticas (por exemplo, o que fez a militância e a grande Benedita da Silva, no Rio de Janeiro capital; e o resultado obtido em Recife, com a candidatura de Marilia Arraes). Mas em âmbito nacional, o resultado de conjunto não pode ser considerado uma vitória, nem eleitoral, nem política.

52.Apesar de termos lançado mais candidaturas e apesar de termos atuado em uma conjuntura mais favorável, reduzimos o número de prefeituras e de mandatos parlamentares conquistados em 2020, em comparação com 2016.

53.Fomos ao segundo turno em um número maior de cidades do que em 2016, mas das 18 cidades que disputamos, a esquerda só conquistou 5, sendo que o PT não conquistou nenhuma capital. E, no final das contas, continuamos governando mais ou menos o mesmo número de brasileiros.

54.Portanto, embora possamos falar de vitórias e/ou de derrotas parciais em comparação com 2016, isto não altera o fundamental: nosso desempenho eleitoral em 2020 contribuiu muito pouco para ampliarmos significativamente, seja nossa oposição ao governo Bolsonaro, seja para construirmos uma candidatura presidencial poderosa para as próximas eleições. Neste sentido – ou seja, no que diz respeito as batalhas futuras, e não no que diz respeito a comparação com batalhas passadas – sofremos uma derrota.

TAREFAS PARA 2021

55.As eleições confirmaram que não estamos diante de uma corrida de 100 metros, mas sim de uma maratona. E esta maratona não terá como trajeto principal as disputas eleitorais, mas sim a disputa política, social e cultural travada fora dos períodos eleitorais.

56.A tendência econômica e social de curto prazo — e, se não houver mudança, de médio prazo também — é de deterioração progressiva. Os indicadores apontam para o crescimento da fome, da pandemia, do desemprego, especialmente na juventude. Mas é um equívoco achar que a simples piora nas condições de vida vá levar a um processo espontâneo de politização pela esquerda; é preciso levar em conta a existência de uma direita organizada, entrelaçada com o fundamentalismo religioso, com milícias e o crime organizado. Nesse contexto, só a ação organizada da esquerda política e social pode impedir que a degradação social resulte em ainda mais apatia e conservadorismo.

  1. Em certa medida foi o que ocorreu em 2020: a crise nacional contribuiu para desgastar Bolsonaro, mas não foi suficiente para tirar o timão da mão dos outros setores da direita. As lutas sociais ocorridas nos últimos meses não tiveram a capacidade de comover o país, gerar solidariedade ampla para além das camadas militantes. No plano das lutas sociais espontâneas, tampouco houve uma resposta a altura. A precarização brutal não está sendo acompanhada de uma radicalização nas lutas. Mesmo o assassinato cometido pelos seguranças do Carrefour não teve, até agora, a resposta justa e necessária.

58.Por outro lado, tem havido um aumento dos homicídios, do feminicídios, do racismo, da lgbtfobia, da intolerância, da violência policial, da criminalidade, da frequência nas igrejas fundamentalistas e o aumento da grosseria e da incivilidade no cotidiano. E tem crescido a compra de armas por “cidadãos de bem”.

59.Um de nossos grandes desafios é fomentar e politizar a insatisfação popular. Ou é isso, ou seguiremos dependentes da dinâmica eleitoral-institucional, cujos limites –ao menos neste momento– estão mais do que evidentes. Como já dissemos, é desta perspectiva que propomos enfrentar o debate sobre a eleição do presidente da Câmara e do Senado. Não podemos comprometer o PT com candidaturas da direita, opção que influenciaria negativamente nossa capacidade de oposição às políticas que o governo impulsiona e a maioria do Congresso endossa. É preciso preservar a independência de classe, contra os que querem –a pretexto de combater o bolsonarismo e o neofascismo– transformar a classe trabalhadora em linha auxiliar de um dos setores da classe dominante.

60.É preciso aproveitar o fato de 2021 ser um ano sem eleições, para ampliarmos ao máximo a mobilização e a organização do povo. Defendemos que as grandes organizações do povo (as frentes, os partidos, os sindicatos, os movimentos) atuem nessa perspectiva, implementando uma intensa mobilização política, cultural e social contra o bolsonarismo e o ultraliberalismo, que se materialize numa retomada do trabalho cotidiano de base, capilarizando nossa presença em todo o território nacional e em todos os setores sociais.

61.Concluímos este documento reafirmando que a transformação do Brasil exigirá mais luta de classe, mais radicalização, mais polarização, mais enfrentamento de projetos, mais batalha cultural, mais defesa clara e explícita de nosso projeto democrático, popular e socialista. Contra isso, ergue-se dentro e fora do Partido um discurso segundo o qual a população não quereria radicalismo, a população desejaria moderação, saídas pelo centro. E que, portanto, o PT deve recuar, sair de cena, abrir espaço para que outros protagonizem o processo político etc. Pedem que o PT faça, ele próprio, aquilo que a extrema direita e a direita não conseguiram fazer, ao longo de 40 anos: nos derrotar. Não aceitamos estes conselhos. Tudo o que de positivo ocorreu no Brasil, nas últimas 4 décadas, teve a participação da militância petista. Foi um avanço imenso, para o Brasil, que a disputa política tenha sido polarizada, entre 1989 e 2018, pela direita e pela esquerda. E na cabeça da esquerda esteve sempre o PT. Esta posição não foi uma herança, foi conquistada com muito suor, lágrimas, sangue e luta. Sabemos que vitórias passadas não movem moinho; que antiguidade não é posto; que o PT sozinho não teria conseguido fazer nada do que fez; e consideramos totalmente legítimo que outros setores da esquerda disputem, conosco e muitas vezes contra nós, a hegemonia junto a classe trabalhadora. Somos defensores de primeira hora de uma frente de esquerda política e social, assim como defendemos que o PT contribua ativamente para que o PSOL e o PCdoB enfrentem os problemas derivados da cláusula de barreira.

62.Temos pela frente uma maratona. Nada está garantido. Os riscos são enormes. Mas o que está em jogo vale todo sacrifício: a sobrevivência digna, os direitos da maioria do povo, as liberdades democráticas, o desenvolvimento e a soberania nacional, a integração latino-americana e caribenha, a construção de um Brasil e de um mundo socialistas.

Viva o Partido dos Trabalhadores!

Viva a classe trabalhadora brasileira!

Fora Bolsonaro!

Anula STF!

Lula livre!

 

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