Página 13 divulga, a seguir, as resoluções do sétimo congresso nacional da tendência petista Articulação de Esquerda, ocorrido nos dias 23 e 24 de julho de 2022
DECLARAÇÃO POLÍTICA
Nos dias 23 e 24 de julho de 2022 a tendência petista Articulação de Esquerda realizou seu 7º Congresso Nacional. No primeiro dia do Congresso foram apresentados e debatidos os seguintes textos: “Resolução sobre Ucrânia”, “O destino do Brasil depende da batalha de outubro”; “Emendas às diretrizes do programa de reconstrução do Brasil”; “Resolução sobre conjuntura e tarefas”; “Contra a violência, organização e guarda alta”. No segundo dia foram debatidas as emendas e aprovadas as resoluções finais. Os textos citados serão publicados como parte integrante das resoluções do 7º Congresso. O Congresso aprovou também a seguinte DECLARAÇÃO.
1.O destino do Brasil depende das eleições de outubro de 2022. Uma vitória eleitoral ou golpista do cavernícola aprofundaria a destruição de nossas liberdades democráticas, degradaria ainda mais a situação social, reduzirá nossa soberania nacional, reafirmaria a opção primário-exportadora da classe dominante e bloquearia nossas perspectivas de desenvolvimento. Já a vitória de Lula abrirá a possibilidade de construirmos um Brasil com liberdades, bem-estar social, soberania e desenvolvimento à serviço da maioria do povo brasileiro.
2.Nossa vitória em outubro não está garantida, nem no primeiro, nem no segundo turno. Pesquisas não ganham eleição. Nossos inimigos são poderosos, tem recursos e já demonstraram serem capazes de absolutamente tudo. O cavernícola combina ações de governo, tipicamente fisiológicas, com iniciativas políticas intimidatórias e abertamente golpistas, que não encontraram até agora resposta à altura, nem da parte das chamadas “instituições” nem tampouco da parte da oposição popular. Este é um dos motivos pelos quais defendemos que a campanha de Lula assuma um caráter de massas. Dia 16 de agosto – primeiro dia oficial de campanha – devemos ocupar as ruas em todo o país, realizando um ato nacional unificado da campanha Lula presidente, sem medo de ser feliz!
3.Vencer em outubro depende essencialmente da nossa capacidade de mobilizar a maioria do povo brasileiro. E para isso é preciso oferecer a perspectiva de um futuro melhor e diferente. Lula simboliza isto para parcelas importantes do povo brasileiro. O mesmo não pode ser dito acerca do vice, de muitas candidaturas a governador e ao senado, tampouco de certos aliados e de aspectos de nosso programa, que introduzem rebaixamentos e contradições de cujo correto tratamento depende em grande parte da mobilização de massas indispensável tanto à vitória quanto à defesa do futuro governo. A pior atitude frente a estas contradições é tratar neoaliados como se companheiros fossem. Ademais, os métodos adotados para impor ao Partido determinadas coligações deixaram diversas sequelas. É preciso reconhecer abertamente estas contradições e, ao mesmo tempo, fazer de tudo para viabilizar o centro da tática: eleger Lula presidente. Sabendo desde já que, alcançado o objetivo de eleger Lula presidente, a luta continuará, contra três inimigos: a extrema-direita, o neoliberalismo e o imperialismo.
4.A extrema-direita, seja ou não bolsonarista, não desaparecerá. Mesmo que não vençam a eleição, mesmo que não tentem ou não tenham êxito em realizar um golpe, mesmo que não tenham êxito em sabotar a transição, continuará sendo uma força ativa e perigosa. Contra a extrema direita devemos implementar duas ações combinadas: por um lado, devemos adotar políticas públicas que neutralizem ou conquistem as bases sociais da extrema-direita junto aos setores populares; por outro lado, devemos combater, processar, condenar e encarcerar os criminosos que lideram o bolsonarismo. Isso inclui com destaque desmontar a influência do bolsonarismo nos meios de comunicação, nas empresas da fé, nas forças armadas e nas polícias. Neste último terreno, não se pode repetir a conciliação praticada pelas forças democráticas na chamada “transição”, nos governos tucanos e nos governos Lula e Dilma. Nosso partido e nosso futuro governo não podem vacilar no enfrentamento permanente e cotidiano com os defensores da ditadura e da tutela militar, tampouco com os defensores de uma política de (in)segurança que converte pobres, periféricos e pretos em alvo de violência estatal sistemática.
5.Os neoliberais – seja os de extrema-direita, seja os da direita gourmet e ainda os abrigados em partidos de centro e esquerda – tampouco desaparecerão depois da eleição. Pelo contrário: a presença de Alckmin na candidatura à vice-presidência, o apoio da esquerda a várias candidaturas neoliberais, a influência do social-liberalismo em aspectos do programa da Federação Brasil da Esperança, tudo isso nos dá a certeza de que no melhor dos cenários viveremos novamente, a partir de 2023, uma situação de governo em disputa. Para que esta disputa não tenha desdobramentos similares aos de 2003-2005 e/ou aos de 2015-2016, é preciso construir – em torno do do PT, do PCdoB, do PSOL, da CUT e do MST, entre outras organizações – um núcleo de esquerda disposto não apenas a defender o governo de seus inimigos externos, mas também disposto a disputar os rumos do governo contra os inimigos internos, expressão política da classe dominante brasileira: os capitalistas, especialmente do agronegócio, das mineradoras e do setor financeiro.
6.O principal inimigo externo de um futuro governo Lula será o imperialismo. E a principal dificuldade para enfrentar este inimigo está na postura ingênua adotada por amplos setores da esquerda brasileira frente aos Estados Unidos. A esse respeito, lembramos dos seguintes exemplos: i/ os que achavam que não haveria golpe em 2016 (e que tampouco poderá haver agora) porque supostamente “os EUA não aceitariam”; ii/os que se desmancharam em elogios ao atual presidente dos EUA, chegando a falar em “revolução no capitalismo” e dizendo que Lula seria o “Biden brasileiro”; iii/os que acreditavam (e parecem seguir acreditando) que a crise do capitalismo em 2008, o declínio da hegemonia dos EUA e a ascendência de um mundo multipolar poderia se dar em termos fundamentalmente pacíficos. A verdade nua e crua é a seguinte: vivemos tempos de guerra. Nosso inimigo nesta guerra não é a Rússia, nem a China. Motivos de sobra para nosso futuro governo concentrar parte importante de suas energias na retomada do BRICS e, principalmente, na retomada da integração latino-americana e caribenha, reforçando a dimensão material, econômica, produtiva, industrial desta integração. Assim como é fundamental que nosso Partido reforce o Foro de São Paulo, assim como aprofunde as relações com partidos de esquerda da África e da Ásia.
7.Frente a tantos e tão poderosos inimigos – o imperialismo, o neoliberalismo e a extrema-direita, a classe dominante – não bastará controlar o governo federal, alguns governos estaduais e parcela minoritária dos parlamentos nacional e estaduais. Também por isto, o ano de 2023 não pode ser dedicado apenas às tarefas de “ocupar a máquina e administrar”. Ocupar a máquina, expulsar dela nossos inimigos, tomar as medidas administrativas previstas em nosso programa constituem tarefas fundamentais, mas não se deve perder de vista o objetivo estratégico mais importante: a retomada e reorganização de nossa presença capilarizada nos locais de trabalho, de moradia, de estudo, de cultura, esporte e lazer. A disjuntiva é a seguinte: ou bem num curto espaço de tempo reorganizamos e colocarmos em movimento nossa base social, ou mais uma vez seremos vítimas da ilusão acerca das vitórias eleitorais e do exercício de mandatos institucionais. Nesta perspectiva, devemos seguir estimulando a formação dos Comitês Populare de Luta e, passada a eleição, fazer um balanço da experiência, na perspectiva deles virem a ser um dos instrumentos para contribuir na mobilização da classe trabalhadora também depois do processo eleitoral.
8.O ciclo de governos Lula e Dilma de 2003 a 2016 demonstrou que a classe dominante sabe usar a institucionalidade estatal, não apenas para sabotar, mas inclusive para derrubar governos eleitos pela esquerda. Fomos capazes de vencer quatro eleições presidenciais seguidas, mas não fomos capazes de evitar um golpe. Evitar que isto se repita exige combinar medidas no plano do Estado (por exemplo, acabar com a tutela das forças armadas, acabar com a militarização e violência sistemática dos aparatos de segurança contra os setores populares, acabar com a partidarização do sistema judiciário e com a judicialização da política, bem como fazendo uma reforma política e adotando uma política de participação popular, acabando com o oligopólio privado da comunicação e implementando fortes políticas culturais e educacionais) com a auto-organização da classe trabalhadora, das mulheres, da juventude, dos negros e negras, de todos os setores populares.
9.Logo depois do golpe de 2016 e durante a campanha Lula Livre, um importante setor do Partido começou a debater estas questões, na perspectiva de formular uma nova estratégia para um novo período histórico. Mas desde que recuperamos os direitos políticos de Lula, este objetivo de formulação de uma nova estratégia foi deixado de lado em favor da velha “teoria” da “governabilidade através de alianças com setores de centro e direita”.
10.O ciclo 2003-2016 também demonstrou a necessidade de articular políticas públicas (destinadas a enfrentar os problemas urgentes e imediatos, tais como a fome, o desemprego, a desassistência) com reformas que alterem as estruturas permanentes da sociedade brasileira. Sendo assim, nosso programa de governo precisa combinar “reconstrução” com “transformação”. Entretanto, nas seguidas versões do programa debatido e aprovado, tanto pelo PT quanto pela Federação, há uma crescente ênfase na “reconstrução” em detrimento da “transformação”. Temas estruturantes como o papel do agronegócio, do capital financeiro, das forças armadas, da Assembleia Nacional Constituinte etc. são tratados de maneira superficial ou incorreta. No lugar de uma solução para os problemas estratégicos, ressurge a igualmente velha “teoria” da “aliança com setores do empresariado”. Entre os temas estruturantes destacamos o da saúde. Precisamos retomar a luta pró-Sistema Único de Saúde. Parcelas relevantes da classe trabalhadora migraram para o seguro-saúde. As operadoras de saúde excluem trabalhadores aposentados e idosos, impossibilitados de arcar com as elevadas prestações. Os planos de saúde são inimigos da classe trabalhadora. Não se pode conviver com uma atenção à saúde que aprofunda as desigualdades sociais, em que apenas 25% da população detentora de cobertura privada consome mais de 50% do gasto total em saúde no Brasil, deixando os mais pobres com serviços racionados e tornando amplos setores da classe trabalhadora crescentemente dependentes da saúde como mercadoria. Nem se pode admitir um SUS privatizado e terceirizado.
11.Precisamos reconstruir, não apenas no PT mas no conjunto da esquerda e da classe trabalhadora brasileira, uma maioria disposta não apenas a defender reformas social-democratizantes, mas disposta a lutar por uma revolução socialista. O que, nas atuais condições do capitalismo brasileiro e mundial, significa uma revolução democrática, popular, negra, feminina, antipatriarcal, antiimperialista e anticapitalista. E fazer isto em um momento histórico marcado por uma crise sistêmica do capitalismo, pelo declínio dos Estados Unidos, pela ascensão da China, por instabilidade e guerras.
12.Não será fácil enfrentar esta situação, nem será fácil dar conta destas tarefas, seja na luta contra nossos inimigos de classe, seja na disputa ideológica na própria esquerda brasileira PT. Um sinal das dificuldades é que a maioria das tendências petistas capitulou sem luta diante do “frente-amplismo”. Outro sinal das dificuldades é a rapidez e a mínima resistência com que várias organizações surgidas da crítica e da ruptura com o PT, hoje se converteram às posições antes criticadas. As dificuldades são agravadas, ademais, pela degeneração causada pelo eleitoralismo, pela transferência de poder para parlamentares e governantes, pela substituição da militância por cabos eleitorais. Contra tudo isto, seguiremos lutando em defesa do Partido e de nosso objetivo histórico e estratégico: um Brasil democrático, popular e socialista. Para contribuir neste sentido, convocamos para setembro de 2023 o 8º Congresso Nacional da tendência petista Articulação de Esquerda, que nessa data completará 30 anos de vida. Caberá a este 8º Congresso: i/elaborar a linha política para a situação pós-eleitoral; ii/formular nossa linha de atuação nos estados, municípios e setores; iii/adotar medidas organizativas (comunicação, formação, finanças) que permitam incorporar, nas fileiras da tendência, a base militante que se aproximou de nós, especialmente durante o período de pandemia e durante a campanha eleitoral, como parte da preparação para o próximo congresso partidário.
13.Como dissemos e repetimos mais uma vez: a vitória em outubro de 2022 não está garantida. Mas temos muitos motivos para ter otimismo, seja com o resultado eleitoral, seja com o que virá depois. A eleição de Lula abre a possibilidade de retomarmos o processo de transformação do Brasil, no sentido de construirmos soberania, bem-estar social, desenvolvimento e socialismo. Mas para transformar esta possibilidade em realidade, será preciso linha justa, muito trabalho e guarda alta, cabendo ao PT em todos os níveis assumir a coordenação deste esforço para fazer uma campanha Lula massificada, nos locais de trabalho e lazer, nas escolas e nos locais de moradia, nas redes e nas ruas. Da nossa parte, que nunca vacilamos na defesa do PT, seguiremos fazendo o que sempre fizemos: disputar os rumos do Partido, entendendo esta disputa como parte importante da disputa pelos rumos da classe trabalhadora brasileira. Em nossa opinião, quanto maior é o agravamento da crise sistêmica do capitalismo mundial e quanto mais profunda é a crise nacional, mais necessária se torna a existência de um Partido dos Trabalhadores e das Trabalhadoras comprometido com a luta por impor uma derrota global ao bolsonarismo, ao neoliberalismo, ao imperialismo e ao capitalismo. E para isso será preciso construir – nas ruas, nas urnas e na classe trabalhadora – uma política disposta a fazer, além de políticas públicas, transformações estruturais na sociedade brasileira, em direção ao socialismo.
Viva o PT, viva a esquerda brasileira, viva a classe trabalhadora!
Lula presidente!
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MOÇÕES
Moção sobre o Andes e as eleições presidenciais
As professoras e professores universitários da tendência petista Articulação de Esquerda participam do movimento Renova Andes. Consideramos fundamental disputar os rumos do Andes, principal sindicato nacional da categoria dos docentes do ensino superior.
Hoje o Andes é dirigido por uma coligação de tendências e partidos que têm como principal ponto comum o antipetismo e como prática a partidarização do sindicato, em detrimento dos interesses da categoria docente e da educação pública.
O exemplo mais recente disso foi a decisão tomada pelo 65° Conselho de Seções Sindicais do Andes-SN.
Nele, a diretoria do Andes não dedicou nenhum esforço nem tempo para um debate profundo sobre as eleições presidenciais de 2022. A proposta, feita pelo Renova Andes, de uma carta a ser entregue o Lula pelo reconhecimento dele ser o único capaz de derrotar Bolsonaro, foi duramente atacada e derrotada no 65o CONAD. A atual diretoria do ANDES não apresentou qualquer proposta para o debate sobre as eleições. E defendeu que a carta proposta pelo Renova Andes fosse enviada para todas as candidaturas do campo da esquerda, defendendo ademais retirar todo o conteúdo proposto e se propôs reescrevê-la baseada “no acúmulo histórico”.
Na curta discussão a respeito, a principal argumentação da atual diretoria do Andes foi de que um sindicato autônomo não pode se manifestar em processos eleitorais. Não apenas um erro grave, mas uma hipocrisia, pois o que estamos vendo é um projeto partidário liderando o posicionamento da diretoria do ANDES contra a defesa da unidade da esquerda no primeiro turno. A principal razão disto está no fato da atual diretoria do ANDES estar atrelada ao Conlutas, aos defensores do Fora Todos, defendendo posições anti-lulistas e anti-petistas, com integrantes do PCB e do PSTU, entre outros. Isso se expressou nas posições do Conlutas e da diretoria do Andes-SN de não reconhecer o golpe de 2016, de não se mobilizar contra a prisão do Lula e de, agora, não querer se manifestar corretamente numa das mais importantes eleições para a classe trabalhadora brasileira.
Por estes e outros motivos, a atual diretoria do Andes precisa ser derrotada, sob pena da desmoralização do sindicato nacional dos docentes do ensino superior.
Moção sobre Temer
O congresso nacional da tendência petista Articulação de Esquerda endossa o sentido geral da carta pública, divulgada recentemente pela presidenta Dilma Rousseff, desmascarando as posições de Michel Temer. Golpista, neoliberal e inconfiável, Michel Temer não é aliado das forças democráticas e populares na luta contra o bolsonarismo e contra o neoliberalismo.
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ANEXOS
O DESTINO DO BRASIL DEPENDE DA BATALHA DE OUTUBRO
1.No dia 2 de outubro de 2022, acontecerá o primeiro turno das eleições para a presidência da República e governos estaduais, assim como a eleição de 2/3 do Senado Federal, de toda a Câmara dos Deputados e de todas as Assembleias Legislativas. Do ponto de vista formal, trata-se de um fenômeno corriqueiro, que vem acontecendo sem interrupção desde 1994. Mas do ponto de vista político, trata-se de uma encruzilhada decisiva na história do Brasil, comparável sob vários aspectos a outros momentos decisivos, como é o caso de 1930, 1964, 1989 e 2002. Se triunfarem as forças políticas e sociais reunidas em torno da candidatura do cavernícola, terá continuidade a marcha em direção ao passado. Se triunfarem as forças reunidas em torno da candidatura de Lula, estará aberta a possibilidade de caminharmos em direção a um futuro de liberdades políticas, bem-estar social, desenvolvimento econômico e soberania nacional. Dizemos aberta a possibilidade, pois a derrota do bolsonarismo, do neoliberalismo e do imperialismo exigirá muitos outros enfrentamentos: a batalha de outubro de 2022 é um momento crucial, mas a guerra será longa.
2.As pesquisas eleitorais publicadas até o momento indicam duas coisas: a polarização da disputa entre Lula e o cavernícola; e a vitória de Lula, no primeiro ou no segundo turno das eleições presidenciais. Mas não se deve confundir pesquisa eleitoral com resultado das eleições. Temos pela frente uma campanha duríssima, contra um adversário violento, num cenário nacional e mundial muito diferente do cenário predominante nas eleições de 2002, 2006, 2010 e 2014. Além disso, a história do Brasil já demonstrou diversas vezes e confirmou tanto no golpe de 2016 quanto na fraude de 2018: a classe dominante brasileira, a cúpula das forças armadas, o oligopólio da comunicação, os setores médios conservadores, as milícias e as empresas da fé não tem compromisso com as liberdades democráticas. Nos últimos meses e semanas, a extrema direita está escalando: a violência policial é um sinal disto. E não interessa, nem aos Estados Unidos, nem a classe dominante, uma vitória de Lula no primeiro turno das eleições. Neste sentido, as candidaturas de Ciro Gomes e da direita gourmet, mesmo que não decolem eleitoralmente, podem ter votos suficientes para forçar um segundo turno, fazendo neste sentido o jogo do bolsonarismo. Por estes e por muitos outros motivos, cabe a nós trabalhar e vigiar!
3.Trabalhar duro para ganhar o voto e o engajamento militante da maioria da classe trabalhadora brasileira, não apenas o voto em Lula, mas nas candidaturas de esquerda para os governos estaduais, senado, assembleias e Câmara. Devemos ampliar ao máximo nossa presença no congresso nacional e nos parlamentos estaduais, de modo a contribuir para a governabilidade. Nosso objetivo na campanha não é acalmar os mercados e seduzir os setores médios, nosso objetivo é ganhar corações e mentes de cada trabalhadora e de cada trabalhador, inclusive daqueles que em 2018 votaram em branco, votaram nulo, não votaram e até mesmo votaram no cavernícola.
4.Vigiar significa estar preparado para absolutamente tudo: não se deixar confundir e não recuar diante das mentiras e da violência do cavernícola e de seus milicianos; estar preparado para tentativas de tumultuar as eleições e fraudar seus resultados; e, conquistada a vitória, seja no primeiro ou no segundo turno, estar mobilizados para garantir a posse e apoiar o futuro governo. E manter a política no comando: é preciso travar e ganhar o debate político em todos os terrenos.
5.A eleição não está garantida, a vitória não está conquistada. Como já dissemos, as pesquisas publicadas até o momento indicam que Lula deve ser eleito, no primeiro ou no segundo turno. Mas, como também já dissemos e vamos repetir, as eleições de 2022 não ocorrem em condições normais de temperatura e pressão. Por isso, a vitória depende de linha política acertada, organização e engajamento da militância. Em resumo, trata-se de fazer não apenas uma campanha eleitoral, mas principalmente um movimento político e social em favor da eleição de Lula.
6.Desde 2016 e principalmente desde 2018, insistimos na necessidade de construir este movimento a partir da base, nas lutas sociais, no enfrentamento do golpismo, na luta pelo Fora Bolsonaro, tudo isto orientado por um programa de esquerda, nos municípios, nos estados e no Brasil. Entretanto, prevaleceu na esquerda brasileira uma orientação política diferente da proposta por nós; ao fim e ao cabo, prevaleceu a tese de “virar a página do golpe”, tese que se materializou na composição de uma “frente ampla” com setores neoliberais e com parte dos golpistas de 2016; noutras palavres, prevaleceu a tese de derrotar o bolsonarismo, não a tese de derrotar o neoliberalismo, bolsonarista ou não. Um dos principais símbolos desta orientação foi a indicação de Geraldo Alckmin como candidato a vice-presidente da República.
7.Embora do ponto de vista formal a disputa ainda não esteja encerrada – pois a última palavra será data pelo encontro nacional do PT dias 9 e 10 de julho -, do ponto de vista política nossa orientação política foi derrotada e prevaleceu a de “virar a página do golpe”. Sendo assim, nos cabe fazer o que aliás faríamos desde sempre: concentrar todas as nossas energias para eleger Lula e demais candidaturas de esquerda nas demais eleições majoritárias e proporcionais.
8.Não importa qual a orientação política da campanha, a vitória de Lula nas eleições presidenciais não vai encerrar o combate contra o bolsonarismo, contra o neoliberalismo e contra o imperialismo. A exemplo do que está ocorrendo em outros países do mundo, a extrema-direita brasileira vai continuar agindo e um de seus setores tente a assumir características cada vez mais fascistas. O neoliberalismo alimenta o neofascismo de várias maneiras. Para a classe dominante, trata-se de um instrumento para ampliar os superlucros. Para os setores médios reacionários, trata-se de um procedimento para proteção de seu status. Para os setores populares, o neoliberalismo alimenta o fascismo através do aprofundamento do desespero e da desgraça econômica, social e cultural. Por tudo isso, derrotar o neofascismo exige derrotar o neoliberalismo. E o combate contra os neoliberais será muito duro e ainda mais complexo, até porque parte deles integra a “frente ampla” que apoia Lula. E como já se viu nas eleições do Peru e da Colômbia, não se deve esperar absolutamente nada do imperialismo, especialmente nestes momentos de “nova guerra fria” e de declínio da hegemonia estadounidense.
9.Vencer a guerra contra o bolsonarismo, o neoliberalismo e o imperialismo exigirá, dentre muitas outras coisas, clareza programática, organização e capilaridade.
10.No terreno programático, enfatizamos o seguinte: tornar possíveis nossa soberania, nossas liberdades, nosso bem-estar, nosso desenvolvimento, pressupõe enfrentar, derrotar e superar as amarras impostas pelo imperialismo, pela classe dominante, pelo capital financeiro, pelo agronegócio, pelas mineradoras. Essas amarras não são apenas econômicas, são sociais, culturais e políticas. Por isso não deixaremos em nenhum momento de colocar em debate – durante a eleição e depois dela – as propostas detalhadas a seguir.
Nossos pontos programáticos
11.A nosso ver, nossa linha de campanha deve priorizar:
i/as propostas emergenciais para superar o desemprego, a inflação, a fome, a carestia, a miséria; o apagão na saúde; os retrocessos na educação e na cultura; a falta de perspectivas para a juventude;
ii/as propostas de natureza estrutural, de médio e longo prazo, capazes de garantir a soberania, o bem-estar, a liberdade e um desenvolvimento de novo tipo para nosso país.
12.Entre as medidas e ações, destacamos NOSSOS TREZE PRONTOS PROGRAMÁTICOS e os TREZE PONTOS EM DEFESA DAS LIBERDADES DEMOCRÁTICAS, de onde extraímos os pontos a seguir:
i/tomar as medidas emergenciais necessárias para que o novo governo tenha os meios legais necessários para enfrentar o caos herdado do governo anterior, em particular no enfrentamento das necessidades mais imediatas: o alimento, a moradia, a saúde, a educação o transporte, o emprego;
ii/corrigir imediatamente o orçamento herdado do governo anterior, principalmente ampliando a dotação vinculada às áreas sociais e ao desenvolvimento econômico, inclusive recuperando a capacidade de investimento do BNDES, do Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, dos bancos regionais (Banco da Amazônia e Banco do Nordeste), bem como das empresas estatais como vetor do desenvolvimento;
iii/tomar as medidas necessárias para estabelecer um imposto sobre grandes fortunas, lucros e dividendos, para contribuir no financiamento das medidas de reconstrução e transformação nacional, especialmente para dobrar ao longo do primeiro biênio de governo as receitas do SUS (hoje de aproximadamente 4% do PIB ou 4,00 per capita). Apoiar as propostas de reforma tributária já apresentadas pelos partidos de esquerda. Colocar o sistema financeiro a serviço do projeto de desenvolvimento nacional e tomar todas as medidas cabíveis para alterar a política e revogar a “independência” do Banco Central;
iv/retomada imediata do programa Bolsa Família, do programa Mais Médicos e do programa Minha Casa Minha Vida, com as devidas alterações. Convocação de concursos públicos emergenciais para recompor o quadro de servidores públicos federais.
v/revogação do “teto de gastos” (através de emenda constitucional), bem como revogação da reforma previdenciária, da reforma trabalhista e da autonomia do Banco Central. Retirada da PEC 32 (reforma administrativa) do Congresso Nacional e revogação das medidas infraconstitucionais que antecipam a reforma administrativa e que colocam a estrutura da administração pública e servidores para atuar no viés neoliberal. Neste espírito, tomar as medidas cabíveis relativas à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares. Revogar o decreto 11.072/2022 que criou o programa de gestão de desempenho para os servidores públicos. Nos casos de alteração constitucional, realizar referendo revogatório;
vi/como parte da defesa da economia popular e do combate à inflação, promover uma lei de reajuste do salário mínimo, garantindo ganho real capaz de recuperar o poder de compra afetado pela carestia; ampliação imediata dos recursos disponíveis para agricultura familiar, principal fonte de alimentos saudáveis e baratos; reduzir os preços da energia elétrica, do gás de cozinha, da gasolina e demais combustíveis, pondo fim ao atual sistema subordinado à oscilação dos preços internacionais. Reconstruir o MDA, retomar a política de reforma agrária, atualização dos índices de produtividade agrícola, apoio a produção familiar, à pesca artesanal e a aquicultura familiar;
vii/iniciar já em 2023 plano de reconstrução da infraestrutura e reindustrialização nacional, inclusive da indústria naval e aeroespacial. Obras públicas nas estradas, hidrovias, ferrovias, fontes de energia, prédios e vias públicas, habitação popular, saneamento básico e medidas de proteção imediata às populações em áreas de risco, investimentos no complexo industrial ligado a saúde, a reforma agrária, o apoio às micro, pequenas e médias empresas, e em especial o fomento aos empreendimentos coletivos da classe trabalhadora, como àquelas organizadas no cooperativismo solidário, as empresas autogestionárias e demais empreendimentos da economia solidária. Promover uma política de desenvolvimento regional levando em consideração a vocação econômica de cada região do país;
viii/encerrar o PND (Plano Nacional de Desestatização), reverter aa privatizações em curso, como é o caso da Eletrobras, dos Correios, da CBTU, da Petrobras e da Pré-Sal Petróleo S.A – PPSA. Reconstrução da Infraero. Reconstrução da Petrobrás como empresa de desenvolvimento nacional, com plena retomada do sistema de partilha para exploração do pré-sal e das medidas dinamizadoras da construção civil e da industrial naval; tomar as medidas necessárias para reverter as criminosas vendas de patrimônio público: o petróleo, assim como a Vale, devem voltar a ser nossos;
ix/ interrupção da destruição do meio ambiente, fechamento imediato dos garimpos ilegais, moratória imediata da expansão do agronegócio especialmente na Amazônia; criação de um sistema emergencial de reflorestamento de todas as áreas desmatadas ilegalmente; retomada da demarcação das áreas indígenas e das comunidades quilombolas, combate sistemático ao uso de agrotóxicos, reconstrução do Ministério do Desenvolvimento Agrário, com retomada e atualização das políticas de reforma agrária; retomada da demarcação das áreas indígenas e das comunidades quilombolas, reconstrução do Ministério do Desenvolvimento Agrário, com retomada e atualização das políticas de reforma agrária;
x/ tomar medidas efetivas, tanto diretas, pelo Governo Federal, quanto de indução e obrigação aos municípios, para a plena aplicação do Estatuto das Cidades, com vistas a iniciar a implantação da Reforma Urbana no país, com garantia ao direito à cidade, sem segregação sócio-espacial, dos que sofrem com o déficit habitacional de moradia digna;
xi/recomposição do orçamento de ciência e tecnologia, reconstrução do Ministério da Cultura, retomada dos projetos de expansão e democratização do setor público de educação, ampliando as políticas de ação afirmativa e desenhando políticas específicas para avaliar e superar as perdas provocadas pela pandemia; retomar a construção do Sistema Nacional de Educação, pública universal, gratuita, de qualidade, inclusiva e crítica, , aplicação de parte dos royalties do petróleo para a educação pública, defesa e ampliação do FUNDEB, ampliação das universidades públicas e dos Institutos Tecnológicos Federais, revogação da Reforma do Ensino Médio e da BNCC e fim das escolas cívico-militares;
xii/tomar medidas efetivas de defesa do SUS enquanto sistema público de saúde, iniciando o processo de desterceirização/desprivatização do Sistema, e de ampliação significativa do financiamento da saúde. Reafirmamos o nosso compromisso com o fortalecimento do SUS. Luta em defesa do SUS 100% público e estatal, com todas as unidades geridas pela administração direta e com carreira única, nacional, interfederativa e multiprofissional, capaz de garantir á população a execução plena de seus princípios de universalidade, integralidade e equidade, com o contínuo aprimoramento da sua gestão, a valorização e formação de profissionais de saúde, a retomada de políticas sólidas, permanentes de fixação de profissionais, com possibilidade de aprimoramento e educação continuada em todos municípios do país. Reafirmamos o nosso compromisso com o fortalecimento e ampliação do programa Farmácia Popular, bem como o fomento contínuo e ações efetivas para reconstrução e ampliação quantitativa e qualitativa do complexo econômico e industrial da saúde, com a ampliação dos recursos orçamentários e a reversão das privatizações e das terceirizações. Reafirmamos o nosso compromisso com a defesa do serviço público e estatal com salário digno, isonomia salarial entre cargos iguais do governo federal, carreira digna, em condições de trabalho decentes, em condições adequadas de segurança e proteção à saúde.
xiii/efetivação dos dispositivos constitucionais que proíbem o oligopólio privado da mídia; relançamento da Empresa Brasileira de Comunicação; apoiar a mídia alternativa, as rádios e televisões comunitárias;
xiv/ é preciso retomar com as políticas públicas e políticas sociais com o objetivo de combater a feminização da pobreza que atinge principalmente, as mulheres negras e periféricas, assim como, a geração de renda e trabalho. Não é diferente, o combate as diversas formas de violências contra as mulheres, que foram acentuadas nesse governo que fortalece o conservadorismo e o fascismo. Esse fortalecimento deve acontecer com o aumento da prevenção, da rede de enfrentamento das violências contra às mulheres e o cumprimento integral da Lei Maria da Penha.
xv/ reconstrução das Secretarias de Mulheres, Igualdade Racial, da Juventude e criação da Secretaria Nacional LGBTQIA+, do Sistema Nacional de Igualdade Racial e retomada das políticas em defesa da Criança e do Adolescente, das pessoas idosas , das pessoas com deficiência, dos povos indígenas e quilombolas, comunidades ribeirinhas e tradicionais;
xvi/ revogação do projeto de resolução que criou as regras para execução das emendas de relator, o chamado “orçamento secreto”, escandaloso mecanismo de corrupção de parlamentares. Apoio às políticas de controle social e de participação popular em todos os níveis de governo, inclusive com a instituição do Orçamento Participativo;
xvii/defesa de uma reforma política-eleitoral que possibilite à maioria do povo brasileiro eleger seus representantes no Congresso nacional, sem as distorções causadas pelo poder econômico, pela compra de votos, pelo oligopólio da comunicação;
xviii/garantia do princípio democrático de uma pessoa um voto e, a partir daí, rever as distorções da representação nos Estados bem como o papel do Senado como câmara revisora;
xix/medidas em defesa do direito à memória e à verdade do povo brasileiro e responsabilização dos agentes envolvidos em desrespeitos aos direitos, liberdades e vida do povo. Retomada das propostas contidas no PNDH-3;
xx/declaração oficial do novo chefe de Estado e de Governo sobre o conjunto de ataques aos direitos, liberdades e vida do povo brasileiro desde o golpe de 2016 até o governo Bolsonaro. Em decorrência, que se instalem processos administrativos e judiciais contra todos (as) que tenham atentado contra os direitos humanos, assegurando-lhes a ampla defesa, o contraditório e o devido processo legal.
xxi/devolução imediata às Forças Armadas de todos os militares nomeados para cargos de natureza civil; transferência para a reserva todos os comandantes de unidades militares nomeados no mesmo período; apresentar PEC para retirar a seguinte frase do paragrafo 6 do artigo 144 da CF: “forças auxiliares e reserva do Exército”; apresentar PEC para retirar do caput do parágrafo 142 da CF o trecho onde se diz: “à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem. Revisar os programas de formação das Forças Armadas, superando o atual modelo baseado na Doutrina de Segurança Nacional construída na Ditadura Militar;
xxii/controle social e desmilitarização da segurança pública, com o objetivo de deter a escalada de violência contra as populações pobres, periféricas e negras, principalmente a juventude e das LGBTQIA+, combinando com medidas para por fim à denominada “guerra às drogas”. Fortalecer medidas de combate à violência policial, de controle da atividade policial e de formação das forças policiais e das guardas municipais que sejam pautadas numa segurança pública cidadã, de direitos humanos e das liberdades democráticas, combatendo violências, arbitrariedades, e situações agravantes como a tortura ou outras penais cruéis, desumanas ou degradantes. Revogar a legislação que facilitou a compra e a posse de armas. Fortalecer políticas de prevenção à criminalidade, de desencarceramento e o fortalecimento das medidas de meio aberto, tanto para adultos quanto para adolescentes autores de ato infracional. Restaurar os espaços de privação de liberdade e qualificar o atendimento prestado às pessoas privadas de liberdade e aos adolescentes e jovens em cumprimento de medida socioeducativa, de modo a reverter o quadro do estado de coisas inconstitucionais das prisões e unidades socioeducativas no país;
xxiii/retomar e intensificar a presença do Brasil nos fóruns e organismos multilaterais, em especial nos BRICS. Construir uma agenda de recuperação da imagem do país em todo o mundo, priorizando a luta pela integração latino-americana e caribenha. Restabelecer as relações com os países da África, da Ásia e do Oriente Médio. Defesa de uma nova ordem mundial, combatendo o imperialismo e seu braço armado, a OTAN;
xxiv/tomando como referência a resolução do 6º Congresso do PT, abrir o debate com a sociedade brasileira acerca da convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.
O Partido dos Trabalhadores é parte essencial da construção do futuro do Brasil
13.Viabilizar nosso programa exige muito mais do que eleger governantes e parlamentares. Para viabilizar nosso programa é preciso impor derrotas profundas à classe dominante e a seus agentes, e isso só será possível se dermos um salto de qualidade na organização e no nível de consciência da classe trabalhadora. E isso pressupõe revitalizar e coordenar nossas organizações de massa (centrais, sindicatos, movimentos, entidades), não apenas para apoiar os governantes e parlamentares, mas principalmente para construir o poder popular necessário para avançarmos em direção ao futuro. Organizar a classe trabalhadora inclui reestabelecer a conexão perdida com setores que já estiveram conosco, mas também conectar com os novos segmentos da classe e com amplas camadas do povo, inclusive as que foram conquistadas pela onda reacionária, neofascista, misógina, fundamentalista, patriarcal, racista e preconceituosa sintetizada pelo cavernícola. A campanha eleitoral é parte deste processo.
14.Pouco antes do primeiro turno das eleições de 2022, o Brasil vai ser palco das comemorações dos duzentos anos da chamada proclamação da Independência, ocorrida em setembro de 1822. Apesar de bicentenária, nossa independência nunca foi completa: seguimos sendo uma nação periférica e dependente. A principal responsável por esta situação é a classe dominante brasileira, que tanto ontem como hoje prefere usufruir as vantagens decorrentes da condição de sócia menor das potências metropolitanas. O preço por esta opção é pago pela maioria do povo brasileiro: para manter taxas de exploração satisfatórias para o consórcio explorador, nosso desenvolvimento é sabotado, nosso bem-estar social é reduzido e nossas liberdades democráticas são violentadas. Não por acaso as piores heranças do passado seguem assombrando o presente e o futuro do nosso povo.
15.Ao longo destes duzentos anos, a classe dominante tratou a ferro e fogo as lutas do povo por soberania, liberdade, bem-estar e desenvolvimento. E mesmo quando era obrigada a dar um passo adiante, a classe dominante o fazia conservando a propriedade e o poder dos de sempre. Foi assim na Independência, feita sob comando de um filho da família real colonizadora. Foi assim na abolição, retardada ao máximo e desacompanhada de medidas que garantissem a devida propriedade e poder a quem fora submetida à abjeta escravidão. Foi assim na República, proclamada e conduzida por militares e oligarcas. Foi assim na chamada revolução de 1930, onde prevaleceu a modernização conservadora conduzida com métodos ditatoriais. Foi assim depois de 1945, onde a democratização foi acompanhada da repressão e restrições à vida sindical e política da classe trabalhadora. E, por óbvio, foi assim durante a ditadura militar. A classe dominante brasileira tem as mãos sujas de sangue e a cabeça cheia de mentiras, pois é principalmente assim que garante a exploração da maioria do povo, dos assalariados, do campesinato, dos indígenas, dos negros, das mulheres, da juventude.
16.A ditadura militar iniciada com o golpe de 1964 foi derrotada, mas não foi derrubada. Seus crimes seguem impunes, como se comprovou mais uma vez com a recente revelação dos áudios do Supremo Tribunal Militar. No ambiente criado por esta impunidade cresceram os esquadrões da morte e as atuais milícias, a sistemática violência policial contra os pobres pretos periféricos, as quadrilhas que desviam por dentro e por fora da lei os recursos públicos. A ausência de punição para golpistas, assassinos e torturadores contribuiu para o surgimento de Bolsonaro, do bolsonarismo e da atual extrema direita. Por que os golpistas de 1964 e os criminosos da ditadura não foram punidos? A resposta é: porque nos anos 1980 prevaleceu entre os setores democráticos a postura de “virar a página do golpe”. Um dos muitos exemplos disso foi a decisão, adotada pelo PMDB, de indicar José Sarney – até a véspera, presidente nacional do PDS, o partido oficial da ditadura militar – para ser candidato a vice-presidente da República na chapa encabeçada por Tancredo Neves. Outro exemplo foi a indicação de outro prócer da ditadura, o senador Marco Maciel, para ser candidato a vice-presidente da República na chapa encabeçada por Fernando Henrique Cardoso. Num caso como noutro, a indicação de umm vice ligado à ditadura foi um sinal da disposição de conciliar com o passado. Não admira, portanto, que tanto a Nova República quanto os governos FHC tenham sido como foram.
17.O PT nasceu enfrentando tanto a ditadura quanto a conciliação das elites. Recusou comparecer ao colégio eleitoral; assinou, mas não chancelou com seu voto a versão final da Constituição de 1988; ofereceu ao país uma alternativa presidencial radical em 1989; fez oposição aos governos tucanos e construiu, no congresso de Olinda de 2001, sob a batuta do companheiro Celso Daniel, um programa de ruptura com o neoliberalismo. Hoje é comum encontrar quem tente apagar esta história ou mesmo apresentá-la de maneira totalmente diferente, como fazem aqueles que tentam apresentar o PSDB e o PT como irmãos separados pelo acaso. Mas não há como disfarçar: durante os anos 1990 os tucanos se converteram no principal partido do capital financeiro, do agronegócio, da grande mineração, das transnacionais, do Consenso de Washington. Já o PT é o partido que representa os setores exploradas e oprimidos exatamente pelos patrões do tucanato.
18.Entre 2003 e 2016 o Partido dos Trabalhadores venceu quatro eleições presidenciais, governou o Brasil e implementou importantes políticas públicas em favor do povo brasileiro. Tais medidas desagradaram, em maior ou menor medida, a classe dominante, seus representantes políticos e seus sócios estrangeiros. Mas as mudanças implementadas pelo PT não chegaram ao ponto de afetar os instrumentos utilizados pela classe dominante para efetivar o golpe de 2016 (instrumentos que, por sinal, foram utilizados nos golpes de 1954 e 1964). Não quebramos o oligopólio que controla a comunicação; não derrotamos a hegemonia pró-EUA e golpista existente nas forças armadas; não alteramos os mecanismos que impõem uma maioria antipopular no legislativo; e, pior ainda, fortalecemos os mecanismos que permitiram ao sistema judiciário operar a AP 470 e a Operação Lava Jato. Sem estes e outros instrumentos à serviço da classe dominante, não teriam tido êxito o golpe de 2016 contra o governo da presidenta Dilma Rousseff, nem o golpe de 2018 contra a candidatura do presidente Lula.
19.O golpe de 2016, seguido da condenação, da prisão e da interdição da candidatura de Lula em 2018 demonstraram mais uma vez a natureza golpista, liberticida, antidemocrática, antinacional e antipopular da classe dominante brasileira e da imensa maioria de seus instrumentos políticos. Como em 1954 e em 1964, o golpe teve o apoio da maioria da classe dominante e contou com amplo apoio nos setores médios, em parcelas do povo, na alta burocracia do Estado, nas forças armadas e polícias, nos meios de comunicação e nos vendilhões do templo. O golpe de 2016 foi obra da direita gourmet, dos neoliberais tradicionais do PSDB, do MDB e do DEM, partidos que criaram e sustentaram o governo Temer e sua ponte para o passado. Exitosa no golpe, a direita tradicional achou que ganharia a eleição presidencial de 2018. Mas foi surpreendida e atropelada pelo crescimento eleitoral de Bolsonaro e da extrema direita. Fora do segundo turno, a classe dominante e a maioria de seus representantes políticos não teve dúvida: entre um professor e um defensor da tortura, optaram por derrotar o PT. E ao longo de mais de três anos de governo cavernícola, a direita gourmet fez de tudo – apoio, cumplicidade, aliança, transação e tolerância – menos oposição de verdade. E o motivo é evidente: o governo Bolsonaro deu e segue dando continuidade às políticas neoliberais de Collor e dos tucanos. Só agora, frente aos sinais crescentes de derrota do cavernícola, a direita gourmet se aproxima da oposição de esquerda, mas sem nunca abrir mão de seu programa neoliberal.
20.Coube ao PT e demais partidos, movimentos sociais e sindicatos do campo democrático, popular e socialista fazer oposição aos governos golpistas de Temer e Bolsonaro. Mas esta oposição não foi unificada: desde 2016 até hoje, a oposição popular implementou duas táticas distintas. A primeira destas táticas defendia ênfase na luta popular para derrotar Bolsonaro e os neoliberais, se possível antes de 2022. A outra tática defendia construir uma frente ampla com setores de centro e direita, com o objetivo de derrotar Bolsonaro nas eleições presidenciais. Foi esta segunda tática que acabou prevalecendo. Aos defensores da primeira tática, como já foi dito anteriormente nesta resolução, cabe redobrar esforços em defesa da candidatura Lula e do PT.
21.Nos próximos dias, semanas e meses, este é o centro da tática: eleger Lula presidente da República. Essencial para isso é não baixar a guarda: o cavernícola não está derrotado, dispondo de instrumentos poderosos seja para travar a disputa eleitoral, seja para tentar um golpe, assim como para fazer uma dura oposição. Só uma campanha de massas permitirá derrotar Bolsonaro e, acrescentamos, só uma campanha de massas neutralizará os prejuízos decorrentes da tática frenteamplista. Trata-se de mobilizar amplos setores da classe trabalhadora em defesa de um programa democrático-popular, indispensável para derrotar tanto o bolsonarismo como o neoliberalismo e o imperialismo. É assim, na mobilização, no enfrentamento, que manteremos vivo o petismo raiz, autêntico, das origens, da militância. Nesta perspectiva, devemos seguir estimulando a formação dos Comitês Populare de Luta e, passada a eleição, fazer um balanço da experiência, na perspectiva deles virem a ser um dos instrumentos para contribuir na mobilização da classe trabalhadora também depois do processo eleitoral.
22.A discussão sobre os desafios do PT a partir de 2023 e o balanço global da eleição de 2022, inclusive a análise das opções adotadas pelo grupo majoritário no Diretório Nacional (como a federação, o vice, as concessões nas eleições estaduais, as inflexões programáticas, a concentração de decisões na executiva nacional, nos parlamentares e governantes), são tarefas a serem realizadas depois da desejada e necessária derrota de Bolsonaro e de seus aliados. Com os objetivos citados anteriormente, fica convocado desde já o 8º Congresso Nacional da AE, a realizar-se preferencialmente em setembro de 2023, quando a tendência petista Articulação de Esquerda completará três décadas de existência (1993-2022).
23.Ao longo destas quase três décadas, não foram poucos os que romperam com o PT fazendo críticas de esquerda, para em muitos casos retornarem ao PT defendendo posições de direita. Organizações inteiras foram construídas pretextando e proclamando a superação do PT, mas hoje muitas destas organizações precisam reconhecer que a vitória do povo brasileiro só será possível com o PT, não sem o PT e muito menos contra o PT. Saudamos as posições políticas agora adotadas, mas não podemos deixar de apontar o seguinte: estaríamos melhor hoje, se nessas três décadas mais setores da esquerda tivessem persistido na disputa de rumos do PT (e da CUT), ao invés de tentar construir alternativas partidárias com base em diagnósticos que ao fim e ao cabo desconsideraram a força social do petismo na classe trabalhadora brasileira e, também, desconsideraram o reacionarismo da classe dominante, reacionarismo que desmentiu todos os diagnósticos de ultraesquerda acerca dos governos Lula e Dilma. Em resumo, os que desistiram da disputa de rumos do PT na prática contribuíram para a hegemonia das posições moderadas, primeiro no PT e por tabela em toda a esquerda brasileira. Por uma dessas ironias de que a história é feita, grande parte dos que denunciaram as supostas “traições” do PT nas décadas de 1990, 2000 e 2010, agora decidiram apoiar com mínima resistência a chapa Lula-Alckmin.
24.Da nossa parte, que nunca vacilamos na defesa do PT, seguiremos fazendo o que sempre fizemos: disputar os rumos do Partido, entendendo esta disputa como parte importante da disputa pelos rumos da classe trabalhadora brasileira. Evidentemente nesta disputa sofremos muitas derrotas, cometemos muitos erros e temos muito a refazer se quisermos ter êxito nas batalhas do presente e do futuro. Entretanto, sem prejuízo das indispensáveis autocríticas e das correções de rumo e prática, somos de opinião que os acontecimentos do passado e do presente confirmaram algumas de nossas teses fundamentais sobre a necessidade e a atualidade da luta por um partido de massas capilarizado na classe trabalhadora; sobre a necessidade de uma estratégia revolucionária que combine luta de massas e luta institucional contra o capitalismo e o imperialismo; sobre a necessidade de um programa democrático-popular e socialista; e sobre a necessidade de uma tática sempre vinculada a estratégia.
25.Em nossa opinião, quanto maior for o agravamento da crise sistêmica do capitalismo mundial e quanto mais profunda for a crise nacional, mais necessário será, para a classe trabalhadora, a existência de um Partido dos Trabalhadores e das Trabalhadoras comprometido com a luta por um Brasil socialista. Para citar um exemplo: sem o PT e tudo o que o petismo expressa, não existiria a candidatura Lula, a única capaz de derrotar eleitoralmente o cavernícola, abrindo caminho para a derrota do bolsonarismo, do neoliberalismo e do imperialismo. Mas para isso acontecer, as forças democráticas, populares e socialistas precisam implementar uma campanha popular de massas e manter a guarda alta: a vitória eleitoral e a defesa das liberdades democráticas não dependem do Supremo Tribunal Federal, nem dos setores da direita gourmet recém-convertidos à defesa da democracia. E para que, além de abrir caminho, sejamos capazes de impor uma derrota global ao bolsonarismo, ao neoliberalismo e ao imperialismo, portanto uma derrota ao capitalismo, será preciso construir – nas ruas, nas urnas e na classe trabalhadora – uma política disposta a fazer, além de políticas públicas, transformações estruturais na sociedade brasileira, em direção ao socialismo.
Viva o PT, viva a esquerda brasileira, viva a classe trabalhadora!
Lula presidente!
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A CONJUNTURA E AS NOSSAS TAREFAS
A direção nacional da tendência petista Articulação de Esquerda, reunida no dia 26 de junho de 2022, debateu e aprovou a seguinte resolução sobre a conjuntura e as nossas tarefas.
1.Faltam menos de 100 dias para o primeiro turno da eleição presidencial brasileira. Está cada vez mais evidente que os resultados de 2 e 30 de outubro poderão ter impacto profundo, não apenas sobre a realidade do Brasil, mas também sobre os destinos da América Latina e do mundo.
2.A situação mundial segue marcada pela crise, pela instabilidade, pelo declínio dos Estados Unidos e pela ascensão da República Popular da China. Foram totalmente frustradas as expectativas – anunciadas por importantes lideranças do nosso Partido – de que o governo Biden fosse capaz de fazer uma “revolução” no capitalismo, ou pelo menos algo similar ao New Deal dos anos 1930. Pelo contrário, vem prevalecendo a receita tradicional, sob a batuta do capital financeiro e do complexo militar industrial. Uma das decorrências disto, no plano eleitoral interno, se verificará no dia 8 de novembro, quando acontecerão eleições legislativas nos EUA. Outra decorrência é a política adotada por Biden, de lutar contra a Rússia “até o último ucraniano”, escalando e esquentando a nova guerra fria contra a Rússia e a China. A difícil situação do governo Biden ajuda a compreender as dificuldades que tiveram para ingerir nas recentes eleições colombianas.
3.No domingo 19 de junho, pela primeira vez em sua história, o povo colombiano elegeu um governo de esquerda. Gustavo Petro e Francia Márquez, do Pacto Histórico, alcançaram ao redor de 50% contra 47% do conservador Rodolfo Hernández. Considerando os dois turnos presidenciais e a eleição legislativa anterior, foram três derrotas eleitorais seguidas da direita e da extrema direita uribista. A vitória de Petro/Francia não foi resultado apenas do processo eleitoral. Como no Chile, as urnas colombianas colheram um resultado plantado nas ruas, durante o Paro Nacional de 2021, um conjunto de mobilizações, atos e greves que comoveram o país. O uribismo e os paramilitares responderam com a violência de sempre: foram ao redor de 80 o número de militantes assassinados durante a repressão ao Paro. A mobilização e a organização popular contribuíram para a vitória do Pacto Histórico nas eleições para o legislativo e, agora, também na eleição para a presidência. Os desafios do novo governo colombiano, que toma posse no dia 15 de agosto, são enormes: desde garantir a paz na Colômbia, colocar fim ao assassinato de lideranças políticas e sociais, afirmar a soberania e a autonomia perante os Estados Unidos, enfrentar as desigualdades sociais e a miséria que assolam o país. Mas um passo fundamental foi dado: a conquista da presidência.
4.As vitórias eleitorais no México, Colômbia, Honduras, Chile, Peru, Bolívia e Argentina, a sobrevivência de governos liderados pela esquerda em Cuba, Nicarágua e Venezuela, somadas a possível vitória que estamos buscando construir no Brasil, poderão abrir novamente as alamedas por onde passará a integração latino-americana e caribenha. E a integração constitui condição essencial para garantir nossa soberania frente ao imperialismo norte-americano, assim como para garantir um desenvolvimento econômico associado ao bem estar da classe trabalhadora da região, combinando tudo isto com uma democracia real para nossos povos. Portanto, vista de conjunto a situação mundial e continental, a eleição de Lula como presidente do Brasil agravará a situação estratégica dos Estados Unidos. Se é verdade que os problemas internos e externos reduzem a margem de manobra da ingerência estadounidense nas eleições brasileiras – sem falar do fato de que Bolsonaro é publicamente identificado com o trumpismo- também é verdade que não devemos esperar neutralidade, nem muito menos apoio dos EUA, que só aconteceriam se estivéssemos dispostos a lhes dar apoio na batalha global que travam contra a China. Entretanto, salvo acontecimentos extraordinários, como uma escalada na guerra ou uma nova crise econômica mundial – a intervenção direta dos EUA contra nós provavelmente não se dará na eleição propriamente dita, mas principalmente no pós-eleição. É preciso manter atitude alerta, até porque há outros agentes atuando, como o governo de Israel e suas agências, assim como as redes da extrema-direita internacional, como as protagonizadas por Steve Bannon e Elon Musk.
5.Ainda sobre a situação continental, cabe destacar que os governos progressistas e de esquerda eleitos no último período estão enfrentando dificuldades em certo sentido maiores do que no ciclo anterior, iniciado em 1999-2003 com as eleições de Hugo Chavez, Lula e Nestor Kirchner. As dificuldades atuais são em certa medida maiores porque a situação material interna é pior, porque a situação mundial é mais complicada, porque a extrema direita está mais radicalizada que antes, mas também porque problemas estratégicos presentes no ciclo anterior e naquela ocasião mal resolvidos, seguem presentes e ainda mais impactantes no ciclo atual. Uma destas dificuldades consiste em como lidar com a relação entre Estado, governos, organizações e lideranças. Tal dificuldade é agravada pelo debilitamento de muitas organizações, como é o caso de sindicatos e partidos (a redução do protagonismo do Foro de São Paulo e o protagonismo do Grupo de Puebla tem relação com isso). A citada dificuldade é agravada, também, pela desaparição física de algumas lideranças (Chavez, Nestor, Fidel, Tabaré) ou pela redução no protagonismo de outras lideranças (Raul, Correa, Evo, Lugo, Mujica) de lideranças decisivas no ciclo anterior.
6.Neste sentido, o Brasil é exceção a esta situação. Aliás, o protagonismo e a influência pessoal de Lula são maiores hoje do que antes. Entretanto, muitos partidos, sindicatos e movimentos sociais brasileiros estão mais débeis do que no período anterior. Esta debilidade é principalmente organizativa e -em especial no caso do nosso Partido – tende a ser em parte encoberta pelo crescimento da simpatia eleitoral por nossas candidaturas e por nossa legenda. Mas não devemos nos enganar: se não corrigirmos rapidamente as nossas debilidades organizativas, no médio prazo a situação tende a piorar muito, pois no melhor dos casos viveremos o mesmo que vivemos entre 2003 e 2016, ou seja, um fortalecimento dos governos e das bancadas frente a organização partidária. Ademais, a força pessoal de Lula – fundamental na presente disputa eleitoral – não é eterna e não há nenhum sinal de que possa ser herdada por outra pessoa física. Ou seja: se não for construído um poderoso sujeito coletivo, corremos o risco de, em algum momento futuro, vivermos um vácuo, uma forte dispersão e debilitamento.
7.O problema citado anteriormente tem uma dimensão de médio prazo, mas tem também uma dimensão de curto prazo. Afinal, a situação atual exige mais radicalidade para conseguir o mesmo que conseguimos antes, com menos radicalidade. Um exemplo: a Petrobrás jogou um papel decisivo nos êxitos dos governos Lula-Dilma. Pois bem: para que a Petrobrás possa jogar um papel similar num futuro governo Lula, a partir de 2023, será preciso desprivatizar e reestatizar a empresa, revogando e revertendo os crime lesa-pátria cometidos por Temer e Bolsonaro. E nada disso será fácil de fazer, exigindo mudanças estruturais e velozes.
8.Outros exemplos podem ser citados: para fazer o mesmo que antes, será preciso muito mais radicalidade. Entretanto, a opção política feita pela maior parte de nosso partido vem sendo no sentido de tentar contornar ou desconhecer o problema apontado. Aliás, a maior parte da esquerda brasileira – inclusive, paradoxal e ironicamente, setores que pretendiam estar fazendo “oposição de esquerda” aos governos Lula e Dilma – adota hoje uma linha política e um programa que só ganhariam pleno sentido se estivéssemos enfrentando uma situação estratégica similar a de 2002. É por isso, aliás, que falam e agem como se o golpe de 2016 não tivesse existido e como se aquele golpe não tivesse comprovado existirem alguns “problemas não resolvidos” na estratégia adotada em 1995, aprofundada em 2002 e materializada nos anos seguintes.
9.Um destes problemas não resolvidos no ciclo 2003-2016 é como evitar que a classe dominante use a institucionalidade estatal não apenas para sabotar, mas inclusive para derrubar governos eleitos pela esquerda. Fomos capazes de vencer quatro eleições presidenciais seguidas, mas não fomos capazes de evitar um golpe. Solucionar este problema exige, por exemplo, combinar medidas no plano do Estado (por exemplo, acabar com a tutela das forças armadas, acabar com a militarização e violência sistemática dos aparatos de segurança contra os setores populares, acabar com a partidarização do sistema judiciário e com a judicialização da política, bem como fazendo uma reforma política e adotando uma política de participação popular), com medidas no plano econômico e social (por exemplo, acabando com o oligopólio privado da comunicação e ampliando a auto-organização da classe trabalhadora). Logo depois do golpe de 2016 e durante a campanha Lula Livre, um importante setor do Partido começou a debater estas questões. Mas desde que recuperamos os direitos políticos de Lula, este debate foi deixado de lado em favor da velha “teoria” da “governabilidade através de alianças com setores de centro e direita”. Um dos efeitos práticos disto foi o apoio apenas formal à campanha Fora Bolsonaro (registre-se, aliás, que nosso país não ocorreu nada parecido às grandes mobilizações do Chile, Bolívia, Colômbia, EUA etc.). Outro efeito prático foi a prioridade concedida à construção de uma aliança com parte dos golpistas de 2016. E, o que é muito pior, esta aliança é as vezes defendida em termos absolutamente falsos, segundo os quais tais neoaliados seriam “defensores da democracia”, afirmação que só seria verdadeira se estes neoaliados tivessem feito autocrítica ou se nós tivéssemos passado a considerar que em 2016 houve “apenas” um impeachment, não um golpe. No fundo, este discurso falso serve para distrair alguns incautos da necessidade de resolver o problema evidenciado em 2003-2016: como evitar que a classe dominante use a institucionalidade estatal não apenas para sabotar, mas inclusive para derrubar governos eleitos pela esquerda.
10.Outro problema não resolvido no ciclo 2003-2016 é como articular políticas públicas (destinadas a enfrentar os problemas urgentes e imediatos, tais como a fome, o desemprego, a desassistência) com reformas que alterem as estruturas permanentes da sociedade brasileira. No período dos governos Lula e Dilma, alguns setores defendiam não existir o problema citado. Davam como exemplo, para sustentar esta opinião, que combater a fome era em si algo estrutural. Pois bem: o que ficou demonstrado, pela volta do Brasil ao mapa da fome durante os governos Temer e Bolsonaro, é que a solução para o problema da fome – e para outros problemas sofridos pela maioria do povo brasileiro – pode ser conjuntural ou estrutural. E se queremos soluções que sejam permanentes, irreversíveis, é preciso ir além de políticas públicas. Por exemplo: ou reindustrializamos o país, enfrentamos o agronegócio, fazemos uma reforma agrária e garantimos a soberania alimentar, ou temas como a fome e o desemprego vão ciclicamente nos assombrar. Sendo assim, nosso programa precisa combinar “reconstrução” com “transformação”. Entretanto, nas seguidas versões do programa debatido e aprovado, tanto pelo PT quanto pela Federação, há uma crescente ênfase na reconstrução e uma crescente secundarização da transformação. Aliás, há uma série de temas estruturantes (como o papel do agronegócio, do capital financeiro, das forças armadas etc. sobre os quais a atual versão do programa cala ou tergiversa). No lugar de uma solução para os problemas estratégicos, ressurge a igualmente velha “teoria” da “aliança com setores do empresariado”, acompanhada da tese segundo a qual o neoliberalismo estaria em decadência mundo afora e, portanto, estaria se criando um consenso mundial que facilitaria nossa ação de governo. Como vimos no caso do governo Biden, os anúncios da morte do neoliberalismo são um pouco prematuros. Mas o mais importante é que – neoliberal ou não – o imperialismo segue imperialista e a ele não interessa que o Brasil mude seu lugar na divisão mundial do trabalho.
11.A opção de evitar certos problemas e definições estratégicas tem como um de seus objetivos declarados facilitar a vitória, tornar possível uma vitória no primeiro turno e, também, facilitar a ação do futuro governo. E o fato de estarmos liderando as pesquisas presidenciais é apresentado como comprovação do sucesso desta linha frente amplista. Obviamente nos é impossível comprovar a tese oposta, a saber, de que com outra linha política estaríamos liderando da mesma forma. Mas se observarmos os dados das pesquisas feitas desde o ano passado até agora, eles indicam que a ampliação das alianças está incidindo pouco ou nada nos resultados; e indicam também que os motivos pelos quais Bolsonaro está atrás nas pesquisas não decorrem principalmente das alianças feitas por nós, mas decorrem isto sim essencialmente dos erros cometidos pelo cavernícola e das consequências de suas políticas. Isto posto, é óbvio que as alianças com setores da direita não bolsonarista reduziram o espaço da terceira via e, nesse sentido, podem sim contribuir para uma vitória no primeiro turno. Mas atenção: se essa vitória não vier no primeiro turno, a antecipação das citadas alianças pode – paradoxalmente – tornar muito mais difícil para nós o quadro do segundo turno, pois em tese haveria menos espaço para crescer. Finalmente, sobre a ideia de que amplas alianças vão facilitar a ação do futuro governo, podemos dizer que já vimos, entre 2003 e 2016, que tipo de governabilidade decorre das amplas alianças e o que podemos esperar ou Temer.
12.O fato de a maior parte da esquerda brasileira ter abraçado ou ter aceito a linha criticada nos parágrafos anteriores não altera em absolutamente nada nossa tarefa principal nos próximos 100 dias, a saber: eleger Lula presidente do Brasil. Entretanto, o mesmo fato nos obriga a combinar o esforço por eleger Lula, com o esforço por reduzir os danos causados pela linha atualmente majoritária na esquerda brasileira. A seguir vamos enumerar algumas das ações práticas que decorrem disso.
13.Devemos seguir apoiando e estimulando as lutas sociais. A mobilização social contribui para a massificação da própria campanha eleitoral e será fundamental para a governabilidade social de um futuro governo Lula.
14.Devemos combater a ofensiva neoliberal em curso no Congresso nacional. Esta ofensiva é em parte preventiva: a direita busca aproveitar o que lhe parece ser o tempo restante. Mas os efeitos desta ofensiva sobre a campanha e inclusive sobre nosso futuro governo são ou podem ser imensos.
15.Devemos trabalhar para manter as candidaturas majoritárias do PT e de esquerda nos estados onde segue existindo uma pressão por candidaturas de partidos de centro e direita.
16.Devemos priorizar a campanha das candidaturas majoritárias e proporcionais do PT e da esquerda.
17.Devemos combater a ilusão indevida nos neoaliados. Os neoliberais golpistas de 2016 podem estar nesse momento contra Bolsonaro, mas isto não os converte em democratas, muito menos em companheiros. No caso específico de Alckmin, é preciso utilizar este personagem para conquistar votos junto ao eleitorado de direita (e não, como vem sendo feito prioritariamente, levá-lo para discursar a setores que já nos apoiam).
18.Devemos prosseguir no debate programático, para incluir no programa medidas emergenciais, políticas públicas e reformas estruturais hoje ausentes. Há problemas inescapáveis, tais como reverter a privatização e destruição da Petrobrás, acabar com a tutela das forças armadas, interromper a política de insegurança pública, acabar com a hegemonia do agronegócio e do setor financeiro, proteger a Amazônia, realizar a reforma tributária gravando os ricos, submeter o BC ao comando do governo. Sem falar de outros temas, como revogar o teto de gastos, a reforma trabalhista e a reforma da previdencia, enfrentar a reforma do ensino médio, retomar o investimento em políticas públicas como saúde e educação (um detalhamento completo das medidas por nós defendidas está em documentos aprovados e divulgados anteriormente pela tendência petista Articulação de Esquerda).
19.Devemos enfatizar firmemente a defesa dos direitos dos indígenas, dos quilombolas, das mulheres, dos negros e negras, da juventude, das pessoas com deficiência, dos LGBT+, de todas e de todos os setores que são alvo da extrema direita e do fundamentalismo em geral.
20.Devemos criar na coligação um núcleo de esquerda – composto por exemplo pelo próprio PT, PSOL, PCdoB, MST, algumas centrais e entidades. Hoje este núcleo não existe, prevalecendo a postura de “ceder antes da negociação começar”. Se este núcleo não for construído, viveremos novamente a experiência de 2003-2016: um governo em disputa… principalmente pela direita.
21.Devemos lutar por proteger o Partido da degeneração causada pelo eleitoralismo, pela transferência de poder para parlamentares e governantes, pela substituição da militância por cabos eleitorais. A defesa do Partido inclui a luta em defesa do nosso objetivo estratégico: um Brasil democrático, popular e socialista.
22.Devemos, finalmente, combater a ideia de que já ganhamos a eleição, cabendo a nós apenas “administrar a vitória”. Uma parte da nossa direção, da nossa militância, da nossa base social e eleitoral vem se orientando exclusivamente pelas pesquisas. Como as pesquisas hoje estão ótimas, muitas pessoas não se sentem convocadas a fazer o esforço extraordinário que consideramos indispensável. Obviamente, se as pesquisas se alterarem, corremos o risco de se instalar um ambiente de desorientação. Entretanto, como pesquisa não é eleição, a verdade é que a vitória na eleição presidencial não está garantida. E muito menos está garantida a eleição de governadores, senadores e parlamentares que ajudem a sustentar o governo Lula. Não está garantida, entre outros motivos, pelo seguinte: o inimigo não desistiu, não entregou os pontos, luta pela sua (deles) vida e pela sua (deles) liberdade, está motivado, tem força e tem muito ódio contra nós. A cassação ilegal do vereador Renato Freitas pela Câmara Municipal de Curitiba, o assassinato de Genivaldo, Bruno e Don, o espancamento de uma procuradora por um criminoso que não foi imediatamente preso, o ataque contra os indígenas no município de Amambai no Mato Grosso do Sul, são alguns dos muitos exemplos de que está em curso uma campanha onde a violência será a tônica, uma campanha diferente das vividas entre 1994 e 2016, uma campanha mais dura do que as de 1989 e 2018. Não podemos, portanto, abaixar a guarda. É preciso manter a guarda alta especialmente no período entre a eleição e a posse. Não se deve esperar uma transição normal, institucional, republicana.
23.O que ainda pode ser feito pelo cavernícola, para tentar evitar sua derrota? Em primeiro lugar, ele seguirá fazendo luta política. A ênfase com que nós falamos de “golpe” reflete – além das ameaças reais já citadas – a crença de que só através de um golpe eles poderiam nos derrotar. Mas esta crença é incorreta. O nosso inimigo ainda dispõe de ferramentas políticas para tentar vencer as eleições. Neste momento, o esforço principal do cavernícola é levar a eleição para o segundo turno. Para tentar isto, lança mão de ações de governo; e, também, pode inflar um pouco a candidatura linha auxiliar (Ciro) e a chamada terceira via. Cabe lembrar da existência de uma grande reserva de eleitores que votam em branco, nulo ou se ausentam das eleições; um movimento de parte destes eleitores pode levar a disputa para o segundo turno.
24.Além de medidas políticas estrito senso, o cavernícola e seus apoiadores preparam e já vem executando “operações extraordinárias” de variados tipos, desde as organizadas pelo “gabinete do ódio”, ações de violência sistemática, tumultuar o processo, sabotagem nas urnas, questionamento do resultado etc. Sem descartar nunca, pois estamos diante de gente com mentalidade e prática assassina, a hipótese indizível. Além disso, existe a possibilidade – ainda remota, mas que vem sendo ventilada – de um desesperado “gambito”: removerem Bolsonaro, para assim viabilizar uma alternativa de terceira via contra Lula.
25.Nossa resposta a esses movimentos é, no essencial, implementar uma campanha presidencial de massas. Esta é a principal medida, seja para ganhar, seja para prevenir operações golpistas, seja para contribuir na criação de uma correlação de forças que nos permita transformar o país. Os neoliberais e os neofascistas, aconteça o que acontecer, seguirão atuando, alguns deles inclusive por dentro do Estado e do próprio governo.
26.Temos muitos motivos para ter otimismo. A eleição de Lula abre a possibilidade de retomarmos o processo de transformação do Brasil, no sentido de construirmos soberania, bem-estar social, desenvolvimento e socialismo. Mas para transformar esta possibilidade em realidade, será preciso linha justa, muito trabalho e guarda alta, cabendo ao PT em todos os níveis assumir a coordenação deste esforço para fazer uma campanha Lula massificada, nos locais de trabalho e lazer, nas escolas e nos locais de moradia, nas redes e nas ruas.
Brasília, 26 de junho de 2022
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CONTRA A VIOLÊNCIA, ORGANIZAÇÃO E GUARDA ALTA
O companheiro Marcelo Arruda, tesoureiro do Partido dos Trabalhadores na cidade de Foz do Iguaçu, foi assassinado na madrugada de 9 para 10 de julho de 2022. O assassino é um bolsonarista que invadiu a festa onde Marcelo Arruda comemorava seu aniversário de 50 anos.
A direção nacional do Partido dos Trabalhadores divulgou a respeito a seguinte nota: https://pt.org.br/violencia-bolsonarista-lider-do-pt-em-foz-do-iguacu-e-assassinado/.
O assassinato de Marcelo Arruda não é um fato isolado. Nas últimas semanas ocorreram diversos episódios de violência política, entre eles o ataque a um bar em Campinas logo depois de uma atividade na Unicamp, o lançamento de uma bomba caseira contra um ato público no Rio de Janeiro e um atentado com drone contra um ato público em Uberlândia.
A violência diretamente política tampouco é fato isolado, combinando-se com: 1/a violência sistemática contra lutadores do povo, especialmente aqueles vinculados aos temas indígenas e do campo; 2/a violência do aparato de Estado, das milícias e do crime organizado contra as populações pretas e periféricas; 3/a perseguição contra parlamentares petistas e de outros partidos de esquerda; 4/um ambiente geral de estímulo ao fundamentalismo, ao racismo, a lgbtfobia e a misoginia.
Este ambiente de violência sistêmica é estimulado, direta e indiretamente, pelo cavernícola que neste momento ocupa o Palácio do Planalto. Embora a extrema direita em geral e o neofascismo em particular sejam geneticamente violentos, no momento a violência é estimulada com o objetivo de intimidar a oposição, criar um clima de caos e, no limite, fraudar o processo eleitoral.
Só a derrota do cavernícola criará as condições institucionais para cortar pela raiz as causas da violência. Mas para derrotar o cavernícola será necessário enfrentar desde já a violência, preservando vidas e protegendo as liberdades democráticas. Como a violência tem o estímulo do governo federal e tem o apoio aberto ou encoberto de diferentes segmentos do aparato de Estado, é preciso cobrar a ação das autoridades e ao mesmo tempo tomar medidas protetivas autônomas. Isso é particularmente necessário para enfrentar a violência difusa praticada por fanáticos bolsonaristas, cujo armamento foi extremamente facilitado nos últimos anos, com a cumplicidade das forças armadas e policiais.
Em cada sindicato, movimento social, comitê de luta, mandatos parlamentares, núcleo de base, setorial e diretório, recomendamos à nossa militância:
1/reforçar as medidas de proteção das nossas lideranças e candidaturas;
2/reforçar as medidas de proteção de nossas sedes e atividades;
3/reforçar o caráter de massa de nossas atividades;
4/reforçar a vigilância frente as atividades dos grupos de extrema-direita;
5/reforçar a denúncia e o repúdio contra cada agressão da extrema direita.
Manifestamos nossa solidariedade e pêsames aos familiares e amigos do companheiro Marcelo Arruda. Ele não estará presente no dia da vitória, mas seu nome será lembrado. Marcelo salvou a vida de muitas pessoas que estavam na festa e nossa reação coletiva ao chefe dos assassinos salvará a vida e o futuro do povo brasileiro.
Brasília, 10 de julho de 2022
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RESOLUÇÃO SOBRE A UCRÂNIA
No dia 2 de março, a direção nacional da tendência petista Articulação de Esquerda aprovou uma resolução sobre a conjuntura nacional e outra resolução sobre a guerra, transcrita a seguir.
1.Há, na esquerda mundial e brasileira, um intenso debate sobre a guerra atualmente em curso entre Rússia e Ucrânia. O debate envolve o que está ocorrendo e seus desfechos imediatos. Ademais, envolve polêmicas históricas sobre o ocorrido nos últimos anos, nas últimas décadas e até mesmo nos últimos séculos. O debate também envolve a caracterização dos governos ucraniano e russo, bem como debates de princípio sobre guerra e paz.
2.Não se trata de um debate inédito: no movimento socialista, polêmicas parecidas foram travadas no século XIX e durante o século XX. Duríssimos debates foram travados, no movimento socialista, em torno da posição a se adotar frente ao colonialismo e ao imperialismo; frente à Grande Guerra de 1914-1918 e frente à Segunda Guerra; frente às ações militares da URSS na Hungria, na Tchecoslováquia e no Afeganistão; frente aos conflitos militares entre China, Vietnã e Camboja; frente ao ingresso da Espanha na OTAN; bem como em torno das ações militares dos EUA e países europeus em diversos países do mundo, como Iraque, Afeganistão, Síria e Líbia; para não falar das diferentes atitudes da esquerda frente à ocupação da Palestina por Israel.
3.Embora não seja um debate inédito, a situação atual envolvendo Rússia e Ucrânia é, sob vários aspectos, nova. Entre outros motivos, por se dar num ambiente de crise sistêmica mundial, marcado pelas decorrências da crise de 2008 e atravessado pelo conflito entre EUA e China. Sendo assim, é importante precisar algumas das premissas de que partimos para nos posicionar no presente debate.
4.A primeira de nossas premissas é a defesa da paz. As guerras causam destruição, sofrimento e morte, que afetam basicamente as classes trabalhadoras. Portanto, defendemos o cessar fogo e a abertura de negociações. Mas a paz que defendemos não se limita à inexistência de guerra. A paz que defendemos tem conteúdo e, portanto, não é um valor abstrato.
5.A segunda de nossas premissas é a de que o maior promotor de guerras são as nações imperialistas, em especial as potências capitalistas europeias e os Estados Unidos. Portanto, não acreditamos em paz efetivamente duradoura sem derrota do imperialismo e, portanto, sem superação do capitalismo.
6.A terceira de nossas premissas é que nem todas as guerras são iguais. As guerras pela independência nacional, as guerras contra a ocupação estrangeira, as guerras contra o fascismo e o nazismo, as guerras civis do povo contra seus exploradores são também guerras e, portanto, são também terríveis, mas são guerras justas e necessárias, portanto, devem ser defendidas.
7.Não nos associamos, portanto, a nenhum tipo de pacifismo abstrato, muito menos ao pacifismo hipócrita, colonialista e racista de certa mídia e de tantas lideranças políticas europeias e estadunidenses e, inclusive, israelenses, que fazem discursos em favor da paz, mas têm as mãos cheias de sangue palestino, sírio, iraquiano, afegão, líbio e de inúmeras nações africanas. O duplo discurso deve-se ao fato de serem colonialistas e racistas e, portanto, não reconhecerem a humanidade dos que não fazem parte dos “povos escolhidos”.
8.A quarta de nossas premissas é a de que o conflito entre Rússia e Ucrânia só pode ser compreendido e, principalmente, só poderá ser resolvido se levarmos em conta que ele faz parte de um conflito maior, acerca dos “termos de funcionamento” do mundo pós-desaparição da União Soviética.
9.Com o fim da URSS e do Pacto de Varsóvia, muita gente honesta imaginou que os EUA e seus aliados desmontariam a Organização do Tratado do Atlântico Norte. Mas não foi nada disso o que ocorreu. A OTAN não apenas continuou existindo, como ampliou sua composição e seu âmbito de atuação, chegando inclusive a atacar a República Federal da Iugoslávia, com bombardeios aéreos de 24 de março de 1999 a 10 de junho de 1999. Antes já haviam ocorridos bombardeios na Bósnia e Herzegovina em 1995, tudo isso sem aprovação do Conselho de Segurança da ONU.
10.Portanto, ao contrário do que se disse por toda a Guerra Fria e ao contrário do que dizem muitos ainda hoje, não coube nem à União Soviética nem à Rússia protagonizar a “primeira grande operação militar em território europeu desde a Segunda Guerra Mundial”. Aliás, a hipocrisia dos EUA e de seus aliados é imensa, assim como é imensa a amnésia de setores “progressistas” mundo afora. O banimento das agências noticiosas russas RT e Sputnik por parte das autoridades da UE é um exemplo disso.
11.Desmentindo a promessa feita em 1991 pelos Estados Unidos aos soviéticos, promessa segundo a qual a OTAN não avançaria “uma polegada” no território do Leste Europeu e da antiga URSS, desde então e até hoje a OTAN incorporou em sua composição a Polônia, República Tcheca, Sérvia, Hungria, Estônia, Lituânia, Letônia, Romênia, Bulgária, Albânia, Macedônia do Norte e Montenegro.
12.É público que a OTAN tem como um de seus objetivos incorporar, de fato e/ou de direito, a Ucrânia. Por isso, estimularam, patrocinaram e apoiaram o golpe de Estado ocorrido na Ucrânia em 2014, com aberta e pública participação de forças paramilitares que se proclamam adeptas do nazismo.
13.Como reação a movimentação da OTAN, a Rússia operou para recuperar a região da Crimeia e deu suporte a dois movimentos secessionistas na Ucrânia. Teve início uma guerra civil, supostamente encerrada com os chamados acordos de Minsk, entre Ucrânia, Rússia, República Popular de Donetsk e República Popular de Lugansk. Especialmente nos últimos meses, a situação voltou a escalar, basicamente por dois motivos: a posição do presidente Volodymyr Zelensky em defesa da incorporação da Ucrânia a OTAN e a ofensiva militar ucraniana contra as duas repúblicas separatistas.
14.Frente a isso, o governo russo exigiu publicamente que se cumprissem os acordos já citados, em particular o compromisso de que a Ucrânia não faria parte da OTAN. Ao mesmo tempo, o governo russo ordenou a mobilização de tropas e, nos últimos dias, decidiu por fazer o que apresenta como um ataque preventivo. Do ponto de vista formal, fez isso em cumprimento de acordos recém firmados com as duas repúblicas secessionistas. Do ponto de vista factual, atacou todo o território ucraniano.
15.A ação russa surpreendeu muita gente ao redor do mundo. Tal surpresa não se deve, é bom que se diga, à dissimulação: o discurso feito por Putin em 10 de fevereiro de 2007 na Conferência de Segurança em Munique, e todos os seus pronunciamentos desde então são absolutamente explícitos. Deve-se perguntar por quais motivos os EUA, a UE e a OTAN não levaram a sério as advertências e não buscaram negociar preventivamente. Há quem diga que um conflito militar interessaria ao governo Biden e ao complexo industrial-militar, opinião que encontra forte respaldo no discurso feito pelo presidente dos EUA perante os congressistas de seu país no dia 1 de março de 2022. E há quem diga que o desprezo pelas advertências de Putin tem um fundo “psicológico”: décadas de unilateralismo faziam parecer ser “impossível” que a Rússia atacasse preventivamente. Neste sentido, aliás, é revelador ler no texto da resolução aprovada no dia 2 de março pela Assembleia Geral da ONU o seguinte: “as operações militares da Federação Russa dentro do território soberano da Ucrânia são de uma magnitude que a comunidade internacional não via na Europa há décadas”. De fato, os EUA e seus aliados europeus (autoproclamados “comunidade internacional”) estão acostumados a fazer operações militares de igual ou maior magnitude em países situados, desafortunadamente, fora da Europa (a Iugoslávia, atacada brutalmente pela OTAN nos anos 1990, pelo visto não foi “vista” pela “comunidade internacional”).
16.Seja como for, há imensas controvérsias sobre os acontecimentos, inclusive sobre a real situação do conflito e de seus desdobramentos. Para além das torcidas e das mentiras de guerra, há também analistas bem-informados fazendo afirmações antagônicas sobre o que está ocorrendo e sobre o que pode vir a ocorrer. Há também um festival de notas e declarações acerca da guerra. Particularmente, na esquerda brasileira, temos desde afirmações que parecem saídas da assessoria de imprensa da OTAN, até as que parecem saídas da assessoria de imprensa de Putin. Temos, também, declarações variadas em favor da paz e outras tantas que denunciam todas as partes envolvidas, como se houvesse responsabilidades simétricas e equivalentes nos acontecimentos.
17.Putin é um nacionalista, um anticomunista e um conservador, motivos pelos quais a esquerda em geral e a esquerda russa em particular tem todos os motivos para se opor a ele e a seu governo. As declarações recentes de Putin criticando a posição de Lênin sobre a Ucrânia são explícitas a respeito. Mas não é preciso aplaudir nem apoiar Putin ou a ação militar na Ucrânia para constatar os fatos a seguir. O governo russo não está envolvido em nenhuma das brutais intervenções militares na África, no Oriente Médio e inclusive na América Latina ocorridas desde 1991. Não é o governo russo que, desde 1991, vem cercando os países da OTAN. Não é o governo russo que vem realizando, desde 2014, ataques contra civis residentes nas duas repúblicas separatistas da região de Donbass. Nem é o governo russo quem vem alimentando as forças nazistas em operação na Ucrânia. Tampouco é o governo russo que vem desrespeitando os acordos feitos desde 1991, inclusive o de Minsk. A ação militar russa iniciada em 24 de fevereiro de 2022 só pode ser compreendida levando-se em conta estes antecedentes.
18.Por todos estes motivos, não há simetria nem equivalência. E do nosso ponto de vista, ou seja, do ponto de vista de um setor da esquerda da América Latina e do Brasil, há uma assimetria fundamental a levar em consideração: o governo russo, nesse momento, é inimigo de nossos inimigos. Isso não implica apoiar suas ações, mas deve ser levado em devida conta na análise dos fatos e de seus desdobramentos.
19.Parte da esquerda brasileira, argumentando razões de princípio contra as guerras, a defesa da autodeterminação nacional e/ou por considerar o governo russo imperialista e autoritário, faz críticas a OTAN e aos EUA, mas concentra o principal de suas energias na denúncia da “invasão russa”. Alguns setores chegam a reconhecer que o governo russo tinha razão em suas denúncias e queixas, mas teria “perdido a razão” ao dar o passo de atacar. Outros admitem que o governo russo corria riscos imensos se deixasse o cerco militar se fechar sobre ele, mas ao iniciar a operação militar teria dado argumentos em favor da campanha “anti-russa” da OTAN, dos EUA e da UE, inclusive para sanções econômicas que, a experiência recente já demonstrou, vitimam especialmente os setores populares.
20.Embora ainda não tenhamos todos as informações necessárias para formar um juízo completo acerca de todos os acontecimentos, reconhecemos em todos estes argumentos de diferentes setores da esquerda a presença de elementos corretos. Reconhecemos, em especial, as dificuldades existentes em tomar posição frente a conflitos entre potências capitalistas. Entretanto, não podemos deixar de constatar, também, a existência de alguns pressupostos que nos parecem incorretos, entre os quais o de achar que a hegemonia do imperialismo será superada numa mesa de negociações ou através de processos “puros”, contrapondo de um lado os interesses dos capitalistas e de outro lado os interesses das classes trabalhadoras. Ao menos até agora, a história tem sido outra: de conflitos brutais envolvendo não apenas as classes fundamentais, mas também conflitos entre nações capitalistas, obrigando a esquerda a fazer a análise concreta da situação concreta.
21.E a situação concreta inclui o conflito entre China e EUA, a aliança Rússia-China, o conflito interno aos EUA entre Biden e Trump, a disputa sobre a segurança europeia, o papel da OTAN e da ONU, a presença crescente do nacionalismo e do extremismo de direita, os interesses da indústria bélica, as repercussões das sanções econômicas, inclusive os seus efeitos na economia latino-americana e brasileira, bem como os efeitos nas eleições de 2022 no Brasil e nos EUA.
22.Por todos os motivos desenvolvidos antes, somos da seguinte posição: ao povo brasileiro, à classe trabalhadora brasileira, à esquerda brasileira, interessa uma saída pacífica e negociada, uma solução que enfraqueça a OTAN e os governos imperialistas, a começar pelos Estados Unidos.
23. Se a OTAN não recuar (inclusive no fornecimento de armas à Ucrânia, como decidiu fazer o “progressista” primeiro-ministro da Espanha Pedro Sanchez) e se a Ucrânia não assumir uma condição neutra (como por exemplo a Áustria pós Segunda Guerra), o conflito voltará a escalar, mais cedo ou mais tarde. É também nesse espírito que defendemos o cessar fogo imediato e a negociação entre as partes.
24.Por fim, mesmo que prevaleça esta posição de uma saída negociada, que faça a OTAN recuar e garanta a autodeterminação e neutralidade da Ucrânia, devemos lembrar que este episódio não é um raio em céu azul, mas parte integrante de um período histórico aberto pela crise de 2008, marcado por imensa instabilidade, por crises recorrentes, por guerras brutais, mas também por grandes lutas contra o capitalismo e o imperialismo. É preciso fazer nosso povo, nossa classe, nosso partido e nosso futuro governo estarem à altura desta situação.
A direção nacional da tendência petista Articulação de Esquerda
Brasília, 2 de março de 2022
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EMENDAS AO DOCUMENTO DIRETRIZES PARA O PROGRAMA DE RECONSTRUÇÃO DO BRASIL.
Apresentamos, a seguir, nossas emendas ao documento “Diretrizes para o Programa de Reconstrução do Brasil”.
1 No título (VAMOS JUNTOS PELO BRASIL – COMPROMISSOS PARA A RECONSTRUÇÃO DO PAÍS) e no ponto 1 e em todos os demais pontos, propomos: sempre que se falar em reconstrução, falar também de transformação. Nosso objetivo não é voltar ao status quo ante; nosso objetivo é retomar o processo de transformação. Por isso é fundamental falar sempre de reconstrução e transformação.
2 No ponto 2, o documento critica a desnacionalização de setores estratégicos do patrimônio público. Propomos falar de privatização e desnacionalização, pois como se está falando do patrimônio público, a premissa óbvia da desnacionalização é a privatização, palavra que precisa ser incluída no parágrafo.
3 No ponto 3, onde fala “Diante desta situação, o primeiro e mais urgente compromisso que assumimos é com a restauração das condições de vida da população brasileira – sobretudo os que mais sofrem com a crise, a fome, o alto custo de vida, os que perderam o emprego, o lar e a vida em família. São esses brasileiros e brasileiras que precisamos priorizar, tanto por meio de ações emergenciais quanto por meio de políticas estruturantes, desde o primeiro minuto de um governo que será eleito para reconstruir o Brasil, superar a crise presente e resgatar a confiança no futuro”, propomos acrescentar: “decretar situação de emergência em âmbito nacional, para que o novo governo tenha os meios legais necessários para enfrentar o caos herdado do governo anterior”. Ou seja: é preciso considerar a fome como uma situação similar a COVID e tomar as compatíveis medidas extraordinárias.
4 No ponto 4, ao citar os compromissos históricos, propomos incluir a defesa da igualdade. Há séculos a defesa da igualdade diferencia o lado de cá do lado de lá. Esta palavra, assim como transformação, deve constar com destaque de nossas diretrizes. O mesmo vale para a defesa da autodeterminação dos povos.
5 O ponto 5 parece querer resolver um problema enunciando um slogan. O problema é: precisamos de desenvolvimento e só haverá desenvolvimento se houver investimento público e o investimento público comporta sempre o risco de algum tipo de desequilíbrio. O slogan é: “estabilidade”, palavra que o senso comum neoliberal interpreta da maneira como sabemos. Para deixar claro nossa posição, propomos incluir neste ponto a seguinte ideia: “Temos compromisso com a ampliação dos investimentos públicos na produção e nas políticas sociais, para gerar um desenvolvimento” e segue o texto como está.
6 No ponto 6, propomos incluir a palavra “empregos” ao lado de trabalho, para explicitar ainda mais um de nossos pontos centrais.
7 No ponto 7, propomos falar explicitamente da luta contra o racismo, contra o machismo, contra a misoginia, contra a lgbtfobia.
8 No ponto 8, propomos falar explicitamente da interrupção imediata e total da expansão do agronegócio na Amazônia. E propomos falar também explicitamente na prioridade para os pequenos e médios produtores de alimentos.
9 No ponto 9, propomos agregar na frase a seguir o indicado em negrito: “em torno da superação do Estado neoliberal e da consolidação de um Estado de bem estar social, como parte de uma perspectiva socialista”. Na periferia do mundo, Estado de bem estar social e capitalismo são incompatíveis no médio prazo. A classe dominante sabe disto e dá golpes também por isso.
10 No ponto 12, propomos incluir a reforma agrária entre as medidas visando criar oportunidades de trabalho e emprego.
11 No ponto 14, propomos dar nova redação a frase final. Explicando: ao falar de “resgatar” a sustentabilidade, abre-se a porta para aceitar a premissa de muitas reformas previdenciárias antipopulares. Propomos, portanto, falar assim: “o desenvolvimento econômico, a geração de empregos e a inclusão previdenciária serão centrais para a sustentabilidade financeira do regime geral de previdência social”.
12 No ponto 21, propomos incluir na frase citada o destacado em negrito: “Reafirmamos o nosso compromisso com o fortalecimento do SUS público e universal, o aprimoramento da sua gestão, a valorização e formação continuada de profissionais de saúde, carreira única, nacional, interfederativa e multiprofissional, a retomada de políticas como o Mais Médicos e o Farmácia Popular, bem como a reconstrução e fomento ao Complexo Econômico e Industrial da Saúde, a ampliação dos recursos orçamentários, a reversão das privatizações e das terceirizações e regulação estatal dos planos privados”.
13 No ponto 22, propomos construir uma nova redação, com base no programa apresentado em 2018 pela chapa Haddad/Manuela. Lá está dito o seguinte: “A atual política de repressão às drogas é equivocada, injusta e ineficaz, no Brasil e o no mundo. É o grande nó a ser desatado em favor do presente e do futuro de nossas crianças e jovens. Hoje, o país prende mais pessoas não violentas, não organizadas e desarmadas, do que homicidas, traficantes de armas e lideranças do crime organizado, que já se transnacionalizou. Com isso, agrava a já desumana condição dos presídios, que funciona como recrutamento em massa de mão-de-obra para facções criminosas. É premente alterar a política de drogas, para combater o que de fato é prioritário: o poder local armado despótico exercido sobre territórios e comunidades vulneráveis. É preciso enfrentar a rede que o tráfico internacional promove. O dinheiro decorrente do tráfico alimenta várias esferas da economia, viabiliza o acesso a armas em grande quantidade – que favorecem a violência letal – e financia a corrupção e outras atividades criminosas. Precisamos priorizar o rastreamento do dinheiro sujo, para suprimir o financiamento do tráfico. O país precisa olhar atentamente para as experiências internacionais de política sobre drogas. É urgente promover medidas consistentes de prevenção da violência, evitando o recrutamento de jovens vulneráveis pelo crime. O Brasil possui um contingente de 11 milhões de jovens entre 15 e 24 anos, e 1,5 milhão entre 15 e 17 anos que não trabalham nem estudam. Evidentemente esses jovens estão em situação de alta vulnerabilidade. Por isso, é fundamental que o Poder Público possa assegurar perspectivas de futuro para as juventudes, oferecendo-lhes educação, cultura, valorização e alternativas atraentes de integração à vida pacífica e ao mercado de trabalho. Em paralelo, o governo federal deve assumir suas responsabilidades no enfrentamento da criminalidade que, tendo origem transnacional, afeta a segurança dos estados e dos municípios. Isso permitirá uma experiência inovadora de atuação da Polícia Federal no ciclo completo na cadeia do crime. A Polícia Federal já atua na cooperação internacional, no controle de fronteiras e armas, e na repressão interestadual, o que a habilita a atuar no enfrentamento do crime organizado, do financiamento associado, em todas as modalidades criminosas de grande vulto que incidem sobre os centros urbanos, mas cujas dinâmicas extrapolam seus limites. A proposta na área de segurança pública deve estar vinculada a medidas de prevenção ao uso de drogas nas áreas de saúde e educação. No âmbito da saúde, é preciso incentivar a abordagem científica e atualizada à luz dos protocolos reconhecidos internacionalmente como mais avançados e eficazes, fortalecer a rede de atenção psicossocial, permitir políticas de redução de danos e atuar com sensibilidade para abordar de diferentes e flexíveis formas a prevenção em relação a grupos sociais distintos. Na educação, é preciso garantir que a comunicação com os adolescentes e jovens seja eficiente e não geradora de mitos e mentiras. Priorizar a dimensão do ensino que dialoga com a vida real do estudante é fundamental, de modo que a abordagem científica deve partir dos problemas experimentados no cotidiano. A prevenção passa pelo estabelecimento de políticas voltadas à primeira infância – de modo a garantir educação, saúde e cuidados para nossas crianças – e de formação continuada , para profissionais de educação nos três níveis de ensino, além de projetos pedagógicos de prevenção do uso indevido de drogas alinhados às diretrizes curriculares nacionais e aos conhecimentos relacionados a drogas”.
14 No ponto 23, propomos trocar a frase “legítima e crescente demanda dos brasileiros e brasileiras por maior segurança pública” por “o direito dos brasileiros e brasileiras por segurança pública”. E propomos incluir a seguinte emenda: “Um país que se preze democrático necessita proteger seus cidadãos de toda sorte de violência. É fundamental fortalecer medidas de combate à violência policial, de controle da atividade policial e de formação das forças policiais e das guardas municipais que sejam pautadas numa segurança pública cidadã, de direitos humanos e das liberdades democráticas, combatendo violências, arbitrariedades, e situações agravantes como a tortura ou outras penais cruéis, desumanas ou degradantes. Ademais encaminharemos a revogação da legislação que facilitou a compra e a posse de armas”. De nosso ponto de vista, portanto, não basta falar em controle de armas, é preciso acabar com a venda de armas. Defendemos apresentar PEC para desmilitarizar a segurança pública, com o objetivo de deter a escalada de violência contra as populações pobres, periféricas e negras, combinado com as medidas para por fim à denominada “guerra às drogas”.
15 Nos pontos 23 e 24, entre eles, incluir o seguinte: “As políticas de prevenção à criminalidade e promoção de uma segurança pública cidadã deverão ter um foco na juventude deste país, sobretudo na juventude negra. Ações de ampliação à cultura, acesso à educação formal e informal, reformas do ensino médio e proteção da vida e inclusão social dos e das adolescentes e jovens deverão ser prioridade. Reafirmamos nosso compromisso em retirar nossos jovens do crime organizado, reconhecendo-os como sujeitos explorados pelo tráfico de drogas e enquanto vítimas de trabalho infantil”.
16 No ponto 24 propomos explicitar a ampliação dos investimentos públicos em cultura e a recriação do Ministério da Cultura.
17 No ponto 28, propomos incluir a proposta feita publicamente pelo presidente Lula, na linha de criar um ministério dos povos indígenas.
18 No ponto 29, onde diz “com o superencarceramento”, escrever “combatendo o superencarceramento”. Sabemos ter sido esta a intenção do redator.
19 Nos pontos 29 e 30, entre eles, incluir o seguinte: “Vivemos num país que detém a terceira maior população carcerária do mundo. As taxas de criminalidade não vêm se reduzindo em detrimento do aumento da privação de liberdade. É imprescindível fortalecer políticas de prevenção à criminalidade, de desencarceramento e o fortalecimento das medidas de meio aberto, tanto para adultos quanto para adolescentes autores de ato infracional. Ao mesmo tempo em que é imprescindível restaurar os espaços de privação de liberdade e qualificar o atendimento a presos adultos e adolescentes e jovens em cumprimento de medida socioeducativo. De modo a reverter o quadro do estado de coisas inconstitucional das prisões e unidade socioeducativas no país”.
20 Entre os itens 35 e 36, incluir: “Reconstrução das Secretarias Especiais de Mulheres, Igualdade Racial, da Juventude e criação da Secretaria Nacional LGBTQIA+, do Sistema Nacional de Igualdade Racial e retomada das políticas em defesa dos idosos, das pessoas com deficiência, dos povos indígenas e quilombolas”.
21.No ponto 38, propomos incluir entre os “investimentos” que podem abrir “enormes possibilidades”: o complexo industrial ligado a saúde, a reforma agrária, o investimento nas pequenas e médias empresas, cooperativas e economia solidária.
22 No ponto 40, no trecho que fala de “um novo regime fiscal”, é preciso incluir o seguinte: “Vamos colocar o pobre outra vez no Orçamento, os super-ricos pagando impostos, colocar o sistema financeiro a serviço do projeto de desenvolvimento nacional e tomar todas as medidas cabíveis para alterar a política e revogar a “independência” do Banco Central”. Não é possível fazer nada do proposto no item 40, sem tratar da “independência” do BC, da oligopolização do sistema financeiro, da dívida pública etc. para alterar imediatamente a política do Banco Central.
23 No ponto 41, propomos trocar a palavra “corrigir” por “extirpar”. Corrigir seria reduzir a sonegação; num programa, devemos expor nossa meta. E propomos acrescentar o seguinte: “estabelecer um imposto sobre grandes fortunas, lucros e dividendos, para contribuir no financiamento das medidas de reconstrução e transformação nacional, especialmente para dobrar ao longo do primeiro biênio de governo as receitas do SUS”.
24 No ponto 43, propomos incluir ao final do item o seguinte: Nesta perspectiva, serão tomadas as medidas necessárias para que a Petrobrás e a Eletrobrás sejam empresas públicas colocadas ao serviço dos interessas nacionais.”
25 No ponto 47, incluir na frase citada o indicado em negrito: “É preciso fortalecer e modernizar a estrutura produtiva por meio da reindustrialização, do fortalecimento da pequena e média produção agrícola e do estímulo a setores e projetos inovadores. Incluir também: “Como parte desta perspectiva, reconstruir o MDA e retomar a política de apoio à pesca artesanal e a aquicultura familiar”.
26 No item 49, propomos tirar a referencia a Defesa. Precisamos, como parte das mudanças indispensáveis nas forças armadas, dotá-las de meios para cumprir seu papel – a defesa nacional. Entretanto, não achamos razoável misturar esta discussão com a política industrial.
27 No ponto 52, propomos incluir nas frases citadas o indicado em negrito: “Precisamos avançar rumo a uma agricultura e uma pecuária comprometidas com a sustentabilidade ambiental e social, o que pressupõe a já citada reforma agrária, para a qual contribuirá a atualização dos índices de produtividade agrícola. Sem isso, perderemos espaço no mercado externo e não contribuiremos para superar a fome e o acesso a alimentos saudáveis dentro e fora das nossas fronteiras. Ademais, é imprescindível agregar valor à produção agrícola, com a constituição de uma agroindústria de médio e pequeno porte, de primeira linha, de alta competitividade mundial”.
28 No ponto 53, na frase a seguir, propomos retirar a palavra “também” e alterar a redação da frase a seguir: “O investimento privado também será parte fundante da reconstrução do Brasil e será estimulado por meio de créditos, concessões, parcerias e garantias”. Convenhamos: o investimento privado sempre foi parte, sempre foi estimulado e sempre teve garantias além da conta. Segue a frase proposta como alternativa: “O investimento privado será parte importante do esforço de reconstrução do Brasil, com prioridade para créditos, concessões, parcerias e garantias voltados aos pequenos e médios investidores”.
29 No ponto 58, retomando tema já tratado em emenda anterior, propomos uma redação compatível com quem será governo, a saber, ao invés de falar “nos opomos”, falar “Reverteremos a privatização em curso da Petrobras e da Pré-Sal Petróleo S.A – PPSA”.
30 No ponto 60, na mesma linha, propomos ficar assim: “Reverteremos a privatização da Eletrobras, maior empresa de geração de energia elétrica da América”.
31 No ponto 61, na mesma linha, propomos ficar assim: “Reverteremos a privatização dos Correios, uma empresa com importante função social, logística e capilaridade em todo o território nacional”.
32 No ponto 70, propomos acrescentar: Convocação de concursos públicos emergenciais para recompor o quadro de servidores públicos federais. Sem isso, o “protagonismo” do governo federal não passará da proclamação de intenções.
33 No ponto 77, propomos incluir a seguinte formulação: reafirmar a histórica defesa de um Atlântico desmilitarizado e desnuclearizado.
34 No ponto 78, propomos incluir: devolução imediata às Forças Armadas de todos os militares nomeados para cargos de natureza civil; transferência para a reserva de todos os comandantes nomeados no mesmo período; apresentar PEC para retirar a seguinte frase do paragrafo 6 do artigo 144 da CF: “forças auxiliares e reserva do Exército”; apresentar PEC para retirar do caput do parágrafo 142 da CF o trecho onde se diz: “à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.”
Segue a integra do caput do Art. 142: “As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.”
Segue a integra do item 6 do Artigo 144: § 6º As polícias militares e os corpos de bombeiros militares, forças auxiliares e reserva do Exército subordinam-se, juntamente com as polícias civis e as polícias penais estaduais e distrital, aos Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 104, de 2019).
35 No ponto 82, propomos incluir ao final o seguinte: “onde defenderemos uma reforma política-eleitoral que possibilite à maioria do povo brasileiro eleger seus representantes no Congresso nacional, sem as distorções causadas pelo poder econômico, pela compra de votos, pelo oligopólio da comunicação, garantindo o princípio democrático de uma pessoa um voto e revendo as distorções da representação nos Estados bem como o papel do Senado como câmara revisora. Também como parte deste debate, os partidos integrantes da coligação colocarão em discussão a necessidade da convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte”.
36 No ponto 83, incluir a “retomada de medidas em defesa do direito à memória e à verdade do povo brasileiro e responsabilização dos agentes envolvidos em desrespeitos aos direitos, liberdades e vida do povo. Retomada das propostas contidas no PNDH-3”.
37 No ponto 86, propomos agregar o seguinte: “instalação de processos administrativos e judiciais contra todos (as) que tenham atentado contra os direitos humanos, assegurando-lhes a ampla defesa, o contraditório e o devido processo legal”.
38 No ponto 87, propomos incluir: Nesta perspectiva tomaremos medidas para revogar o chamado “orçamento secreto”, escandaloso mecanismo de corrupção de parlamentares e de sequestro das atribuições do executivo.
39 No item 90, incluir: “relançamento da Empresa Brasileira de Comunicação, implementação das previsões constitucionais contrárias ao oligopólio privado da mídia”.