Sem Clima no Seminário

Das incompreensões da Realidade Brasileira, a Emergência Climática faltou ao encontro

por Rafael Tomyama (*)

Vamos lá, mais um Seminário nacional do PT, nos próximos dias 5 e 6, em Brasília. A programação parece uma reedição das mesmas enfadonhas ‘novidades’. Infelizmente, enquanto o país arde em chamas, nenhuma mesa do evento trata dos limites planetários e da emergência climática.

Não estão na ordem do dia, para os organizadores do evento e da maioria petista, os fenômenos extremos, como enchentes no Sul e desertificação no Nordeste. Nem mesmo as conferências do meio ambiente, promovidas pelo ministério do próprio governo liderado por petistas, nem a realização da Cop 30 no Brasil no ano que vem, aparecem no radar dos dirigentes que querem abordar os desafios da ‘Realidade Brasileira’, mas não dão sinais que pretendem desafiá-la.

As estrelas infelizmente não partem das relações interdependentes entre as pegadas devastadoras de contaminação pela avidez do crescimento-a-qualquer-custo capitaneada pelas megacorporações transnacionais e seus tentáculos locais e as crises política e civilizatória.

Esse negacionismo da esquerda, que anda desconetada dos reais dilemas que afetam a juventude e a classe trabalhadora como um todo e, portanto, alienada da capacidade de respostas coerentes, é que vai dar na ‘surpresa’ nos anos eleitorais, quando aparece o crescimento das abstenções, brancos e nulos e da votação na extrema direita, que é exatamente quem mais dissemina a anticiência, o desmatamento, o elitismo excludente e a superexploração do trabalho.

Aos que se apressam achando que esta crítica trata da postulação ecochata de uma pauta ‘temática’ – assim como faltam enfoque em muitos outros viéses da identidade opressora nacional, como a questão do feminino, do racismo e outras violências – para além da fragmentação pós-moderna das áreas dos conhecimentos e das administrações, que fazem perder a dimensão da ecologia política, está algo ainda mais duro de quebrar nessa castanha: a apartação de uma institucionalidade fenomênica que cria uma autonomia própria ao que é essencial.

Dito de outro modo: O negacionismo não é tão somente um postulado teórico, é algo entranhado na materialidade das relações de produção-consumo entre capital-trabalho-natureza. Sua latência evidenciada espelha a superestrutura de reprodução ideológica que retroalimenta o domínio mental por crenças numa redenção metafísica transcendental, seja num milagre, seja – paradoxalmente – na ciência. Mas que, de todo modo, não tem lastro na realidade. Ao invés de enfrentá-la, dissimula.

Assim, provavelmente não há salvação na hipocrisia do marketing verde do ‘ecocapitalismo’ destrutivo, sob a hegemonia do mercado banqueiro, que estrangula os povos e os governos com endividamento, enquanto financeiriza a vida e privatiza a Natureza. Se ainda houver saída para evitar a extinção da espécie humana e de toda biodiversidade será obra da luta emancipatória do povo que trabalha pelo Bem Viver.

Isso se boa parte da esquerda sabichona acordar, deixar de insistir em alianças pragmáticas para ganhar eleições reféns da ‘governabilidade’ e reacender a esperança com programas coerentes de viradas estratégicas estruturais ecológicas e sistêmicas. Inversamente se deveriam fortalecer movimentos potentes com pautas justas, democráticas e inclusivas por uma nova bioeconomia comunitária, para além do eleitoralismo e do jogo combinado do milionário mercado de votos, orçamento secreto, muita corrupção e golpismo, se preciso for.

A essa tarefa, deveria tal Seminário se propor a (re)começar. Sim, o negacionismo climático não é inerente à direita, está na esquerda, em boa parte dela e no cotidiano da vida humana. Antes fosse, no entanto, apenas o caso de ajustar o discurso, o centro do rumo ao desastre.

Sem inovação, vestindo à risca o figurino de certinha, a tal ‘vanguarda’ domesticada, distraída e burocratizada segue atrás de alguma sinecura, passeando no ar-condicionado dos templos do consumo, em meio aos incêndios e culpando os ‘pobres de direita’. Vai dar certo. Só que não.

(*) Rafael Tomyama é vice-presidente do PT Fortaleza e membro do Coletivo da Secretaria Nacional do Meio Ambiente do PT

Respostas de 2

  1. Parabéns por contextualizar de forma corajosa a falta de ações objetivas e focadas em soluçes que minimizem os danos causados pela ganância capitalista exarcebada que assola o nosso planeta, o nosso povo.

  2. Parabéns pela postura corajosa de acordar os adormecidos, distantes da dura realidade do planeta, embalado pelos cantos, das sereias poderosas do capitalismo mercantilista, que afetou os ouvidos dos marinheiros do barco, rumo a catástrofe.

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