Solidariedade e resistência popular

Por Elbe Belardinelli (*) e Veridiana Pivetta de Mello (**)

O Comitê Solidário Contra o Coronavírus de Santa Cruz do Sul/RS foi criado no final de março, a partir de uma rede de voluntários formada por um grupo de pessoas da comunidade e suas entidades como escolas, sindicatos, universidade, escritório de advocacia, e alguns membros de partidos de esquerda que se organizaram democraticamente e de forma horizontal. Através de um grupo de whatsapp, os participantes começaram a discutir que ações fazer e em quais locais.

O objetivo é atuar junto à comunidade, no seu bairro, com o propósito de prevenir a disseminação do novo coronavírus, mas também, intervir em uma ação que assista aos mais vulneráveis em um momento de crise e necessidade extrema, com a perspectiva de construir resistência e auto-organização no território. Portanto, a construção das atividades junto com os trabalhadores do bairro é fundamental.

Neste sentido, o Comitê Solidário é formado por cerca de 80 pessoas. Já foram alcançadas milhares de pessoas com entrega de kits de higienização, cestas básicas, ajuda no cadastro das pessoas para receber o auxílio emergencial de R$ 600,00 e, ainda, a realização de Brechós Solidário, que está distribuindo cerca de 2 mil peças de roupas.

No entanto, é com a Janta Solidária que o Comitê alcança mais pessoas. A ideia surgiu de uma ativista de Porto Alegre que se somou ao comitê e propôs atender moradores de rua. Levamos a ideia para o coletivo e problematizamos a questão chegando a definição que teríamos que atender as pessoas nos bairros, também. Foi isso que fizemos. A Janta Solitária é realizada no bairro Faxinal, periferia de Santa Cruz do Sul, região central do Rio Grande do Sul, onde já tínhamos contato com alguns vizinhos e alunos. Desta forma, foi rápido para que os próprios moradores conseguissem o local e juntos organizássemos a janta e o Brechó.

Hoje fazemos todas as quartas-feiras e entregamos jantas para mais de 200 pessoas. Comida que vem das doações que o Comitê arrecada.

Há alguns dias lançamos outra campanha que é a Tapa Furo Solidário. Esta ação consiste em arrecadar fundos através de uma plataforma online (APOIA.se) para fazer pequenos consertos nas casas de moradores de dois bairros de Santa Cruz do Sul.

Além da Janta Solidária, Brechós e a campanha Tapa Furo que juntos atendem muitos trabalhadores, acreditamos que a mais importante ação do Comitê, talvez tenha sido dar visibilidade/colocar na pauta a problemática da fome no município que estava fora do centro do debate.  É necessário, também, pontuar que a organização das pessoas em seu território, a partir da solidariedade constrói processos que ultrapassam a lógica assistencialista da igreja e dos partidos de direita. Pois o nosso objetivo é construir laços sólidos com a comunidade e participar de um processo de resistência que amenize os problemas da fome e de moradia, mas que gere consciência de classe e auto-organização a partir do território de forma independente do estado.

Portanto, o Comitê é uma rede solidária dinâmica e flexível que chega aonde o estado não chega, ou não quer chegar. Também, tem o papel de atuar, em algumas situações, junto ao poder público para que os recursos cheguem aos mais necessitados. Mas o principal legado do Comitê Solidário é que em tempos de pandemia e que as pessoas estavam isoladas em casa, mostrou que é possível se organizar de outra maneira e dar respostas as necessidades do momento. Recuperar uma tradição da esquerda popular e democrática que é de estar junto com o povo trabalhador e lutar com ele para um outro projeto de sociedade. Uma coisa é evidente: esse mundo que conhecemos está falido. Temos que construir outro, e esse processo passa por uma luta junto com os trabalhadores mais vulneráveis da periferia.

(*) Elbe Belardinelli é professor de História da Rede Estadual RS.

(**) Veridiana Pivetta de Mello é jornalista e doutora em Comunicação Social.

 

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