Vannuchi e Maringoni estão gastando vela com mau defunto?

Por Valter Pomar (*)

No dia 8 de abril, um amigo me perguntou quantos votos teria a candidatura a vice de Alckmin no Encontro Nacional do PT. Eu respondi o seguinte: a preços de hoje, no mínimo 65%, mas pode chegar a 95%.

Por pensar assim, fiquei surpreso com o artigo de Paulo Vannuchi, publicado na Folha de S. Paulo no dia 8 de abril. E mais surpreso ainda com o artigo de Gilberto Maringoni, publicado no site Disparada no dia 12 de abril.

O artigo de Vannuchi pode ser lido nesse endereço:

https://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2022/04/uniao-de-lula-e-alckmin-concretiza-frente-ampla-contra-o-bolsonarismo.shtml

O artigo de Maringoni pode ser lido nesse endereço:

https://disparada.com.br/oposicao-chapa-lula-alckmin/

No caso de Maringoni é preciso dar um desconto. Ele está no PSOL e, portanto, não tem a obrigação de conhecer a correlação de forças existente no PT.

Mesmo assim, frases do tipo “investir contra a chapa Lula-Alckmin não apenas atrapalha, mas objetivamente sabota a única tentativa viável de nos tirar do abismo e de recolocar o Brasil no rumo da democracia” revelam um nível de preocupação só explicável se houvesse um movimento poderoso contra a candidatura de Alckmin.

Seja como for, simplesmente não é verdade que Alckmin seja o último pacote do biscoito. Havia inúmeras outras alternativas, inclusive no campo conservador, desde empresárias até políticos abrigados por exemplo no PSD. E as pesquisas divulgadas desde que se aventou o nome de Alckmin ainda não demonstraram as suas vantagens eleitorais. Mesmo na disputa paulista, um dos argumentos mais utilizados para demonstrar a suposta genialidade da aliança, ainda está por demonstrar estar sendo bom negócio, eleitoralmente falando.

Maringoni usa como argumento em favor da aliança com Alckmin os “resultados desastrosos do primeiro turno francês”, reclamando do fato de “quatro candidatos progressistas sequer terem se sentado para traçar uma tática comum, que poderia ter levado Jean-Luc Melénchon à segunda volta”. Realmente é um desastre que as candidaturas de esquerda (não “progressistas”) não tenham se unificado. Mas tirante a aparência, o caso francês só teria alguma semelhança com a situação brasileira se estivesse na mesa uma aliança de primeiro turno entre Melenchon e, digamos, Macron.

Maringoni afirma, também, que os que atacam a proposta de entregar a vice de Lula para Alckmin “são insensíveis não apenas a fascitização do governo Bolsonaro e seus apoiadores, mas à gosma social que o sustenta”.

Entendo o ponto de vista, mas do meu ponto de vista ocorre exatamente o contrário. Bolsonaro e sua gosma não vieram do espaço, vicejaram no ambiente neoliberal. Foi a lógica da Aliança Democrática que permitiu a sobrevivência do bolsonarismo nas forças armadas. Foram os golpistas tucanos de 2016 que abriram caminho para a fraude de 2018. É o ambiente social gestado pelo neoliberalismo que fez a “gosma” crescer.

Por tudo isso, do ponto de vista eleitoral e do ponto de vista programático, a aliança com Alckmin pode ter o efeito diametralmente oposto ao esperado. Temos falado disso o tempo todo. Podemos estar errados, óbvio. Mas impressiona como os defensores de Alckmin na vice são “insensíveis” a estes alertas. Tão insensíveis que foram surpreendidos pela repercussão da “fotografia azul e branca” da reunião de Lula com o PSB, pequena mostra dos problemas que teremos pela frente, caso a vice seja mesmo entregue a um golpista e neoliberal.

Maringoni fala também que “as Forças Armadas viraram um lumpesinato fardado, as polícias estão incontroláveis, diversos bandos milicianos fortemente armadas estão prontos para botar fogo no circo nos próximos meses, entre outras coisas”. Tudo isso é verdade. Resta nos explicar como a presença de Alckmin na vice vai contribuir para enfrentar estes e outros problemas. Afinal, os tucanos não são propriamente bons conselheiros no trato com as forças armadas e com as polícias militares.

Maringoni usa, ainda, um argumento insólito para defender Alckmin na vice, a saber: “alguém acha, siceramente, que Alckmin tem posições mais neoliberais do que Antonio Palocci e Henrique Meirelles – que elevaram a selic a 26,5% em 2003 e o superávit primário para 4,8% do PIB em 2005 (índice sequer tentado nos anos FHC)? Ou que a fé mercadista do governador suplanta a de Dilma Rousseff, que dobrou o desemprego em 15 meses e chegou a dizer – ao jornal belga Le Soir, em junho de 2015 – que não havia outro caminho a não ser o alucinado ajuste fiscal que arrebentou nossa economia? Alckmin seria mais conservador que José Eduardo Cardozo, que ofereceu ao ex-governador a Força Nacional para reprimir os protestos de 2013? Seria um direitista mais extremado que Dias Tóffoli, Luís Fux, Luís Roberto Barroso, Edson Facchin e outros juristas de confiança do PT?”

Supondo que tudo isso seja verdade, pergunto: devemos aprender com os erros passados ou devemos repetir tudo de novo, para ver se desta vez o desfecho é diferente?

Maringoni, uma pessoa supostamente de esquerda, mas cujo pensamento é organizado pelo antipetismo visceral padrão Hora do Povo, chega a dizer o seguinte: “Pela composição de forças, a chapa Lula-Alckmin não parece ser nem melhor e nem pior do que as administrações do período 2003-16. Assim como aqueles governos, a chapa não tem em seu horizonte qualquer perspectiva de transformação social.”

Mesmo assim, segundo ele, “mesmo um governo mediano e tímido é preferível à barbárie em curso. As oposições de esquerda ao longo dos 13 anos petistas foram incapazes de gerar um programa de desenvolvimento factível e realista. Não adianta brigar pelas aparências agora”.

Infelizmente, não se trata de “aparências”, mas se trata de uma opinião: Lula é  de fato“a única tentativa viável de nos tirar do abismo e de recolocar o Brasil no rumo da democracia”. Colocar Alckmin na vice sabota estes objetivos e, na melhor das hipóteses, aprisiona a “democracia” pela qual lutamos no figurino social-liberal. Nos tempos da política normal de 2003 a 2016 isso já seria um erro. Mas em tempos de bolsonarismo, com uma extrema direita com apoio popular, isso pode ser suicida.

Na continuação deste texto, na próxima postagem, falarei das opiniões de Paulo Vannuchi.

(*) Valter Pomar é professor e membro do Diretório Nacional do PT

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