Por Adriano Bueno (*)
Este texto é uma transcrição de um áudio gravado para o Podcast “Em Tempos de Guerra, A Esperança é Vermelha”, conduzido pelo camarada Patrick Araújo e disponível nas redes.
No último dia 24 de janeiro, um jovem trabalhador negro de 24 anos chamado Moïse Kabagambe, refugiado do Congo no Brasil, foi assassinado a pauladas na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro.
Num país onde os neoliberais impõem aos trabalhadores a prevalência do “negociado sobre o legislado”, Moïse aparece como um caso escandaloso que revela a falsa simetria: segundo seus familiares, ele tentava cobrar uma dívida trabalhista!
Para além da “relação trabalhista” precarizada e violenta, a barbaridade revela também racismo e xenofobia: fosse um imigrante europeu, o tratamento seria o mesmo?
As imagens captadas por uma câmera de segurança vazaram e causaram indignação. Pessoas que aparecem nas imagens não tentam evitar o espancamento.
Poucos dias depois o quiosque voltou a funcionar normalmente, com proteção da polícia, provando que “o poste sempre pode mijar no cachorro” diante dos nossos olhos no Brasil de Bolsonaro.
O silêncio feito em torno do caso foi ensurdecedor. Bom lembrar que quiosque Tropicália fica próximo ao famoso condomínio Vivendas da Barra. A informação que circula é que a região é dominada pelas milícias. O dono do quiosque só foi notificado 3 dias depois.
O Congo, país onde nasceu Moïse, foi colonizado como propriedade particular do Rei Leopoldo 2º da Bélgica.
A colonização do Congo foi extremamente violenta, tendo inspirado o livro “O Coração das Trevas”, de Joseph Conrad. Fala-se em 10 milhões de mortos. Outra boa fonte sobre a colonização do Congo é o livro “O Fantasma do Rei Leopoldo”, escrito por Adam Hochschild.
Moïse procurou acolhimento no Brasil, mas encontrou aqui neste nosso “país acolhedor” o horror: violência racial e morte.
Na terça, 1 de fevereiro, 3 homens foram finalmente presos e serão processados por homicídio duplamente qualificado, por impossibilidade de defesa e meio cruel.
A família de Moïse relatou ter sofrido intimidação por parte de 2 policiais, os mesmos que também estiveram presente em um protesto em frente ao quiosque no dia 29. O detalhe é que o protesto já vinha sendo acompanhado por outros policiais. A PM do Rio de Janeiro não quis comentar.
No sábado, dia 5 de fevereiro, aconteceram atos programados em diversas cidades do Brasil. No Rio de Janeiro, o ato ocorreu a partir das 10 horas, no Posto 8 da Barra da Tijuca; em São Paulo, no mesmo horário, no vão livre do MASP.
Os atos foram organizados por comunidades de imigrantes africanos no Brasil e pelo movimento negro, com participação de diversas outras organizações.
Moïse presente!
(*) Adriano Bueno é coordenador geral do Movimento Negro Unificado (MNU) de Campinas-SP.