A disputa cultural na classe trabalhadora

Por Clarice Avila (*)

Trabalhadores, 1955. Di Cavalcanti

“Cultura é um conceito basilar do socialismo” (Antonio Gramsci)

A dominação cultural e sua capacidade de difusão de ideias, valores, filosofias e visões de mundo podem até substituir o uso da força bruta para impor uma ordem social. Nesse sentido, a cultura é um dos elementos fundamentais na organização da classe trabalhadora, pois também é capaz de romper com a desagregação dos indivíduos e abrir caminhos para a construção de uma vontade coletiva.

A cultura apresenta-se como condição necessária ao processo revolucionário, pois contribui para o trabalho de crítica, se contrapõe ao individualismo e serve como um elo para todos que desejam construir uma contra-hegemonia. Algumas formulações gramscianas apontam no sentido de reivindicar a cultura como elemento central da luta de classes.

Hoje, podemos dizer que vivemos um momento de consolidação da indústria cultural e este momento nos desafia a pensar sobre novas questões para a luta de classes, tendo como tarefa primordial das organizações políticas e sindicais da classe trabalhadora a construção de aparelhos de hegemonia cultural para se posicionarem na disputa contra-hegemônica.

A cultura, a partir da visão marxista, é o modo de vida de uma comunidade humana. Essa maneira de viver e de ser é disputada pelas classes dominantes para seguir impondo as suas regras, violentando o legado dos nossos antepassados e “modelando” o nível cultural da população.

Não podemos esquecer que existe uma herança cruel no Brasil, que é a representação de uma classe buscando impor, de forma violenta, seu modo de vida e seus interesses particulares, inclusive na forma de criminalização dos nossos bens culturais. Os objetivos do passado estão bem vivos no presente quando uma classe dominante busca perpetuar a sua hegemonia política e cultural.

A hegemonia é uma combinação de direção moral, política, cultural e intelectual com dominação. É a combinação de liderança ideológica e cultural com coerção. Desta forma, determinada classe que consegue se alçar à condição de classe dominante, com apoio dos aparelhos estatais, acaba transformando o seu interesse de classe em interesse universal.

Importante destacar, como exemplo, que as indústrias editoriais em geral, e o jornalismo em particular, representam a força motriz da classe dominante quanto à produção de consenso e formação da opinião pública. São setores que criam uma percepção comum sobre as pautas políticas e culturais em disputa, influenciando e definindo a posição que deve ser adotada pelo seu “público”. Isto é, não somente apresentam uma visão baseada na concepção do mundo dominante, mas condicionam o que será considerado relevante no mundo cultural, por exemplo.

O teatro, o cinema, a música, o rádio e outras produções culturais faladas superam, em ampla escala, todas as demais formas de comunicação escrita (livros, revistas, jornal etc.). Mas é uma superação em nível de superfície, não é profunda. Porém, são capazes de dar maior capilaridade à hegemonia política e cultural das classes dominantes. Observar essa relação é fundamental, já que urge estabelecer uma cultura das massas populares feita por legítimos organizadores da cultura nascidos dentro dos movimentos de luta de classe.

Importante também compreender que, a partir da política cultural de um governo, há favorecimento à produção cultural da classe dominante ou da trabalhadora, com a valorização da cultura popular, dando centralidade a uma política cultural que seja conduzida pelo povo, sindicatos e organizações de classe. A cultura é, e sempre será, uma das ferramentas mais poderosas na luta de classe, servindo para a inquirição crítica e como instrumento de transformação social.

A Central Única dos Trabalhadores (CUT) e seus sindicatos filiados devem possuir a compreensão de que a luta pela emancipação da classe trabalhadora não se restringe à esfera econômica. Esse poder emancipador passa pela valorização do fator cultural, protagonizando uma frente cultural que caminhará ao lado das frentes econômicas e políticas, com a preocupação de se elevar a cultura das massas, para que possam se libertar da pressão ideológica das classes dirigentes.

 (*) Clarice Avila é professora – servidora pública em Barra Mansa-RJ; doutoranda no Programa de Ciências Sociais da UFRRJ; dirigente do PT/BM e do Sepe/BP e executiva da CUT-Rio.

 

 

 

 

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