A entrevista de Múcio e a necessidade de mudança

Por Marcos Jakoby (*)

A cada dia que passa fica mais claro que se o governo Lula quiser superar a tutela militar não será com o atual ministro da Defesa, José Múcio Monteiro. Pelo contrário, suas ações e declarações mostram-se um verdadeiro empecilho tanto na possibilidade governo Lula exercer efetivamente a autoridade e o comando civil na área, quanto de não conviver permanentemente com crises e ameaças golpistas.

Nesta sexta-feira, dia 20, ocorreu uma reunião entre o presidente Lula e os comandantes das Forças Armadas articulada por Múcio. Ao término da reunião, o ministro da Defesa concedeu uma entrevista a jornalistas (AQUI).

Segundo Múcio, a reunião foi para “tratar dos investimentos da indústria de defesa do Brasil” e disse que “não tratamos do dia 8, isso está com a Justiça”. Considerando que a afirmação do ministro é verdadeira e considerando que o presidente da FIESP, Josué Alencar, participou da reunião, trata-se de um absurdo. Como há uma tentativa de golpe, onde  há vários fatos envolvendo militares, inclusive oficiais e comandantes da ativa, e a reunião com o alto comando militar restringe-se a discutir investimentos na área de Defesa, como se nada tivesse acontecido?

Perguntado sobre a participação dos militares nos atos do dia 8, Múcio diz entender “que não houve envolvimento direto das Forças Armadas. Agora, se algum elemento, individualmente, teve sua participação, ele vai responder como cidadão”. Não sei em que mundo vive o ministro, mas há evidencias, provas, imagens e testemunhos que comprovam a participação de militares, em funções militares e de comando militar, na preparação e nas ações do dia 8. É só lembrarmos o que se passou no Gabinete de Segurança Institucional, no Batalhão da Guarda Presidencial e no acampamento golpista defronte ao Quartel General em Brasília.

Em seguida, um jornalista pergunta ao ministro se ele “se arrepende de ter classificado como democráticos os acampamentos?” Resposta de Múcio: “não, não me arrependo porque eu vim para negociar. Não podia negociar com você e a priori criar um pré-julgamento. Não me arrependo”. Pré-julgamento??? Não era mais do que declarado, aos quatro ventos, as intenções golpistas dos acampamentos? Múcio continua passando pano para o golpismo, mesmo depois das invasões do dia 8, talvez, porque, como ele mesmo disse, tivesse amigos e familiares participando dos acampamentos e tenha vínculos com o bolsonarismo. Aliás, Jair Bolsonaro é um “apaixonado” por “Zé Múcio” (AQUI).

No mesmo dia, noticiava-se em alguns veículos da imprensa, sem desmentidos do ministro até o momento,  de que o “Ministério da Defesa resiste à desbolsonarização para não desagradar Forças (…), ele [Múcio] tem dito que pretende manter lá os mesmos quadros do governo anterior. Alterações podem ser vistas como uma tentativa de influenciar na gestão das Forças Armadas. Por isso, a opção de Múcio é de manter o organograma anterior intacto. Segundo o Portal da Transparência, no fim do governo Bolsonaro, havia mais de 800 integrantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica trabalhando no Ministério da Defesa” ( AQUI).

Para não desagradar as Forças??? Elas não têm que ser agradas e nem desagradas, devem cumprir seu papel consitucional que é a defesa do país contra ameaças externas, na defesa da soberania nacional. Por fim, dizer que “alterações podem ser vistas como uma tentativa de influenciar na gestão das Forças Armadas” é uma inversão absurda das coisas, pois a política de defesa é uma política pública e de responsabilidade do governo democraticamente eleito e já as Forças Armadas são instrumento dessa política; portanto, o ministério da Defesa pode e deve “influenciar na gestão das Forças Armadas”.

Está mais do que evidente de que Múcio Monteiro não reúne as condições, o perfil e a orientação política para estar à frente do Ministério da Defesa, uma vez  que não coerente com o propósito do governo de romper com a tutela militar, anular o golpismo nas Forças Armadas e construir uma política de Defesa que contribua com  a soberania  nacional. É hora de mudar!

(*)  Marcos Jakoby é professor e militante petista

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