A farsa de João Doria

Por João Luís Lemos (*)

João Doria (PSDB), atual governador de São Paulo, vem tentando aparecer como contraponto a Bolsonaro em relação ao combate à pandemia do coronavírus. O governador tem apoio de setores da grande mídia e busca liderar a construção de uma alternativa política da direita tradicional para o país. Não há outra maneira de nomear essa movimentação: trata-se de uma grande farsa.

O estado de São Paulo é governado há 26 anos pelo PSDB. O resultado é uma enorme redução da capacidade de investimento do estado e destruição de direitos sociais. É nesse contexto que devemos compreender o profundo processo de desindustrialização, a precarização da educação, da saúde e demais serviços públicos e a política de genocídio da população negra nas periferias em São Paulo. João Doria intensificou o desmonte já em curso, seguindo a onda ultraliberal que assola o país desde o golpe de 2016.

Cabe lembrar que o atual governador se elegeu em 2018 com o mote “BolsoDoria”, estabelecendo estreita identidade com o bolsonarismo, e numa campanha marcada pelo antipetismo e anticomunismo. Esta identidade tem um conteúdo político muito nítido: a implementação de um programa ultraliberal e a presença de traços neofascistas. A agenda do governo estadual até o momento da pandemia concentrou-se em irrestritas privatizações e na aprovação de uma cruel reforma da previdência na Assembleia Legislativa, com dura repressão contra a classe trabalhadora, no início de março deste ano.

O primeiro caso da COVID-19 em São Paulo e no Brasil foi confirmado ainda no final de fevereiro. No dia 22 de março, quando centenas de casos já estavam confirmados, o governo estadual decretou quarentena. Desde então, este tem sido o principal ponto de apoio da ação midiática do governador para buscar diferenciar-se do cavernícola na Presidência da República. Nesse sentido, os atos dos bolsonaristas contra a quarentena ajudam o tucano a fazer este teatro. Porém, na realidade, as semelhanças entre Dória e Bolsonaro continuam muito maiores do que pontuais diferenças.

Pelo menos desde fevereiro, já estava evidente que São Paulo seria um dos principais epicentros da disseminação da COVID 19 no país. O governo Doria, no entanto, não estabeleceu um plano nítido de enfrentamento à pandemia de acordo com as experiências internacionais. Esta preparação demandaria organizar a realização de testagem em massa e um reforço nas políticas de saúde pública, especialmente nas periferias das grandes cidades. Além disso, seria preciso colocar toda a capacidade econômica do governo do estado para implementar políticas sociais de apoio à classe trabalhadora, como uma política estadual de renda emergencial e políticas de preservação dos empregos nas pequenas e médias empresas. Nada disso foi sequer cogitado pelo governo, dominado pela mesma lógica ultraliberal em que opera o governo Bolsonaro.

Como se já não bastasse a ausência de políticas sociais para proteger a vida da população do estado, Doria leva adiante uma política de retirada de direitos em plena pandemia. Desde março, centenas de trabalhadores de empresas terceirizadas que prestam serviço ao governo estadual – no Poupatempo, por exemplo – vem sendo demitidos sem que o governo estadual adote nenhuma medida efetiva para protegê-los.

Na educação, com a suspensão das aulas, o governo se limita a pagar um valor referente à merenda para uma pequena parcela dos estudantes, ao invés de disponibilizar cestas básicas para todos matriculados na rede estadual. São cerca de dois milhões e oitocentos mil (2,8 milhões) estudantes desassistidos. Já os professores categoria O e eventuais sem atribuição de aulas ficam sem pagamento de salários, quando o governo deveria garantir no mínimo um pagamento igual ao último vencimento, conforme reivindica a APEOESP. Para completar, o governo se aproveita das circunstâncias adversas para implementar a Educação à Distância, quando deveria suspender o calendário e reavaliar de acordo com as necessidades da preservação das vidas.

Na Assembleia Legislativa, a ação do governo é de atravancar qualquer Projeto de Lei que vise a criação de políticas sociais no período da pandemia. Os governistas refugiaram-se na pauta da redução dos subsídios dos deputados, o que é absolutamente insuficiente para a necessidade de aumento do investimento do estado, e cortes nos salários dos servidores comissionados da ALESP, o que traz uma armadilha ao abrir caminho para novos ataques aos servidores públicos estaduais de conjunto. Enquanto isso, projetos como o Auxílio Emergencial para os trabalhadores da cultura, apresentado por deputados do PT e do PSOL, ficam engavetados.

Por fim, o tom do governo Doria tem sido na perspectiva de flexibilizar a quarentena nos próximos dias, justamente no momento em que se acelera a elevação dos números de casos e de mortes no estado. Os leitos na capital paulista, principalmente nas periferias, alcançam maiores taxas de ocupação a cada dia e serão demandados os leitos do interior, justamente quando os casos nas diversas regiões do estado começam a aumentar. Caso se concretize a flexibilização da quarentena, ficará ainda mais escancarado o compromisso do governador com os interesses capitalistas e não com a vida da maioria da população.

Doria e Bolsonaro são farinha do mesmo saco. Não cabe, portanto, qualquer elogio à política implementada pelo governador de São Paulo. Não cabe, da mesma forma, qualquer ilusão de que Dória possa vir a compor uma “Frente Ampla” pela democracia, pois já demonstrou inúmeras vezes sua total falta de compromisso com as liberdades democráticas. Assim, o PT deve adotar uma política ofensiva de denúncia pública dos ataques aos direitos promovidos pelo governo Doria e desnudar a falta de políticas efetivas para o combate à pandemia. Dória é um inimigo da classe trabalhadora e devemos desmascarar sua farsa.

(*) João Luís Lemos é vice-presidente do PT Guaratinguetá e membro do Diretório Estadual do PT SP

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