Articulação de Esquerda: resolução sobre a situação política e nossas tarefas

A Direção Nacional da tendência petista Articulação de Esquerda, reunida no dia 28 de setembro de 2025, aprovou a seguinte resolução sobre a situação política e nossas tarefas.


1. Saudamos a imensa mobilização popular realizada no dia 21 de setembro contra a “PEC da Bandidagem” e contra a “anistia para golpistas”. Tanto nas ruas quanto nas redes sociais, uma parte importante do povo brasileiro manifestou-se a favor das liberdades democráticas. Nos próximos dias, será necessário mobilizar novamente para barrar qualquer tentativa de anistiar golpistas e defender a pauta do povo. Ocupar as ruas é importante para pressionar o Congresso, é importante para apoiar o governo Lula, mas, acima de tudo, é importante por si mesmo: a esquerda precisa recuperar o controle e a confiança nas ruas.

2. O resultado da votação no Senado, enterrando a tramitação da “PEC da Bandidagem”, mostrou mais uma vez que é possível alterar, a partir da pressão das ruas, a correlação de forças existente no Congresso Nacional. Não precisamos (e não podemos) ficar reféns dessa correlação de forças. Pelo contrário: se queremos mudar o resultado das votações e se queremos criar as condições para, em 2026, mudar a composição do Congresso, é essencial travar a disputa na sociedade.

3. É preciso dizer que importantes dirigentes de partidos, de movimentos sociais e do governo não acreditavam no sucesso das mobilizações. Noutras palavras: as manifestações poderiam ter sido ainda maiores e, principalmente, poderiam ter sido melhor organizadas se os “descrentes” tivessem feito sua parte. O Partido deveria ter convocado nacionalmente as manifestações, destacando o tema da “PEC da Bandidagem”; deveria ter providenciado materiais (bandeiras, adesivos, panfletos) para distribuir nos atos; e deveria ter utilizado os atos para desautorizar oficialmente os parlamentares que votaram a favor da “PEC da Bandidagem”.

4. As manifestações, nas ruas e nas redes, mostraram que a maior parte da esquerda repudia duramente a postura dos petistas que votaram a favor da “PEC da Bandidagem”. As manifestações foram poderosas em todo o país, entre outros motivos, porque as direções locais e a militância petista – ampla maioria nos atos – se engajaram na mobilização.

5. Ao comparecer, os militantes também deram seu veredito contra os parlamentares petistas que contribuíram com seu voto para aprovar a “PEC da Bandidagem”. Publicamente, ficou registrado que teriam sido 12 os parlamentares petistas que votaram a favor da “PEC da Bandidagem”. Mas, na verdade, foram 14 os parlamentares petistas que em algum momento votaram a favor de algum aspecto da tal PEC. Os 14 são Leonardo Monteiro (MG), Odair Cunha (MG), Paulo Guedes (MG), Airton Faleiro (PA), Divanda Faro (PA), Dr. Francisco (PI), Flávio Nogueira (PI), Florentino Neto (PI), Merlong Solano (PI), Alfredinho (SP), Jilmar Tato (SP), Kiko Celeguim (SP), Valmir Assunção (BA), João Daniel (SE). Importante dizer que, destes 14, oito contribuíram para aprovar o que talvez seja um dos piores trechos da “PEC da Bandidagem”: o voto secreto. São eles: João Daniel, Valmir Assunção, Kiko Celeguim, Jilmar Tato, Alfredinho, Odair Cunha, Paulo Guedes e Divanda Faro.

6. Nas manifestações, alguns desses parlamentares petistas foram acusados de “traidores” e nas redes houve muitos pedidos de “punição” e até de “expulsão”. Como a bancada e a Executiva Nacional do PT não fecharam questão a respeito, não há base estatutária para tomar medidas disciplinares. Mas a impossibilidade de tomar medidas disciplinares não impede que se apoie a campanha “não votar em quem tentou blindar”, nem tampouco impede que se faça um debate político a respeito não apenas do ocorrido, mas, principalmente, do que não pode voltar a ocorrer.

7. Em primeiro lugar, cabe criticar a Executiva Nacional do PT. A Executiva esteve reunida antes da votação da PEC e não aprovou resolução alguma. Reuniu-se outra vez depois da votação e novamente não aprovou resolução alguma. E quando, depois das manifestações, aprovou uma resolução, referiu-se à “PEC 03/2021, aprovada pela Câmara dos Deputados, rechaçada pelo povo brasileiro, que restabelece prerrogativas parlamentares, interpretada, nas ruas, nas mobilizações do último domingo, como instrumento de blindagem de parlamentares investigados”. Na prática, portanto, a Executiva Nacional do PT oscilou entre a omissão e a contemporização. “Passou o pano”! É óbvio que esta atitude da maioria da Executiva Nacional está ligada ao fato de que 11 dos 14 deputados federais que votaram a favor da “PEC da Bandidagem” são ligados à tendência Construindo um Novo Brasil (CNB); e todos os 14 votaram em Edinho para presidente do Partido.

8. Em segundo lugar, cabe ao Partido criticar formal e publicamente a atitude dos parlamentares, com destaque para a atitude dos oito que apoiaram o “voto secreto”. Embora não houvesse uma orientação do Partido, havia uma orientação amplamente majoritária da bancada. Ao votarem a favor da “PEC da Bandidagem”, esses parlamentares causaram um enorme desgaste para o Partido, um imenso ônus sem nenhum tipo de bônus. Pois, como se viu em seguida, o Centrão votou em peso a favor da urgência para a PEC da anistia para golpistas.

9. Em terceiro lugar, cabe um tratamento específico para os oito que foram decisivos para aprovar o voto secreto nas votações para abertura de processos criminais contra parlamentares. A previsão de voto secreto foi inicialmente derrubada, mas depois foi restaurada numa manobra dirigida pessoalmente por Hugo Motta. Para que a manobra desse certo e o voto secreto fosse aprovado, eram necessários 308 votos. Pois bem: o voto secreto foi aprovado, nessa segunda votação, por 314 votos contra 168. Se os oito petistas não tivessem votado a favor, a proposta teria recebido 306 votos e não teria sido aprovada. Neste caso particular, dada a gravidade do fato, consideramos necessário inquirir diretamente os oito acerca do seu voto e, a depender do que se diga, tomar as medidas decorrentes.

10. Em quarto e mais importante lugar, cabe enfrentar o problema político de fundo: a batalha contra a anistia para os golpistas, a luta pela pauta do povo, a vitória nas eleições de 2026 e um próximo mandato Lula superior ao atual exigem uma tática de polarização na sociedade.

11. Nossa tática não pode ser baseada na conciliação dentro do Congresso. Até porque, se queremos mudar a composição do Congresso, é importante explicar à população os motivos pelos quais a atual maioria é antipopular, antinacional e antidemocrática. Ademais, nossa tática deve levar em conta que a direita não é confiável e que, portanto, certos acordos são totalmente inócuos, prejudiciais, inúteis, desacumulam. E, como sabemos, o pior tipo de pragmatismo é aquele que não tem resultados. Os 14 supostamente acreditavam que, votando na PEC da bandidagem, conteríamos ainda que parcialmente a tramitação da PEC da Anistia para golpistas. O resultado foi outro, diferente do supostamente pretendido: i/o Centrão não cumpriu sua parte do acordo e ii/a imagem do Partido foi comprometida.

12. A tática que os 14 adotaram foi diferente da tática que vínhamos adotando desde o episódio do IOF, tática que leva em conta, cada vez mais, a necessidade de mobilizar a população. A vida demonstrou que teria sido melhor que toda a bancada tivesse sido unificadamente derrotada no Congresso e travar a disputa na sociedade, do que uma parte da bancada “ceder parcialmente” em troca de absolutamente nada, atrapalhando nossa disputa na sociedade.

13. O Partido precisa acreditar na mobilização social. Nem sempre é possível adotar esta tática; nem sempre ela tem êxito imediato, nem sempre ela é capaz de alterar a votação; mas existem situações (como esta que envolve a tentativa de “blindagem” de parlamentares e de anistiar golpistas) nas quais é possível mobilizar e a pressão popular pode ser vitoriosa. Ademais, há questões onde é preferível perder a ceder. Este é o caso, precisamente, da “PEC da Bandidagem” e da anistia para golpistas.

14. Neste sentido, é preciso exigir da Direção Nacional do PT que feche questão contra qualquer concessão no tema da anistia, pois já existem movimentos no sentido de aceitar uma “revisão da dosimetria”, como se isso não fosse uma anistia disfarçada. É o caso da deplorável opinião do senador Jacques Wagner, que declarou que “não se opõe” à redução de penas. O Partido precisa organizar imediatamente nova rodada de mobilizações populares contra a anistia para golpistas.

15. A luta pelas liberdades democráticas — que inclui punição para os golpistas, mas também inclui impedir que o parlamento se transforme em refúgio de criminosos — não esgota a pauta do povo. Para a imensa maioria da população, a democracia só ganha sentido se estiver a serviço da defesa do fim da escala 6×1, da redução da jornada, de que os ricos paguem impostos, da redução dos juros, da ampliação dos recursos para as políticas públicas. Por isso, ao mesmo tempo que devemos comemorar o êxito das manifestações de 21 de setembro, devemos pressionar o governo para que mude o rumo da política econômica. A Polícia Federal demonstrou os vínculos entre o PCC e a Faria Lima. Mas a verdade é bem pior: o conjunto do capital financeiro assalta cotidianamente o povo brasileiro. O Banco Central comandado por Galípolo, ao manter uma taxa de juros de 15%, está a serviço de quem pretende estrangular a economia, prejudicar o povo e nos derrotar nas eleições de 2026.

16. Embora existam divergências entre a direita tradicional e a extrema-direita, ambas estão unificadas na defesa da política neoliberal. As propostas de “pacificação”, feitas por diferentes porta-vozes da direita, visam exatamente criar as melhores condições para defender esta política neoliberal. Do nosso lado, se queremos melhorar aqui e agora a vida do povo, se queremos ampliar as chances de vitória em 2026 e se queremos fazer um próximo mandato Lula superior ao atual, estamos obrigados a enfrentar o capital financeiro e as restrições impostas pelo neoliberalismo. Ao mesmo tempo, temos a obrigação política e histórica de ir até o limite na luta em defesa das liberdades democráticas, condenando os golpistas, criticando a maioria de 311 picaretas que fazem o Congresso ser inimigo do povo, denunciando a manipulação da mídia empresarial e os compromissos de classe da maioria do STF. Por tudo isso, seguiremos nos opondo à “frente ampla”.

17. A tática da polarização está contribuindo para que Lula melhore nas pesquisas. Mas não devemos nos iludir, nem com as pesquisas, nem com o STF, tampouco com os acenos do presidente dos Estados Unidos. A eleição de 2026 não será um passeio. Estão e estarão contra nós o governo Trump, a aliança entre o agronegócio e o capital financeiro, as duas direitas (a tradicional e a extrema-direita), tudo junto e misturado. O mesmo Supremo que condenou os golpistas está prestes a aprovar, no julgamento do chamado Tema 1.389, uma destruição em larga escala dos direitos trabalhistas e sociais. E, no Congresso, segue o debate da contrarreforma administrativa, que nos cabe derrotar.

18. Venceremos se, entre inúmeras outras coisas, lembrarmos que colheremos nas urnas o que tivermos plantado nas ruas. Até porque não é com flores e negociatas que se combate o fascismo, nem tampouco o neoliberalismo!

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