Breve olhar sobre as eleições em Salvador

Num dia de sol, Salvador acordou

Com a mesma fedentina do dia anterior”

Chico Science, modificado

Por Maria Maranhão e Rodrigo Pereira (*)

Existe um sentimento entre a militância e a nação petista de que o Partido dos Trabalhadores/as, há muitos anos, desistiu de disputar o cotidiano político e a vida pública de Salvador. Apesar da importância política e eleitoral da cidade junto ao cenário nacional, a Direção Estadual e a Direção Municipal defenderam e bancaram a tática eleitoral palaciana de impor um pré-candidato fora do quadro e do espectro petista. Em meio a esse vácuo político, ambas Direções subestimaram a capacidade de luta e engajamento político da militância petista. Em termos populacionais, Salvador é a quinta maior cidade do Brasil, com mais de 2,4 milhões de habitantes e com 1.969.757 de eleitores, dado isso, abrir mão da disputa política na capital é um erro histórico que terá consequências para o próximo processo eleitoral.

De modo geral, o sentido apreendido pela população soteropolitana, quanto à inserção do PT em Salvador, é de que o Partido não tem interesse em disputar a capital baiana. O sentimento cristalizado nas ruas pelo povo é que há uma expectativa e até “legitimidade” de que a direita tradicional, neocarlista, a cada quatro anos, renove sucessivos mandatos no poder executivo municipal, além de formar uma maioria de vereadores na Câmara Municipal ligada ao prefeito. Esse mesmo sentimento, mais uma vez, foi confirmado no dia 6 de outubro, consolidando quase 28 anos — agora, mais quatro anos — de neocarlismo, constituindo-se, assim, como uma força política hegemônica em Salvador.

Depois de tudo que foi feito na pré-campanha, a cúpula governamental petista e as Direções do Partido esperavam por um resultado diferente? Passaram por cima do Estatuto partidário, rasgando as regras do processo de definição de candidatura, por meio do emprego de um método antidemocrático e antiestatutário, desrespeitando, por completo, todos os fóruns e instâncias petistas. Apesar de tanta flexibilidade posta pela Resolução que estabeleceu os Critérios para indicação de candidaturas do PT para a Federação Brasil da Esperança para o pleito das eleições de 2024, a cúpula petista baiana, mesmo subsidiada por regras frouxas, passou por cima da orientação da Direção Nacional, tratorou a militância e as instâncias petistas e retirou: o 13 (é 13!) da boca do povo; a estrela do peito; a bandeira vermelha com a estrela PT das mãos da nação petista e; por fim, o vermelho das ruas soteropolitanas. Foi-se a identidade partidária.

A derrota não foi só por conta do método aplicado para a “contra tática eleitoral”, mas, principalmente, pelo candidato escolhido, o qual possui trajetória política antagônica ao projeto democrático e popular defendido pelo Partido. A representação do candidato imposto foi, de tal modo, tão contraditória para a esquerda que membros da Direção do Partido afirmaram que seriam necessárias uma “camisa vermelha” e uma “vice-prefeita de esquerda”, isso tudo na tentativa de iludir a população soteropolitana e vender um sujeito de trajetória historicamente de direita, que sempre foi aliado de primeira ordem ao neocarlismo, como se fosse um “democrata” e “progressista”. É importante afirmar que quem pariu Geraldo Júnior não o balançou!

O candidato apoiado por um setor do PT foi derrotado nas ruas e nas urnas. Contra o autoritarismo, a rebeldia militante e a nação petista deram nas urnas uma resposta clara ao método de toada de gado, afirmando que tirania não combina com corações à esquerda. É preciso combater o discurso de que as vitórias são dos “líderes”, “magos” e “bruxos” e as derrotas são “socializadas” à militância, esta considerada, por parte das Direções, como rebelde e indisciplinada, contrariando a “orientação dada”. Essa “máxima” subalterniza a militância e as instâncias partidárias à condição de sujeitos secundários, alijados do processo de participação das decisões partidárias.

O autoritarismo de um setor do Partido tem nos levado a derrotas eleitorais acachapantes. Nessas eleições, por exemplo, o candidato a prefeito Geraldo Júnior (MDB), atual vice-governador, que tinha Fabya Reis (PT) como vice na chapa, ficou em terceiro lugar, com 10,33% dos votos válidos; o segundo lugar foi de Kleber Rosa (PSOL), com 10,43%, enquanto Bruno Reis (União Brasil) foi reeleito com 78,67%. Esse foi o pior desempenho do PT nas eleições em Salvador nos últimos 28 anos.

O resultado final das eleições foi melancólico. Apenas foi reeleita a vereadora Marta Rodrigues, para o quarto mandato. De modo geral, o desempenho pífio deve-se: 1°) ao “consórcio” falido de partidos conhecido como Federação Brasil da Esperança; 2°) pelo fato de não haver o 13 nas urnas, levando o PT a retroceder em mandatos na Câmara de quatro para um; 3°) ao abandono de uma estratégia política de esquerda, ausência de disputa ideológica, de projeto popular e de concepção de uma cidade inclusiva.

“O medo dá origem ao mal”

A conivência e o silêncio de uma dezena de lideranças e, principalmente, de parlamentares do Partido é notória diante dos rumos que têm levado o PT a derrotas vexatórias. Isso não pode passar despercebido. Por que se calam? Por que essa obediência cega? Como é possível vários se calarem diante de alguns? Estas reflexões são importantes para pensarmos e construirmos outro caminho político de esquerda, combatendo a lógica do partido de parlamentares e construindo o partido por e para militantes.

Se o presente é de luta, o futuro nos pertence!

Che Guevara

(*) Maria Maranhão e Rodrigo Pereira são militantes do PT e da Articulação de Esquerda de Salvador.

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