Por Milton Pomar (*)
Relatório da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico confirma o esperado para a economia mundial em 2023: (https://www.oecd.org/economic-outlook/november-2022/) o PIB deverá crescer 2,2%. Com previstos 5,7% para 2023 e 6,9% para 2024, a Índia promete o maior crescimento do mundo, seguida de perto pela Indonésia (4,7% e 5,1%) e a China (4,6% e 4,1%). Evidentemente, em termos absolutos, o crescimento do PIB chinês impacta a economia mundial muito mais, porque trata-se de US$ 20 trilhões pela paridade cambial e US$ 27 trilhões pela (https://data.worldbank.org/indicator/NY.GDP.MKTP.PP.CD?locations=CN) paridade do poder de compra (PPP), o que coloca o país com PIB per capita de US$19 mil (o da Índia é US$ 7 mil, e do Brasil US$16 mil).
Participando na economia global (https://www.visualcapitalist.com/100-trillion-global-economy/), com 20% da riqueza gerada, quase 30% da manufatura, US$ 3,1 trilhões em importações em 2021(total equivalente a duas vezes o PIB do Brasil em 2021),e tendo contribuído para reduzir a pobreza e a fome no mundo, com políticas de aumento constante do poder (https://data.worldbank.org/indicator/NE.IMP.GNFS.CD?locations=CN) aquisitivo da população, via manutenção do pleno emprego e taxa média de 9% de crescimento econômico entre 1980 e 2020, a China é hoje efetivamente a “tábua de salvação” de muitos países – inclusive o Brasil, de quem é a maior parceira comercial e maior compradora de produtos agropecuários.
Aliás, a China é a maior parceira comercial de mais de 100 países, e através do seu programa de “conectividade” comercial mundial “Cinturão e Rota” (BRI, na sigla em inglês, ou “Rota da Seda do Século 21”), iniciado em 2015, ela tem investido em infraestrutura (principalmente transportes) em vários países da Ásia Central e África. Conta para isso com recursos próprios e empréstimos dosbancos do BRICs (https://www.ndb.int/) e de Investimento em Infraestrutura da Ásia(https://www.aiib.org/en/index.html).
Certamente é por essa importância que ela tem para a economia do Brasil que o presidente Lula anunciou que irá à China em março de 2023. Com um “primo rico” assim, e a projeção da OCDE para o crescimento do PIB brasileiro de deprimentes 1,2% e 1,4% nos próximos dois anos, não há tempo a perder. O Brasil precisa conseguir centenas de bilhões de dólares para investir em infraestrutura, para que a necessária reindustrialização do País tenha chance real de acontecer – a indústria brasileira só será competitiva internacionalmente se o país tiver financiamento de longo prazo e baixo custo, e o dobro de malha ferroviária atual, mais transporte fluvial e marítimo costeiro, e aéreo regional.
Talvez seja possível o Brasil conseguir uma parte dos recursos necessários para investir em infraestrutura com os Estados Unidos (EUA) e a União Europeia, que anunciaram um plano de investimentos para suas ex-colônias, para concorrer com o “Cinturão e Rota” chinês (ferroviário e marítimo), porque temem o poder comercial que ele proporcionará à China e aos países asiáticos. Temor confirmado pela criação da RCEP (Parceria Econômica Regional Abrangente) – grupo de países do Leste e Sul da Ásia (mais Austrália e Nova Zelândia),liderados pela China, que certamente continuará tentando que a Índia, Bangladesh e o Paquistão também participem, porque com mais esses países seu “poder de fogo” comercial, econômico e político será enorme, superior ao da União Europeia e dos EUA.
Participando da indústria mundial com menos de 2%, o Brasil continua mercado consumidor de produtos manufaturados da China e exportador de minerais, produtos agropecuários e florestais, situação que só aumentou nos anos 2000. O detalhe é que, ao contrário do que se imagina, a tendência é que a China diminua a importação de alimentos a médio prazo, porque a lógica com a qual trabalha nessa área é a da soberania (garantir a segurança alimentar com produção própria, não depender de importações agropecuárias).
Todos os países da América do Sul (exceto o Paraguai, que ainda mantém relações com Taiwan) dependem do crescimento da economia chinesa. E todos estão com investimentos chineses em recursos minerais e/ou em produção agropecuária, florestal e de pescado.
Interessa à China aumentar a cooperação com o Brasil? – Se sim, em quais áreas? Em futebol com certeza, mas há muito mais possibilidades. Será que o governo chinês se dispõe a ser realmente “tábua de salvação” do Brasil nesse momento (como está sendo para vários países da América do Sul, África e Ásia)?
Como, quando e por quem será definida (se é que será algum dia…) a estratégia do Estado brasileiro para a cooperação com a China, visando o desenvolvimento do País e não apenas o enriquecimento de alguns milhares de empresários do “Agro”, e dos setores mineral e florestal, todos eles coincidentemente às custas da Natureza?
Em 2023, completará 49 anos o estabelecimento de relações diplomáticas entre o Brasil e a China, e 35 anos do acordo Cbers, de cooperação científica e tecnológica aeroespacial (http://www.cbers.inpe.br/) entre os dois países, que é um sucesso e poderá servir de exemplo para “n” acordos semelhantes entre instituições brasileiras e chinesas. Portanto, passa da hora de ser feito um debate sério, de caráter estratégico, sobre a cooperação entre os dois países, a nível federal, estadual e municipal, e entre universidades, institutos federais, instituições de pesquisa, e nas áreas esportiva e cultural.
(*) Milton Pomar é profissional de marketing, geógrafo, e trabalha com a China há 25 anos.