Por Mateus Luan (*)
Texto integrante do Boletim Página 13 LGBTQIA+ de outubro
O Partido das Trabalhadoras e dos Trabalhadores inicia um novo ciclo de encontros setoriais nos próximos meses. No entanto, causa preocupação o fato de que apenas a juventude e as mulheres terão encontros presenciais, enquanto os encontros dos demais setoriais de organização do PT serão realizados online. Essa decisão fragiliza a intensidade e a profundidade dos debates, reduzindo o espaço para o reconhecimento mútuo e para a construção coletiva que só o encontro presencial proporciona.
Nossa militância sabe, por experiência própria, que estar junto importa. Foi assim em 2017, quando a criação da Secretaria LGBT do PT ocorreu a partir de encontros estaduais e de um encontro nacional totalmente presenciais. Naquele momento, nos reconhecemos não apenas como LGBTs, mas como LGBTs petistas, sujeitos políticos, militantes de diferentes realidades e inserções: gays, lésbicas, bissexuais, travestis, transexuais, pessoas não-binárias, intersexo, assexuais e tantas outras identidades – sem falar das nossas diferenças políticas, quando encontramos uma verdadeira diversidade de organizações internas ao PT presentes também na ideologia de cada LGBT petista. Essa pluralidade só pôde se afirmar pela experiência da convivência e da escuta ao vivo, do debate olho no olho, onde diferenças se tornam força e não obstáculo.
E ainda assim, a construção desse espaço foi árdua. Consolidar uma instância partidária em sintonia com as lutas da comunidade LGBT e pela visibilidade e organização das LGBTs petistas exigiu atravessar realidades de exclusão que infelizmente se repetem fora, mas também dentro do PT. LGBTs da classe trabalhadora enfrentam condições de vida piores que pessoas – e em especial homens – heterossexuais, seja no trabalho, na família, na cultura ou na política. E mesmo sendo um partido que nasceu para acabar com as desigualdades, ao longo da sua história, o PT também acabou por muitas vezes, reproduzindo essa lógica.
Mas a Secretaria se consolidou, de 2017 a 2025, como espaço institucional fundamental: não apenas para demarcar a luta dentro do partido, mas também para que com os acúmulos gerados conseguíssemos pautar governos, visando mudar concretamente a vida da população LGBT em geral, e em todo o país. Essa nossa luta e nossa organização, que garante melhores condições políticas de atuação das LGBTs petistas, se soma a todo o movimento LGBT em ascensão no país: promovendo mais cidadania e mais dignidade para esta população, e quem ganha com isso é toda a sociedade.
A militância LGBT da Articulação de Esquerda cumpre papel decisivo nesse processo. Nosso compromisso é com o recorte de classe: não queremos representar “todos os LGBTs”, mas sim os LGBTs da classe trabalhadora: aqueles e aquelas que, enquanto trabalhadores e trabalhadoras, sofrem exploração e opressão redobradas. Cabe a nós interseccionar gênero, raça e sexualidade na luta pelo socialismo — combatendo um sistema que extrai mais-valia de todos, mas com especial brutalidade das mulheres, da população negra, indígena, das pessoas com deficiência e, claro, das LGBTs, de maneira estrutural e estruturante: todos e todas sabemos que sem as opressões contra essas falanges da população, o capitalismo não se sustentaria como hoje.
Por isso, não podemos aceitar que o debate seja esvaziado. É necessário que cada município organize reuniões presenciais e, sempre que possível, encontros estaduais que fortaleçam nossas bases. Essa é a melhor forma de impedir que os encontros setoriais se tornem meros ritos burocráticos e sem vida. A experiência recente comprova a importância da Secretaria LGBT forte, ativa e representativa em todas as regiões do país: o financiamento e a visibilidade das candidaturas resultaram no sucesso de diversas campanhas nas eleições municipais de 2024, ampliando a presença de parlamentares LGBTs petistas em todo o Brasil.
Esse espaço institucional é conquista coletiva e não pode ser desperdiçado por divisões internas estéreis, nosso local de atuação precisa somar forças e não disputar poder, essa compreensão é fundamental para não colocar em risco esse processo de consolidação da militância LGBT no PT. O próximo processo de escolha da direção da setorial deve ser momento de soma, não de disputa fratricida.
Nosso desafio é consolidar ainda mais essa instância, para pautar governos — especialmente o governo de coalizão do Presidente Lula — em políticas públicas contra a violência e pela promoção da cidadania LGBT+, e também para preparar o PT para as eleições gerais de 2026. Queremos renovar e ampliar nossa bancada LGBT+ no Congresso e nas Assembleias Legislativas, mas isso só será possível com unidade, organização e presença concreta nos territórios, na luta por uma sociedade mais justa e igualitária, livre de exploração e opressão.
Nunca foi apenas uma opção de militância: é parte da luta por um Brasil justo, socialista e sem LGBTfobia. Sem LGBTs não teremos revolução.★
(*) Mateus Luan, militante do PT e da AE e primeiro vereador LGBT de Palmeira das Missões/RS, ex-coordenador geral da União Estadual dos Estudantes – UEE/RS, delegado fundador da Secretaria Nacional LGBT do PT e agente territorial de cultura do Ministério da Cultura – Minc, pelo Programa Nacional dos Comitês de Cultura – PNCC.