Padilha, Nisia e Cassandra

Por Valter Pomar (*)

Primeiro li uma declaração da ministra Nísia Trindade.

Segundo consta: “Ao JOTA, a ministra afirmou que a pasta não pleiteia este ano o aporte de recursos de R$ 18 bilhões – quantia que teria de ser acrescida ao orçamento caso houvesse o entendimento de aplicação imediata que vincula o piso de saúde a 15% da Receita Corrente Líquida (RCL).”

A declaração está aqui: https://www.jota.info/tributos-e-empresas/saude/nisia-defende-proposta-de-zeca-dirceu-para-o-impasse-sobre-o-minimo-da-saude-05102023

Considero absolutamente fantástico ver alguém, à frente de um ministério de onde golpistas & bolsonaristas tungaram, desde 2016, dezenas de bilhões de reais, abrir mão de 18 bilhões.

Depois vi & ouvi um áudio do ministro Alexandre Padilha.

O vídeo está circulando nas redes sociais.

Transcrevo o que é dito, no vídeo, pelo Padilha: “eu fico impressionado com muita fake news, muita interpretação incorreta, sobre o piso constitucional da Saúde. Vamos começar lembrando que o piso constitucional da Saúde está na Constituição e ele foi alterado pelo famigerado teto de gastos que congelou os recursos durante vinte anos. O governo Lula acabou com o chamado teto de gastos, com a aprovação do novo marco fiscal, que aprovamos esse ano e foi sancionado agora nesse segundo semestre. Com a sanção do novo marco fiscal, volta a funcionar o chamado piso constitucional, que significa mais recurso para a saúde já esse ano. Aliás, é isso que garantiu exatamente o PLP (136/2023), que é um PL abaixo da Constituição, aprovado essa semana no Congresso nacional. Eu acho inclusive absurdo como é que alguém pode falar que muda o piso constitucional através de um PL, que tá abaixo da Constituição? Isso é negacionismo legislativo gente. Nós garantimos aquilo que era compromisso nosso, de acabar com o famigerado teto de gastos, aprovar o novo marco fiscal e com a aprovação do novo marco fiscal volta a valer o piso constitucional. O que significa neste ano ter mais recursos para a saúde, aliás o presidente Lula já colocou no começo do ano mais de 20 bi adicionais pra saúde do governo federal acima do que tava no teto de gastos com a PEC da transição e com os recursos adicionais desse ano e mais os recursos do ano que vem já no novo orçamento com piso constitucional valendo também pro ano que vem serão mais de 70 bilhões de reais adicionais além do orçamento. Ou seja, o presidente Lula já passa nesses dois anos como o presidente que mais investiu na saúde.”

Considero absolutamente fantástica a frase final do vídeo, segundo a qual, em outubro de 2023, Padilha já comemora como fato totalmente realizado o que Lula, esperamos, conseguirá em dezembro de 2024, caso tudo corra como ele Padilha diz que vai ocorrer.

Isto posto, reconheço ser muito complexa a situação do ministro e da ministra.

Que o piso constitucional voltou a valer, é um fato que ninguém nega. E que houve recomposição de recursos, em relação ao desastre anterior, também ninguém nega.

A esse respeito, Padilha está arrombando porta aberta.

Mas também é um fato que existe um movimento no sentido de “flexibilizar” o cumprimento do piso constitucional da saúde. Movimento que tem apoiadores no ministério da Fazenda, fato demonstrado por documentos do próprio ministério.

A esse respeito, ler aqui: Valter Pomar: O Tesouro contra a Constituição

Que a emenda de Zeca Dirceu seja parte deste movimento que visa flexibilizar o piso, uma espécie de cabeça de praia, um movimento antecipatório, é algo sobre o qual há polêmicas.

Polêmica ao menos em parte resultantes do fato que Zeca Dirceu não combinou nem avisou muita gente acerca do que faria.

Diante do referido movimento, Nisia e Padilha poderiam adotar várias posturas.

Escolheram a clássica: culpar Cassandra.

Gostaria de acreditar que eles têm razão. Mas, infelizmente, o conjunto da obra aponta noutro sentido. Sendo assim, melhor continuar denunciando as intenções e brigando para que não se materializem.

Afinal de contas, negacionismo mesmo é acreditar que no nosso governo não há social-liberais e neoliberais à solta.

(*) Valter Pomar é professor  e membro do diretório nacional do PT

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