Por Varlindo Nascimento (*)
Tem sido co um observar ao lado da bandeira nacional brasileira a presença dos símbolos dos Estados Unidos e de Israel nos atos em defesa do governo Bolsonaro, nos movimentos pró intervenção militar, entre outras manifestações dos grupos da direita antidemocrática local.
No caso da bandeira norte americana é mais fácil de explicar, dado o caráter semicolonial imposto ao Brasil pela maior potência econômica e militar do mundo. É importante lembrar que a manutenção desse quadro conta com o papel de força auxiliar desempenhado pelas elites econômicas locais, tributárias dos interesses imperialistas.
Explicar a bandeira do Estado de Israel é algo bem mais complexo e envolve pelo menos um elemento a mais, a religião.
Ressalto aqui que trato Israel sempre pelo prefixo Estado, no sentido de restringir qualquer possibilidade de confusão entre a entidade política e a atribuição religiosa dada a partir da interpretação bíblica de um povo escolhido e de uma terra sagrada.
Nos últimos anos tem ganhado força dentro do fundamentalismo evangélico a tese de que a consolidação do Estado de Israel no território palestino contribuiria para a antecipação da segunda vinda do Cristo à terra para o arrebatamento definitivo do seu rebanho.
Do ponto de vista histórico essa corrente responde a doutrina dispensacionalista, desenvolvida em sua forma moderna durante o século XIX pelo pregador inglês John Nelson Darby, a qual defende uma interpretação literal do texto sagrado calcada no antigo testamento e que tem arregimentado cada vez mais adeptos no meio evangélico brasileiro. Do ponto de vista prático essa corrente exegética tem grande inserção na política de governo dos Estados Unidos, país de maioria protestante consolidada. O secretário de Estado Mike Pompeo e o vice-presidente Mike Pence são, inclusive, defensores e propagandistas dessa corrente.
No Brasil a aliança política entre Jair Bolsonaro e lideranças dos principais conglomerados evangélicos faz com que os atos de governo estejam sempre carregados de simbologias religiosas, como por exemplo o slogan: “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”. A presença constante da bandeira do Estado de Israel faz parte dessa lógica de funcionamento de um Estado que abre mão da sua laicidade constitucional em nome da governabilidade e do apoio maciço de um setor da sociedade extremamente corporativista e que hoje responde por cerca de 30% da população do país. Coincidência ou não, número semelhante à base de apoio mantida pelo presidente, mesmo diante de todas as crises e denúncias.
A perspectiva religiosa acaba servindo tanto para a construção de apoio político interno como no âmbito da geopolítica internacional. Estados Unidos, Brasil e Israel compõem atualmente uma tríade totalmente alinhada em termos de política externa. Um exemplo disso foi o apoio dado por Brasil e Estados Unidos à mudança da capital do Estado de Israel para Jerusalém, território sagrado também para cristãos e muçulmanos.
Na verdade Israel sempre desempenhou um papel de satélite da política militar e intervencionista dos Estados Unidos no Oriente Médio, funcionando como uma base militar e de inteligência avançada no entorno dos países árabes produtores de petróleo. O Brasil tem desde o ano passado buscado exercer uma função parecida no América do Sul, sendo uma espécie de capanga dos yankees. É neste sentido que estão a entrega do controle da base militar de Alcântara no Maranhão, assim como, o flerte constante com uma intervenção militar na Venezuela, único país importante do subcontinente onde os Estados Unidos ainda não conseguiu impor um regime político alinhado aos seus interesses.
O significado da bandeira de Israel nos atos da extrema direita acaba respondendo a questões históricas de fundo religioso, o que mostra o quanto a exaltação de símbolos pátrios associados a determinadas doutrinas pode ser transformada num catalizador político para interesses bem mais amplos e complexos.
(*) Varlindo Nascimento é militante petista em Recife, bacharel em Geografia, pós-graduado em Sindicalismo e Trabalho, graduando em História e mestrando em Estado, Governo e Políticas Públicas.