Por Jonatas Moreth (*) e Patrick Araújo (**)
As eleições municipais de 2020 será um pleito com características e desafios completamente diversos do que a esquerda e o campo democrático enfrentaram em nossa curtíssima trajetória de democracia formal, a começar pelo calendário eleitoral (mas não só).
Em virtude da pandemia da Covid-19, e a necessária exigência de isolamento social, tem se construído um consenso para que os dois turnos ocorram em novembro. A iniciativa partiu do presidente do TSE, Ministro Luís Roberto Barroso, e já foi aprovada no Senado (PEC 18/2020), e aguarda votação na Câmara dos Deputados, onde já existe acordo para sua aprovação.
Com este novo calendário, o primeiro turno será adiado do dia 4 de outubro para 15 de novembro, e o segundo turno de 25 de outubro para 29 de novembro. Esse calendário não é completamente inédito porque as eleições de 1989, a primeira após a redemocratização, também teve o primeiro turno no dia 15 de novembro. A diferença é que em 1989 o segundo turno ocorreu em 17 de dezembro.
Em virtude do adiamento do pleito, o prazo para as convenções partidárias serão entre 31/08 e 16/09, e os registros de candidaturas encerram-se em 26/09. O inicio da propaganda eleitoral iniciará em 27/09. A posse dos candidatos eleitos não foi alterada, continuando no tradicional primeiro de janeiro subsequente as eleições. A grande alteração neste calendário é o encurtamento do segundo, que neste pleito será de apenas duas semanas.
Como dito acima, essas não são as únicas alterações para a eleição de 2020. Este será o primeiro pleito sem coligação para as candidaturas proporcionais. Ou seja, no caso do Partido dos Trabalhadores, será possível fazer coligação para a campanha de prefeito, todavia o partido sairá sozinho na disputa para vereança, podendo apresentar como candidatos 150% das vagas em disputa. Assim, caso a Câmara dos Vereadores de determinado município tenha 10 cadeiras, cada partido sozinho poderá ter 15 candidatos, sendo obrigatoriamente 30% de mulheres.
Essa alteração tende a pulverizar ainda mais a quantidade de partidos políticos com representação nas Câmaras de Vereadores, e o mesmo no Congresso Nacional em 2020, assim como motivará ainda mais a criação de novos partidos. Apesar
disto, no caso do PT, a alteração pode ser benéfica por dois fatores: a) enfraquece a possibilidade de troca de apoio para candidatura majoritária em detrimento de coligações proporcionais; b) facilita, caso assim aprovem as instâncias partidárias, o uso do fundo eleitoral para o voto em legenda, sem receio de com isto eleger candidatura de outros partidos.
Apesar dos esforços das bancadas femininas, ainda não foi solucionada em definitivo a utilização de candidaturas de mulheres como laranja para injetar recursos destinados às mulheres em campanhas masculinas, uma vez que não foi criado dispositivo eficiente de fiscalização das dobradas mistas.
O maior desafio, no entanto, não será o segundo turno mais curto; ou as candidaturas laranjas para apropriação de recursos destinados a participação feminina na política; ou mesmo a ausência de coligações proporcionais. O maior desafio chama-se fake news e a rede subterrânea de destruição de reputações comandadas pela extrema direita e, tudo indica, financiada por recursos empresariais ilegais.
Segundo a maioria dos especialistas as eleições, mesmo com o adiamento, ocorrerão ainda na vigência de algum tipo de isolamento social em virtude da pandemia da Covid-19. Ainda que alguns municípios já tenham revogado as medidas de isolamento social, a população possivelmente ainda estará receosa do contato, da conversa muito próxima com estranhos, ou mesmo de receber panfletos dos candidatos.
Portanto, ainda com mais intensidade do que ocorreu em 2018, as eleições serão definidas pela internet, seja por meios legais e controlados para apresentação de propostas e debate de ideias, seja pelo subterrâneo do gabinete do ódio e outros grupos especializados em divulgação em massa de mentiras nas redes sociais.
Como as eleições de 2018 comprovaram, nosso sistema judicial não está capacitado, nem parece ter disposição política, para coibir os grupos subterrâneos de fake news e seus financiadores.
Já se passaram 18 meses das eleições que, com muita mentira nas redes sociais, elegeu Bolsonaro, e apesar de muitos indícios e algumas provas, pouco foi feito. Em verdade, a máquina judiciária só se movimentou com maior eficiência quando os alvos dos ataques covardes foram os Ministros do Supremo Tribunal Federal.
Caberá ao PT e a esquerda um imenso desafio: recuperar parcela de sua base social e eleitoral perdida, derrotar política e eleitoralmente a extrema-direita, ciente de que será alvo prioritário de uma avalanche de mentiras nas redes sociais.
(*) Jonatas Moreth é advogado e militante do PT.
(**) Patrick C. Araújo é advogado e militante do PT.