Um balanço necessário: a luta em defesa do serviço público

Avaliação de conjuntura da Articulação de Esquerda sobre a luta em defesa do Serviço Público e Valorização das Carreiras do Executivo Federal

Também é possível descarregar o texto diagramado como jornal, em versão pdf: Jornal Página 13 – Especial Condesef

Após o Golpe de 2016, foi inaugurada uma era nefasta para o serviço público no Brasil, pois desde então houve um acelerado desmonte do Estado brasileiro no atendimento à maioria da população. Nesse contexto, as reformas que visam concretizar a terceirização da prestação pública de serviços  estiveram no centro das reformas neoliberais propostas pelos governos Temer e Bolsonaro. Sendo que uma das primeiras medidas do governo golpista de Temer foi o encaminhamento da Emenda Constitucional 95 (“PEC da Morte”), que limitou os gastos públicos em várias áreas, sendo um instrumento eficaz no desmonte das políticas públicas, direitos sociais e desestruturação dos serviços públicos no Brasil.

Graças à muita luta e resistência das três esferas do serviço público foi possível resistir até agora à Reforma Administrativa, consolidada na Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 32. Que, aliás, não é uma reforma, e sim a destruição da prestação pública de serviços à população e visa transformar essa prestações em novos “ativos” do mercado. Dessa forma, a falácia do enxugamento do Estado, com o desmonte das carreiras públicas, é um atalho para a questão principal que é a terceirização e privatização do Serviço Público. Em que pese não tenham sido possíveis greves exitosas durante todo o período nefasto de Temer e Bolsonaro, houve resistência dos servidores públicos ao desmonte e destruição da prestação pública de serviços para a população. A exemplo da greve contra a Reforma da Previdência em 2017; as mobilizações contra a Emenda Constitucional 95 (PEC de “Gastos”), o “Tsunami da Educação”, em 2019, contra o desmonte do orçamento das universidades e dos institutos federais. E foi justamente devido à unidade das três esferas do serviço público e pela capacidade de diálogo com a população sobre os malefícios  dessas medidas que conseguimos barrar, até então, o avanço da PEC 32 (que, de fato, está pronta para ser votada) no Congresso Nacional.

Assim, a eleição de Lula não só representou um freio contra o avanço desses desmontes, como trouxe a possibilidade de recomposição do Orçamento Público e de retomada do papel do Estado na promoção de políticas públicas e direitos essenciais à população brasileira, notadamente àquela que mais precisa, a classe trabalhadora. Nesse sentido, foi importante que já na transição tenha sido assumido o compromisso pelo novo governo de barrar a PEC 32, regulamentar a negociação coletiva do serviço público e retomar a Mesa Nacional de Negociação. Um avanço extraordinário, num cenário em que a maioria dos servidores e servidoras tiveram salários congelados por mais de sete anos sendo corroídos pela inflação, como também sequer houve qualquer processo de negociação.

O reajuste salarial de 9% em 2023 e dos benefícios em 2023 e 2024 foi uma conquista imediata que emergiu como um resultado da derrota do projeto de Bolsonaro, Paulo Guedes e Arthur Lira. Entretanto, esses reajustes não resolveram o arrocho que assolou os servidores desde o Golpe de 2016. E, infelizmente, o governo Lula adota algumas políticas que promovem austeridade fiscal contra o orçamento público. E o faz  tragicamente, na medida em que para “recolocar os pobres no orçamento” e  reconstruir o Brasil são necessários investimentos públicos robustos e valorização do Serviço Público e isso não se faz com contenção do investimento público. Ou seja, tendo a geração de superávits e o pagamento dos juros e encargos da Dívida Pública como prioridades macroeconômicas.

Nesse sentido, o Arcabouço Fiscal, piorado significativamente pelo Congresso Nacional, restringe e aprisiona a expansão de investimentos públicos. Essa política cria “gatilhos” que impedem a execução de políticas públicas essenciais e a valorização dos trabalhadores e trabalhadoras públicas.  A política do Déficit Zero segue o mesmo curso de austeridade fiscal, pagamento dos juros e encargos da Dívida Pública, em detrimento do incremento dos investimentos públicos essenciais às mudanças estruturais profundas que necessitam serem feitas para que o Brasil saia da rota do entreguismo, privataria e desmonte neoliberal.

No Congresso Nacional o centrão e uma maioria conservadora, fisiológica e liberal chantageia e promove um cerco para evitar a efetivação de um projeto de governo de transformação. Se apropriaram de boa parte do orçamento do Executivo para manter a lógica neoliberal e clientelista. Trabalham diuturnamente para beneficiar o andar de cima. Mas o Governo precisa fincar marcos e avanços para a sua base social.

No que diz respeito à negociação salarial e às concepções de Estado e “gestão de pessoas”, por um lado, evidencia-se que há um esforço real para recomposição do funcionalismo, num contexto em que em 2022 o número de servidores ativos era o menor da história recente (no governo Bolsonaro ocorreu apenas um concurso no Ibama devido à determinação judicial). Por outro lado, há uma nítida visão meritocrática e desestatizante proposta pelo MGI para alguns âmbitos do Serviço Público, o que não coaduna com as diversas necessidades do estado brasileiro na prestação de serviços públicos e na garantia de direitos da população. Inclusive no que diz respeito ao papel da esfera pública de promover, sim, a mobilidade para amplas parcelas da população que o fazem por meio do acesso a um cargo público. Nos referimos nesse caso com políticas que excluem e desvalorizam o Nível Auxiliar (NA) que foram propostas pelo governo, as quais rejeitamos e que foram revistas pelo governo no acordo a ser assinado em breve, mas que seguem presentes enquanto uma diretriz para algumas carreiras. Muito menos com a visão de que os novos servidores de Nível Intermediário (NI) devem ser contratados como empregados públicos celetistas, flexibilizando o RJU. Graças à contrariedade da Condsef, o Concurso Nacional Unificado (CNU) prevê a contratação de servidores do (NI), contrariando a opinião inicial expressada pela bancada governista na Mesa  Nacional de Negociação. Nesse sentido, aliás, se faz necessário que a Condsef e nossos sindicatos reafirmem a defesa e proteção dos direitos dos servidores de nível auxiliar e intermediário. Aliás, a grande parte dos cargos de NI tem natureza técnica e que cumprem funções operacionais e de administração permanente indispensáveis ao serviço público e ao atendimento da população. Nesse sentido,  questionamos ainda: qual o sentido do investimento na educação profissional, com a criação de 100 novos Institutos Federais, se essas formações não terão o direito de acesso a cargos públicos, mediante o fim do concurso para ingresso desses cargos?

Nesse mesmo contexto de balanço, precisaremos acumular avaliações e debates sobre a diluição (na prática) da Mesa Nacional de Negociação e adoção de Mesas Temporárias e Específicas para a negociação da reestruturação das carreiras. Reconhecemos que há um grande anseio na base da Condsef e de nossos sindicatos pela reestruturação das carreiras. No entanto, na prática, o que temos visto até agora, em termos de resultado dessa linha adotada pelo governo, é que apenas no caso das chamadas carreiras típicas e do topo de cima tem ocorrido, de fato, reestruturações das carreiras com uma reposição de média 30 a 34% dos vencimentos. Por outro lado, o governo segue afirmando que inúmeros setores do funcionalismo federal,  a exemplo do Plano Geral de Cargos (PGPE), não terão suas carreiras estruturadas num plano de cargos. Bem como, em outras mesas de setores que já têm planos de carreiras, a exemplo da área ambiental e agrária, as propostas apresentadas não dizem respeito a uma reestruturação, e versam tão somente sobre insuficientes recomposições de perdas acumuladas no período. Assim, acabamos abrindo mão de uma negociação geral, em nome de corrigir distorções da recomposição linear, mas, até então, isso não tem redundado em reestruturação das carreiras e correções das distorções salariais. Precisamos agir contra o processo de fragmentação das futuras negociações salariais.

Sem que infelizmente tenha sido possível construir greves na maioria da base da Condsef em 2024, realizamos importantes processos de mobilização que possibilitaram  avanços nas negociações com o MGI. No caso do PGPE, PST e PECs avançou-se de uma proposta de reajuste zero para 2024, 4,5% em 2025 e 4,5% em 2026 para o aumento do índice para 9% em 2025 e de 3,5% para 5% em 2026, estendendo essa proposta a outros setores, inclusive da base da Condsef/Fenadsef, tanto para ativos, como também aposentados/pensionistas dos níveis Superior, Intermediário e Auxiliar. Sublinha-se que a forte greve dos servidores das Instituições Federais de Ensino (docentes e técnicos), junto com a força da grande Marcha dos Servidores de 17 de abril, combinada com a Marcha da Classe Trabalhadora de 22 de maio, que contou com participação expressiva de Servidores Públicos foi essencial para que alguns avanços ocorressem na negociação.

Aliás, a Greve na Educação continua em todo o país. As entidades que representam o setor da Educação apresentaram uma proposta de reajuste de 3,69%, em agosto de 2024; 9%; em janeiro de 2025; e 5,16%, em maio de 2026. Porém, o MGI afirma não ter mais espaço no orçamento para dar o aumento neste ano, em que o governo aperta os cintos para fechar as contas. O fato é que era possível atender as demandas dos trabalhadores em greve, no entanto o governo preferiu fechar um acordo com uma única entidade que representa parte da categoria, uma prática divisionista, anti sindical, levando uma parte da sua base social, a se indignar e se manter em luta.

Dessa forma, avaliamos que o governo se equivoca em manter o arrocho das carreiras em 2024 e  destacamos que não houve um processo real de negociação e muito menos de correção das distorções salariais, ao contrário a manutenção de privilégios na negociação àqueles que já ganham muito reforça a elitização do serviço público. Contudo, reconhecemos que a proposta que resultou das carreiras PGPE, PEC e PST, que são a maioria da base da Condsef e de nossos sindicatos, somente foi possível pelo contextos de mobilização e luta da da base da Condsef. Do ponto de vista financeiro, se considerados os 9% de 2023, essa proposta significa que, nos quatro anos do atual governo, os salários do PGPE-PST-Planos Correlatos terão 24,75% de reposição, portanto, terão sido corrigidos pela inflação prevista no período (16,84%) e terão um ganho real de 6,77%. Compreendemos, entretanto, que a assinatura dos acordos não deve significar o encerramento da mobilização e pressão para que o governo adote alternativas para o aumento salarial dos servidores em 2024, a exemplo de propostas de envio de projetos de lei de realocação dos valores orçamentários deste exercício orçamentário

Por fim, não há o que tergiversar sobre a PEC 32 e o governo precisa agir para enterrar a Reforma Administrativa imediatamente, portanto, cabe ao executivo federal assumir uma posição nítida e adotar ações efetivas contra essa PEC nefasta. Além disso, é urgente que o Projeto de Lei (PL) de regulamentação da Convenção 151 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que prevê a proteção sindical e a regulamentação da negociação coletiva, seja concluído e enviado pelo governo para o Congresso Nacional, com o real compromisso do  e empenho para a sua aprovação.

Em tempo, reafirmamos nossa solidariedade à Palestina e o repúdio à política genocida de Israel. Defendemos que o governo Lula rompa relações diplomáticas com Israel, a exemplo do que fez a Colômbia  com a suspensão das exportações de carvão, conforme anunciou  recentemente o presidente Gustavo Petro, forte crítico do governo de Benjamin Netanyahu pela condução do conflito. No ato realizado no dia 06 de maio, em frente a Embaixada de Israel, em Brasília, os dirigentes da CUT e da Condsef exigiram que o Brasil faça o mesmo, e rompa imediatamente as relações diplomáticas com governo sionista de Israel, pois defender o povo Palestino é defender todos que sofrem com as opressões no mundo inteiro.

Assinam pela Articulação de Esquerda:

Ismael José César – Executiva da CUT e da direção nacional da Condsef

Eleandra Raquel da Silva Koch– Secretária-Geral do Sindiserf-RS e da direção nacional da Condsef

Adilson dos Santos– Diretor da CUT-MS e Diretor Condsef no período de 2019-2023.

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