A eleição da presidência da Câmara e o PT

Por Daniel Valença (*)

A escolha sobre o que fazer na eleição da presidência das Casas do Congresso Nacional não decorre de questões morais, mas de táticas políticas.

Uma das táticas para superar o golpe de 2016 e a derrota nas eleições de 2020 é intensificar a luta social, reconquistar parcelas das classes trabalhadoras; organizar, mobilizar. Se tudo isto for feito, as cada vez piores condições de vida do povo poderão se reverter em reação popular. Da mudança na correlação de forças na sociedade se produzem transformações na disputa institucional.

Há outra tática, prevalecente na esquerda nas últimas duas décadas, pela qual a nossa vitória se dará por quantos mais espaços institucionais ocuparmos. Seja uma secretaria, uma vice-prefeitura, uma comissão na Câmara, um governo, etc.

Como essa tática não parte do pressuposto de conquistar a maioria da população para nosso programa político, corre o risco de acabar no vale tudo, inclusive abdicar de partes ou quase a integralidade de nosso programa, ou aliar-se com nossos inimigos, aqueles que realizaram o golpe de 2016 e os ataques aos direitos no país.

Para a eleição na Câmara, os que defendem essa tática diziam que aliar-se a Maia no primeiro turno seria importante para ocupar cargos na mesa diretora e comissões.

Após o Vice-presidente do PT, Quaquá, defender que, se o objetivo é ocupar cargos, se ambos são de direita e se está indefinido o resultado, então o caminho é apoiar quem mais oferecer como contraprestação – e aí, segundo ele, este critério o leva a apoiar Arthur Lira – passou-se a argumentar que estaríamos perante uma disputa entre o candidato de oposição a Bolsonaro – ou de “defesa da democracia”, dos “direitos”, contra o “avanço do fascismo”, etc. – e o candidato bolsonarista.

De lá para cá, a maioria da bancada do PT decidiu pelo apoio ao bloco de Maia. Nesta decisão, aprovou-se um “puxadinho”; integraríamos o bloco de Maia (para ocuparmos cargos na mesa e comissões), mas teríamos candidatura própria.

Logo após a decisão petista, Rodrigo Maia se reúne com Michel Temer – ele mesmo! Michel Temer! – e delibera pelo nome de Baleia Rossi para a presidência. Para quem não se recorda, este deputado foi um dos articuladores do golpe de Estado de 2016, homem de confiança de Michel Temer.

Considerando que a decisão de candidatura própria tratava-se de um verdadeiro “puxadinho”, que a candidatura à presidência da Câmara do PT seria mesmo o nome indicado por Maia, houve inúmeras críticas de petistas contra o nome de Baleia e, segundo a imprensa, haveria uma preferência da bancada petista pelo nome do deputado paraibano Aguinaldo Ribeiro (PP). Para quem não se recorda, ele foi ministro de Dilma, prometeu voto contra o golpe, e, por óbvio, não cumpriu.

De acordo com a imprensa da Paraíba, está em curso sua filiação ao PSL. Aguinaldo é herdeiro político do chamado grupo da Várzea, organização liderada por seu finado avô e que é acusada pelo assassinato de Margarida Maria Alves, sindicalista rural histórica brutalmente assassinada por sua luta em defesa da reforma agrária e direitos trabalhistas dos trabalhadores rurais.

Ao final de todo esse enredo indigno ao partido de maior bancada na Câmara e maior instrumento partidário que a classe trabalhadora já construiu, Maia desconsiderou as críticas e reafirmou a candidatura do homem escolhido por Temer, Baleia Rossi.

Poderíamos estar com uma candidatura própria defendendo, ao longo de todo esse período, o impeachment de Bolsonaro, o fim das privatizações e a reestatização das empresas privatizadas após o golpe; a derrubada da EC 95, das reformas da previdência e trabalhista.

Além de se constituir-se em instrumento de politização da população, em meio a um estágio da luta de classes que mais se assemelha a uma maratona que a cem metros rasos. Inclusive, uma candidatura de esquerda nos possibilitaria chegar ao segundo turno em melhores condições.

E, antes de mais nada, deixaria demarcado para as classes trabalhadoras que não há alternativa senão derrotarmos os neoliberais e a extrema direita; ao final, eles muito mais se assemelham que se diferenciam.

A ilusão que nos vendem quanto a disputa da presidência da Câmara, como dizia Fidel, é mais efêmera do que a espuma de Champagne. E todo o ano de 2021 o comprovará.

(*) Daniel Valença é professor da graduação e mestrado em Direito da UFERSA; Vice-presidente do PT/RN


(**) Textos assinados não refletem, necessariamente, a opinião da tendência Articulação de Esquerda ou do Página 13.

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