Articulação de Esquerda: texto-base para a Plenária nacional de balanço das eleições 2020

 

Plenária nacional de balanço das eleições 2020

Domingo, 6 de dezembro, das 10h00 às 18h00

(documento em arquivo word: roteiro de discussão a hora do balanço )

Programação

10h00 abertura e leitura do texto-base

11h00 debate

13h00 interrupção para almoço

15h00 retomada do debate

17h00 encaminhamentos sobre nossa contribuição ao balanço que será feito no DN dia 7/12 e apresentação do calendário de atividades da AE em 2021, inclusive do congresso da tendência

18h00 encerramento


Terão direito a voz na plenária do dia 6 de dezembro os integrantes das coordenações setoriais e direções municipais, estaduais e nacional da tendência petista AE; a militância da tendência que assumiu candidaturas proporcionais e majoritárias nas eleições de 2020, não importando se eleitas ou não; os companheiros e as companheiras que integram direções partidárias e direções de movimentos sociais; nossos parlamentares e governantes.

Também terão direito a voz representantes dos setores que integraram conosco a chapa que disputou o Congresso nacional do PT. Assim como outras pessoas convidadas pela Direção nacional da tendência.


Esta plenária é dedicada ao camarada Clóves de Castro, militante comunista, revolucionário, fundador da tendência petista Articulação de Esquerda, um proletário combatente.

Clóves de Castro, presente!


Texto-base: A hora do balanço

(versão não revisada e sujeita a alterações)

Passado o segundo turno, há uma enxurrada de análises acerca do ocorrido nas eleições.

No caso do Partido dos Trabalhadores, foi convocada para o dia 7 de dezembro uma reunião do Diretório Nacional do Partido.

Na pauta desta reunião, o balanço eleitoral e a discussão sobre a tática do PT na eleição da mesa diretora da Câmara dos Deputados e do Senado.

Como o que está ruim sempre pode piorar, parte significativa da bancada defende apoiar uma candidatura da direita, ao contrário de lançar uma candidatura da esquerda.

Quanto ao balanço das eleições, existe uma grande divergência acerca de como interpretar os resultados, tanto do primeiro, quanto do segundo turno.

Por isto, é muito importante que todas as instâncias do Partido dos Trabalhadores se reúnam, para analisar os resultados eleitorais e para discutir como dar continuidade à nossa luta contra os governos e contra as políticas ultraliberais.

Nesse espírito, nós da tendência petista Articulação de Esquerda estamos ajudando a organizar, no dia 12 de dezembro, uma plenária aberta de balanço das eleições e discussão do futuro do PT.

Além de participar desta atividade no dia 12 de dezembro e além de participar ativamente do balanço partidário – nas candidaturas, nas cidades, nos estados e regiões, setorialmente, nacionalmente – nós da AE também faremos nosso próprio balanço, das candidaturas que impulsionamos e dos resultados que obtivemos.

A esse respeito, informamos que os candidatos e candidatas serão chamados – pela direção nacional – para uma ou mais reuniões de avaliação. E que pretendemos, no início do ano de 2021, divulgar um balanço específico acerca do nosso desempenho.

Quanto ao Roteiro de Discussão que passamos a ler, trata-se de um texto que – após o debate neste plenária – será emendado e divulgado, como nossa contribuição para o debate partidário. Com base nele, vamos apresentar ao DN neste dia 7 de dezembro um projeto de resolução. Passemos à leitura.

ROTEIRO DE DISCUSSÃO

1.O balanço das eleições de 2020 deve começar com uma saudação à militância popular que fez campanha no primeiro e no segundo turno para as candidaturas da esquerda, em particular para as candidaturas petistas.

2.Saudamos, também, todas as nossas candidaturas majoritárias e proporcionais, tanto aquelas que foram vitoriosas, quanto aquelas que foram eleitoralmente derrotadas.

3.Saudamos nominalmente as companheiras Marilia Arraes, Luizianne Lins, Benedita da Silva e Manuela Dávila, e através delas homenageamos a todas as candidaturas – em particular as de companheiras mulheres — que foram vítimas de uma campanha brutal de ataques, patrocinada pela velha e pela nova direita brasileira, em alguns casos com a participação cúmplice e desonrosa de setores que se pretendem democratas e até de esquerda.

4.Também saúdamos nominalmente Margarida Salomão, de Juiz de Fora; Marília Campos, de Contagem; José de Filippi, de Diadema; Marcelo Oliveira, de Mauá; e Edmilson Rodrigues, de Belém, através dos quais homenageamos todos e todas as candidaturas petistas e de esquerda que foram vitoriosas nas eleições 2020, tanto no primeiro quanto no segundo turno.

5.E agradecemos o apoio dos mais de dez milhões de brasileiros e de brasileiras que votaram na esquerda, especialmente os mais de seis milhões que votaram em candidaturas do Partido dos Trabalhadores.

6.Nos dirigimos também à militância da tendência petista Articulação de Esquerda. Em todo o país, nas cidades e estados onde atuamos, participamos do esforço feito pelo Partido dos Trabalhadores e pela esquerda, apoiando e em alguns casos lançando candidaturas a prefeitura e a vereança. É o caso da companheira Célia Tavares, que disputou a prefeitura de Cariacica (ES) e do companheiro Ary Vanazzi, reeleito prefeito de São Leopoldo (RS), em nome de quem saudamos toda a militância da Articulação de Esquerda que encabeçou candidaturas no processo eleitoral, seja candidaturas ao executivo, seja ao legislativo.

O SEGUNDO TURNO

6.No dia 17 de novembro, a tendência petista Articulação de Esquerda divulgou um documento intitulado “Balanço preliminar do primeiro turno”. Reiteramos as ideias gerais contidas naquele documento. Agora, concluído o segundo turno, é possível e necessário fazer um balanço do processo eleitoral como um todo.

7.Como há balanços de todos os gostos e sabores, é importante deixar claro que fazemos este balanço na condição de militantes e dirigentes do Partido dos Trabalhadores.

8.Não nos propomos a falar em nome de nenhuma “ciência política” supostamente neutra. Tampouco nos arrogamos o papel de falar em nome dos interesses gerais de todo o campo popular, de toda a esquerda, como gostam de achar que fazem alguns analistas, muitos deles integrantes do que chamamos “fração do teclado vermelho”. Nosso ponto de vista, o ponto de vista da tendência Articulação de Esquerda, é o ponto de vista de quem milita em um determinado partido político, o PT, dentro do qual somos defensores de um programa e de uma estratégia que busca abrir caminho para um Brasil democrático, popular e socialista. Uma estratégia que só triunfará se houver muita luta de classe, muita polarização política, social e cultural.

9.Por ser este o nosso ponto de vista, um ponto de vista de partido, fazemos um balanço de combate. Por um lado, combate contra a extrema direita, contra a direita, contra setores autoproclamados de centro, contra o oligopólio da mídia e contra certos “cientistas políticos”, que afirmam que o resultado das eleições municipais teria sido um triunfo do centro, da moderação, uma derrota da polarização e dos radicalismos, um suposto golpe fatal para o Partido dos Trabalhadores. Consideramos que estes balanços estão totalmente equivocados. O que eles denominam de “centro”, é na verdade a velha e a nova direita. O que eles chamam de moderação, é uma direita que patrocina a violência ultraliberal e não vacila em usar práticas bolsonaristas contra a esquerda. Quanto a “morte do PT”, esta já foi anunciada dezenas de vezes, nas últimas quatro décadas.

10.Esta opinião de que o PT teria sofrido uma derrota definitiva – opinião que, de maneira as vezes mais sutil e elaborada, é também compartilhada por articulistas e dirigentes de partidos de esquerda, entre os quais o PSOL – não encontra, em nossa opinião, respaldo nos fatos eleitorais, nem na história recente. Basta dizer que algo muito parecido foi dito em 2016, entre outras tantas vezes.

11.Contudo, nosso balanço também é de combate contra avaliações feitas por setores do próprio PT. Setores que fazem avaliações que manipulam números e estatísticas, na vã tentativa de ocultar que sofremos uma derrota eleitoral e política nas eleições de 2020.

12.Nos parece óbvio que — nas mais de 200 cidades onde vencemos — obtivemos uma vitória eleitoral e, muitas vezes, também obtivemos uma vitória política. Assim como é óbvio que, em muitas cidades do país, sofremos derrotas eleitorais, mas obtivemos vitórias políticas de natureza local. É o caso de Recife e do Rio de Janeiro, para ficar só nestes dois exemplos.

13.Mas quando analisamos o desempenho em inúmeras cidades, nos estados, nas grandes regiões do país e no Brasil como um todo, é impossível não reconhecer que sofremos, ao mesmo tempo, uma derrota eleitoral e uma derrota política. Por exemplo: como qualificar o resultado da eleição em Belo Horizonte e em São Paulo? Como qualificar o resultado da eleição no estado de São Paulo? Como qualificar o resultado das eleições no Nordeste do país, especialmente quando lembramos do que ocorreu em 2018 e dos discursos acerca de uma suposta “tática nordeste”, cuja amplitude de alianças era apresentada como uma receita que garantia o sucesso? Aliás, destacamos: é essencial fazer um balanço detido do que ocorreu na região nordeste, especialmente nos estados governados pela esquerda (BA, CE, PI, RN e MA), onde o resultado foi preocupante.

14.Os que pretendem apresentar nosso desempenho nacional como uma vitória eleitoral e/ou política estão incorrendo em algo que, a falta de termo melhor, podemos chamar de criptonegacionismo.

15.Um bom exemplo de atitude negacionista foi dada pelo governador Rui Costa, para quem o desempenho eleitoral do PT no estado da Bahia poderia ser sintetizado pelo crescimento de 42% em relação a votação de 2016. Este crescimento de 42% é real, assim como é igualmente real o decréscimo na votação de 2020 em relação a votação obtida pelo PT em 2012. Também é real que, tomados isoladamente, os resultados eleitorais obtidos em cidades como Salvador, Feira de Santana, Vitória da Conquista e outras podem, inclusive, ser apresentados como um avanço em relação às eleições anteriores (em Feira de Santana, por exemplo, é um grande êxito eleitoral e político termos ido ao segundo turno e obtido a votação que obtivemos). Mas tomado de conjunto, o resultado das eleições municipais na Bahia não foi favorável ao PT. Vencemos em 2018, porque reconhecemos a derrota ocorrida em 2016. Se não reconhecermos a derrota em 2020, não tomaremos as atitudes necessárias para virar o jogo e ganhar em 2022. Isto vale para a Bahia e para todo o Brasil: a classe trabalhadora e a esquerda não podem ter medo da verdade, não podem ter medo de dizer as coisas como elas são. O autoengano nunca produziu e nunca produzirá vitórias.

UM AMPLO LEQUE DE QUESTÕES

16.Um balanço completo do processo eleitoral exigirá um certo tempo, indispensável para analisar com ciência todas as questões envolvidas. Entre estas questões estão:

17.A análise das características da eleição propriamente dita, realizada em tempos de pandemia, o que gerou reflexos tanto sobre o eleitorado em geral quanto na dinâmica das campanhas populares; uma campanha sem coligações proporcionais; uma campanha com fundo público eleitoral, mas com grande volume de financiamento privado e compra de votos; uma campanha com as fake news e manipulações de sempre, inclusive das pesquisas eleitorais; uma campanha em tempo reduzido. E é preciso levar em devida conta o ambiente de pandemônio – político, econômico e social – em que transcorreram as eleições, inclusive seus reflexos no âmbito da guerra cultural e religiosa que a direita segue implementando.

18.A análise do crescimento das abstenções, dos votos nulos e dos votos em branco. Mesmo descontando os que se abstiveram por conta da pandemia e os efeitos do recadastramento biométrico, em muitas cidades os votos não válidos atingiram níveis altos demais, estabelecendo o voto facultativo de fato. E em vários casos, como em São Paulo capital por exemplo, o PT foi um dos prejudicados pela evasão de parte do voto popular.

19.A análise de como os votos válidos se repartiram entre os três grandes campos políticos que disputaram as eleições: a direita, o centro e a esquerda. E, claro, a análise de como os votos válidos se repartiram dentro de cada um desses campos políticos. E, mais importante, a origem social dos votos, em particular descobrir em quem votou a classe trabalhadora.

20.A análise da quantidade de cidades que cada campo político administrará a partir de 1 de janeiro de 2021, levando em consideração o número de habitantes das cidades, sua importância econômica e política, bem como a vinculação social dos eleitos.

21.A análise do número de vereadores/as que cada campo político elegeu e a vinculação social (gênero, étnica, geracional, religiosa etc.) dos e das parlamentares.

22.A análise detalhada do desempenho do PT: sua votação absoluta e relativa em relação a eleições passadas, a composição social do voto, nosso desempenho pelos diferentes tipos e tamanhos de cidades, os motivos que nos levaram a perder parte importante das cidades que governávamos desde 2016 etc.

26.Parte destas questões já foi abordada no já citado “Balanço preliminar do primeiro turno”. Outras questões estão contempladas neste “Roteiro para discussão”. E todas merecem um estudo detalhado, que tomará certo tempo. Mesmo sabendo que vamos repetir algo que já foi abordado anteriormente, sistematizamos a seguir trezes questões:

a/Houve um crescimento da abstenção, dos votos brancos e dos votos nulos. Em que medida isso se deve a pandemia, em que medida se deve a razões políticas, qual o impacto que isto tem sobre a votação da esquerda e o que pode ser feito para reverter a situação, para impedir que se instale entre nós o voto facultativo na prática?

b/Como os votos válidos se distribuíram pelos diferentes campos políticos e pelos diferentes partidos? E qual a composição social, étnica, de gênero, geracional, regional e como se distribuí pelo tamanho de cidade, da votação de cada campo político e de cada partido?

c/Levando em consideração as diferenças entre eleições municipais e eleições gerais, em que medida os resultados eleitorais estimulam ou dificultam alianças políticas entre os diferentes partidos, tendo em vista as futuras eleições presidenciais?

d/Qual o impacto das eleições, sobre a disputa entre os diferentes setores da direita? Especificamente, como avaliar o desempenho eleitoral do bolsonarismo e o desempenho eleitoral da direita tradicional?

e/Como avaliar o desempenho da esquerda em geral, em particular o desempenho do PT, do PSOL e do PCdoB? No caso do PSOL e do PCdoB, o que este resultado projeta, quando levamos em conta a chamada cláusula de barreira?

f/Como avaliar o desempenho dos governadores de esquerda e que tipo de impacto isto pode ter na sucessão, em 2022?

g/Como avaliar as relações entre PT, PSB e PDT, tendo em vista o ocorrido nas eleições de Recife e de Fortaleza, bem como as declarações anteriores e posteriores de Ciro Gomes, de Carlos Siqueira e da família Campos?

h/Como avaliar o fato de que, no primeiro turno de 2020, quase dois terços (63,7%) dos candidatos prefeitos à reeleição foram reeleitos, quando em 2016, somente 40% obtiveram êxito na reeleição, sendo que o percentual de reeleição se manteve acima de 60% em todas as eleições municipais desde 2000? Por quais motivos diminuiu o número absoluto de prefeituras petistas, embora tenha aumentado a presença de prefeitos em médias e grandes cidades, assim como crescido um pouco o número de habitantes governados pelo PT?

i/Levando em conta que em 2020 houve, pela primeira fez, fundo público para eleições municipais, como avaliar o seu impacto em geral e no PT em particular? O PT cumpriu o estipulado por lei e algo mais? Que conclusões tirar do fato de que mais da metade dos vereadores eleitos das cidades com mais de 200 mil habitantes foi financiada também por doações de empresários, especialmente do setor imobiliário e do comércio varejista? ne

j/Como avaliar e como enfrentar o antipetismo (e outras expressões do discurso da extrema direita, como o discurso moralista anticorrupção, de ódio, de crítica dos costumes e dos valores, de preconceitos contra pobres, trabalhadores, LGBTQI, negros, mulheres, assim como o fundamentalismo religioso) como arma ideológica, política e eleitoral, especialmente na reta final, para mobilizar o “exército de reserva eleitoral” das candidaturas conservadoras? E como avaliar o emprego desta arma, mediada pelas chamadas fake news, inclusive por partidos e candidaturas que fazem parte do arco de alianças do PT?

k/Em muitas cidades foram eleitas candidaturas de jovens, mulheres, negras e LGBTQI, assim como candidaturas indígenas. Como estas candidaturas se distribuem pelos diferentes partidos, em que proporção estão nos partidos de esquerda, em que medida isto foi produto de uma política organizada e em que medida isto foi na contramão de interesses já estabelecidos? Como, a partir dos resultados obtidos, fortalecer a luta contra o racismo, a defesa das mulheres, dos jovens, dos LGBTI etc.

l/Que decorrências podemos extrair, dos resultados da eleição municipal, no que diz respeito a estratégia geral da esquerda, em particular na polêmica sobre a frente ampla e frente de esquerda? E que decorrências podemos extrair, no que diz respeito a nossas formas de organização de atuação, a nossa formulação programática e ao nosso discurso, a nossas políticas de comunicação, especialmente com a juventude e com os setores populares, bem como sobre nossa política, alianças e candidatura na próxima eleição presidencial?

27.Sem prejuízo da análise e resposta detalhada de cada uma destas e de outras questões, já é possível adiantar algumas conclusões fundamentais sobre o resultado global das eleições. Destas conclusões, destacamos a seguir as que nos parecem mais relevantes.

VITÓRIA DA DIREITA

28.Como o resultado eleitoral de 2020 incide na situação geral do país? As forças de direita que sustentam a política ultraliberal, foram derrotadas ou foram vitoriosas?

28.O fato é que cerca de 75% dos votos no primeiro turno e parte majoritária dos votos no segundo turno foram dados para partidos que estão à direita do centro, seja a candidaturas vinculadas ao bolsonarismo raiz, seja a candidaturas vinculadas aos partidos tradicionais da direita: MDB, PSDB, PP, DEM, PSD etc. Partidos que, entre outras coisas, foram capazes de capitalizar a ajuda emergencial em seu favor.

29.Ou seja: a maioria dos novos governantes municipais e dos vereadores/as eleitos integram o campo político que deu o golpe em 2016, apoiou a condenação e prisão de Lula, contribuiu para a eleição de Bolsonaro e sustenta parte essencial das políticas adotadas por este governo.

30.Tanto no primeiro quanto no segundo turno, as candidaturas lançadas pelos partidos tradicionais de direita se saíram eleitoralmente melhor do que aquelas explicitamente bolsonaristas. Além disso, as pesquisas de opinião indicam um crescente desgaste de Bolsonaro e de seu governo.

  1. Tanto no primeiro quanto no segundo turno, as candidaturas lançadas pelos partidos tradicionais de direita, como PSDB, MDB e DEM, se saíram eleitoralmente melhor do que aquelas explicitamente bolsonaristas. Apesar de uma perda expressiva de votos desse campo em relação a 2016, igualando sua performance de 2012. O campo bolsonarista, como PSL, PSC e Podemos, quase dobrou sua quantidade de votos em relação a 2016, ano ainda sem Bolsonaro. O bolsonarismo conseguiu capturar uma boa parcela dos votos da direita tradicional. Apesar das pesquisas de opinião indicarem um crescente desgaste de Bolsonaro e de seu governo os partidos bolsonaristas tiveram uma boa performance. Mas, candidatos explicitamente apoiados por Bolsonaro foram derrotados.

31.Mas não devemos superestimar a derrota do bolsonarismo. Afinal, parte importante do eleitorado continua se orientando pelo repertório bolsonarista. Aliás, foi no esgoto bolsonarista que as campanhas de João Campos (a versão baby de Aécio Neves), de Melo e de Sarto foram buscar “argumentos” contra as candidaturas de Marilia Arraes, de Manuela Dávila e de Luizianne, respectivamente. Valendo registrar que a ênfase com que Sarto legitimou a baixaria bolsonarista, quase lhe custou uma derrota no segundo turno frente ao Capitão Wagner; o que não impediu Ciro Gomes de atacar brutalmente o PT em declarações dadas logo após o segundo turno. Aliás, sobre Ciro Gomes, além de reiterar que o governador Camilo Santana é um infiltrado dos Ferreira Gomes no PT, é preciso apontar que altos dirigentes do nosso Partido precisam se libertar da dependência política e psíquica que sofrem frente ao Coronel Gomes. Apesar dos abusos continuados de que somos vítima, estes dirigentes seguem tratando Ciro como um aliado, como alguém que merece intimidades e salamaleques, que merece reuniões reservadas. Os partidos, como as pessoas, precisam saber se dar ao respeito. Ciro não é de esquerda, nem é um democrata; democratas não vão para Paris, quando o país está sob ameaça.

32.Voltando ao tema do bolsonarismo: parte das candidaturas eleitas e das candidaturas derrotadas, mesmo que não tenham explicitado isso durante a campanha eleitoral, apoia, apoiou e/ou podem voltar a apoiar o próprio Bolsonaro. Isso parece particularmente verdadeiro, e não apenas no interior do país, como demonstram os casos de Fortaleza, de Vitória, de Cariacica, de Belém e de São Gonçalo.

33.Por tudo isso, embora seja correto dizer que Bolsonaro não saiu vencedor das eleições, embora possa ser dito que ele saiu derrotado das eleições, não se deve concluir daí que o resultado de 2020 decidirá o futuro de seu governo e seu potencial de reeleição. Até porque, como sabemos, Bolsonaro não disputou para valer e de forma organizada as eleições municipais. Caso a oposição de esquerda atue, em 2021, com o mesmo “freio de mão puxado” com que atuou em vários momentos em 2019 e 2020, é perfeitamente possível que o cavernícola seja capaz de voltar a colher vitórias. Ou que outro nome da direita triunfe, tocando o mesmo repertório.

34.Além de tudo o que foi dito anteriormente, é preciso agregar o mais importante: o bolsonarismo não é um fim em si mesmo, mas um dos meios para implementar a política ultraliberal. E a verdade é que os apoiadores desta política foram amplamente vitoriosos nas urnas de 2020.

35.Por tudo isso, os resultados de 2020 confirmam, mais uma vez, que não virá principalmente da luta eleitoral-institucional o impulso necessário para derrotar o bolsonarismo e o ultraliberalismo. Para alterar a correlação de forças do país, faz-se necessário uma grande onda de lutas sociais. Sem isso, as próximas eleições tendem a perpetuar a atual correlação de forças, com pequenas inflexões à esquerda ou à direita.

AS EXPECTATIVAS DO CENTRO

36.Mesmo sabendo as diferenças que existem entre uma eleição municipal e uma eleição presidencial, os números de 2020 confirmam que segue existindo espaço eleitoral para o projeto de “centro” que vem sendo costurado por Ciro Gomes e outros.

37.Do ponto de vista numérico, os partidos de centro (PDT, PSB, PROS, PV e Rede) obtiveram 13.018.963 votos no primeiro turno. Elegeram, somando 1º e 2º turnos, ao todo 658 prefeituras e 7.968 vereadores. A partir de 1 de janeiro de 2021, governarão cidades onde moram 10,74% dos brasileiros e brasileiras.

38.Os integrantes deste campo de “centro” demonstraram, nas eleições de 2020, que não hesitam em usar – contra o PT — os mesmos argumentos e as mesmas armas utilizadas pela direita. E, apesar disso, o “centro” também demonstrou ser capaz de atrair setores da esquerda (com destaque para o PCdoB, que foi cúmplice dos ataques movidos contra Marília Arraes, mesmo sabendo que ataques similares eram perpetrados contra Manuela Davila em Porto Alegre).

39.Tudo isto posto, é preciso ver o reverso da medalha: o “centro” segue com a mesma dificuldade estrutural já experimentada pela candidatura Marina Silva em 2014 e pela candidatura Ciro Gomes em 2018: a situação econômica e social produz uma polarização política; e esta polarização política esvazia o centro, que é forçado a deslocar-se para posições ou mais à direita ou mais à esquerda; acontece que tanto a direita quanto a esquerda já estão ocupadas, por representantes legítimos destas respectivas posições.

40.Por isso, para se tornar viável eleitoralmente, o centro depende, ou bem de capturar o petismo, ou bem de uma aliança com a direita tradicional. E qualquer uma destas alternativas implica em grandes dificuldades e em enormes riscos eleitorais. Como a principal destas dificuldades é a existência do PT, o centro desenvolve uma operação de pinça: por um lado, usa métodos bolsonaristas contra o PT; por outro lado, afirma que o PT é incapaz de derrotar o bolsonarismo.

DERROTA DA ESQUERDA

41.A eleição de 2020 confirmou as imensas dificuldades que a esquerda acumulou, bem como as que terá pela frente. No primeiro turno, os principais partidos de esquerda (PT, PSOL e PCdoB) apresentaram-se separados na maioria das eleições municipais. Esta divisão se explica por vários motivos, entre os quais as imposições da cláusula de barreira, bem como as divergências políticas mais ou menos profundas, divergências daquele tipo que não é superável por apelos emocionais, nem por cálculos de engenheiros de obra feita.

42.Uma destas divergências já foi citada antes: o PCdoB, ou pelo menos um setor majoritário deste partido, está sendo polarizado pelo “centro”, inclusive ali onde o centro guinou para métodos de direita, como ocorreu em Recife. E é preciso que se diga claramente: as opções feitas pelo PCdoB, neste caso, estão relacionadas a dependência material que este partido vem desenvolvendo para com as estruturas governamentais mantidas pelo PSB. O que terá implicações nas decisões que este partido venha a tomar, frente as eleições 2022 e frente as imposições da cláusula de barreira.

43.Quanto ao PSOL, a dinâmica interna deste partido torna muito difícil uma aliança de primeiro turno deste partido com o PT, nas próximas eleições presidenciais. Além da já citada cláusula de barreira, pesa nisto o fato de que setores do PSOL (e do próprio PT) interpretam equivocadamente os resultados eleitorais de 2020, em particular o ocorrido na cidade de São Paulo.

44.E quanto ao Partido dos Trabalhadores? Desde pelo menos 2015 o Partido vive uma disputa interna e pública acerca de seu papel na sociedade brasileira, de seu programa, de sua estratégia e de seus métodos de atuação. E, desde então, viemos sofrendo seguidas derrotas: o impeachment, a condenação-prisão-interdição de Lula, a aprovação da “reforma” trabalhista, a fraude que resultou na vitória de Bolsonaro, a destruição causada pelo governo do cavernícola, as eleições de 2016 e 2020. Dentro do Partido, entretanto, não há unidade nem no diagnóstico, nem nos remédios a serem adotados para enfrentar a situação.

45.Em nossa opinião, é necessário reconhecer que a esquerda foi derrotada nas eleições de 2020. Obtivemos muitas vitórias eleitorais e políticas, no âmbito local; e também obtivemos muitas vitórias políticas, apesar de derrotas eleitorais. Mas quando analisamos o resultado nacional, verificamos que os partidos de esquerda (PT, PSol, PC do B, PSTU, UP, PCO e PCB) obtiveram 10.451.618 votos no primeiro turno. Elegeram, somando 1º e 2º turnos, cerca de 234 prefeituras e 3.370 vereadores. A partir de 1 de janeiro de 2021, governarão cidades ondem moram 4,15% dos brasileiros e brasileiras.

46.Para além disso, as candidaturas da esquerda (não só as do PT, mas também de partidos que gostam de achar que estão à esquerda do PT) tiveram muita dificuldade em nacionalizar as campanhas. A triste verdade é que, aonde o povo votou contra Bolsonaro, isto não se deveu principalmente ao que foi dito pelas campanhas eleitorais da esquerda em 2020. Portanto, não podemos falar em vitória eleitoral, nem em vitória política no terreno nacional.

47.O que foi dito em relação a esquerda em geral, pode ser repetido em relação ao Partido dos Trabalhadores. Reiteramos que, em âmbito local, ocorreram vitórias eleitorais e políticas, assim como derrotas eleitorais e vitórias políticas (por exemplo, o que fez a militância e a grande Benedita da Silva, no Rio de Janeiro capital; e o resultado obtido em Recife, com a candidatura de Marilia Arraes). Mas em âmbito nacional, o resultado de conjunto não pode ser considerado uma vitória, nem eleitoral, nem política.

48.O mais grave, ao nosso ver, é que havia condições políticas para termos um resultado melhor, tanto político, quanto eleitoral. O desgaste do governo Bolsonaro é imenso. Portanto, nosso desempenho em Belo Horizonte, em Salvador, em Fortaleza, em São Paulo e em Recife – para citar só os casos mais relevantes — poderia ter sido outro. Por isso, o nosso Partido precisa pelo menos dizer claramente quais erros foram cometidos, inclusive para que não se repitam.

49.Apesar de termos lançado mais candidaturas e apesar de termos atuado em uma conjuntura mais favorável, reduzimos o número de prefeituras e de mandatos parlamentares conquistados em 2020, em comparação com 2016.

50.Fomos ao segundo turno em um número maior de cidades do que em 2016, mas das 18 cidades que disputamos, a esquerda só conquistou 5, sendo que o PT não conquistou nenhuma capital. E, no final das contas, continuamos governando mais ou menos o mesmo número de brasileiros.

51.Portanto, embora possamos falar de vitórias e/ou de derrotas parciais em comparação com 2016, isto não altera o fundamental: nosso desempenho eleitoral em 2020 contribuiu muito pouco para ampliarmos significativamente, seja nossa oposição ao governo Bolsonaro, seja para construirmos uma candidatura presidencial poderosa para as próximas eleições. Neste sentido – ou seja, no que diz respeito as batalhas futuras, e não no que diz respeito a comparação com batalhas passadas – sofremos uma derrota.

52.Sofremos uma derrota política essencialmente porque nossas campanhas (e portanto, o significado político de nossas votações, seja onde perdemos, seja onde fomos vitoriosos) não foram nacionalizadas, não foram de fato organizadas em torno do objetivo de acumular forças para derrotar Bolsonaro. Este objetivo estava escrito em nossas resoluções, mas não se materializou na imensa maioria das campanhas, que giraram em torno de questões locais. Também estava escrito nas nossas resoluções que não faríamos alianças com partidos de direita, ultraliberais, bolsonaristas; e que faríamos campanhas em defesa do legado dos governos petistas e em defesa de Lula. Mas isto foi a exceção, não a regra. Claro que não sabemos o que teria ocorrido se tivéssemos feito o que estava determinado pelas resoluções; mas sabemos o que ocorreu, na medida em que as descumprimos. E não há como chamar de vitória (política ou eleitoral) o que emergiu das urnas de 2020.

ERROS DE INTERPRETAÇÃO E OPERAÇÃO

53.Desde o golpe, cresce na esquerda como um todo e no PT em particular a certeza de que precisamos atualizar nosso diagnóstico acerca da sociedade brasileira, acerca da luta de classes, da composição da classe trabalhadora, dos métodos da direita e assim por diante. Assim como cresce a certeza de que precisamos mudar nossa linha política e nossos métodos de atuação. Apesar disso, no balanço dos resultados de 2020 já circulam avaliações que atribuem nossa derrota à sordidez dos nossos inimigos, como se tivéssemos o direito de esperar algo diferente disso.

54.Nesse sentido, a tendência petista Articulação de Esquerda reitera o que vem dizendo desde 2015: ou mudamos de estratégia e de conduta, ou deixamos de ser um partido essencialmente eleitoral, ou até mesmo nossas vitórias eleitorais vão minguar.

55.No que diz respeito ao processo eleitoral estritamente falando, é preciso identificar por quais motivos cometemos tantos erros de avaliação e outros tantos de operação.

56.Alguns destes erros foram cometidos pelo conjunto do Partido. Por exemplo, ninguém considerou a possibilidade de que fossemos reduzir o número de prefeituras governadas por nós, nem reduzir o número de vereadores. Pelo contrário, prevaleceu a ideia de que, lançando mais candidaturas e atuando numa situação política melhor do que a de 2016, cresceríamos. E isso não ocorreu.

57.Infelizmente, no momento do balanço, ao invés de reconhecer o erro e buscar as suas verdadeiras causas, há pessoas e setores do Partido que esquecem do que escreveram e disseram ontem, apelando para “argumentos” do tipo: de fato perdemos grande número de prefeituras e vereadores, mas em compensação cresceu o número de cidades médias em que vencemos ou fomos ao segundo turno. Acontece que isto não explica por quais motivos perdemos tantos mandatos e tampouco explica por quais motivos não percebemos que isto poderia ocorrer. Aliás, não percebemos antes e não percebemos nem mesmo durante a campanha; só percebemos depois do fato consumado.

58.Citamos entre os erros que são do conjunto do Partido a falta de política para enfrentar a compra de votos, as dificuldades na política de comunicação, a falta de percepção acerca da dimensão que tomaria a abstenção, os votos brancos e nulos, bem como a falta de política a respeito. Destacamos o fato do Partido simplesmente não existir, não estar organizado, em um grande número de cidades do país. E citamos a inacreditável crença nas pesquisas eleitorais, desmentidas inúmeras vezes tanto no primeiro, quanto no segundo turno.

59.Citamos também como um erro coletivo não ter percebido, nem se preparado, para o crescimento das candidaturas de direita na reta final. Em outras eleições, o PT demonstrou ser um “partido de chegada”, capaz de crescer muito na reta final. Nesta eleição, muitas vezes foi a direita que demonstrou esta capacidade, com crescimentos imensos de votação na reta final da disputa. É nesse sentido que deve ser compreendido o papel do antipetismo: como uma arma mobilizada pela direita na reta final das campanhas, muitas vezes pegando de surpresa nossas candidaturas, especialmente aquelas que haviam baixado a guarda, que não haviam feito o debate político, que não quiseram radicalizar o confronto de ideias e de projetos, que achavam que sem explicitar os símbolos do Partido não atrairiam rejeição. O antipetismo, como o anticomunismo no passado, é uma arma sempre disponível no arsenal da direita; não é nada de novo, nem de extraordinário, nem de invencível. Mas exige um trabalho permanente de organização e de disputa ideológica, por exemplo em torno de temas como a corrupção, as causas da crise nacional, os direitos humanos e civis, a religiosidade etc. Sem este trabalho permanente, continuaremos nos deparando com situações em que segmentos do eleitorado votam silenciosamente na direita, não por conta do que foi dito e feito na campanha eleitoral, mas por conta de uma adesão mais profunda, cristalizada ao longo de anos e décadas.

60.Falamos até agora dos erros cometidos pelo conjunto do Partido. Agora falaremos dos erros cometidos não por todo o Partido, mas “apenas” por alguns setores do Partido, setores estes que são majoritários nas direções partidárias em certas cidades e estados, erros que em alguns casos erros foram avalizados implícita ou explicitamente pela maioria do atual Diretório Nacional. Citamos entre estes erros alguns que nos parecem exemplares:

61.A tática adotada nas cidades onde o Partido existe, mas decidiu não lançar candidatura à prefeitura.

62.A tática adotada naquelas cidades onde o Partido, em flagrante desrespeito a expressa proibição, decidiu fazer aliança com partidos de direita.

63.A gestão do fundo eleitoral, a respeito do qual propomos que o Diretório faça uma análise detida, inclusive da relação entre recursos alocados e votação obtida.

64.A tática adotada em Belo Horizonte, resultado não apenas de escolhas eleitorais, mas da explicita promiscuidade entre setores do Partido e o prefeito reeleito.

64.A tática adotada em Salvador, tática patrocinada pelo governador Rui Costa, que contribuiu para a vitória em primeiro turno do candidato do DEM. Agremiação que, dos partidos da direita tradicional, é um dos que alcançou melhores resultados eleitorais.

65.A tática adotada em João Pessoa, que resultou num desastre eleitoral, político e organizativo de imensas proporções.

66.A tática adotada em São Paulo, onde o Diretório Nacional recusou convocar Fernando Haddad para ser candidato, erro primário que esteve na base de grande parte dos demais problemas verificados na eleição da maior cidade do país.

O CASO DE SÃO PAULO

  1. Dada a importância do resultado eleitoral de São Paulo, vale detalhar o ocorrido. No dia 31 de julho de 2020, nós da tendência petista Articulação de Esquerda propusemos à direção nacional do PT que convocasse o companheiro Fernando Haddad para ser nosso candidato a prefeito de São Paulo.

68.Nosso recurso afirmava que “as chances de irmos ao segundo turno e as chances de vencer serão muito maiores se nosso candidato for o companheiro Fernando Haddad”.

69.Dizíamos, também, que não podíamos “subestimar o impacto político nacional de uma derrota política (não apenas eleitoral) na cidade de São Paulo”.

70.Lembramos que não sabíamos “ter um bom desempenho em 2020 é essencial para o que vai acontecer depois, seja em 2022, seja antes; não está dado que Haddad venha a ser o nosso candidato em 2022, seja porque Lula pode recuperar seus direitos, seja por que outra candidatura petista pode vir a se colocar; Haddad perdeu as eleições municipais em 2016 e foi candidato a presidente em 2018; 5/se vitorioso em 2020, a decisão sobre o que fazer a seguir é um bom problema, não um mal problema”.

71.Concluímos afirmando esperar que o Diretório Nacional “faça um balanço cuidadoso da situação política e eleitoral. A situação do país é muito grave e precisamos adotar uma tática adequada, sob pena da eleição de 2020 não resultar naquilo que todos pretendemos”.

72.Naquela ocasião, em agosto de 2020, em torno de 20 integrantes do Diretório Nacional do PT apoiaram o recurso apresentado pela tendência petista Articulação de Esquerda. Mas, nas semanas seguintes e até o final do primeiro turno, a candidatura de Jilmar Tatto foi alvo de uma campanha permanente, que pressionava o PT a retirar a candidatura de Tatto em favor da candidatura Boulos.

73.Esta campanha utilizava vários argumentos, o principal dos quais era o de que a manutenção da candidatura do PT impediria a esquerda de estar no segundo turno das eleições municipais. Este argumento foi derrotado pelos fatos: a manutenção até o final da candidatura Tatto não impediu que a candidatura Boulos fosse ao segundo turno.

75.Seja como for, a campanha de Tatto foi “cristianizada” por uma parte do petismo, o que pode ser constatado comparando sua votação para prefeito e a votação obtida pela chapa proporcional lançada pelo PT. Felizmente, o candidato e uma parte da base do partido recusaram as pressões e mantiveram a candidatura até o fim. Valendo registrar que o ocorrido é um dos desdobramentos inevitáveis da lógica de um partido eleitoral, lógica que foi alimentada pelo próprio Jilmar Tatto.

76.O segundo turno deixou evidente os limites da candidatura de Boulos: uma candidatura ancorada nos setores médios, com muita dificuldade de penetrar nos setores populares. Ao término da campanha, o mapa dos votos da candidatura Boulos 2020 coincidiu com o voto da candidatura Haddad de 2018. E mesmo isso ocorreu, em grande medida, graças ao esforço da militância petista e do próprio candidato Jilmar Tatto, especialmente quando Boulos se retirou da campanha de rua em função de um Covid assintomático.

77.A campanha do segundo turno ainda não havia terminado e uma parte do PSOL e inclusive setores do PT passaram a apontar Boulos como o “grande vencedor” das eleições. Parte da mídia oligopolista patrocinou a mesma interpretação, com o óbvio objetivo de estimular a competição entre PT e PSOL, inclusive nas próximas eleições presidenciais.

78.Uma ironia desta história é que, depois de anos acusando o PT de rendição à institucionalidade, aos processos eleitorais e ao personalismo, estes mesmos setores da esquerda trilham o mesmo caminho, num contexto muito pior e com menos chances de êxito.

79.Uma demonstração exemplar disso está no seguinte texto, divulgado por um prócer do PSOL: “NA PERSPECTIVA de uma luta anticapitalista no Brasil, não é uma ruptura insurrecional que vai levar a esquerda ao Poder. É a disputa presidencial. É o único momento político em que, do gaúcho do Pampa ao extrativista da Amazônia, todos se concentram na discussão sobre modelo de sociedade. ELEGER UM PRESIDENTE que não traia compromissos programáticos nem se entregue à conciliação de classes é o caminho mais factível para a abertura de possibilidades de avanços realmente transformadores da estrutura social perversa em que sobrevive nosso povo”.

80.Como tudo seria mais fácil, se os descaminhos da esquerda pudessem ser explicados com base na (suposta) “traição” dos líderes. Como seria fácil se a esquerda pudesse chegar ao “poder”, através de uma eleição presidencial. Como seria fácil, se pudéssemos resolver nossos problemas organizativos, criando movimentos “coletivos” em torno deste ou daquele indivíduo.

81.Este caminho já foi tentado e não teve êxito. Sendo que foi tentado por um partido com muito mais base de massas do que o PSOL tem. E exatamente quando este caminho demonstra todos os seus limites, o PSOL começa a trilhar o mesmo curso.

82.Para concluir a análise sucinta dos acontecimentos de São Paulo capital, é importante registrar a necessidade de um balanço muito duro do ocorrido no estado como um todo. A vitória em Diadema e Mauá, no segundo turno, ou vitórias como a de Araraquara, no primeiro turno, são a exceção. A regra foi outra. A derrota em São Bernardo e Santo André, por exemplo, merecem uma análise detida, pelo simbolismo e pelos ensinamentos, inclusive no que diz respeito a condução dada pelo diretório estadual do PT, onde prevaleceu uma tática e uma distribuição de recursos do fundo partidário que contribuiu para a derrota.

O CASO DE BELO HORIZONTE

83.Também vale a pena analisar detalhadamente o ocorrido em Belo Horizonte (MG).

84.Nos anos 90 e parte dos anos 2000  Belo Horizonte se destacou por sua prefeitura progressista e por grandes feitos de Patrus Ananias, Célio de Castro e Fernando Pimentel. O orçamento participativo, a boa gestão na educação e a assistência social  eram símbolos de uma cidade que caminhava com igualdade e democracia participativa. Todavia, em 2008, a prefeitura progressista foi entregue à direita neoliberal: a tática defendida por Fernando Pimentel levou a uma aliança com Aécio Neves para eleger Márcio Lacerda. Depois disso, o PT municipal foi gradativamente perdendo o protagonismo, oscilando entre fracos enfrentamentos e participações nas prefeituras neoliberais.

85.O último enfrentamento claro foi em 2012, com o rompimento do PT com a prefeitura Lacerda e com a candidatura de Patrus, que não chegou ao segundo turno. Em 2016, na fraca campanha de Reginaldo Lopes, houve uma sucessão de erros e um enfraquecimento grave da legenda. A campanha de Reginaldo Lopes escondeu os símbolos petistas e não enfrentou a direita. Entretanto, foram eleitos Arnaldo Godoy e Pedro Patrus, mostrando que o PT resistia aos ataques do ano do golpe; além disso, a esquerda fez a vereadora mais votada, Áurea Carolina (PSOL).

86.O ex-presidente do Atlético-MG, Alexandre Kalil, venceu as eleições de 2016 com o discurso de antipolítica. A prefeitura Kalil foi e é um clássico exemplo da política tradicional e clientelista brasileira, ou seja, o Kalil buscou ocupar todos os espaços da esquerda e da direita, neutralizar a oposição e construiu sua imagem personalista. Mesmo eleito pelo PHS, um partido inexpressivo, Alexandre Kalil fez acordo com a maioria dos partidos representados na Câmara e distribuiu cargos, o que colocou golpistas junto a petistas numa mesma gestão. Kalil deu apoio à  bancada evangélica na Câmara e, em seguida, discursou na Parada do orgulho LGBTQI+. Essa estratégia colocou o Kallil dentro de todos os espectros da política belo-horizontina, neutralizando qualquer oposição. Além disso, manteve o discurso pela ciência, o que lhe deu mais visibilidade ao polarizar com o governo negacionista de Bolsonaro no enfrentamento da covid. O personalismo e o discurso antipolítica foram traços marcantes de seu mandato e que são percebidos em suas costumeiras declarações de que não é um político tradicional e que faz sem prometer. Na prática, houve ineficiência de sua gestão em administrar os problemas decorrentes das enchentes, bem como a realização de obras em pleno período eleitoral, com o claro propósito de angariar votos. Vale destacar que o maior feito na gestão Kalil será a construção do estádio do Atlético-MG, que é um empreendimento privado.

87.O PT/BH silenciou frente aos problemas da cidade, não fez oposição à prefeitura Kalil e, pior, compôs alguns cargos na prefeitura. A estratégia do Kalil de neutralizar uma possível oposição foi aceita pelo PT, sendo que a passividade em relação ao Kalil continuou até perto da eleição de 2020, quando petistas não viam o Kalil como adversário, e sim, um possível aliado. Havia uma resistência à crítica aberta ao Kalil, numa clara estratégia de transformar o PT em um partido auxiliar.

88.As eleições de 2020 começaram no contexto de participação do PT na prefeitura Kalil e com setores do Partido defendendo uma frente de Esquerda, já que  Áurea Carolina do PSOL era o nome com capacidade eleitoral. Com o tempo, a frente de esquerda se tornou inviável e o PT optou pelo lançamento de Nilmário Miranda, que teve um resultado pífio, perdendo para as marionetes de Bolsonaro.

89.Apesar do resultado ruim na campanha para prefeito, o PT conseguiu manter as duas cadeiras que tinha. Mas, com um cenário diferente, onde caiu a quantidade de votos na legenda e houve uma renovação petista. Arnaldo Godoy e Pedro Patrus não se elegeram, e Sônia Lansky e Macaé Evaristo vão ocupar as respectivas vagas. Isso mostra que a base petista quer uma mudança de atitude do PT e decidiu por eleger duas mulheres de luta para se opor ao Kalil.

O QUE NOS ESPERA É UMA MARATONA

90.Concluímos dizendo que as eleições confirmaram que não estamos diante de uma corrida de 100 metros, mas sim de uma maratona. E esta maratona não terá como trajeto principal as disputas eleitorais, mas sim a disputa política, social e cultural travada fora dos períodos eleitorais. Ou o PT muda de estratégia e de conduta, o que inclui atuar com intensidade também nos anos ímpares, ou continuaremos colhendo mais derrotas que vitórias nos anos pares.

A HORA DA BRONCA

91.A mudança da linha e do comportamento do Partido é necessária, não apenas por razões de médio e longo prazo, mas também por razões de curto prazo. Passada a eleição, fica evidente que o Governo Bolsonaro está enfrentando um novo momento de crise. Frise-se que no passado recente, as ilusões na constituição de uma Frente Ampla, a demora em adotar a consigna Fora Bolsonaro e a concentração de esforços na oposição parlamentar contribuíram para a relativa estabilidade e fortalecimento do presidente e de seu governo. Agora, apesar de nova onda da pandemia, a massa da classe trabalhadora está tendo que dar continuidade à dura luta pela sobrevivência, em condições cada vez piores. O anúncio presidencial de desprezo pela vacina contra o COVID-19, a manutenção da agenda neoliberal e as posições de Guedes sobre a ajuda emergencial indicam que manter e aumentar a mobilização e a luta social trata-se, literalmente, de questão de vida ou morte.

92.Não podemos repetir, frente a segunda onda do Covid, o erro cometido na primeira onda. Medidas sanitárias sim; mas manter o vínculo com a classe trabalhadora é a maior e mais importante das medidas sanitárias. Por isso, é preciso aproveitar a experiência da mobilização eleitoral em tempos de pandemia, para estimular nossa mobilização militante.  Sem mobilização social, perderemos aquilo que pode ocorrer nos próximos meses: outra “janela” para a derrubada do governo Bolsonaro.

93.A tendência econômica e social de curto prazo — e, se não houver mudança, de médio prazo também — é de deterioração progressiva. Os indicadores apontam para o crescimento da fome, da pandemia, do desemprego, especialmente na juventude. Portanto, deve crescer a “bronca” no país. Mas de que forma tal “bronca” vai se traduzir politicamente? É um equívoco achar que a simples piora nas condições de vida vá levar a um processo espontâneo de politização pela esquerda; na presença de uma esquerda tímida e de uma direita organizada, entrelaçada com o fundamentalismo religioso e com a criminalidade organizada, a degradação social pode produzir uma politização contra a esquerda, uma prolongada apatia ou um deslocamento em direção a setores de direita e centro.

94.Vejamos o que ocorreu no período 2019-2020. No plano eleitoral, a “bronca” não compareceu na medida devida: 2020 não foi 1988, nem foi 2000. A crise nacional contribuiu para desgastar Bolsonaro, mas não foi suficiente para tirar o timão da mão dos outros setores da direita. No plano das lutas sociais organizadas, até agora pelo menos, a “bronca” também não apareceu. As greves ocorridas nos últimos meses não tiveram a capacidade de comover o país, gerar solidariedade ampla para além das camadas militantes. No plano das lutas sociais espontâneas, tampouco apareceu uma “bronca” a altura da situação. Não aconteceu uma onda de saques e quebra-quebras, como ocorreu em algumas cidades no final dos 1970 e início dos 1980. A precarização brutal não está sendo acompanhada de uma radicalização nas lutas. Mesmo o assassinato cometido pelos seguranças do Carrefour não teve, até agora, a resposta justa e necessária.

95.Por outro lado, tem havido um aumento dos homicídios, do feminicídios, do racismo, da lgbtfobia, da intolerância, da violência policial, da criminalidade, da frequência nas igrejas fundamentalistas e o aumento da grosseria e da incivilidade no cotidiano. E tem crescido a compra de armas por “cidadãos de bem”. Sinais de que, se a “bronca” do povo ainda não se manifestou, a “antibronca” do lado de lá está em curso.

96.Um de nossos grandes desafios é fomentar e politizar a “bronca” popular. Ou é isso, ou seguiremos dependentes da dinâmica eleitoral-institucional, cujos limites –ao menos neste momento– estão mais do que evidentes. É desta perspectiva que propomos enfrentar o debate sobre a eleição do presidente da Câmara e do Senado. Não podemos comprometer o PT com candidaturas da direita, opção que influenciaria negativamente nossa capacidade de oposição às políticas que o governo impulsiona e a maioria do Congresso endossa.

97.Para fomentar e politizar a “bronca”, é preciso reconhecer:

-que a pandemia e seus reflexos até agora criaram mais problemas do que estímulos para a luta aberta;

-que segue imenso o descrédito na participação política, na contramão do que vivemos entre 1988 e 2010;

-que reduziu muito a influência organizada da esquerda social (sindicatos, movimentos);

-que houve uma terrível institucionalização dos partidos de esquerda, inclusive daqueles que se pretendem alternativos ao PT;

-que persiste um rebaixamento no horizonte programático da vanguarda da classe, diferente do que ocorreu na crise dos anos 1970 e 1980.

98.Tendo em vista estes problemas, o que está ao nosso alcance fazer? O que, dentro de nossas forças, podemos realizar para ajudar a mudar a situação? Defendemos, entre outras medidas:

-elevar o horizonte programático (caracterizar a crise do capitalismo, colocar o socialismo sobre a mesa, defender programa de transformações efetivas, fazer o balanço crítico do passado e do presente);

-ampliar a presença junto ao conjunto da classe trabalhadora (presença nos locais de trabalho, nos locais de moradia, nos locais de estudo, nas atividades recreativas e culturais);

-defender a luta cultural, política e social de massas como variável central para alterar a correlação de forças;

-preservar a independência de classe, contra os que querem –a pretexto de combater o bolsonarismo e o neofascismo– transformar a classe trabalhadora em linha auxiliar de um dos setores da classe dominante.

99.A mudança no estado de ânimo do povo virá, mais cedo ou mais tarde. Nossa linha geral, portanto, é adotar uma postura de “espera ativa”: não dar passos maiores do que as nossas pernas, mas ao mesmo tempo estimular para que a reação popular venha o mais cedo possível, para que seja o mais politizada possível e para que conte a seu favor com as organizações políticas e sociais que estejam à altura dos desafios do período histórico.

100.Nossa mobilização deve se intensificar em 2021. É preciso aproveitar o fato de 2021 ser um ano sem eleições, para ampliarmos ao máximo a organicidade, ou seja, organizar e colocar em movimento dezenas, centenas, milhares, milhões de pessoas. Defendemos que as grandes organizações do povo (as frentes, os partidos, os sindicatos, os movimentos) atuem nessa perspectiva.

101.Ampliar a organização e mobilização, em 2021, inclui e supõe mudar os rumos do PT. Nosso Partido segue sob intenso ataque (da extrema direita e da direita, da mídia e da justiça), bem como sob fortíssima concorrência (de partidos de “centro” e também de esquerda). E, dentro do Partido, os problemas são imensos. No âmbito das direções, os problemas principais são:

-um importante setor do Partido segue alérgico a fazer um balanço, um debate estratégico e uma mudança de linha;

-um importante setor do Partido contribui para perpetuar métodos de funcionamento inadequados, contribuindo pela ação ou pela omissão para que continuemos sendo um partido centrado no eleitoral, dirigido a partir de mandatos parlamentares e executivos, com reduzida organização de base e débil organização intermediária, com dificuldade para implementar campanhas permanentes, salvo disputar eleições de 2 em 2 anos;

-um importante setor do partido atua como se fosse um “partido dentro do partido”, o que afeta o bom funcionamento das instâncias partidárias;

-até o momento, os setores insatisfeitos com esta situação não conseguiram construir uma alternativa que permita ao PT sair da situação em que nos encontramos hoje. Aliás, entre os setores que criticam o status quo partidário, é cada vez mais comum encontrarmos a reprodução das mesmas práticas que são criticadas.

102.Para que 2021 seja um ano do reposicionamento estratégico do PT, devemos:

-apontar com absoluta clareza os problemas programáticos, estratégicos e organizativos que precisam ser resolvidos, sob pena do PT ser destruído por fora e/ou por dentro;

-defender a convocação do 8º congresso partidário, com o objetivo de retomar a embocadura de formulação que marcou o 5º encontro nacional de 1987 e o 6º congresso nacional do PT de 2017.

-implementar em 2021 uma linha de intensa mobilização política, cultural e social contra o bolsonarismo e o ultraliberalismo, que se materialize numa retomada do trabalho cotidiano de base, capilarizando nossa presença em todo o território nacional e em todos os setores sociais.

103.Entre os problemas a serem enfrentados no 8º Congresso Nacional, problemas sobre os quais devemos nos debruçar imediatamente, destacamos os seguintes:

1/análise e propostas referentes a situação mundial, da crise do capitalismo, da disputa de hegemonia entre EUA e China, do curso da América Latina;

2/análise e propostas referentes a crise do capitalismo brasileiro e a luta de classes em curso no Brasil;

3/análise e propostas referentes a como lidar com as diferentes frações existentes na classe dominante, inclusive como disputar com o “bolsonarismo raiz”, com a “direita tradicional” e com os setores denominados de “centro”;

4/análise e propostas referentes a como lidar com os chamados setores médios e com os diferentes setores da classe trabalhadora e suas demandas;

5/análise e propostas referentes a como lidar com as diferentes organizações da esquerda politica e social, incluindo aí as frentes, os partidos, as centrais e os movimentos;

6/análise e propostas referentes a como lidar com o fundamentalismo religioso, com a criminalidade organizada e com todas as pautas e formas organizativas que tem servido para capilarizar a direita nas camadas populares;

7/análise e propostas referentes a próxima disputa presidencial.

104.As tarefas acima relacionadas deveriam ser tarefas de todo o Partido. Mas é preciso dizer as coisas como elas são: nosso Partido vive uma crise profunda. E uma parte dessa crise tem relação com os dilemas do grupo que é majoritário no Diretório Nacional do PT. Como este grupo adota práticas de “partido dentro do partido”, seus problemas se tornam problemas de todo o Partido.

105.Não é segredo para ninguém que há divergências profundas no interior da tendência denominada “Construindo um novo Brasil”. Divergências que compareceram, em grande estilo, nas eleições municipais de 2020: vide a disputa sobre candidaturas em São Paulo capital, vide a disputa sobre as alianças em Belford Roxo, vide a disputa sobre a campanha em Recife, vide os balanços díspares que vem sendo anunciados pela imprensa, vide as divergências sobre uma futura candidatura presidencial.

106.Os companheiros e companheiras da tendência CNB decidirão, em seus espaços, qual sua posição. Mas não podem bloquear o debate dentro do Partido. Nenhuma tendência do Partido pode se colocar acima do Partido como um todo. O PT precisa de uma nova estratégia e de novos métodos de construção partidária, inclusive novos métodos de eleição das direções e dos delegados – não um processo de eleição viciado pelos mesmos métodos que condenamos nas eleições ditas burguesas, inclusive a “compra de votos” e o “uso da máquina”. A atual direção nos conduziu a uma derrota eleitoral e política e, mais do que isso, vem demonstrando não ter condições de nos conduzir na virada estratégica e organizativa que necessitamos, nem mesmo demonstra ser capaz de construir uma política e um sistema de comunicação, atuando em diversos meios como imprensa, TV e internet.

107.No atual período histórico, a luta por um Brasil democrático, popular e socialista não terá êxito, se o PT não mudar seus rumos e suas práticas. É a isto que nos dedicamos.

108.Concluímos este documento reafirmando que a transformação do Brasil exigirá mais luta de classe, mais radicalização, mais polarização, mais enfrentamento de projetos, mais batalha cultural, mais defesa clara e explícita de nosso projeto democrático, popular e socialista. Contra isso, ergue-se dentro e fora do Partido um discurso segundo o qual a população não quereria radicalismo, a população desejaria moderação, saídas pelo centro. E que, portanto, o PT deve recuar, sair de cena, abrir espaço para que outros protagonizem o processo político etc. Pedem que o PT faça, ele próprio, aquilo que a extrema direita e a direita não conseguiram fazer, ao longo de 40 anos: nos derrotar. Não aceitamos estes conselhos. Tudo o que de positivo ocorreu no Brasil, nas últimas 4 décadas, teve a participação da militância petista. Foi um avanço imenso, para o Brasil, que a disputa política tenha sido polarizada, entre 1989 e 2018, pela direita e pela esquerda. E na cabeça da esquerda esteve sempre o PT. Esta posição não foi uma herança, foi conquistada com muito suor, lágrimas, sangue e luta. Mas vitórias passadas não movem moinho; antiguidade não é posto; o PT sozinho não teria conseguido fazer nada do que fez; e é totalmente legítimo que outros setores da esquerda disputem, conosco e muitas vezes contra nós, a hegemonia junto a classe trabalhadora. Até por isso, somos defensores de primeira hora de uma frente de esquerda, assim como defendemos que o PT contribua ativamente para que o PSOL e o PCdoB enfrentam os problemas derivados da cláusula de barreira. Mas frente de esquerda é frente de esquerda: não inclui o PDT, o PSB e outros partidos de centro, com os quais devemos manter relações e alianças pontuais, mas sempre de guarda alta, pois prevalece nestes partidos a disposição de derrotar o petismo.

109.Temos pela frente uma maratona. Nada está garantido. Os riscos são enormes. Mas o que está em jogo vale todo sacrifício: a sobrevivência digna, os direitos da maioria do povo, as liberdades democráticas, o desenvolvimento e a soberania nacional, a integração latino-americana e caribenha, a construção de um Brasil e de um mundo socialistas.

Viva o Partido dos Trabalhadores!

Viva a classe trabalhadora brasileira!

 

ANEXO: BALANÇO PRELIMINAR DO PRIMEIRO TURNO

1.O primeiro turno das eleições municipais aconteceu no dia 15 de novembro. No dia 16 de novembro, reuniu-se o Diretório Nacional (DN) do Partido dos Trabalhadores. No dia 17 de novembro, reuniu-se a Comissão Executiva Nacional (CEN) do PT. Mas nem o DN, nem a CEN, aprovaram documentos de balanço do primeiro turno. A direção nacional da tendência petista Articulação de Esquerda (Dnae) também reuniu-se, no dia 17 de novembro de 2020. E achou que era necessário elaborar e divulgar um balanço dos resultados do primeiro turno das eleições municipais de 2020.

2.Por qual motivo a Dnae considerou necessário publicar um balanço? Primeiro, porque já está sendo debatido o balanço das eleições. Aliás, antes mesmo da eleição terminar, já havia balanços sendo elaborados. Existe, por exemplo, quem tente naturalizar a ideia de que o PT foi ferido de morte. E que o grande vitorioso desta eleição teria sido um tal de “centro” (sim, nesse santo ano de 2020 existe quem ache que o DEM é centro, que o PP é centro, que o PSD é centro, que o MDB e o PSDB seriam de “centro”). Portanto, ou o PT participa organizadamente deste balanço, ou ele será “balançado” pelos outros. Inclusive por aliados de esquerda e, também, por supostos aliados de centro.

3.Não é fácil fazer um balanço do processo eleitoral brasileiro de 2020. Foram eleições para escolher quem dirigirá as prefeituras e quem comporá as câmaras municipais. E o Brasil possui 5.568 municípios. E cada um destes municípios tem características próprias, que um balanço precisa levar em conta. Por exemplo: a composição social, a história política regional, tamanhos de população e eleitorado muito diferentes etc.

4.O PT participou do processo eleitoral em 2.902 cidades com chapas proporcionais. Portanto, de cara fica a questão: o que ocorreu nas outras 2.666 cidades? Porque em tantas cidades o PT não conseguiu lançar nem mesmo um candidato a vereador??? Aliás, em cerca de 40% do eleitorado não teve a possibilidade de votar em uma candidatura à prefeitura do PT. O PT local ou não existe, ou se anulou. Isso, evidentemente, não é um problema eleitoral. O problema é organizativo. O PT não está organizado nessas cidades. Mas cabe perguntar: como votaram aquelas pessoas que, nas eleições presidenciais de 2018, votaram nas candidaturas do PT?

5.Nas 2902 cidades em que lançamos chapas proporcionais, se somarmos todo mundo que foi lançado, foram 28.900 candidaturas à vereança.

32.O PT também lançou 1.256 candidaturas às prefeituras. E aí de novo fica a pergunta: por qual motivo não conseguimos ter candidatura a prefeito em 4.312 municípios do país?

6.Claro, há casos como Belém e Porto Alegre, onde decidimos apoiar ótimas candidaturas a prefeito, o Edmilson do PSOL e a Manuela do PCdoB. Aliás, assim como Boulos em SP, estamos na batalha para eleger o Edmilson e a Manu. Ao todo, lançamos candidaturas a vice prefeitura em 1.292 cidades. Logo, se somarmos 1292 vices de outros partidos com 1.256 candidaturas a prefeito, a conclusão é que dá 2548. E se subtrairmos este número do total de 5568 municipios que existem no país, sobram 3.020 cidades onde o PT não lançou uma candidatura a prefeitura. Novamente: não se trata apenas de um problema eleitoral. Temos um problema organizativo. Uma cidade onde o PT não existe. Há trabalhadores, tem luta de classes, mas não existe nosso partido para participar desta luta.

7.Uma curiosidade: segundo estes dados, que foram fornecidos pela secretaria nacional de organização do PT, teríamos 2666 cidades sem candidaturas a vereador e 3.020 cidades sem candidatura a prefeito.

8.Questões como essas precisam ser levadas em conta, para um balanço completo do processo eleitoral. E por isso seguimos incentivando nossa militância a fazer balanços locais, detalhados, que possam ir contribuindo para termos um quadro mais completo do processo.

9.Isso é particularmente importante no caso dos 95 municípios que possuem mais de 200 mil eleitores. Desses, em 38 não houve segundo turno. Dada a importância política destas cidades, é muito importante entender por quais motivos a fatura foi liquidada no primeiro turno em 38 municípios. Este é o caso de Salvador e de Belo Horizonte, onde em nossa opinião fomos vítimas de uma tática eleitoral incorreta.

10.Seja como for, em mais da metade dos municípios brasileiros tivemos militantes e simpatizantes na defesa do voto petista, com passeatas, carreatas, visitas nas casas da população, banquinhas nas feiras e centros das cidades, comícios, organização de comitês nos bairros, entre outras ações nas ruas de grande parte de um país que se encontra sob comando de uma coalizão golpista, genocida e executora de um programa ultraneoliberal.

11.Apesar de todo este esforço, um grande número de brasileiros e brasileiras não compareceu para votar, votou branco ou votou nulo. De um total de 147.403.074 eleitores aptos, 34.121.874 não compareceram para votar. Dos que compareceram para votar, 10.983.466 votaram branco ou nulo. Ou seja, 45.105.340 eleitores não votaram em nenhuma das candidaturas. O mais alto percentual de abstenção, brancos e nulos da história eleitoral recente do Brasil: 30,6% (contra 27,8% em 2016). Em alguns casos, como SP e RJ, o percentual chegou a 37,22% e 29,16%, respectivamente.

12.No segundo turno, os números de abstenção votos brancos e voto nulos são os seguintes: XXX.XXX.XXX.

13.Qualquer análise do resultado nessas duas cidades e no país como um todo precisa levar isso em consideração. Mas parte das análises simplesmente desconsidera este eleitorado. É como se ele não existisse, como se fossem invisíveis. Sendo importante lembrar que, com o recadastramento e a biometria, o número de abstenções, brancos e nulos de 2020 é mais próximo da realidade do que o de 2018. Na prática, isto quer dizer que parte expressiva da população escolheu não participar politicamente, instituindo uma espécie de voto facultativo de fato (ainda que não de direito). Um partido de esquerda não pode desconhecer ou subestimar estes fatos, que afetam sobremaneira trabalhadores e trabalhadoras pobres.

14.Claro que parte desta abstenção pode decorrer do fato do artigo 14, parágrafo 1º da Constituição não considerar o voto obrigatório para maiores de 16 e menores de 18 anos, analfabetos e os maiores de 70 anos. Em 2016, por exemplo, 11.352.863 tinham 70 anos ou mais, 2.311.120 tinham 16 ou 17 anos, e 6.981.111 declararam ser analfabetos. Portanto, 20.645.094 pessoas. Mas o número de abstenções excede muito o número dos que podem exercer facultativamente o voto.

15.Na abstenção de 2020, é preciso considerar a pandemia e o estímulo que o TSE deu ao não comparecimento, ao facilitar a justificativa de voto. Entretanto precisamos levar em conta também outros fatores, entre os quais a decepção com a participação política eleitoral, especialmente entre eleitores que em 2018 votaram em Bolsonaro, e que em eleições anteriores apoiaram as candidaturas de Lula e Dilma.

16.Para quem olha o eleitorado como uma massa homogênea, ou apenas dividida por opções políticas, isso não faz muita diferença. Mas para nós, que consideramos obrigatório levar em conta a classe social dos eleitores, que buscamos descobrir como votaram os diferentes segmentos sociais, é chave compreender as motivações dessas massas populares que se abstiveram, votaram branco e nulo. Até porque uma implicação prática desta abstenção tão alta (37% em SP capital) é que o voto dos setores médios cresceu de importância relativa, elitizando o eleitorado, com implicações inclusive na distribuição de votos entre os partidos de esquerda. Este fenômeno se fez presente, por exemplo, na capital de São Paulo.

17.Na esteira do debate sobre as abstenções, nulos e brancos, cabe também uma análise do fenômeno da compra de votos. No segundo turno, a compra de votos foi extremamente presente, por exemplo na cidade de Recife, por parte do PSB.

18.No primeiro turno, os partidos de esquerda com legenda eleitoral (PT, PSOL, PCdoB, PSTU, UP, PCO, PCB) tiveram pouco mais de 10.433.119 votos. Ou seja, de um total de 102.297.734 votos válidos, cerca de 10% votou em candidaturas lançadas pelo núcleo duro da esquerda.

19.Os números acima citados são para prefeito. Pode ser feita uma análise também do voto para vereadores, os números seriam um pouco diferentes, mas o sentido global não mudaria. Mas, claro, partimos do princípio de que o voto majoritário tende a ser mais programático do que o voto proporcional. Daí a escolha.

20.Os partidos que, não fazendo parte do núcleo duro da esquerda, assinaram coletivamente pedidos de impeachment contra o presidente Bolsonaro (PSB, PDT, PROS, Rede, Partido Verde), lançaram candidaturas que obtiveram 13.020.163 votos. Portanto, somando esquerda com centro, alcançamos cerca de 23,4 milhões de votos. Ou seja, algo como 23% dos votos válidos. Em números aproximados, portanto, 77 milhões de pessoas (ou 77% dos votos válidos) optaram por candidaturas patrocinadas por partidos que estão à direita do centro.

21.Se não quisermos enganar a nós mesmos, a análise política do resultado eleitoral deve levar isso em conta. Pois, como dissemos no início, tem gente vendendo a falsa ideia de que os extremos, Bolsonaro e o PT, foram derrotados, e que o centro foi vitorioso. Mas na verdade, quem foi eleitoralmente majoritário no primeiro turno do processo eleitoral não foi o centro. O centro teve 13 milhões de votos. Quem foi majoritário foi a direita, com 77% dos votos. E dentro da direita, as candidaturas da direita não bolsonarista se saíram melhor do que as candidaturas da direita que explicitaram seu bolsonarismo.

22.A esse respeito, chega a ser engraçada a atitude de setores da esquerda que dizem que no segundo turno precisamos derrotar o bolsonarismo – o que como linha geral não é errado – mas não se dão conta de que, em muitos casos, isso é uma escolha de Sofia, uma vez que dos dois lados há bolsonaristas ou similares; bem como dos dois lados há, muitas vezes, ultraliberais.

23.Felizmente, em diversos casos, o Partido não comprometeu-se a chamar voto e não passou o pano em candidaturas ultraliberais e autoritárias, só porque não são explicitamente bolsonaristas.

24.Há candidaturas vinculadas e defensoras do bolsonarismo em vários partidos políticos. Até porque o bolsonarismo é força política recente e seu líder anunciou não tratar as eleições municipais com prioridade, o que de fato quer dizer que ele não conseguiu ter uma tática nacional clara. Por outro lado, muitos prefeitos e vereadores eleitos não fizeram campanha vinculando-se de forma explícita ao bolsonarismo, mas o apoiam e estão sintonizados ideologicamente com a extrema-direita. Isto torna difícil fazer um balanço preciso. Mas, nas médias e grandes cidades, as pesquisas de opinião primeiro e os resultados eleitorais depois, indicam que as candidaturas explicitamente vinculadas ao bolsonarismo não tiveram bom resultado.

25.Infelizmente, como já foi ressaltado, na maioria das cidades, as candidaturas de esquerda não utilizaram as campanhas eleitorais para nacionalizar a disputa. O que, para além de ser um erro político, foi também um equívoco eleitoral, uma vez que em muitas cidades o governo Bolsonaro atinge enormes rejeições. Isto significa que o desgaste do bolsonarismo não foi – ao menos principalmente – resultado de uma crítica política proveniente da esquerda.

26.O segundo turno seria uma oportunidade decisiva para que se trave esta disputa aberta contra o bolsonarismo. Infelizmente, nem todas as candidaturas petistas e de esquerda que estão no segundo turno travaram uma disputa aberta contra o bolsonarismo.

27.Seja como for, os números do primeiro turno são claros: os partidos de direita tradicionais (MDB, DEM, PSDB, o PSD, o PP e similares) elegeram o maior número de prefeitos e prefeitas, de vereadores e de vereadoras, e obtiveram o maior número de votos. Sendo que o MDB e o PSDB perderam grande número de votos, enquanto o DEM, o PP e o PSD cresceram.

28.Este resultado eleitoral faz parte do movimento que a direita não bolsonarista está fazendo para chegar na próxima eleição presidencial com uma candidatura competitiva. Claro, que a relação entre 2020 e a próxima eleição presidencial não é direta, nem automática. Claro, também, que o resultado do segundo turno pode acentuar ou atenuar estas tendências, tanto do ponto de vista eleitoral quanto político. Mas, a preços de hoje, foram estes partidos de direita que se destacaram no primeiro turno das eleições municipais de 2020.

29.Notem que foi dito: nas próximas eleições presidenciais. Não se descarte que elas ocorram antes de 2022. E não se descarte que Bolsonaro seja afastado antes disso. Como não se descarte que ele vença em 2022. Inclusive com o apoio desta mesma direita não bolsonarista que hoje muita gente apoia, com o pretexto de derrotar o bolsonarismo raiz. Muita água vai passar por debaixo desta ponte.

30.As candidaturas lançadas pelos partidos de esquerda (PT, PSOL e PCdoB) obtiveram cerca de 10.433.119 votos. Deste total, o PT obteve 6.971.136 votos, ou seja, 66% dos votos da esquerda foram dados ao PT; o PSOL teve 2.236.273 votos, ou seja, 21%; e o PCdoB teve 1.184.609, ou seja, 11%. Os demais partidos de esquerda, somados, conquistaram cerca de 3% dos votos. Quanto ao número de prefeituras, o PT elegeu no primeiro turno 175 prefeitas/os, o PSOL elegeu 4 e o PCdoB elegeu 45. Das 57 disputas de segundo turno, o PT encabeça 15, o PCdoB 1 (Porto Alegre) e o PSOL 2 (Belém e São Paulo). Quanto ao número de vereadores, o PT elegeu 2609, o PSOL 88 e o PCdoB 678.

31.Portanto, se levarmos em conta apenas o primeiro turno, o PT segue muito mais forte do que os demais partidos da esquerda. Evidente que o resultado do segundo turno ganha grande significado na correlação de forças entre os partidos de esquerda, no que toca a presença em governos municipais. Se Boulos tivesse sido eleito prefeito de São Paulo, por exemplo, o PSOL estaria no comando da maior cidade do país. E embora ele tivesse uma presença institucional muito pequena no restante do Brasil, isto daria a Boulos e ao PSOL uma relevância política muito maior. Mas, ao mesmo tempo, reduziria seu leque de alternativas presidenciais. Neste sentido, a derrota em São Paulo estimula o lançamento da candidatura Boulos a presidente em 2022.

32.Um tema que deve ser tratado, diz respeito a composição das bancadas de vereadores. Como já foi dito, os três principais partidos de esquerda elegeram, somados, 3.375 vereadores e vereadoras. Um gota dágua num oceano de direita. Mas uma avaliação qualitativa desta gota dágua depende de confirmar o perfil das candidaturas eleitas, quantas mulheres, quantos negros e negras, quantos indígenas, quantos lgbti+, quantos são trabalhadores que estavam no processo de produção e de que categorias, quantos são reeleições etc.

  1. Houve renovação em geral? Houve renovação, pelo menos nas bancadas de esquerda? Ou prossegue o processo de oligarquização, em que os detentores de mandatos se perpetuam, depois sobem de posto e elegem um parente para o posto deixado vago e assim sucessivamente? Há várias questões em aberto, portanto, para uma análise detalhada.

34.A avaliação (verbalizada por setores da direita, como o ex-ministro Sérgio Moro, pela grande mídia e também por analistas de esquerda) acerca da ascensão de uma esquerda alternativa ao PT não encontra respaldo nos números do primeiro turno. O que não quer dizer que o PT não enfrente graves problemas. Mas a ênfase nos problemas do PT não pode desviar nossa atenção para um problema muito maior: a redução dos votos dados para a esquerda em geral. Em 2012 o PT+PSOL+PCdoB conquistaram 21.688.830 votos; em 2016, os três partidos conquistaram 10.883.557 votos; em 2020, os três partidos conquistaram 10.392.018 votos. Estes números indicam, portanto, que o fenômeno principal, em 2020, não é o de uma transferência de votos do PT para outros partidos de esquerda, mas sim o da transferência de votos do PT para fora da esquerda (outros partidos, abstenção, brancos, nulos).

35.Neste sentido, a afirmação feita, ainda no segundo turno, por dirigentes nacionais do PSOL, segundo os quais seu partido “sem dúvida, cresceu muito e saiu credenciado para liderar um processo de renovação da esquerda no Brasil” foi não apenas inapropriada –considerando a importância do PT no processo eleitoral em Belém e São Paulo; mais importante que isso, a declaração do presidente do PSOL incorreu no mesmo equívoco em que tropeça um amplo setor do PT: o de acreditar que a “renovação da esquerda” resultará de movimentações eleitorais, e não das lutas sociais e da reconquista ideológica e orgânica da classe trabalhadora”.

36.É no mínimo irônico que o PT tenha sido acusado de eleitoralismo, de institucionalismo, de desprezar o trabalho de base, por pessoas que agora desejam liderar um “processo de renovação da esquerda” baseados no desempenho eleitoral. E, destacamos, baseados num desempenho eleitoral que depende da vitória em São Paulo. Vitória que depende, em parte, do engajamento do petismo. Que, segundo disse o presidente do PSOL, deveria se engajar em algo que supostamente vai contribuir para a superação do próprio PT…

37.No segundo turno, o PT se engajou totalmente na campanha de Boulos. Lutams para tentar eleger Boulos prefeito de São Paulo. O que o presidente do PSOL disse é uma imensa besteira, salto alto e má sociologia. E a renovação da esquerda não depende de vitórias eleitorais. Até porque, como nós do PT sabemos muito bem, nada melhor do que governar para mostrar que existem mais contradições entre o céu e a Terra do que a nossa vão filosofia pode supor.

38.Nesse sentido, não compartilhamos do clima de “grande vitória” que transparece em algumas avaliações feitas por alguns integrantes do Diretório Nacional do PT (e, por motivos outros, de avaliações de dirigentes do PSOL).

39.Em 2020, o PT conquistou menos prefeituras do que em 2016: 175 contra 276. A queda ocorreu em todas as categorias de cidades (pequenas, médias etc.). A novidade poderia vir, mas não veio, do segundo turno.

40.Em 2020, o PT conquistou menos mandatos de vereadores do que em 2016: 2609 contra 2808. Destacamos que algo mudou entre 2016 e 2020: deixaram de existir coligações proporcionais. Portanto, a comparação entre 2016 e 2020 precisa ser ponderada. Se já houvesse a vedação de coligações proporcionais em 2016, será que teríamos eleito 2808 vereadores e vereadoras? Será que seria menos ou mais?

41.Por outro lado, no primeiro turno tivemos um crescimento no número de eleitores: de 6.843.575 em 2016 para 6.971.136 votos em 2020. Este crescimento poderia ser considerado vegetativo, pois nesses quatro anos cresceu o eleitorado como um todo. Mas é preciso lembrar que, enquanto o eleitorado cresceu, no sentido oposto caiu o número de votos válidos, portanto o crescimento em números absolutos de nossos votos se deu na contramão do movimento do eleitorado (em que houve uma redução do número de votos válidos e também uma “redução no universo total de eleitores de esquerda). Por outro lado, a conjuntura de 2016 era muito pior do que a de 2020. Portanto, teria sido “perfeitamente possível um crescimento ainda maior do nosso eleitorado. Cabe no nosso balanço debater por quais motivos não crescemos tanto quando poderíamos.

42.Aqui, há um detalhe adicional: o número total de candidaturas lançadas pelo PT em 2020 foi maior do que o de 2016. Portanto, tínhamos um ambiente político melhor e um número maior de candidaturas. Logo, teria sido perfeitamente possível um resultado maior. E porque não tivemos este resultado maior? Entre os motivos, destacamos os seguintes:

1/a tática de municipalização das campanhas

2/a tática adotada pelos governadores e por muitos dos parlamentares federais e estaduais

3/a tática adotada em São Paulo capital (e também em Belo Horizonte e em outras cidades importantes).

43.A respeito do primeiro ponto, a municipalização das campanhas, a recusa em nacionalizar a disputa, vários documentos da Dnae já falaram bastante.

44.A respeito do segundo ponto, o desempenho do partido em vários dos estados governados pelo PT revela, mais uma vez, que a mal denominada política de governabilidade gera desacumulo no desempenho eleitoral do Partido. O caso do Ceará (em que o governador fez campanha para a candidatura do PDT); e o caso da Bahia (em que o governador articulou uma tática desastrosa em Salvador) são particularmente escandalosos.

45.Aqui é importante lembrar: foi Camilo que vazou a conversa de Lula com Ciro, foi Camilo que contribuiu, por ação e por omissão, para que a candidatura do PT não fosse ao segundo turno. Camilo está no PT, mas no seu ombro está tatuado um coração e as palavras FERREIRA GOMES.

46.Também é importante dizer que, ao menos nos casos da Bahia, do Piauí, do Ceará e do nosso aliado governador do Maranhão, será muito importante analisar o que ocorreu nas eleições. Como pode, por exemplo, que depois de tantos governos petistas na Bahia, que o PSD e o DEM nos superem? Como é possível que tenha ocorrido as derrotas em Feira de Santana e em Vitória da Conquista, no segundo turno?

47.Se o partido nesses estados não debater a sério o ocorrido, se não houver uma mudança de tática, a próxima eleição presidencial e para governadores e senadores vai nos provocar fortes dissabores.

48.O resultado da campanha eleitoral confirmou que o companheiro Fernando Haddad deveria ter sido candidato a prefeito. Mas o Diretório Nacional do PT decidiu, pelo voto da maioria de seus integrantes, que não convocaria o companheiro Haddad para esta tarefa. Ao agir assim, o DN aceitou que os interesses individuais se sobrepusessem às necessidades coletivas; não é de admirar que o desfecho disso tenha sido que muita gente achasse ser natural desrespeitar a posição do Partido.

49.Se o PSOL e Boulos conseguiram ir ao segundo turno, Haddad muito provavelmente também conseguiria. Assim como Freixo conseguiria, muito provavelmente, ir ao segundo turno no Rio. Como já foi dito, mesmo não tendo participado do processo, Freixo e Haddad estão entre os derrotados desta eleição.

50.O balanço detalhado do que ocorreu em São Paulo será feito em documento a parte, mas podemos adiantar, desde já, que a existência de várias candidaturas de esquerda (tanto em SP quanto em outras capitais) não impediu uma delas de ir ao segundo turno, como quis fazer-se crer em muitas análises e operações políticas, inclusive na esquerda e centro-esquerda. Aliás, a existência de mais de uma candidatura majoritária da esquerda foi um fator importante, em muitas cidades, para viabilizar o segundo turno, para disputar votos com a direita, para manter ou ampliar as bancadas de esquerda”.

51.Também será preciso analisar com mais detalhes as importantes vitórias nos legislativos em muitas capitais e grandes cidades que sinalizam para uma renovação na representação da esquerda, com maior participação de mulheres, negros, LGBTI+ e jovens.

52.O PT fez campanha, no fundamental, com recursos públicos, enquanto a direita usou e abusou de recursos privados; por isso, era tão importante acertar na distribuição dos recursos. Mas foram cometidos erros de todo tipo, que precisam ser avaliados com muito detalhe. Por exemplo: houve um acerto importante, que foi reservar recursos para gastar no segundo turno, onde estamos disputando diretamente, com candidaturas do PT ou apoiadas desde o primeiro turno pelo PT. Mas, por outro lado, a distribuição dos recursos no primeiro turno padeceu de graves problemas.

53.O PT deliberou lançar candidaturas próprias no maior número possível de cidades, deliberou não fazer alianças com partidos bolsonaristas e ultraliberais, deliberou fazer campanhas nacionalizadas. Mas, na prática, a teoria foi outra. Na maioria das cidades, as campanhas foram municipalizadas. E em muitas cidades, como é o caso emblemático de Belford Roxo, o próprio Diretório Nacional aprovou uma coligação com o bolsonarismo – dando carta branca para que se fizesse o mesmo em inúmeras outras cidades país afora. Cabe analisar, por fim, o que poderia ter sido feito em termos de alianças na largada com outras forças de esquerda; assim como cabe analisar a desastrosa condução dada à eleição em João Pessoa (PB) e a ausência total de candidaturas em grande número de cidades.

54.O PT tem uma tradição de disciplina partidária. Mas em 2020 podemos dizer que nunca antes na nossa história tivemos tantos casos de parlamentares e figuras públicas apoiando candidaturas de outros partidos, em cidades em que havia candidaturas petistas. Por conta disso, a AE solicitou comissão disciplinar contra 1 senador e alguns deputados federais. Mas nos parece que estamos diante de um problema sistêmico, que precisa ser enfrentado de conjunto. Inclusive no tocante a situação em Fortaleza (CE) e de outras importantes cidades”.

PLANO DE TRABALHO

ATIVIDADES PERMANENTES

-reuniões mensais da Dnae, página eletrônica, Podicasti, Antivírus, Contramola, Página 13, Esquerda Petista

CALENDÁRIO 2020

6/12 plenária nacional de balanço das eleições 2020.

7/12 reunião DN do PT

11/12 planejamento formação

12/12 as eleições 2020 e o futuro do Partido dos Trabalhadores.

13/12 análise de conjuntura e história do PT promovido pelo Coletivo do mandato #UMDENÓS!

14/12 reunião nacional área comunicação da AE

16/12 Serra Talhada (Plenária do Sertão)

17/12 Paudalho (Plenária da Mata Norte)

18/12 Plenária Região Metropolitana Recife

19/12/2020 curso de formação no RN

CALENDÁRIO 2021

11/1/2021 começa jornada de formação

30/1/2021 Dnae divulga o projeto de resolução

13 e 14/2/2021 curso formação Viçosa

28/2/2021, congressos municipais aprovam os delegados nacionais

30/3/2021 até o final de março de 2021, congresso nacional VIRTUAL com delegados eleitos diretamente nos municípios PARA APROVAR RESOLUÇÃO POLÍTICA

30/4/2021, plenárias municipais para informar as resoluções do congresso nacional, eleger as novas direções municipais e para eleger delegados aos congressos estaduais

30/5/2021, congressos estaduais elegem as novas direções estaduais da AE e elegem delegados ao congresso nacional da AE

30/6/2021, congresso nacional elege a nova direção nacional da AE

FALTA DEFINIR EM QUE DATAS VÃO OCORRER AS ATIVIDADES ABAIXO

-curso de formação presencial

-plenária nacional de combate ao racismo

-curso de trabalho de base

-curso/seminário sobre situação internacional

-curso no Piauí

-curso em Cuiabá

-reunião em MG com Alvorada e sindicalistas

-seminário de lutas urbanas e plenária da educação

-plenária nacional de saúde da AE

-conferência nacional de combate ao racismo

-viagem presencial a SC

-viagem presencial ao Paraná

-viagem presencial a Alagoas

-marcar plenárias virtuais no MS e em MG

-elaborar um documento de balanço da participação da AE no processo eleitoral

-agendar reuniões de balanço da participação eleitoral da AE

-reuniões virtuais no PI, MT, SC, Paraná, AL

-curso de formação presencial

-plenária nacional de combate ao racismo

-curso de trabalho de base

-curso/seminário sobre situação internacional

-seminário de lutas urbanas e

– plenária da educação

-plenária nacional de saúde da AE

-conferência nacional de combate ao racismo

-plenária nacional de cultura

-plenária ou conferência LGBT+

-reunião com eleitos e eleitas da AE

(versão não revisada e sujeita a alterações)

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