Projetos de Resolução ao 6° Congresso Nacional da Articulação de Esquerda

Página 13 divulga as versões finais dos projetos de resolução que serão debatidos e submetidos à aprovação dos delegados e delegadas do 6° Congresso da Articulação de Esquerda (dias 10 e 11 de abril de 2021).

Os textos são:

1) Proposta de Regimento interno do 6º Congresso Nacional da tendência petista Articulação de Esquerda

2) Projeto de Resolução sobre Passado, presente e futuro do PT;

3) Projeto de resolução sobre “Conjuntura e tática” ( unificando as versões anteriores de resolução de conjuntura e de balanço das eleições e tática para as eleições 2021) 

4) Projeto sobre Tarefas e funcionamento da tendência petista Articulação de Esquerda.

A seguir, seguem os quatro textos.

Boa leitura e bom debate!

1) Proposta de Regimento interno do 6º Congresso Nacional da tendência petista Articulação de Esquerda

1.O 6º Congresso será realizado nos dias 10 e 11 de abril de 2021.

INGRESSO NA SALA

2.O 6º Congresso será realizado em uma sala zoom, cujo link será distribuído aos delegados, delegadas, observadores e convidados no dia 9 de abril.

3.Os delegados e delegadas, assim como os observadores e observadoras, convidados e convidadas, devem solicitar ingresso na sala zoom a partir das 8h00 da manhã e preferencialmente antes das 9h00 da manhã de sábado 10 de abril.

4.O ingresso na sala será autorizado pelos integrantes da Direção nacional da AE que serão host da sala, tomando como base a lista fornecida pela tesouraria nacional.

5.Os delegados e delegadas, assim como os demais militantes em dia, só terão acesso a sala zoom se estiverem na lista da tesouraria nacional. Neste sentido, ao entrar na sala zoom todos/as devem ter seu aparelho denominado com o mesmo nome que está na lista. Não sendo possível fazer esta alteração, solicitamos que se contate previamente algum integrante da direção nacional da AE. Eventuais alterações na delegação deverão ser informadas, à direção nacional da AE, por membro da DEAE ou pelo próprio delegado a ser substituído até as 13h do dia 10.

6.Todo militante da AE em dia, mesmo que não esteja na lista de delegados/as, será observador ou observadora e, portanto, poderá ter acesso a sala onde ocorrerá o congresso e inclusive fazer uso da palavra, desde que autorizado previamente pela mesa. Mas vale o mesmo critério acima, ou seja, será considerado militante em dia quem estiver na lista fornecida pela tesouraria nacional da AE.

7.Militantes que não estejam em dia não terão acesso a sala zoom, podendo acompanhar a transmissão que será feita pelo canal de YouTube.

8.Os convidados e convidadas que terão acesso à sala zoom são aqueles/as que constem da lista aprovada pela Direção Nacional da AE.

9.A Dnae vai organizar uma lista de convidados/as, que poderão acompanhar os debates e inclusive fazer uso da palavra, desde que autorizado previamente pela mesa.

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PROGRAMAÇÃO

10.A programação do 6º Congresso é a seguinte:

10 de abril, sábado, das 9h00 às 12h00

Dnae faz a leitura e aprovação do regimento interno.

Aprovação da mesa condutora dos trabalhos, composta por 2 pessoas, sendo 1 responsável por coordenar a reunião e outra por secretariar.

Leitura do projeto de resolução sobre conjuntura e tática.

Debate.

10 de abril, sábado, das 12h00 às 14h00

Apresentação das emendas ao texto sobre conjuntura e tática, via correio eletrônico ou zap dos integrantes da mesa (será comunicado durante o congresso quais os contatos).

10 de abril, sábado, das 15h00 às 18h00

Leitura do projeto de resolução sobre passado, presente e futuro do PT.

Debate

10 de abril, sábado, das 18h às 20h

Apresentação de emendas ao texto “passado, presente e futuro do PT”, via correio eletrônico ou zap dos integrantes da mesa (será comunicado durante o congresso quais os contatos).

11 de abril, domingo, das 9h00 às 12h00

Leitura do projeto de resolução sobre funcionamento e tarefas da AE.

Debate.

11 de abril, domingo, das 12h00 as 14h00

Apresentação das emendas sobre o ponto funcionamento e tarefas, via correio eletrônico ou zap dos integrantes da mesa (será comunicado durante o congresso quais os contatos).

11 de abril, domingo, das 15 às 18h00

Votação de emendas.

Encerramento.

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TRANSMISSÃO

11.A apresentação dos projetos de resolução será divulgada pelos canais da AE nas redes sociais. O debate não será divulgado, mas será gravado. E será disponibilizado via YouTube, mas com acesso restrito a quem tiver o link.

VOTAÇÕES

12.As votações serão feitas na plenária final, a partir de um relatório elaborado pelos secretários das mesas e com uma metodologia que será proposta pela Dnae, levando em conta o número de emendas.

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2) Projeto de resolução sobre “Passado, presente e futuro do Partido dos Trabalhadores”

(versão final,  de 8 de abril de 2021, que será debatida no Congresso)

A direção nacional da tendência petista Articulação de Esquerda submete ao 6º Congresso nacional da AE o seguinte projeto de resolução:

1.Desde 1980 até hoje, o Partido dos Trabalhadores vem contribuindo para elevar a influência da classe trabalhadora nos destinos do Brasil. Quaisquer que sejam os problemas, as dificuldades, os equívocos cometidos por nosso partido ao longo desses 41 anos, o fato é que a existência do PT coincide com o momento de maior influência da esquerda na vida política nacional. A classe dominante sabe da importância do PT e por isto faz de tudo para nos cooptar, para nos confundir, para nos desmoralizar, para nos derrotar e – no limite – para nos destruir.

2.Desde1993 a tendência petista Articulação de Esquerda vem lutando para que o Partido dos Trabalhadores mantenha os propósitos democráticos, socialistas e revolucionários que estiveram presentes em sua criação. Como parte disso, sempre defendemos nos congressos, nos encontros e nos processos de eleição das direções partidárias teses e projetos de resoluções em favor de um programa e de uma estratégia democrático-popular e socialista, o que inclui considerar que o conjunto da classe dominante e o imperialismo constituem nossos inimigos estratégicos. As resoluções do 5º Encontro Nacional do PT, do 8º Encontro Nacional do PT e do 7º Congresso Nacional do PT são marcos nesse sentido. Entretanto, desde 1995 até hoje o Partido está sob direção de um grupo que – com inflexões à esquerda e à direita – se distancia cada vez mais dos objetivos programáticos e estratégicos do socialismo e da revolução. Também devido a esta moderação programática e estratégica, que se traduziu em ilusões republicanas e na chamada conciliação de classe, as importantes vitórias parciais obtidas durante os governos Lula e Dilma acabaram sendo seguidas por grandes derrotas, como as que estamos vivendo desde 2016. Já em 2015 a tendência petista Articulação de Esquerda alertou que precisávamos de um partido para “tempos de guerra” e mesmo hoje seguimos lutando para que o Partido realize um encontro extraordinário, para elaborar um programa e uma estratégia que estejam à altura da situação mundial, regional e nacional, de crise sistêmica do capitalismo e de intensos conflitos entre classes e Estados.

3.Quando o PT foi criado, em 1980, o mundo ainda vivia nos marcos estabelecidos pelo desfecho da Segunda Guerra. Desde 1945 até 1991, a principal variável da situação mundial foi o conflito entre Estados Unidos e União Soviética, que era então a principal expressão geopolítica do conflito entre capitalismo e socialismo. A dissolução da União Soviética (1991) abriu um período de instabilidade nas relações internacionais, causada no essencial pela tentativa que os Estados Unidos fizeram de converter-se numa espécie de “império global unilateral”, tendo como pano de fundo a expansão acelerada das relações capitalistas, expansão que também alimentou-se da relação bilateral entre EUA e China. Acontece que a crise de 2008 alterou as bases daquela relação. E hoje, 41 anos depois da criação do PT e 30 anos depois do fim da URSS, a principal variável da situação mundial passou a ser o conflito entre EUA e China. Conflito que, para alguns, seria também a principal expressão geopolítica do conflito entre capitalismo e socialismo. A América Latina e o Caribe constituem um território de combate econômico, político, ideológico e, em menor escala, militar entre China e EUA. Algo similar já havia ocorrido durante a Guerra Fria. Agora, entretanto, há pelo menos duas novidades importantes: a decadência dos Estados Unidos e a potência econômica chinesa.

4.Por uma combinação de fatores internos e externos, há um declínio acentuado na capacidade dos Estados Unidos exercer sua hegemonia. No médio prazo, há dois cenários fundamentais: ou 1/os EUA recuperam sua hegemonia global ou 2/recuam no sentido de converter-se em uma importante potência regional que participa das questões mundiais. Na busca por reverter seu declínio, os Estados Unidos lançam mão de diversos instrumentos, dentre os quais parece inescapável o uso crescente de ações bélicas, mesmo que “apenas” como fator de ameaça. Seja qual for o cenário que predomine, os Estados Unidos manterão pressão intensa sobre a América Latina e o Caribe em geral e sobre o Brasil em particular.

5.E se a China triunfar, que será de nossa região e de nosso país? Diferente dos Estados Unidos no período 1945-1991, a expansão chinesa não é acompanhada de um aumento equivalente da influência política e militar. Ademais, tudo indica que os chineses seguirão fazendo quase tudo que for possível para evitar um conflito militar generalizado. Por outro lado, diferente do que fez a União Soviética no período 1945-1991, a China adotou desde 1978 uma política que têm como desdobramento sua penetração econômica em todo o mundo e a ultrapassagem dos Estados Unidos em vários indicadores. A evidente relação deste sucesso econômico com a estabilidade do regime político chinês manda uma forte mensagem positiva em favor do papel diretor do Estado de tipo socialista, na contramão do discurso capitalista e neoliberal difundido pelos Estados Unidos. Mas um eventual sucesso da China no conflito com os Estados Unidos não produzirá por si só, nem automaticamente, uma alteração no “lugar” da América Latina e Caribe no mundo.

6.Seja qual for o desfecho da nova “guerra (por enquanto) fria”, seguirá sendo funcional às principais potências do mundo que a América Latina e Caribe, o Brasil em particular, perpetue sua condição de exportadora de matérias primas e importadora de produtos industriais e pacotes tecnológicos. Portanto, ao contrário do que ocorreu por exemplo nos anos 1950, do mundo – mantidas as condições atuais – não virão muitos “estímulos espontâneos” no sentido de algum desenvolvimento reindustrializante, mesmo que dependente. Evidente que se ocorrer uma grande guerra de escala planetária, que cause uma interrupção dos fluxos de bens e capitais, como em certa medida ocorreu entre 1914 e 1945, a classe dominante brasileira pode se ver forçada a usar seus capitais na expansão da produção e do consumo interno e regional. Mas tirante esta situação extrema, a classe dominante brasileira não dá nenhum sinal de que pretenda correr os riscos implícitos em um movimento de desenvolvimento (re)industrializante de novo tipo. Afinal, fazê-lo implicaria em conflitos com os capitalistas estrangeiros (que querem que o Brasil continue sendo exportador de primários e importador de produtos industrializados e de tecnologias). Um movimento de reindustrialização de novo tipo exigiria, também, investimentos de longo prazo (algo que parece insuportável para uma classe dominante acostumada a enormes lucros de curto prazo). Reindustrializar implicaria, ainda, em aumentar a massa salarial (o que poderia reduzir os lucros) e poderia implicar inclusive em ter que compartilhar algum poder com outros setores sociais, em detrimento da primazia oligárquica. Por estes e por outros motivos, não há sinais de que possa ocorrer algo similar ao que se passou em 1930, quando uma fração da classe dominante e dos setores médios se lançaram à luta por um programa de industrialização e desenvolvimento, mesmo que limitado, conservador e dependente. Dada a composição atual da classe dominante e dado, também, o excesso de capacidade produtiva instalada em âmbito mundial, a opção preferencial da classe dominante é ser exportadora de primários, estufa especulativa e importadora de industrializados e pacotes tecnológicos.

7.Esta opção tem várias implicações, entre as quais a superexploração da força de trabalho chegando a situações análogas à escravidão; a redução ao mínimo dos direitos sociais; a permanente ameaça às liberdades democráticas da maioria do povo; a perpetuação de uma mentalidade colonizada, racista, patriarcal, opressiva, preconceituosa; bem como padrões de desenvolvimento inferiores aos das potências mundiais e inferiores às evidentes potencialidades do Brasil. Mas há uma implicação adicional: depois de meio século de industrialização (1930-1980), quarenta anos de desindustrialização estão espremendo um país de 210 milhões de habitantes no figurino estreito que o país tinha quando éramos cerca de 40 milhões de almas. O retrocesso iniciou nos anos 1980 com a crise da dívida e os governos Figueiredo e Sarney; prosseguiu nos anos 1990 por obra dos neoliberais colloridos e tucanos; e desde 2016 segue por conta dos ultraliberais e bolsonaristas. Importante ressaltar que esta associação entre neofascismo e neoliberalismo não ocorre por acaso: na ausência de desenvolvimento, a brutal desigualdade existente no país não encontra válvula de escape e a questão social vira caso de polícia (e de milícia). O bolsonarismo, a tutela militar, o fundamentalismo, o genocídio pandêmico e a ampliação do comércio de armas de fogo não são, portanto, raios em céu azul.

8.Em resumo: não é apenas que estão impedindo um futuro melhor do que o passado. Em certo sentido, a “ponte para o futuro” implementada desde 2016 até 2021 está nos fazendo voltar para o passado. A classe dominante brasileira está nos empurrando de volta a uma situação que lembra os anos 1920, quando o Brasil era um país primário exportador, submisso ao imperialismo, onde a política era assunto oligárquico e a questão social era caso de polícia. Cabendo lembrar que nos anos 1920 e 1930, a superação dos dilemas estruturais foi possível graças a adoção de métodos revolucionários, ainda que revolucionários de tipo burguês.

9.Em 2021, como há 100 anos, a classe trabalhadora brasileira tem duas alternativas fundamentais: ou 1/hipoteca seu destino a alguma das frações da classe dominante ou 2/trilha um caminho de independência de classe. Mas há uma diferença fundamental: ao contrário do que ocorria nos anos 1920, hoje não existe nenhum setor relevante da classe dominante com disposição para defender um caminho alternativo ao do país primário-exportador & estufa especulativa. Todos os setores fundamentais da classe dominante apoiam desde o final dos anos 1980 as políticas neoliberais. Estas convicções programáticas e estratégicas não foram abaladas pelas flexões táticas que setores e indivíduos da classe dominante fizeram durante os governos Lula e Dilma (flexões que foram facilitadas pela disposição de conciliação que prevaleceu nesses governos). E mesmo aquelas flexões táticas foram sendo abandonadas, à medida que a “marolinha” causada pela crise de 2008 tornou-se um “tsunami”. E desde 2016, o caminho programático seguido pelas diferentes frações da classe dominante é o do golpismo reacionário e cavernícola. As diferenças eventuais entre as frações da classe dominante são de forma e de ritmo, não de sentido e direção.

10.Diante de tal situação, não há motivo para dúvida: se a classe trabalhadora brasileira escolher o caminho da “hipoteca”, da aliança subalterna, da conciliação de classe, nossas atuais organizações, movimentos, sindicatos e partidos muito provavelmente sofrerão destino similar ao sofrido por nossos antepassados do século XX: a cooptação e, no limite, a anulação. Para quem quiser visualizar o que isto poderia causar ao PT, basta comparar o Partido Trabalhista Brasileiro, o Partido Comunista do Brasil e o Partido Comunista Brasileiro de 2021 com as posições, a influência e a força que tinham estas organizações em 1964.

11.Portanto, a disjuntiva estratégica posta em 2021 diante do Partido dos Trabalhadores é a seguinte: ou um “grande passado pela frente” ou redobrar a aposta radicalmente antissistêmica expressa na fundação do Partido, em 10 de fevereiro de 1980. Aposta que pode ser politicamente traduzida assim: o Brasil precisa de uma grande revolução política, social e cultural. Não de uma “revolução” fake como a de 1964, nem de uma revolução dirigida por uma fração da classe dominante, como foi a de 1930. Precisamos de uma revolução plebeia, popular, radical, que corte a cabeça da oligarquia, que gere pânico nos poderosos, que derrube a canalha que faz nosso povo viver em meio a suor, sangue, lama e vírus. Ontem como hoje, ser antissistêmico é ser revolucionário.

12.A ausência de uma revolução é uma das principais razões (a outra é a subordinação ao imperialismo) para a persistência, em nossa sociedade, de tantos traços coloniais, da escravidão, patriarcais, discriminatórios e opressivos de todo tipo, da política oligárquica, da abissal desigualdade social, da dependência externa e da falta de liberdades democráticas reais para a imensa maioria da população trabalhadora. O Brasil nunca experimentou uma grande revolução democrático-burguesa e, também por isso, nosso capitalismo é como é: dependente, oligopolizado, oligárquico, atrasado. Só uma revolução pode garantir ao Brasil e ao povo brasileiro um futuro qualitativamente melhor do que o passado. Sem uma revolução, o lugar do nosso país na divisão internacional do trabalho continuará sendo o de estufa de especuladores, exportador de primários, importador de produtos industriais e pacotes tecnológicos. O Brasil nunca experimentou uma grande revolução popular e por isso a vida do povo parece as vezes um vale de lágrimas interrompido aqui e ali por breves carnavais. Precisamos de uma revolução. E se esta revolução vier a ocorrer e for triunfante, sua dinâmica vai nos empurrar em direção ao socialismo. Não um socialismo de tipo soviético, chinês ou cubano, mas sim um socialismo brasileiro, pelo simples motivo de que será obra não de trabalhadores russos, chineses ou cubanos, mas sim de trabalhadores e trabalhadoras brasileiras, em luta contra o tipo de capitalismo que aqui floresceu.

13.A classe trabalhadora brasileira será capaz de fazer, no século 21, a revolução que não conseguiu fazer no passado? Evidentemente não há como saber. Mas sabemos que uma revolução não é o fenômeno histórico mais provável em um país com as características conservadoras que o Brasil demonstra ter. Apesar disso, a defesa e a luta por transformações profundas, revolucionárias – mesmo que elas não cheguem a ocorrer, ao menos não em sua plenitude – é algo indispensável até mesmo para que possamos ter mais vitórias em lutas parciais e reformistas. Por outro lado, num momento mundial, regional e nacional de crise sistêmica do capitalismo, é mais do que nunca atual propor uma alternativa sistêmica, revolucionária e socialista. Se não formos capazes disso, que futuro nos espera? Aos preços de hoje, considerando a disposição da classe dominante brasileira e as tendências mundiais, se não houver muita luta, o que virá pela frente no futuro imediato pode ser uma longa e cruel decadência, com elementos de catástrofe. Evitar isto exige retomar uma rota que foi apenas insinuada pelo ciclo de governos progressistas e de esquerda de Lula e Dilma. Mas para isso será preciso não apenas recuperar o governo e implementar políticas públicas, será preciso não apenas realizar reformas estruturais, mas também será necessário disposição de ir até o fim: derrubar a classe dominante e iniciar a superação do capitalismo.

14.Há quem diga que seria puro voluntarismo esquerdista propor tal coisa neste momento em que país está dominado pelo golpismo, pelo ultraliberalismo e pelo bolsonarismo. Há quem diga, também, que o momento é de amplas alianças na luta pela democracia, sem aspas nem apelidos, deixando para depois objetivos que dividem os que lutam “contra o fascismo”. Os que falam assim deveriam estudar melhor a história de outras experiências de luta contra o militarismo, contra a extrema direita e contra o fascismo, lutas que em vários casos desembocaram em transformações revolucionárias sob direção de forças socialistas que não aceitaram limitar seus objetivos ao que agravada o “centro” e a “direita” suposta ou realmente “democrática”. Aliás, cabe sempre lembrar uma das características dos momentos de crise sistêmica como o que vivemos neste ano de 2021: ou bem se avança muito ou bem se retrocede muito, existindo pouco espaço para soluções intermediárias.

15.A crise internacional de 2008 demonstrou que o capitalismo segue extremamente instável, propenso a crises brutais, que se desdobram em “guerras” comerciais, políticas, culturais — e guerras propriamente ditas. Essa crise também revelou que o capitalismo neoliberal é incapaz de reformar a si mesmo: é cada vez menor a chance de convivência pacífica entre, de um lado, o capitalismo, e de outro lado as políticas de bem estar social e as liberdades democráticas. Assim como é cada vez menor a chance de convivência pacífica das grandes potências entre si e destas com os países periféricos. As lutas entre as classes sociais dentro de cada país, bem como as disputas e conflitos entre os Estados nacionais, tendem ao acirramento. Sendo este o contexto, ou bem a classe trabalhadora se dispõe a lutar pelo comando da nossa sociedade, ou corremos o grande risco de continuar neste ambiente de crescente degradação econômica, social, cultural e política, variando no máximo de velocidade, mas sem alterar o curso.

16.Parte da esquerda brasileira não acredita nisto, não concorda que é preciso acentuar nosso radicalismo programático. Por isso, deixa o socialismo (e, também, as chamadas reformas estruturais) na “fila de espera”. Quando estivemos à frente do governo federal, esta parte da esquerda fazia isso porque considerava que o socialismo e as reformas estruturais não seriam indispensáveis e urgentes, constituindo pelo contrário um risco desnecessário. Afinal, estaríamos conseguindo avançar, melhorar a vida do povo, ampliar as liberdades, afirmar a soberania, construir a integração regional, mudar pouco a pouco o mundo, mesmo sem tocar nas bases estruturais do capitalismo. Em 2021, aquele mesmo setor da esquerda defende continuar mantendo o socialismo na “fila de espera”, porque pensa que a tarefa seria resistir, impedir o desmonte, recuperar o terreno perdido. E depois, quem sabe, quando tudo voltar ao normal, voltar a sonhar com bandeiras de longo prazo, como as reformas estruturais e o socialismo. Os que pensam desta forma convertem o socialismo em absolutamente nada: não seria necessário quanto a classe trabalhadora está forte e não seria factível quanto está fraca. Pensamos totalmente diferente disto. Em nossa opinião, a experiência latino-americana (1998-2018) e a experiência da socialdemocracia europeia (1945-91) demonstram que a sobrevivência das reformas e dos avanços depende da correlação de forças entre capitalistas e classes trabalhadoras. E por mais que as classes trabalhadoras melhorem suas posições, se elas não avançarem sobre a propriedade dos meios de produção e dos instrumentos de poder, os capitalistas sempre terão os meios para “recolocar as coisas no seu devido lugar”. Por isso é imprescindível adotar uma estratégia socialista, ou seja: uma estratégia que visa fazer a classe trabalhadora construir e conquistar os instrumentos de poder e controlar os meios de produção, tendo como principal objetivo programático instalar um padrão de desenvolvimento que supere a desigualdade, o que passa por derrotar o capital financeiro, os oligopólios, as transnacionais, o agronegócio, colocando a economia brasileira sob controle da classe que realmente produz as riquezas: a classe trabalhadora. Apenas nestes novos marcos estruturais, que combinam medidas democrático-populares com medidas socialistas, terão pleno êxito nossas políticas públicas – como o Sistema Único de Saúde (a respeito do qual precisamos dizer: hoje tantos na esquerda defendem o SUS, mas ontem muitos vacilaram em sua defesa).

17.Em resumo: trata-se de organizar nosso programa, nossa estratégia, nossas táticas e nossa política de organização em torno do objetivo de converter a classe trabalhadora em classe dominante, não se contentando em estar no governo e sem alimentar velhas e novas ilusões no caráter supostamente neutro do aparato estatal. Lutar por um Estado de novo tipo, incluindo a democratização radical dos meios de comunicação, do sistema judiciário e das forças armadas, de forma que estejam à serviço da maioria da população brasileira. Construir e conquistar o poder e implementar uma política de desenvolvimento de tipo socialista, não para ser executada em quatro anos de governo, mas sim como meta para décadas de trabalho duro, é um objetivo que decorre não apenas da situação nacional, mas também da situação mundial. Afinal, a crise mundial do capitalismo e seus efeitos tóxicos só serão interrompidos e superados por transformações de tipo socialista: para uma crise sistêmica, uma solução sistêmica.

18.Se a classe trabalhadora brasileira e cada uma de nossas organizações quiserem estar à altura da situação histórica, precisamos reafirmar estes “objetivos finais” socialistas e revolucionários. Entretanto, como sabemos muito bem, a maioria da classe trabalhadora brasileira está hoje mais submetida à hegemonia da classe dominante, do que estava há dez anos. E a ala esquerda da classe trabalhadora segue aprisionada ao modo de pensar segundo o qual nosso programa deve resumir-se a superação do neoliberalismo, nossa estratégia deve limitar-se a transformar o Brasil através de políticas públicas implementadas por governos eleitos, nossa tática deve buscar uma aliança com a direita golpista neoliberal para derrotar exclusivamente o bolsonarismo. Como a organização é política concentrada, esta linha política afeta os partidos, os sindicatos e os movimentos sociais, que passam a ter parte crescente de sua vida interna e de sua relação com o conjunto da classe trabalhadora determinadas por esta lógica conciliadora, institucional, eleitoral, como se disputar espaços dentro do Estado fosse a única dimensão da luta de classes.

19.Esta síndrome institucionalista afeta, em maior ou menor medida, toda ou quase toda a esquerda (quem tiver dúvida a respeito, basta olhar as posições defendidas por setores do PSOL). Mas por razões óbvias o fenômeno institucionalista é mais visível no Partido dos Trabalhadores. Durante algum tempo, a institucionalização parecia contribuir para o acúmulo de forças. Hoje já está visível e inegável o outro lado da medalha: uma desacumulação crescente, inclusive no terreno eleitoral. Embora a recuperação dos direitos políticos do companheiro Lula torne possível (mas não garantido) um futuro de curto prazo melhor, o médio e longo prazo não se alteram por isto e, mantida a institucionalização, o cenário é de crescentes dificuldades. Esta é a realidade objetiva. Mas a interpretação subjetiva desta realidade depende do ponto de vista. Para os que enxergam no PT um partido trabalhista e reformista, quase que apenas uma legenda eleitoral, o atual descaminho partidário não parece tão trágico: no limite mudam de partido, em busca de preservar espaços na institucionalidade. A situação tampouco parece trágica aos olhos daqueles que acham que Lula teria o dom de curar todos os problemas do Partido. Vale dizer que na cúpula do PT há setores que, para além do culto à personalidade, estimulam uma conduta quase infantil de elogiar os feitos do Partido, como se a cabotinice (o pensamento positivo de nós mesmos a nosso respeito) fosse capaz de mudar o mundo ao redor, como se águas passadas fossem capazes de mover moinhos. Há também os cínicos, lideranças que contribuíram e seguem contribuindo com suas ideias e ações para este descaminho partidário, ao mesmo tempo que criticam a situação, como se não tivessem nenhuma responsabilidade no que está ocorrendo. Há quem acredite que a batalha pelos rumos do PT é assunto do passado, pois nosso destino já estaria selado. Sem falar nos que não sentem a menor atração por esta discussão, em alguns casos por não perceber que o destino de curto e médio prazo do Brasil está diretamente ligado às opções que o PT faça ou deixe fazer, assim como as opções majoritárias no PTB e no PCB contribuíram para o êxito do golpe militar de 1964 e da ditadura que se seguiu. Aliás, a classe dominante sabe disso e faz de tudo para destruir, desmoralizar e submeter o PT, muitas vezes com a ajuda dos integrantes da “tendência suicida” que segue tão influente na cúpula partidária. Enfim, apesar da situação objetiva ser preocupante, ou por isso mesmo, existem no Partido e no seu entorno inúmeras interpretações acerca do que está ocorrendo e acerca do que fazer. Na opinião da tendência petista Articulação de Esquerda, há motivos para extrema preocupação em relação ao futuro do PT. Inclusive porque as dificuldades objetivas e subjetivas afetam principalmente aqueles que defendem uma tática radical na luta contra o bolsonarismo e o ultraliberalismo, aqueles que defendem a atualidade programática do socialismo e a atualidade estratégica da revolução, aqueles que lutam para que o PT continue sendo um instrumento útil para a transformação radical do Brasil.

20.Nesse debate acerca do papel presente e futuro do Partido dos Trabalhadores, a tendência petista Articulação de Esquerda acumulou desde 1993 opiniões que consideramos seguirem válidas. Começamos lembrando que os partidos também morrem (as vezes tornando-se verdadeiros mortos vivos). Lembramos, também, que o PT é desde 1989 até hoje, o partido hegemônico na esquerda brasileira; e o relevo de um partido hegemônico, quando ocorre, não ocorre súbita nem rapidamente. Para citar um exemplo: o Partido Comunista Brasileiro foi duramente golpeado pelo golpe de 1964 e pela ditadura militar subsequente. Mas passaram-se muitos anos até que outro partido hegemônico o substituísse. E quem sucedeu o PCB na condição de partido hegemônico na esquerda não foi nenhum dos seus concorrentes anteriores ao golpe militar de 1964 (a Política Operária, a Ação Popular, o PCdoB), nem foi nenhuma das organizações que romperam com o PCB depois do golpe e foram para a luta armada (a ALN, o PCBR, a Var-Palmares etc.). Só em 1980, dezesseis anos depois do golpe, surgiu um partido que assumiria, na esquerda brasileira, o papel hegemônico que algum dia fora do Partido Comunista. E a condição hegemônica do PT só ficou estabelecida a partir de 1989.

21.Por analogia ao processo descrito anteriormente, nossa posição é a seguinte: se o Partido dos Trabalhadores não conseguir enfrentar seus atuais problemas e dificuldades, se o Partido dos Trabalhadores não conseguir superar seus atuais limites, o que provavelmente virá pela frente será um período mais ou enos longo em que a classe trabalhadora não disporá mais de um instrumento partidário à altura de suas necessidades. Certamente, mesmo que perca a hegemonia na esquerda e na classe trabalhadora, o PT poderá sobreviver, assim como o PTB, o PCdoB e o PCB “sobreviveram”. Mas neste caso nosso Partido já não ocuparia mais o mesmo lugar na luta de classes e, portanto, não contribuiria ou contribuiria muito pouco para a construção de uma alternativa socialista no Brasil. E neste caso a classe trabalhadora teria que, mais cedo ou mais tarde, forjar outro partido, sendo muito pouco provável que os atuais concorrentes do PT estejam à altura da tarefa. Noutras palavras, se passariam muitos anos em que a classe dominante teria mais facilidade e espaço para agir, com muita pouca resistência em contrário. Portanto, não temos dúvida de que, tanto por razões de curto, quanto de médio e longo prazo, é fundamental prosseguir a luta para construir o PT, defender o PT e mudar os rumos do PT. Aliás, mudar os rumos do Partido dos Trabalhadores é a melhor maneira de construí-lo e defendê-lo. Mas como fazer isso? Tanto nesta quanto em resoluções anteriores, já dissemos que o PT é produto do que até hoje foi a maior onda de lutas populares da história do Brasil. Sem uma onda de lutas similar, sem que a classe trabalhadora se lance em revolta aberta contra o regime atual, assim como o fez no final dos anos 1970, nem o PT conseguir superar seus limites e mudar seus rumos, nem outro partido de esquerda conseguirá energia para superar o PT, nem surgirá uma nova organização que possa vir a ocupar na luta de classes lugar similar ao atualmente ocupado pelo PT. Portanto, para nós que defendemos o PT, o caminho da mudança é o da luta de classes.

22.A solução dos problemas do Brasil e a solução dos problemas da esquerda brasileira gira ao redor da ação da classe trabalhadora. Acontece que o comportamento da massa da classe trabalhadora depende em alguma medida do comportamento da vanguarda da classe. E grande parte desta vanguarda ainda é petista. Portanto, a ação do petismo pode contribuir (ou não) para que haja uma nova onda de lutas populares. O PT pode ou não ajudar a salvar o próprio PT. E se nossa atual geração não conseguir equacionar corretamente a situação, apenas transferiremos a tarefa para gerações futuras, que se verão diante de questões similares às que enfrentamos hoje, mas não necessariamente atuando em condições de temperatura e pressão melhores do que as atuais. É também por isso que seguimos disputando os rumos do PT. Seguiremos resistindo aos que tentam converter o PT em um MDB trabalhista. Seguiremos buscando conquistar a maioria da classe trabalhadora, bem como a maioria dos e das petistas para uma estratégia socialista revolucionária.

23.Estamos conscientes de que disputar os rumos do PT em 2021 é diferente de disputá-lo em 1983, em 1993 ou em 2005. Cristalizaram-se no Partido práticas que tornam muito mais difícil enfrentar e derrotar as práticas e as ideias atualmente hegemônicas:

-uma dependência quase que total frente ao fundo partidário e eleitoral, na prática desistindo do financiamento militante;

-uma atração fatal e unilateral pelas eleições, pelos mandatos parlamentares e governos, na prática quase desistindo de fazer o partido “funcionar em anos ímpares” ou melhor, fazendo dos anos ímpares fundamentalmente momentos de preparar as eleições dos anos pares;

-uma crescente transferência do poder partidário, das bases e das instâncias formalmente diretivas, em direção às lideranças públicas, aos parlamentares e governantes;

-uma adesão, nos processos eleitorais internos, a métodos típicos das eleições burguesas tradicionais, agravadas por fraudes que em 2019 não foram nem mesmo julgadas pelos organismos partidários;

-uma submissão do Partido aos interesses e aos dilemas internos de uma única tendência, que vem se comportando mais e mais como “partido dentro do partido”;

-o crescimento de práticas internas típicas de partidos tradicionais, incluindo o surgimento de uma nova “geração de líderes” que vem vestindo mais e mais o figuro de políticos profissionais tradicionais, incluindo aí o hábito de “viver da política”, embora sigam recheando seus discursos com jargões de esquerda, misturados com lugares comuns e todo o protocolo demagógico que marca a política profissional em nosso país;

-um enfraquecimento da cultura socialista e radical que formam parte do ambiente intelectual necessário para que a classe trabalhadora se eleve acima das dificuldades cotidianas e se disponha a lutar por outro mundo, por outra vida.

-e, de maneira mais geral, a perda de contato organizado de boa parte do Partido com a vida cotidiana da classe trabalhadora. Problema que foi maximizado neste momento de pandemia.

24.As questões acima descritas e tantas outras fazem com que, periodicamente, militantes e lideranças desistam de militar ou até mesmo saiam do Partido. Até o momento, nenhuma destas saídas – individuais ou coletivas – contribuiu para superar os problemas apontados. Contribuíram, isto sim, para enfraquecer a resistência dos que permanecem. Ademais, grande parte dos que saíram do PT acabaram investindo suas energias em projetos individuais ou coletivos que acabam repetindo os mesmos problemas do PT, sem ter as qualidades do PT.

25.Repetimos aqui o que já foi dito anteriormente: uma onda de lutas sociais é condição necessária para empurrar o PT para um novo curso e para construir uma nova direção no Partido, uma direção adequada aos “tempos de guerra” que vivemos. E uma onda de lutas sociais também é necessária para que ocorra uma revolução socialista em nosso país. Almejamos que nossa classe trabalhadora trave lutas políticas, sociais e culturais de extensão e intensidade muitas vezes maior do que hoje e no passado recente. É nisto que devemos concentrar o principal de nossas energias, inclusive onde governamos e exercemos mandatos parlamentares. Entretanto, uma nova onda de lutas pode vir e isto pode não ser o suficiente, se não houver um partido e outras organizações de classe organizadas minimamente para agir de maneira politicamente adequada neste contexto. Sendo assim, é preciso seguir atualizando nosso estudo acerca do capitalismo e da luta contra o capitalismo e pelo socialismo no mundo e no Brasil do século XXI; é preciso seguir formulando e testando uma nova estratégia de luta pelo poder no Brasil; é preciso seguir formando uma nova geração de quadros capazes de dirigir o PT e a esquerda brasileira, em uma jornada que certamente não será uma corrida de cem metros, podendo parecer mais com uma maratona em pleno deserto, durante a qual teremos o desafio de reconquistar maioria na classe trabalhadora para as posições democráticas, populares  e socialistas, elevando o nível programático da esquerda, defendendo a independência de classe, estimulando a luta social, reconstruindo a organicidade em todos os terrenos (frentes, partido, sindicatos, movimentos), reocupando territórios perdidos nas escolas, empresas, locais de moradia e todos os demais ambientes onde se trava a luta de classes, inclusive no âmbito privado, na cultura e no lazer, com destaque para a juventude, para as mulheres, para os negros e negras. Se não tivermos êxito nestas tarefas, o PT terá apenas um grande passado pela frente. Se tivermos êxito, daremos passos importantes em direção à revolução e ao socialismo.

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3) Projeto de resolução sobre “Conjuntura e tática”

(última versão, de 8 de abril de 2021, que será debatida no Congresso)

A direção nacional da tendência petista Articulação de Esquerda submete ao 6º Congresso nacional da AE o seguinte projeto de resolução:

1.O Partido dos Trabalhadores realizou, no dia 29 de março de 2021, uma reunião de seu Diretório Nacional. Esta reunião realizou um interessante debate sobre a situação política e aprovou uma resolução que dever ser lida com atenção por toda a militância da tendência petista Articulação de Esquerda. Participamos do debate travado no DN e fomos derrotados em algumas votações importantes, entre as quais: 1/a defesa de uma frente de esquerda; 2/a defesa enfática da antecipação das eleições presidenciais; 3/a defesa de um encontro nacional extraordinário do Partido. O texto que vem a seguir – que deve ser atualizado pelo Congresso da AE, dias 10 e 11 de abril – desenvolve estas e outras questões. Lembrando que vivemos num contexto de aprofundamento da crise, de reviravoltas e de sobressaltos, onde a iniciativa política (nossa e de nossos adversários e inimigos) cumpre papel fundamental na luta política.

2.O ano de 2020 terminou com quase 200 mil mortos devido à pandemia de Covid 19. Sendo importante lembrar que os dados oficiais são notoriamente subestimados. Passaram-se apenas três meses de 2021 e o número de mortos já ultrapassa os 330 mil. Caminhamos para 5 mil mortes diárias, indicando uma aceleração catastrófica da doença, devido a novas cepas, a ausência de medidas adequadas de isolamento social e a desastrosa política de vacinação adotada pelo governo federal. O capitão-presidente Jair Bolsonaro é o maior aliado do vírus. Ele, seu vice-presidente e os demais titulares de seu governo precisam ser destituídos de seus postos, submetidos a julgamento e punidos por esta tragédia.

3.Ao lado da peste e da morte, a fome também segue avançando. A interrupção por vários meses do auxílio emergencial, o crescimento do desemprego (que a depender dos critérios, atinge entre 13 e 40 milhões de pessoas) e a inflação empurram parte importante da população brasileira para uma situação insuportável. As políticas implementadas pelo governo federal – a começar por aquelas defendidas pelo ministro Paulo Guedes – são direta e indiretamente responsáveis por todo este sofrimento. A financeirização, a desindustrialização, a primarização, a privatização de empresas públicas (como a Petrobrás, a Eletrobrás, os Correios) e os cortes em todas as áreas sociais já seriam desastrosas em qualquer cenário. Em meio a uma pandemia, constituem crimes inafiançáveis contra o povo brasileiro, atitudes tão genocidas quanto o apoio que Bolsonaro dá à transmissão do Covid 19. Também por isso não basta o impeachment do “presidente”: é necessário derrotar o conjunto deste governo e de suas políticas.

4.Ao lado da peste, da morte e da fome, avança a guerra. Grande parte do governo Bolsonaro está sob gestão militar, havendo inclusive quem o apresente como um governo militar. De fato, a presidência, a vice-presidência, vários ministérios, diversos escalões da administração direta e indireta, órgãos públicos dos mais diferentes tipos estão sob gestão militar. Além dos ganhos pessoais, a instituição forças armadas também está sendo beneficiada na distribuição do orçamento público. A recente troca do ministro da Defesa e dos três comandantes (Aeronáutica, Marinha e Exército) não alterou, senão para pior, a situação. Ao mesmo tempo, ocorre um “empoderamento” das polícias militares em todo o país, crescendo simultaneamente a influência da extrema direita bolsonarista entre os policiais e seus comandos, com destaque para as PMs. Facilita-se também a importação e a comercialização de armamentos de “uso pessoal”: o governo presidido por um aliado das criminosas milícias está incentivando abertamente as camadas ricas da população a se armarem. Embora haja quem diga que esta proliferação de armamento afetaria o monopólio da violência pelo Estado e, por isso, causaria preocupações nas forças armadas, os fatos apontam para outra conclusão: como treinaram no Haiti e como praticam cotidianamente nas periferias, trata-se de impor a “lei e a ordem” sobre os setores populares, sobre os negros e as negras, sobre as mulheres, sobre a juventude trabalhadora, sobre a esquerda. Para as forças armadas, é dentro de certos limites útil que isto seja feito por forças auxiliares, policiais, milicianos ou civis de classe média armados. Vamos lembrar que o atual ministro da Defesa dirigiu a intervenção militar no Rio de Janeiro quando Marielle foi assassinada e nada fez de efetivo contra as milícias. Vamos lembrar, também, que nos Estados Unidos – modelo para esta gente – também há intenso armamento da população civil e nem por isto o “monopólio da violência pelo Estado” é ameaçado. Pois o que importa neste monopólio não é tanto que instituição o exerce, mas principalmente que seja exercido contra o povo.

5.Peste, morte, fome e guerra anunciam que um apocalipse está às nossas portas; como já foi dito, caminhamos para meio milhão de mortos, com dezenas de milhões de famintos e de desempregados, com parte majoritária da população sendo submetida a um imenso sofrimento mental e a todo tipo de violência. Uma das consequências desse agravamento da situação objetiva e subjetiva é que se aprofunda o conflito entre as diferentes facções do condomínio que realizou o golpe parlamentar de 2016 contra Dilma, sustentou o golpe judiciário contra Lula e apoiou no primeiro e/ou segundo turno de 2018 a fraude que levou Bolsonaro à presidência. A eleição da presidência da Câmara dos Deputados e do Senado, a prisão do deputado Daniel Silveira, o fim da Operação Lava Jato, as decisões do STF sobre Lula e Moro, a reforma ministerial e a disputa em torno do Orçamento 2021 são os acontecimentos mais recentes de uma guerra intensa entre aquelas facções, guerra que pelo menos até o momento não colocou em questão um consenso que há nas elites: manter o povo do lado de fora e do lado de baixo. Fora do poder e debaixo do tacão.

6.Frente a esta situação, a classe trabalhadora ainda está na defensiva e a esquerda encontra-se dividida em relação à tática, para além das divisões programáticas e estratégicas que são detalhadas no documento “Passado, presente e futuro do PT”. A defensiva da classe trabalhadora pode ser ilustrada pelo resultado das eleições municipais de 2020, assim como pela reduzida mobilização de rua contra o governo e seus aliados. Há mobilização da opinião pública – afetando a popularidade do governo, que não obstante mantém importante apoio – mas não há mobilização presencial de massa. Sendo importante reconhecer que não é apenas a pandemia, o golpe e seus efeitos, que explicam a defensiva da classe trabalhadora. Parte desta defensiva resulta da política adotada desde 2003 por uma parte importante da esquerda, que escolheu trocar a mobilização pelo “lobby” nas instituições, defendendo ser melhor um acordo ruim do que arriscar uma boa luta, sacrificando os objetivos estratégicos em nome de ganhos táticos.

7.Neste momento, abril de 2021, ainda predomina na esquerda brasileira uma tática que pode ser resumida assim: tentar derrotar Bolsonaro em 2022, através de uma frente ampla entre a esquerda, o centro e parte da direita. A primeira parte desta tática abre mão, na prática, de lutar de verdade por fazer o impedimento agora. A segunda parte desta tática abre mão de enfrentar com a devida firmeza as políticas também neoliberais e golpistas da direita que neste momento se opõe a Bolsonaro. Parte dos que defendem esta política de “frente ampla” falam abertamente que é preciso tirar protagonismo do PT. É o caso da maioria do PDT de Ciro Gomes, de amplos setores do PSB, de uma coluna numerosa do PCdoB e até mesmo de uma fração do PSOL. A tática da frente ampla foi aplicada na recente eleição das Mesas do Senado e da Câmara dos Deputados. Nos dois casos, a disputa foi vencida pelo candidato apoiado por Bolsonaro. Nos dois casos, a esquerda não conseguiu ter protagonismo público. Na Câmara, tal política subalterna foi defendida até mesmo pelo setor mais esquerdista do PSOL. Em vários setores desta esquerda frenteamplista, há uma persistente ilusão de classe, que se manifesta também e por exemplo na crença no STF como defensor da democracia, na convicção sem provas de que a cúpula das FFAA seria inocente nos crimes de Bolsonaro, na busca de aliados no grande empresariado etc.

8.Um rápido panorama dos acontecimentos destes últimos doze meses ilustra o que estamos dizendo. Quando a pandemia estava começando, em março de 2020, setores importantes da esquerda resistiram a defender o impeachment e apostaram em diferentes iniciativas frenteamplistas. Diziam que era hora de “defender a vida, não de fazer política”. O resultado foi que talvez tenhamos perdido uma oportunidade de afastar Bolsonaro, que seguiu livre para continuar matando. Desde então e até hoje, na prática vem prevalecendo o negacionismo: não houve o isolamento necessário, não há vacinação adequada, a política sanitária defendida por nós vem sendo derrotada. E o auxílio emergencial que nós corretamente defendemos, foi capitalizado politicamente pelas forças de direita. Tudo isto provando que é a luta política que salva vidas, não as frases de efeito com que certos dirigentes querem lacrar nossos debates internos.

9.Hoje, em abril de 2021, sob alguns aspectos parece que voltamos ao início de 2020: a pandemia em curva de crescimento exponencial, novo debate sobre o auxílio emergencial, conflitos entre o presidente e governadores, ameaças de golpe, conflitos entre os diferentes setores do golpismo, setores da esquerda dizendo não acreditar ser possível fazer o impeachment e ressuscitando o frenteamplismo. Os que agem assim esquecem que a correlação de forças necessária para nossa vitória não é como a chuva, que cai do céu. Constrói-se. E isso exige demarcar posição – em primeiro lugar contra Bolsonaro e suas políticas – o que aliás não ocorreu na imensa maioria das campanhas eleitorais de 2020, assim como não ainda não conseguimos fazer na mobilização de rua. Mesmo em situações extremas, como o fechamento das fábricas da Ford, prevaleceu tanto nas bases quanto entre dirigentes da classe trabalhadora uma posição tímida frente à violência da agressão. Sendo assim, não há por que admirar-se do resultado das eleições municipais, em que cerca de 75% dos votos válidos beneficiaram candidaturas de direita.

10.Como já dissemos, o ano de 2020 terminou e o de 2021 começou com a esquerda votando para a presidência do Senado em um candidato também apoiado por Bolsonaro. No caso da Câmara, a maior parte da esquerda aceitou que as direitas polarizassem a disputa pela presidência da Câmara, sem demarcar campo próprio. Argumentando que Arthur Lira defenderia retrocessos políticos, apoiou-se Baleia Rossi, também golpista e defensor de um programa neoliberal, que não obstante foi traído pelos próprios partidos da direita gourmet. Vitorioso Arthur Lira, sua primeira medida foi encaminhar a aprovação da autonomia do Banco Central; defender um auxílio emergencial menor e menos abrangente, ademais financiado com recursos retirados das áreas sociais. Lira também tentou aprovar uma ampliação da imunidade parlamentar (o que na prática serviria apenas para proteger facínoras) e agora tenta recauchutar a LSN. Sempre buscando abocanhar mais recursos orçamentários e sem medo até mesmo de fazer ameaças contra Bolsonaro, mostrando que o centrão não se vende: se aluga. E o que fez diante disso uma parte da oposição de centro e esquerda? Na prática, começou a preparar-se para 2022, como se fosse razoável aceitar que Bolsonaro tem direito a passar mais 18 meses massacrando o povo. No caso do PT, consumiu-se grande energia no debate de um programa de reconstrução e transformação que nada fala acerca das forças armadas, além de ser absolutamente tímido contra o capital financeiro e o agronegócio. Depois veio a operação “colocar o bloco na rua” com Fernando Haddad. E, a partir de 8 de março, a maioria do Partido passou a depositar todas as energias na força da candidatura Lula, minimizando as reações e alternativas da direita e – mais grave – colocando em segundo plano a luta pela derrubada imediata do governo Bolsonaro, com antecipação das eleições presidenciais.

11.A tática frenteamplista ainda hegemônica na esquerda (e no PT), pior do que errada, é ineficaz. É errada porque compromete a esquerda com posições neoliberais e muito pouco democráticas, como é o caso das posturas de Dória, Leite, Maia, Baleia e Temer. Ou de Luciano Huck e Amoedo, E é ineficaz porque não contribui para reconquistar – para a esquerda e contra Bolsonaro – os setores populares que se afastaram da esquerda, particularmente desde 2015. Para que esta reconquista seja possível, não é suficiente a disputa da opinião pública nas redes sociais, nem é suficiente a disputa eleitoral, nem adiantam as gravíssimas concessões feitas por exemplo no caso da Caixa Econômica Federal. A esquerda precisa reocupar território perdido nos locais de moradia, nos locais de trabalho, nos locais de estudo, nos ambientes de cultura e lazer, especialmente entre os jovens, as mulheres, os negros e negras. E esta reocupação precisa começar aqui e agora, em torno das questões imediatas: a luta contra a pandemia e pela vacinação para todos e todas, a luta contra o desemprego e pelo auxílio emergencial de 600 reais e mais, a luta pelo Fora Bolsonaro imediato, com antecipação das eleições e garantia dos direitos políticos de Lula (que estarão novamente em questão na reunião do STF dia 14 de abril). Neste sentido, o centro da tática não está nas eleições presidenciais de 2022, mas sim na disputa em curso neste ano de 2021. É para esta disputa que temos que “colocar o bloco na rua”; sem esta disputa, nossas chances de vencer as próximas eleições presidenciais, de tomar posse caso vitoriosos e de conseguir governar serão muito reduzidas (sem falar que não sabemos como estará o país, caso Bolsonaro siga “presidindo” até o final de 2022. Basta pensar na aberta articulação que o bolsonarismo faz para usar as Polícias Militares contra os governos estaduais da oposição; ou na intimidação contra ativistas, lançando mão da LSN, que precisa ser revogada).

12.É preciso construir maneiras que nos permitam subir o tom e dar visibilidade de massas à insatisfação crescente. Não basta fazer oposição parlamentar, lives e carreatas pontuais. É preciso retomar a mobilização, é preciso reocupar as ruas, é preciso colocar a classe trabalhadora em movimento, é preciso radicalizar na luta contra o governo genocida e suas políticas. Por exemplo convocando – por iniciativa da Frente Brasil Popular e da Frente Povo Sem Medo – variadas formas de paralisação nacional/greves gerais contra este governo que está matando o povo brasileiro. Ao mesmo tempo, nossos governos estaduais e municipais, nossas bancadas, as organizações de massa que influenciamos, bem como nosso Partido e sua área de influência precisam articular e implementar um programa comum de combate ao Covid 19, que parta do princípio de que Bolsonaro é o maior aliado do vírus e que seu impeachment sanitário é uma medida de salvação nacional. E que a antecipação das eleições presidenciais é a única saída democrática para a crise, recusando alternativas conservadoras como o parlamentarismo ou a posse do vice-presidente.

13.O balanço que fazemos das eleições municipais de 2020 também nos leva a reafirmar que o acúmulo de forças prévio na luta social, política e cultural é uma variável fundamental para o desfecho dos processos eleitorais. Neste sentido, como já dissemos, se queremos ter um ótimo desempenho nas próximas eleições presidenciais, é preciso concentrar energias nas batalhas em curso neste ano de 2021. Isto é ainda mais importante quando lembramos que uma de nossas batalhas (ao lado da vacinação, de um auxílio adequado, por emprego e desenvolvimento) é pelo impeachment de Bolsonaro e pela convocação de novas eleições. Sempre haverá quem diga que “não será possível aprovar o impeachment no Congresso”, “se sai Bolsonaro, vai entrar Mourão”, “com ou sem impeachment, as eleições continuarão sendo em 2022”. Sem prejuízo da discussão dessas e de outras afirmações similares, entendemos que o PT, a esquerda e a classe trabalhadora temos a obrigação moral e política de lutar pelo Fora Bolsonaro e por novas eleições (até porque a decisão do STF sobre Lula confirma que a eleição de 2018 foi uma fraude). Caso tenhamos êxito em derrotar Bolsonaro e antecipar as eleições, isto terá efeitos sanitários e políticos extremamente positivos, independente dos desdobramentos e efeitos colaterais, sobre os quais tudo que se diz hoje não passa de mera especulação. Caso não tenhamos êxito, a luta pelo Fora Bolsonaro e por novas eleições serve para acumular forças em favor de mudanças mais radicais.

14.A restituição dos direitos políticos de Lula – que parte importante da direita segue questionando, questionamento que não devemos subestimar – nos garante uma candidatura forte para as próximas eleições presidenciais, seja em 2022, seja antes. Este fato gera, em amplos setores do PT, duas ilusões que devemos combater: 1/a de que Lula já tem maioria garantida na classe trabalhadora, eleitoral e política; 2/a de que, portanto, devemos buscar compor uma aliança com todos os setores não bolsonaristas. Acontece que a rejeição ao PT segue muito forte, assim como segue forte o apoio à direita, inclusive o apoio à extrema-direita bolsonarista. Por outro lado, há diferenças programáticas profundas entre nós e todas as direitas (bolsonaristas ou não). Alianças devem ser feitas em torno de programas e tirar Bolsonaro é apenas uma parte do nosso programa; tão importante quanto tirar Bolsonaro é mudar a política do atual governo e, além disso, implementar políticas de médio e longo prazo de efetiva transformação. Nesse terreno, programático, não existem bases para uma aliança ampla.

15.Portanto, inclusive por razões programáticas, é preciso deixar claro sempre que a candidatura petista disputará o primeiro turno das próximas eleições presidenciais. Não devemos alimentar ilusões em alianças nacionais com o PDT de Ciro Gomes, nem com o PSB. Ambos partidos estão dominados por uma lógica antipetista, como ficou claro na recente reunião de Lula com a cúpula do PSB, ao término da qual o presidente nacional do PSB deixou claro que não pretende apoiar o PT na disputa presidencial de 2018. Devemos nos concentrar em buscar alianças nacionais com o PCdoB e com o PSOL, inclusive tendo sensibilidade para soluções que contribuam para que estes partidos superem as restrições da clausula de barreira. Entretanto, também devemos estar prontos para um cenário que nunca se verificou, entre 1989 e 2018: o de termos uma candidatura petista no primeiro turno, sem aliança com nenhum outro partido que seja relevante.

16.No segundo turno, a direita pode estar representada por Bolsonaro, mas também pode estar representada por uma candidatura da direita gourmet. Neste sentido, é um erro comprometer o PT com uma unidade de segundo turno com a direita anti-Bolsonaro. Primeiro, porque isso pode passar a impressão de que não acreditamos que vamos estar no segundo turno. Segundo, porque isso implicaria – no primeiro turno – tratar a direita não bolsonarista como aliada ou pelo menos merecedora de um tratamento mais suave (tendo em vista atraí-los no segundo turno). E não há como ser suave com uma direita que além de neoliberal, não é democrática. Terceiro e mais grave, falar em unidade de segundo turno com a direita gourmet abre a porta para discutir uma aliança de primeiro turno, em que a direita gourmet vai seguir exigindo que o PT abra mão da candidatura presidencial. Claro que o fato de hoje termos Lula como candidato enfraquece esta pressão; mas por diversos motivos já se demonstrou ser um erro fazer nossa tática depender única e exclusivamente do fator Lula.

17.Nas eleições estaduais, para governo e senado, bem como para a Câmara dos Deputados, nossa tática deve estar organizada pela disputa nacional. Do nosso ponto de vista, isto significa compor uma frente de esquerda, com um programa democrático-popular de orientação socialista, de combate contra as duas direitas que destroem o país. Evidente que um setor do Partido buscará adotar em cada estado a política que aparentemente seja mais útil para a vitória eleitoral naquele respectivo estado. É preciso desde já combater esta dinâmica, seja pelos efeitos que causará sobre a política nacional, seja pelos efeitos constrangedores que tem sobre a política estadual.

18.Devemos nos esforçar para lançar e eleger candidaturas a governos estaduais, ao senado e para a Câmara de Deputados, que tenham compromisso com a defesa de um PT democrático, popular e socialista. E, sempre que for possível, devemos lançar e eleger candidaturas vinculadas à tendência petista Articulação de Esquerda; e onde isto não for possível, apoiar preferencialmente candidaturas de outros setores da esquerda partidária. Nesse sentido, iniciaremos desde já um contato com as direções da tendência nos estados para fazer um mapa da situação e ver como podemos contribuir.

19.Nas próximas eleições presidenciais, terá grande importância o debate programático. Nesse sentido, continuaremos pressionando para incluir – no programa de Reconstrução e transformação aprovado pelo DN do PT – as medidas que propusemos sobre as Forças Armadas, sobre o capital financeiro, sobre o agronegócio, sobre a Constituinte, entre outras.

20.O êxito da luta contra o governo Bolsonaro depende em boa medida das escolhas que venham ser feitas pelo Partido dos Trabalhadores. E a verdade é que o PT está dividido profundamente em torno da linha política a adotar. As recentes polêmicas na reunião do Diretório Nacional e as que se travaram sobre a Caixa Econômica Federal e sobre um possível apoio de Joaquim Barbosa são apenas os exemplos mais recentes. As resoluções do 7º Congresso Nacional do PT – até hoje não publicadas, porque até hoje não foram devidamente finalizadas pelo Diretório Nacional – não dão conta da situação que vivemos. Por isso defendemos convocar um Encontro nacional extraordinário, único espaço idôneo para dirimir as profundas divergências que impedem nosso partido de cumprir seu papel nesta conjuntura dramática que o país vive. Mas o Diretório Nacional recusou convocar um encontro extraordinário, motivo pelo qual apoiamos a iniciativa de convocar um encontro nacional livre para debater as questões programáticas, estratégicas e táticas inescapáveis.

20.Por fim: vivemos um momento de crise profunda, em que parece que tudo pode acontecer, inclusive nada. Mas o mais provável é que – frente ao avanço da peste, da morte, da fome e da guerra – haja um aprofundamento da disputa política no país. Se o povo brasileiro não entrar em cena, a disputa será resolvida na luta entre as diferentes quadrilhas da classe dominante, com parcelas da esquerda aceitando escolher o suposto mal menor. Só uma grande onda de lutas sociais reverterá a catástrofe. O PT deve fazer de tudo para estimular e buscar dirigir esta luta. Sem ilusões no STF, no parlamento, nas forças armadas e na classe dominante. A salvação da classe trabalhadora só pode ser obra da própria classe trabalhadora.

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4)  Projeto de resolução sobre “Tarefas e funcionamento da tendência petista Articulação de Esquerda”

(versão final, 8 de abril de 2021, que será debatida no Congresso)

A direção nacional da tendência petista Articulação de Esquerda submete ao 6º Congresso nacional da AE o seguinte projeto de resolução:

1.A tendência petista Articulação de Esquerda (AE) foi criada em setembro de 1993. Falta pouco para concluirmos três décadas de existência. Nossa história já é parte da história do PT e da classe trabalhadora brasileira. Entretanto, não queremos que a AE tenha “um grande passado pela frente”. Nosso principal objetivo é que o Brasil seja um país socialista. E nossa contribuição específica neste sentido é lutar, como estamos fazendo desde 1993, para que o Partido dos Trabalhadores seja efetivamente democrático, socialista e revolucionário. Este é o sentido principal da existência da AE e é por isto e para isto que seguiremos construindo nossa tendência e buscando realizar alianças com outros setores do Partido.

2.Em outras resoluções explicamos detalhadamente o que significa a estratégia democrático-popular e socialista que defendemos que nosso Partido dos Trabalhadores adote e implemente; assim como explicamos por quais motivos consideramos que nosso Partido dos Trabalhadores é um dos instrumentos necessários para a luta pelo socialismo no Brasil, neste período histórico em que vivemos. Na presente resolução, nos limitaremos a detalhar as “tarefas” e o “funcionamento” da tendência petista Articulação de Esquerda” no biênio 2021-2022.

3.No Brasil, assim como nos demais países do mundo, nunca foi tarefa fácil construir um partido da classe trabalhadora, um partido que seja democrático, socialista e revolucionário, capaz de influenciar a maioria da classe trabalhadora e ter protagonismo na luta política nacional e internacional. Pressões externas e internas dificultam e ameaçam o tempo todo a realização destes propósitos. E, em alguns momentos, estas pressões negativas se impõem, deformando de maneira profunda suas características e/ou colocando em risco a própria sobrevivência dos partidos da classe trabalhadora. Por razões análogas, nunca foi e segue não sendo tarefa fácil construir uma tendência com os propósitos da Articulação de Esquerda, em um Partido que desde 1995 vem sendo dirigido por um grupo que defende orientações programáticas e estratégicas cada vez mais distantes do socialismo e da revolução, além de recorrer a métodos internos que substituem a democracia da classe trabalhadora por métodos típicos da democracia liberal burguesa.

4.As tarefas da AE (que, de forma mais ou menos semelhante, são também assumidas por outros setores do Partido) se tornaram ainda mais difíceis de cumprir desde 2016, pois frente ao golpismo da classe dominante e frente à intensificação da “concorrência” de outros partidos de esquerda, o grupo que dirige o Partido desde 1995 vem adotando métodos que consideramos cada vez menos democráticos e cada vez mais “suicidas”, no sentido de que insiste em uma estratégia historicamente superada, cuja implementação nos dias que correm ameaça a sobrevivência do próprio Partido. É importante dizer que as dificuldades se acentuaram a partir do golpe de 2016, não apenas por causa de fatores objetivos – que causaram imensos retrocessos na consciência, na organização e na capacidade de luta da classe trabalhadora, sem o quê nenhuma esquerda é possível – mas também por conta de fatores subjetivos: paradoxalmente, em amplos setores do Partido, o golpe e o refluxo da classe trabalhadora produziu um comportamento programático e estratégico mais moderado, mais rebaixado, mais adaptado, mais conciliador, mais institucional. Paradoxal, mas compreensível: afinal, quem não possui visão estratégica, quem só é capaz de pensar em termos táticos, tende a ser mais afetado em situações como as que vivemos, oscilando entre a euforia e a depressão.

5.Entretanto, todas estas imensas dificuldades não alteram – nem antes, nem agora – a decisão da Articulação de Esquerda de seguir disputando os rumos do Partido dos Trabalhadores, em particular lutando por uma tática que nos permita derrotar o conjunto dos golpistas e neoliberais, por um programa efetivamente transformador e por uma estratégia democrática-popular e socialista. Aliás, neste contexto de refluxo como o que vivemos, adotar outra conduta produziria derrotas ainda maiores. Por exemplo: se a esquerda petista não disputar os rumos do PT, o efeito prático será um partido mais suscetível de ser derrotado pela classe dominante. E se a classe dominante tiver êxito em derrotar o PT, será ainda mais difícil derrotar o programa reacionário que prejudica a classe trabalhadora brasileira, suas liberdades democráticas, seus direitos sociais, as perspectivas do desenvolvimento e da soberania nacional. Portanto, nós da AE seguiremos disputando os rumos do PT e, com esta finalidade, seguiremos construindo a tendência petista Articulação de Esquerda.

6.Entretanto, a piora nas condições objetivas e subjetivas vigentes no mundo e no Brasil, o refluxo da classe trabalhadora e as dificuldades experimentadas por várias organizações populares, em particular a degradação da democracia interna do PT e o comportamento “suicida” do grupo atualmente majoritário nos obrigam a fazer ajustes importantes em nosso funcionamento interno, entre os quais: 1/adotar métodos organizativos mais rigorosos, 2/reforçar nossas finanças militantes, 3/qualificar e ampliar a difusão de nossos instrumentos de comunicação, 4/melhorar a qualidade política e ideológica de nossa militância (através de políticas de comunicação, de formação e de organização), 5/prezar cada vez mais pelo respeito às nossas resoluções, 6/fazer funcionar de modo permanente e proativo nossas instâncias e direções, 7/garantir que todo militante integre um organismo da tendência e esteja envolvido em algum nível no trabalho de reconquista da classe trabalhadora (nos ambientes de moradia, de trabalho, de estudo, de cultura&lazer), 8/bem como integrado no trabalho de construção do próprio PT. Os ajustes citados constituem parte importante da resposta que devemos dar ao comportamento do grupo atualmente majoritário na direção nacional do PT, grupo que se comporta cada vez mais como um “partido dentro do partido”.

7.Ao longo do biênio 2021-2022, implementaremos as seguintes tarefas:

*realizar em todos os estados e no maior número possível de cidades, plenárias abertas de apresentação das resoluções da primeira etapa do 6º congresso da AE;

*realizar a segunda etapa do 6º congresso virtual 2021 no maior número possível de estados e cidades, sendo que cada congresso deve aprovar uma resolução política e organizativa específica (sobre a cidade e/ou estado respectivo), bem como eleger uma direção com real capacidade operacional;

*onde não conseguirmos realizar congressos estaduais, caberá à Direção nacional convocar plenárias para organizar a tendência, tendo como meta chegar ao final de 2021 com direções em todos os estados brasileiros e direções municipais nas 49 cidades com mais de 500 mil habitantes;

*deflagrar, ainda em 2021, uma campanha especial de finanças, com o objetivo de receber doações de simpatizantes da tendência para sustentar e ampliar nossas atividades de formação e comunicação;

*manter nossos atuais meios de comunicação (site Página 13, Poadcast, Antivírus, Contramola, jornal Página 13Orientação MilitanteEsquerda Petista, editora Página 13), ampliar sua qualidade e organizar sua difusão profissional;

*manter a realização anual de 1 jornada nacional de formação política, bem como estimular que os estados e municípios façam o mesmo;

*realizar plenárias nacionais, sob convocação e coordenação da Dnae em articulação com as coordenações setoriais e direções estaduais e municipais, para debater nossa intervenção nas mais diferentes frentes de atuação (por exemplo: saúde, comunicação, moradia, rurais, juventude, mulheres, combate ao racismo, LGBT, direções partidárias, governos, bancadas, eleições 2022 etc.);

*continuar apoiando o projeto da Elahp, o projeto do blog MANIFESTO PETISTA e a proposta de convocação de um “encontro nacional livre”, para debater temas estratégicos e programáticos.

8.Cabe reafirmar que nossa principal tarefa – e, também, a principal tarefa do Partido dos Trabalhadores – em 2021 e 2022 segue sendo reconquistar maioria na classe trabalhadora. No limite, é isto que almejamos, quando buscamos ampliar nossa organicidade (direções estaduais, direções municipais, coordenações setoriais, organismos de base): ampliar a influência de nossas posições na classe trabalhadora, em particular na juventude trabalhadora, entre as mulheres, negros e negras.

9.Lembramos que nossa influência na classe trabalhadora se dá, primeiramente, através da presença e fortalecimento do PT, da CUT, do MST, da UNE, Ubes e demais organizações do campo democrático-popular e socialista. Em segundo lugar, se dá através da nossa presença (que buscaremos seja majoritária e hegemônica) nas direções das organizações populares, com destaque para as citadas. Em terceiro lugar, é preciso ampliar a presença direta (física e virtual) organizada de militantes da AE nos ambientes de moradia, trabalho, estudo, cultura&lazer. Uma de nossas diretrizes é que cada um de nossos militantes se envolva diretamente, em algum nível, em um trabalho de massa.

10.Onde temos e onde viermos a eleger parlamentares e executivos vinculados a AE, é fundamental que sua atuação seja diferenciada, não apenas no que diz respeito à linha política, mas também na maneira de estabelecer relação com a classe trabalhadora, evitando o que ocorre em vários mandatos de esquerda, que acabam convertendo-se em micro organizações cujo objetivo é a reeleição permanente. Os mandatos não devem substituir nem se sobrepor ao trabalho do Partido junto à classe trabalhadora; os mandatos tampouco devem substituir ou se sobrepor ao trabalho da AE na disputa de rumos do PT.

11.A atual direção nacional do Partido tem mandato até 2023. Infelizmente, o grupo que é majoritário nesta atual direção não vem se demonstrando à altura das tarefas que decorrem da situação política nacional e mundial. Nem tem demonstrado disposição em contribuir para mudar a estratégia adotada pelo Partido desde 1995. Entretanto, este grupo vem fazendo um grande esforço no sentido de manter e perpetuar sua atual maioria. De nossa parte, seguiremos pressionando por uma mudança na linha política e nos métodos de funcionamento. Mas não temos ilusões de que esta mudança vá ocorrer voluntariamente ou de que bastarão os processos eleitorais internos para que a mudança ocorra. Em nossa opinião, uma mudança de rumos e de direção no Partido depende da ocorrência de uma grande onda de lutas populares e/ou de alguma imensa reviravolta política, que impactem o partido de fora para dentro e de baixo para cima. Entretanto, continuará sendo necessário lançar chapas e candidaturas para disputar as direções partidárias em todos os níveis, sempre cuidando do fundamental: política no comando, demarcar o campo de classes, acumular forças em favor de nosso objetivo, um Partido dos Trabalhadores democrático, socialista e revolucionário. Ainda é cedo para determinar qual a tática que adotaremos na disputa interna de 2023; entretanto, seja qual for, devemos ampliar nossa presença na classe, ampliar nossa organicidade e filiar mais militantes no PT.

12.Lembramos sempre que a AE não é uma “cooperativa de anjos”. Portanto, muitos dos problemas que existem na classe trabalhadora e no PT, também existem dentro da AE. Uma diferença fundamental, entretanto, é que nos propomos a combater duramente e de maneira proativa estes problemas, para evitar que mimetizemos as práticas do grupo atualmente majoritário dentro do PT. Isto muitas vezes gera incompreensões noutros setores do Partido e até mesmo em nossa própria militância, mas consideramos que se não fizermos este combate duro, mais cedo ou mais tarde acontecerá conosco o que aconteceu com outras tendências do PT e – paradoxalmente – também aconteceu com grupos que saíram do PT, mas que hoje defendem políticas similares às defendidas pelo grupo majoritário na direção nacional do PT.

13.Lembramos por fim, mas não menos importante, que a tendência petista Articulação de Esquerda não é um “partido dentro do partido”. Fomos criados dentro do PT, existimos para disputar os rumos do PT. Exatamente por isto não fazemos segredo de nossas posições; pelo contrário, oferecemos nossa contribuição prática e teórica em todos os terrenos da atuação partidária, sempre com o objetivo de fazer com que nosso Partido reincorpore a defesa de um programa e de uma estratégia democrática-popular e socialista.

Viva o PT!

Viva a classe trabalhadora!

Viva o socialismo!

 

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