Balanço das eleições 2020 no estado de São Paulo

Eleições 2020 no estado de São Paulo

O balanço necessário de uma grave derrota eleitoral e política

Para reagir e vencer é preciso uma nova estratégia para o PT SP

As eleições municipais de 2020 acentuaram uma tendência que vem se impondo na conjuntura política do estado de São Paulo há vários anos.

Já nas eleições de 2016 era evidente que o péssimo resultado eleitoral de então denotava sérios problemas políticos e organizativos que vinham se acumulando em nosso PT-SP há vários anos. Naquela ocasião, o peso da derrota eleitoral se fez sentir na imediata continuidade do afastamento definitivo da companheira Dilma da presidência da República, que se dera no final de agosto daquele ano, já em meio ao curto período oficial de campanha.

No terreno eleitoral, confirmava-se então a seríssima derrota estratégica que havíamos sofrido meses antes. Com efeito, nas eleições de 2016, dos 645 municípios paulistas, o PT foi vencedor em apenas 8 cidades: Araraquara (228.664 habitantes), Franco da Rocha (147.650); Cosmópolis (67.960); Rincão (10.809); Barra do Chapéu (5.619); Motuca (4.642); Itapirapuã Paulista (4.161) e Nantes (3.014). Em 2012 havíamos eleito 74 prefeitos no estado.

Em 2020, depois de atravessarmos nova derrota expressiva nas eleições gerais de 2018 no estado de SP, observamos uma regressão no número de cidades governadas pelo PT, num sinal evidente de que não revertemos as tendências negativas que vem se acumulando. Desta vez elegemos apenas 4 prefeitos, sendo que em Araraquara tivemos reeleição, além de vencermos em Diadema, Mauá e Matão.

Cumpre destacar que em 2016 o PT lançou candidaturas a prefeito em apenas 94 munícipios dos 645 existentes no Estado, ao passo que em 2020 foram lançadas 131 candidaturas. Comparativamente, em 2012 foram lançadas candidaturas em 251 cidades.

Fica claro, portanto, que estamos muito distantes de recuperar o patamar político e organizativo de oito anos atrás. É também inescapável a conclusão de que o golpe teve efeitos devastadores na implantação territorial do PT no estado e que nossa construção anterior era fragilíssima do ponto de vista orgânico e político-ideológico.

Já em 2020, o primeiro importante elemento de balanço geral é que um grande número de eleitores no estado de São Paulo não compareceu para votar, votou branco ou votou nulo. De um total de 33.570.719 eleitores aptos, 9.164.470 não compareceram para votar. Dos que compareceram para votar, 3.338.815 votaram branco ou nulo. Ou seja,12.503.285 eleitores não votaram em nenhuma das candidaturas.

Este é o mais alto percentual de abstenção, brancos e nulos da história eleitoral recente no estado, chegando à impressionante marca de 37,22% do total do eleitorado. Parte das análises simplesmente desconsidera este eleitorado. É como se ele não existisse, como se fossem invisíveis. Na prática, isto quer dizer que parte expressiva da população escolheu não participar politicamente, instituindo uma espécie de voto facultativo de fato (ainda que não de direito). Um partido de esquerda não pode desconhecer ou subestimar estes fatos, que afetam sobremaneira trabalhadores e trabalhadoras pobres.

Na abstenção de 2020, é preciso considerar a pandemia e o estímulo que o TSE deu ao não comparecimento, ao facilitar a justificativa de voto. mas precisamos levar em conta também outros fatores, entre os quais a decepção com a participação política eleitoral, especialmente entre eleitores que em 2018 votaram em Bolsonaro, e que em eleições anteriores apoiaram as candidaturas de Lula e Dilma.

Para quem olha o eleitorado como uma massa homogênea, ou apenas dividida por opções políticas, isso não faz muita diferença. Mas para nós, que consideramos obrigatório levar em conta a classe social dos eleitores, que buscamos descobrir como votaram os diferentes segmentos sociais, é chave compreender as motivações dessas massas populares que se abstiveram, votaram branco e nulo, até porque uma implicação prática desta abstenção tão alta é que o voto dos setores médios cresceu de importância relativa, elitizando o eleitorado, com implicações inclusive na distribuição de votos entre os partidos de esquerda.

Os partidos de esquerda com legenda eleitoral no estado de São Paulo (PT, PSOL, PCdoB, PSTU, UP, PCO) tiveram 2.852.109 votos. Ou seja, de um total de 20.462.889 votos válidos, cerca de 13,94% votou em candidaturas lançadas pelo “núcleo duro” da esquerda. Aqui, vale esclarecer que os números acima citados são para prefeito. Poderia ter sido feita uma análise também do voto para vereadores, os números seriam um pouco diferentes, mas o sentido global não mudaria. Mas, claro, partimos do princípio de que o voto majoritário tende a ser mais programático do que o voto proporcional.

Há que se destacar o avanço da votação do PSOL que logrou obter 1.302.225 (6,36% dos votos válidos), se aproximando da votação global do PT no estado, que foi ligeiramente maior (1.496.828/7,31% dos votos válidos). Importante ressaltar que o resultado do PSOL se deve fundamentalmente ao seu desempenho na disputa da capital.

De conjunto, estes partidos de esquerda elegeram apenas 6 prefeitos no estado, menos de 1% do total, em cidades que concentram apenas 2,67% da população do estado. Em relação a 2016, os partidos de esquerda elegeram menos 3 prefeitos.

Quando olhamos para o bloco formado pelos partidos de “centro- esquerda” (PSB, PDT, PV e Rede), que fazem uma oposição moderada a Bolsonaro e a Dória, se aliando a este em várias localidades, lograram alcançar apenas 8,91% dos votos, elegendo 36 prefeitos que governam 3,32% da população do estado. Em relação a 2016, este “bloco de centro- esquerda” teve a maior perda, elegendo menos 52 prefeitas/os. Destaca-se neste bloco a votação do PSB, que não obstante, perdeu 27 prefeituras.

A soma, portanto, da votação dos blocos de “esquerda” e “centro- esquerda” corresponde a 22,85% dos votos válidos no estado de São Paulo.

No espectro oposto, vemos que o grande vitorioso das eleições no estado de São Paulo foi o bloco de direita capitaneado pelo PSDB, partido que sozinho teve 26,63% dos votos, elegendo 172 prefeitos que governam 48,13% da população do estado.

Quando ampliamos este campo para os aliados do PSDB que compõe a base parlamentar do governo na Alesp, a vitória da direita é ainda mais acachapante, com 62,32% dos votos, que deram a vitória a 532 prefeitos que governam 84,02% da população do estado, crescendo em 40 cidades governadas em relação a 2016.

Completando o quadro, temos o desempenho dos partidos de extrema- direita, que ainda que tenham regredido em relação a 2018, quando surfaram na “onda Bolsonaro”, ainda assim tiveram um desempenho superior à esquerda em 2020. De conjunto, estes partidos tiveram 14,84% da votação geral e elegeram 47 prefeitas/os que governam 8,75% da população do estado, com um crescimento de 31 prefeituras àquelas eleitas em 2016. Destaca-se neste bloco a votação do Republicanos, ligado à ala evangélica do bolsonarismo, além das votações do Patriota e do PSL.

Os dados das votações acima descritas estão detalhados no Quadro 2, em anexo.

Quando analisamos a situação de conjunto e em perspectiva no período 2014-2020, os traços fundamentais da conjuntura estadual no atual período combinam uma profunda derrota política do PT e um revigoramento da hegemonia neoliberal caracterizada pela vitória eleitoral do PSDB e uma persistência da força relativa da extrema direita no estado, ao mesmo tempo em que se avolumam crescentes sinais de instabilidade política e social, agravadas de forma aguda pela crise sanitária causada pela pandemia da Covid-19.

A instabilidade social é diretamente ligada à deterioração acelerada das condições de vida das grandes massas.

O estado de SP se conformou nos últimos anos, pelo menos desde 2013, como a ponta de lança e o “quartel general” das forças golpistas que lograram levar a cabo o impeachment da presidenta Dilma e deram a vitória a Bolsonaro em 2018.

Ao longo deste período, o grande capital sediado em SP logrou efetivar uma operação de cerco sobre a esquerda, que se pretende consumar com anulação e, no limite, aniquilamento, a depender dos ritmos e processo da luta de classes.

É vital, portanto, superar todas as ilusões implícitas na conciliação de classes e construir uma política capaz de romper o cerco e nos levar à contraofensiva.

A debilidade da oposição de esquerda ao governo Dória vem contribuindo para uma situação desastrosa em que a polarização da política paulatinamente desliza da tradicional disputa “esquerda x direita” para uma disputa “direita x extrema direita”, na qual os dois polos têm acordo no fundamental para os interesses da burguesia: a manutenção e ampliação da aplicação da política econômica ultraliberal.

A burguesia paulista adotou uma tática agressiva de levar a disputa política e ideológica para as ruas, até então arena política cativa da esquerda. Neste movimento lançaram mão de todos os meios à sua disposição, a começar pelo aparato do governo do estado, dentro do qual a PM ocupa um local especial, passando pela FIESP (que cada vez mais assume de forma desenvolta um papel político) e pelos grandes meios de comunicação de massa.

O objetivo central dos golpistas foi alcançado com o impeachment de Dilma e a consequente implantação do programa ultraliberal da “ponte para o futuro”. Ao levar a disputa política para o terreno das mobilizações de massas, a burguesia ofereceu o terreno para que extrema direita deslocasse a direita tucana ao colocar no debate político o seu diapasão da demagogia pretensamente anti-sistema.

Com efeito, em 2018, a burguesia não teve dúvidas em apoiar Bolsonaro contra o PT quando a sua candidatura preferida (Alckmin -PSDB) naufragou. Para a burguesia, trata-se, acima de tudo, de impor a ferro e fogo um programa de “ajuste econômico” brutal, materializado nas propostas de reformas regressivas que impõe o teto nos gastos públicos nas áreas sociais, principalmente saúde e educação, destrói a previdência social e os direitos trabalhistas e ataca brutalmente o funcionalismo público com as privatizações e a proposta de reforma administrativa.

Para levar a cabo este programa, será necessário quebrar a resistência dos trabalhadores, das mulheres e da juventude, generalizando e ampliando a escalada repressiva que de há muito é praticada contra as populações das periferias das grandes cidades, em especial contra a juventude negra.

Funcional para este propósito também será, pelo menos por um determinado tempo, a ampliação do desemprego e o consequente crescimento do “exército industrial de reserva”, usado pelo grande capital na queda de braço por uma redução estrutural no valor da força de trabalho, batalha em curso que passa pela ampliação e generalização das terceirizações e pela desindustrialização crescente do parque produtivo do estado.

O “conjunto da obra” aponta então, reiteramos, para um quadro de ampliação da instabilidade social e política no estado. A “instabilidade social” tem várias facetas, mas tem registros fortes com o visível aumento da “população de rua” nas cidades, bem como aumento exponencial da violência urbana e da truculência assassina do aparato repressivo do estado.

É neste cenário instável que é preciso situar a gravidade da derrota eleitoral do PT no estado de São Paulo na última eleição.

O fato central e base material do cenário que vem se desenhando há tempo, é que ao lado da ofensiva ideológica pesada da burguesia através dos seus aparatos comunicacionais e de táticas abertas de disputa das ruas até então historicamente hegemonizadas pela esquerda, a “greve de investimentos” do grande capital fortemente implantado em São Paulo foi fator determinante para criar o cenário político devastador que jogou o PT numa defensiva profunda no estado.

Contra toda lógica e sinais, grande parte dos dirigentes do PT paulista acreditou que seria possível desconectar a campanha eleitoral do debate geral sobre a situação política do país, na falsa perspectiva de “municipalizar” a disputa tratando dos temas locais.

Assim, deixamos o flanco aberto para os ataques dos inimigos que, eles sim, trataram de surfar na onda do antipetismo histérico insuflado cotidianamente com a pauta nacional em destaque nos meios de comunicação.

Via de regra, nossas campanhas praticamente deram peso quase total às pautas municipais, descontextualizadas das conjunturas estadual e nacional. Com raras exceções que confirmam a regra, nossas campanhas não levantaram a questão do Fora Bolsonaro! e tampouco a questão da luta pela anulação das condenações de Lula.

A direita, ao contrário, politizou ao extremo a campanha, principalmente no segundo turno, explorando a fundo a ideia do antipetismo, sem uma reação à altura da nossa parte.

Este quadro de conjunto criou as condições para uma vitória inequívoca da direita nas maiores cidades do estado, com destaque para a capital, onde o PT cometeu equívocos graves que merecem uma análise específica.

Na região metropolitana de São Paulo, em que pese nossas importantes vitórias em Diadema e Mauá e o fato de termos ido ao segundo turno em Guarulhos, de conjunto nosso desempenho foi muito ruim, com derrotas duras no primeiro turno em cidades importantes e simbólicas como São Bernardo do Campo, Santo André e Osasco.

Na capital, o resultado da campanha eleitoral confirmou que o companheiro Fernando Haddad deveria ter sido candidato a prefeito. Mas o Diretório Nacional do PT decidiu, pelo voto da maioria de seus integrantes, que não convocaria o companheiro Haddad para esta tarefa.

Ao agir assim, o DN aceitou que os interesses individuais se sobrepusessem às necessidades coletivas; não é de admirar que o desfecho disso tenha sido que muita gente achasse ser natural desrespeitar a posição do Partido. Se o PSOL e Boulos conseguiram ir ao segundo turno, Haddad muito provavelmente também conseguiria.

A este erro de origem ligado à negativa de lançarmos uma candidatura capaz de disputar com chances de vencer e polarizar, está ligado o profundo equívoco que foi o processo de escolha da nossa candidatura a prefeito, com uma autoritária posição contrária à realização de prévias, alijando dezenas de milhares de militantes e filiados do debate político e confinando-o a um pequeno “colégio eleitoral” sob controle. Além do viés antidemocrático, em si lamentável, subtraiu-se ao conjunto do Partido um processo que daria densidade política ao debate da conjuntura e do nosso programa.

Tão grave quanto a situação referida acima, foi a postura adotada por vários setores partidários que, na prática, fizeram coro às pressões externas, em especial da mídia burguesa, e sabotaram a candidatura petista em nome de um suposto “voto útil” na candidatura do PSOL.

Na prática, esta tese foi desmentida pelos fatos, pois a existência de várias candidaturas de esquerda (tanto em SP quanto em outras capitais) não impediu uma delas de ir ao segundo turno, como quis fazer-se crer em muitas análises e operações políticas, inclusive na esquerda e centro-esquerda. Aliás, a existência de mais de uma candidatura majoritária da esquerda foi um fator importante, em muitas cidades, para viabilizar o segundo turno, para disputar votos com a direita, para manter ou ampliar as bancadas de esquerda.

É importante salientar que o PT deliberou lançar candidaturas próprias no maior número possível de cidades, deliberou não fazer alianças com partidos bolsonaristas e ultraliberais, deliberou fazer campanhas nacionalizadas. Mas, na prática, a teoria foi outra. Lamentavelmente, em várias cidades a regra foi “naturalizar” as alianças com partidos golpistas, de direita.

Frise-se que as ilusões na constituição de uma Frente Ampla, a demora em adotar a consigna Fora Bolsonaro e a concentração na oposição parlamentar constituíram erros graves que contribuíram para a relativa estabilidade e fortalecimento do presidente.

Apesar da pandemia, a massa da classe trabalhadora deu continuidade à dura luta pela sobrevivência. Mas parte importante da vanguarda se resguardou. Iniciado o calendário eleitoral, mesmo sem ter sido superada a crise pandêmica, parte importante da vanguarda foi às ruas. É preciso dar continuidade ao contato com as massas.

O anúncio presidencial de desprezo pela vacina contra o COVID-19 e manutenção da agenda neoliberal indicam que manter e aumentar a mobilização trata-se, literalmente, de questão de vida ou morte. Medidas sanitárias são importantes, mas não podemos perder vínculo com a classe trabalhadora.

No estado de São Paulo, é essencial qualificar e intensificar em muito a oposição ao governo Dória. Como ficou evidente no processo eleitoral e nos últimos meses que se seguiram à eleição, o PT vem deixando o terreno livre para Dória adotar uma suposta postura de “campeão no combate à pandemia” que não corresponde absolutamente aos fatos.

Ocorre que a pandemia da Covid-19 no Brasil, combinada ao completo descaso do governo federal com as condições de vida e com a própria vida da imensa maioria da população, abriu uma janela de oportunidade para que governadores eleitos em grande medida pelo impulso resultante da vinculação de suas campanhas a Bolsonaro em 2018, buscassem descolar sua imagem daquele que, deliberadamente, apostou no vírus e na política de morte para a condução dos rumos do país.

Doria foi um dos exemplos mais emblemáticos deste movimento. Como não poderia ser diferente em se tratando de um governador eleito por um partido neoliberal com vasto histórico de ataques aos direitos da maioria da população, o suposto empenho no combate à pandemia vem embalado fundamentalmente em ações de propaganda e marketing, como fica evidente na recente “guerra das vacinas”.

Inicialmente, as ações do governo do Estado buscavam “conscientizar” a população sobre a importância de ficar em casa, sem oferecer nenhuma alternativa concreta para que a grande maioria dos trabalhadores e trabalhadoras pudessem fazê-lo sem que fossem comprometidas suas fontes mais básicas de renda e, portanto, de sobrevivência.

Não foi necessário muito tempo para que ficasse evidente a completa impossibilidade de um governo que opera sob a lógica do neoliberalismo implementar uma política efetiva de combate ao coronavírus. Sucumbindo rapidamente à pressão do empresariado, o governo do estado não hesitou em afrouxar as já bastante frágeis medidas de contenção e combate à pandemia.

Paralelamente às propagandas em que o governo estadual apregoava preocupação com a vida das pessoas, o judiciário paulista autorizava inúmeras reintegrações de posse em plena pandemia, desabrigando centenas de famílias em várias regiões do estado.

Hoje, um ano após o início da pandemia no Brasil, o estado de São Paulo já atinge a alarmante marca dos 1.849.334 casos confirmados da doença (19,47% do total de casos confirmados no país, dados de 7/2/2021) e 54.614 óbitos (23,64% do total de óbitos no Brasil, dados de 7/2/2021).

É escandaloso, para dizer o mínimo, que com este péssimo desempenho no estado em que estão presentes, em tese, melhores condições de infraestrutura de serviços de saúde, o número de casos, e principalmente de óbitos, atinja este nível alarmante.

Dória, via de regra age em consonância com os interesses do grande capital na “administração da pandemia”, o que fica evidente na sua posição de pressionar pela volta às aulas, sob pressão evidente dos “tubarões” do ensino privado.

Ao mesmo tempo, Dória foi eleito sob a promessa de privatizar tudo o que fosse privatizável. A pandemia mostrou-se uma excelente justificativa para colocar em prática suas políticas neoliberais e, em certa medida, acelerá-las.

Por exemplo, Dória enviou à Assembleia Legislativa para tramitar em regime de urgência o Projeto de Lei n°529, que buscava, entre outras coisas, extinguir dez órgãos públicos de uma só vez: o Instituto de Terras (ITESP), o Instituto Florestal, a Fundação para o Remédio Popular (FURP), a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano de São Paulo (CDHU), a Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos de São Paulo (EMTU), a Fundação Oncocentro, a Superintendência de Controle de Endemias (SUCEN), o Departamento Aeroviário (DAESP), o Instituto de Medicina Social e de Criminologia (IMESC) e a Fundação Parque Zoológico, além de privatizar sete parques públicos estaduais, vender parte do patrimônio imobiliário do Estado e retirar recursos das universidades estaduais e da FAPESP.

A mobilização de setores importantes do funcionalismo público conseguiu minimizar os efeitos deste fatídico PL 529, que resultou na Lei 17.293/2020, fazendo com que o governo recuasse e retirasse da lista de órgãos públicos que seriam extintos a Fundação para o Remédio Popular, a Fundação Oncocentro, o IMESC (medicina criminal) e o Instituto de Terras (ITESP). Retirou ainda o confisco de verbas das universidades e da Fundação de Amparo à Pesquisa (FAPESP). Ao fim e ao cabo porém, o governo estadual logrou golpear profundamente o serviço público e avançar na sua politica de privatizações.

A pretexto de “dotar o Estado de meios de enfrentamento da grave situação fiscal devido aos efeitos negativos da pandemia”, que na verdade se caracteriza por um déficit de R$10 bilhões no ano fiscal de 2021. Acontece que só em desonerações fiscais o governo Doria repassou 24 bilhões para alguns grandes grupos empresariais em 2019. Portanto, bastaria reduzir as desonerações de 2020 pela metade para cobrir o suposto déficit em 2021.

Alinhado ainda com suas políticas de descaso frente ao coronavírus, com as demissões de trabalhadores terceirizados e com a precarização de serviços públicos e a degradação das condições de trabalho de trabalhadores e trabalhadoras da educação, vem a proposta de retorno das aulas presenciais na rede estadual de ensino, contra a qual vários sindicatos tem lutado, tendo em vista a óbvia incapacidade do governo de garantir as condições mínimas de resguardo da saúde de professores, estudantes, funcionários e famílias que seriam afetados com o retorno às escolas.

Quando analisamos o conjunto da obra do neoliberalismo no estado de São Paulo nos deparamos com uma fórmula conhecida e expressa recentemente por um seu representante, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), em entrevista ao jornal Valor. Segundo ele, seria necessário “cortar privilégios para fazer política social”.

Como o caso paulista mostra, “cortar privilégios” consiste em atacar direitos fundamentais de parte da classe trabalhadora, bem como extinguir serviços básicos geridos pelo Estado. Tudo isso numa lógica de sistemática aniquilação de serviços públicos universais e de entrega destes à iniciativa privada, redução da qualidade dos empregos, aprofundamento da desindustrialização e do subemprego.

Todos os ataques promovidos contra o povo no estado de São Paulo têm acontecido não sem a expressiva resistência de importantes setores organizados da classe trabalhadora e de seus representantes, do funcionalismo público estadual e dos movimentos sociais. Mas é fato que, até o momento, os neoliberais têm sido vitoriosos em seu empreendimento antipopular, a exemplo do que tem acontecido a nível federal.

Para reverter esta dinâmica, é necessário construir uma nova estratégia para o PT SP. É preciso retomar com vigor a mobilização militante nas ruas pelo Fora Bolsonaro e por um Brasil Democrático, Popular e Socialista. Sem mobilização social, mais uma vez corremos o risco de perder de outra ‘janela histórica’ para a derrubada do governo Bolsonaro e abertura de um novo ciclo no país.

O resultado eleitoral confirma a necessidade do PT alterar sua estratégia e alterar seu padrão de funcionamento. O ano de 2021 tem que ser o ano do reposicionamento estratégico do PT.

Este reposicionamento estratégico passa por um profundo debate da estratégia e do modelo organizativo do PT-SP, a começar pela resolução de uma firme oposição ao governo Dória, que terá como um sinal efetivo o lançamento de uma candidatura petista para a disputa da próxima mesa diretora da Alesp.

São Paulo, fevereiro de 2021

Articulação de Esquerda SP (tendência interna do PT)

(*) Na versão em pdf é possível visualizar as tabelas que apresentam um quadro geral dos resultados das eleições. Para acessar, clique aqui.

 

 

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