Desafios para as lutas LGBTQIA+ em tempos de ofensivas fascistas, ultra neoliberais e imperialistas

Por Paulo Mariante (*)

Texto integrante do boletim  especial  Página 13 LGBTQIA+ de julho de 2025

Há menos de um mês realizou-se a grande Parada do Orgulho LGBT de São Paulo, considerada a maior do mundo há mais de uma década, e com isso um considerável espaço nas mídias, inclusive as burguesas, foi ocupado por diferentes abordagens de temas voltados às pessoas LGBTQIAPN+. Em muitas delas chega-se a uma sensação de termos enormes avanços nos direitos desta população. Mas será que isso é verdade?

É preciso considerar-se que as pessoas LGBTQIAPN+ são, em sua grande maioria, da classe trabalhadora, ainda que certos setores do movimento não tenham isso em conta nas suas estratégias de luta, o que favorece as lamentáveis ideias de “pink money” e de “inclusão pelo mercado”, algo que a história do capitalismo não parece endossar: a lógica do mercado não é de direitos, e sim de privilégios, algo que só pode ser ignorado por quem continua acreditando na proclamação de 1789 na “Revolução Francesa”.

Mesmo nos limites dos “direitos” no capitalismo, podemos avaliar alguns aspectos que são frequentemente apontados como “avanços” da pauta LGBTQIAPN+: o reconhecimento do casamento igualitário, da identidade trans e da criminalização da discriminação contra esta população. Inicialmente é importante ressaltarmos que todos estes direitos foram conquistados através de decisões do Supremo Tribunal Federal, pois embora desde 1995 existam projetos de leis no Congresso Nacional sobre estes assuntos, o Legislativo Federal, por suas maiorias ultraconservadoras, interditou qualquer possibilidade de debate e aprovação.

Sobre o casamento igualitário, apesar de ser legítima a reivindicação de “direitos iguais”, em relação às uniões entre pessoas heterossexuais, devemos avaliar seriamente quais os efeitos concretos na vida da maioria das pessoas LGBTQIAPN+, pois uma mudança jurídica não altera as ideias dominantes numa sociedade, ainda mais em tempos de recrudescimento do conservadorismo religioso.

Não se trata de menosprezar a conquista, mas de compreender corretamente seu alcance e seus efeitos, isso para não entrarmos na discussão sobre as possibilidades de uma instituição patriarcal e patrimonial ter algum caráter emancipatório.

Em relação à identidade trans, ao menos a militância LGBTQIAPN+ deveria ter conhecimento de que apesar da amplitude da decisão do STF – dispensando laudo médico e assistência de advogado (a) – existem ainda enormes barreiras para o exercício deste direito, tais como as burocracias e as absurdas taxas cartorárias, que seriam altas para qualquer pessoa, ainda mais para o segmento desta população que é, sabidamente, o mais excluído das possibilidades do mundo do trabalho e de geração de renda.

A criminalização da discriminação das pessoas LGBTQIAPN+, a última conquista no STF neste rol, deve ser observada sob dois aspectos: uma norma punitiva e criminalizadora é o melhor instrumento para se combater o discurso de ódio? Grades prendem ideias? O direito penal num estado classista burguês, racista e patriarcal, será mesmo essa fórmula para combater uma opressão milenar? E além disso, como essa criminalização funciona no cotidiano de delegacias de polícia espalhadas por esse “país-continente”?

Precisamos fazer estas reflexões para compreender a responsabilidade das pessoas LGBTQIAPN+ que hoje estão organizadas em coletivos, associações, sindicatos da classe trabalhadora, movimentos sociais e populares como sem teto e sem-terra, e partidos de esquerda, na construção de estratégias que combinem a lutas imediatas, tais como políticas de trabalho e renda emergenciais para as pessoas trans, com o horizonte de transformação radical da sociedade, numa perspectiva socialista.

Para nós LGBTQIAPN+, nesta quadra do tempo histórico, a luta deve se somar a todos os outros segmentos da classe trabalhadora no enfrentamento ao fascismo, ao ultra neoliberalismo e ao imperialismo, pois todos esses são nossos inimigos, e não há outra possibilidade que não o combate diuturno. ★

(*) Paulo Mariante é advogado popular, militante LGBTQIAPN+ no Identidade – Grupo de Luta Pela Diversidade Sexual, de Campinas, dirigente da ABGLT, ativista pelos Direitos Humanos, Saúde e Antiproibicionista, e filiado ao PT

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