Algumas linhas sobre a crise social no Haiti

Por Varlindo Nascimento (*)

As últimas semanas têm sido pródigas em acontecimentos (eleições) e insurgências que têm colocado em risco a política imperialista em vários países da América Latina e Caribe. O Haiti é mais um desses casos, mas que, diante volume de situações, pode passar despercebido do conhecimento de um público mais amplo.

O Haiti é um país caribenho localizado na margem oeste da Ilha de São Domingos. Na outra margem fica a República Dominicana. Como sabemos, o Haiti tem uma história sui generis entre países com formação de base escravista, realidade de toda a América Latina e Caribe. Enquanto os processos de independência se davam a partir da intervenção de uma elite local descendente dos colonizadores (criollos), o Haiti alcançou sua independência do jugo colonial francês a partir de uma revolução de escravos que instituiu a república no início do século XIX.

A exclusividade na forma como esse país alcançou sua independência lhe trouxe muito mais prejuízos do que vantagens históricas. As elites que controlavam os demais países não queriam o Haiti como um exemplo a ser seguido pelos povos subalternos do continente. Dessa maneira, o Haiti não deveria se constituir em um precedente para movimentos libertários.

No início dos anos 2000, depois da deposição do presidente Jean-Bertand Aristide, o país viveu sob intervenção da ONU através de uma “missão de paz” liderada pelo exército brasileiro que se estendeu até 2017. Como se não bastasse os problemas socioeconômicos e a intervenção estrangeira, que servia antes de mais nada para controlar a população, em 2010 um forte terremoto colapsou ainda mais as condições do país.

Os fatos atuais servem antes de mais nada como prova de que as ditas “missões humanitárias” serviram apenas como instrumento de controle popular e não contribuíram em nada para que a realidade socioeconômica do país tivesse algum avanço concreto. O Haiti permanece sendo um dos países mais miseráveis do mundo e a geopolítica do petróleo levou o país nos últimos dias ao limite da insurreição contra o governo direitista de Jovenel Moïse.

O Haiti tem uma matriz energética extremamente limitada, sendo assim, o país depende fortemente da importação de petróleo e seus derivados, inclusive querosene, extremamente necessária a grande parte da população que não conta com rede de abastecimento de energia elétrica. Em 2005, sob o governo de Hugo Chaves, a Venezuela criou a Petrocaribe, uma aliança que forneceria petróleo e seus derivados a preços subsidiados aos vários países da região, inclusive ao Haiti. Durante esses anos a Petrocaribe possibilitou o escoamento de parte da produção venezuelana em benefício do desenvolvimento regional e de países que sempre foram quintal dos interesses econômicos dos Estados Unidos e suas corporações.

Na tentativa de enfraquecer a Venezuela e levar o governo de Nicolás Maduro ao colapso os Estados Unidos tem impingido uma série de sansões e embargos àquele país, fato que tem gerado impactos diretos nas possibilidades de comercialização de petróleo com os países vizinhos, afetando diretamente as operações da Petrocaribe. Em paralelo a isso, enquanto tiram a Venezuela do comércio na região, os Estados Unidos beneficiam suas grandes corporações, que passam a não ter concorrência vendendo seu petróleo a preços bem mais altos.

O atual governo do Haiti está totalmente alinhado às políticas imperialistas. Acordos com o Fundo Monetário Internacional têm resultado numa série de medidas econômicas que comprometem ainda mais o nível de vida dos haitianos. Diante desse quadro o povo tem ocupado às ruas e exigido a renúncia do presidente Moïse.

A grande mídia corporativa diz que a culpa do problema no Haiti é reflexo da crise na Venezuela, mas não diz que a crise na Venezuela é culpa de uma política de sabotagem econômica levada a cabo pelos Estados Unidos para desestabilizar país. O povo haitiano neste momento sofre duplamente, sofre com as consequências da sua dependência histórica e sofre com um governo completamente alinhado aos interesses americanos e que leva adiante uma política interna de fome.

Diante desse quadro, o povo haitiano se encontra nas ruas exigindo a renúncia imediata de Jovenel Moïse.

(*) Varlindo Nascimento é militante petista em Recife- PE

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